A LITERATURA DOS VIAJANTES EM MATO GROSSO

Se não fossem os bandeirantes, Mato Grosso teria uma literatura em outra língua. Graças a eles, estamos integrados ao espaço geográfico brasileiro.Mas os bandeirantes nada escreveram, pelo menos literariamente, porém passaram por aqui, espíritos cultos que registraram o que viram e o que sentiram. Tais viajantes vieram de diversos países ou Estados e escreveram em sua próprias línguas. Eram estudiosos ou, talvez, curiosos cultos, com sede de ver, de sentir, de descobrir algo novo e diferente. Eles deram outros rumos às lendas antigas, estudaram a quinina, recolheram amostras de material, deram nomes a locais, contactaram com os índios, descobriram minas, plantaram roças, implantaram cidades, etc.

Para estas andanças, eles usaram os mais variados veículos de locomoção como a canoa, lombo de burros e carros de boi, cavalos e até mesmo a pé. Aqui, eles passaram privações: intempéries, ataque de insetos, doenças, etc.

O mais antigo viajante que se tem notícia de que chegou a esta região, foi Antônio Rodrigues,português que subiu o rio Paraguai como soldado. Depois, a pedido do Pe. Manuel da Nóbrega,ele escreveu as "Memórias de Soldado". A chegada deste viajante ocorreu no ano de 1553. Serafim Leite traz o documento de Antônio Rodrigues e o interpreta: "Da carta consta que Antônio Rodrigues, depois de participar da fundação de Buenos Aires e de Assunção em 1537, narra: Desta cidade fomos mais adiante a conquistar terras e subimos acima 250 léguas e chegamos perto do Maranhão e Amazonas. Chegamos aos Parais, gente lavradora, muito amigo dos cristãos, têm um principal a quem obedecem que em sua língua chamam Cameri. Não comem carne humana".

Segundo o Pe. José de Moura, provavelmente, este soldado chegou na região dos Parecis (Parais) em Diamantino.

Alexandre Rodrigues Ferreira foi outro viajante que aqui chegou, provindo da Bahia. Explorou os rios Paraguai, São Lourenço e Cuiabá. Recolheu material e dados sobre zoologia, botânica, Geografia, etc. Ele deixou muitos trabalhos escritos. Segundo João Antônio Neto, Ferreira "foi o que conseguiu arrancar a nossa literatura social do quadro do primitivismo e grosseiro, da simples "sociografia", ou seja da descrição da sociedade, sem preocupação de ciência. Entre suas obras citaremos: "Suplementos à Memória dos rios de Mato Grosso", "Roteiro da Viagem a Mato Grosso" e muitos outros.

Em 1797 Ricardo Franco foi nomeado pelo governador para comandar as tropas na fronteira sul e Forte de Coimbra. Era, na verdade, um militar. Escreveu sobre explorações etnográficas e geográficas. Fez o levantamento hidrográfico do Madeira e Guaporé. Seus trabalhos são científicos (ultrapassados) descritivos. Podemos citar ainda: "Extrato da descrição da Capitania de Mato Grosso", "Reflexões sobre a capitania de Mato Grosso".

Ricardo Franco diz que Cuiabá progredira muito no final do século XVIII: "É Cuiabá um grande povo que consta presentemente com as suas dependências 18 000 almas, abundantíssima de carnes, frutas e hortaliças e peixe por preço ainda mais cômodo do que nos portos do mar. É terra própria para criar homens robustos"...

Francisco Lacerda de Almeida, foi companheiro de Ricardo Franco. Notável matemático formado em Coimbra. Prestou vários serviços a Mato Grosso, trabalhando nas regiões mais inóspitas do Estado. Deixou-nos seu "Diário de viagem".

Visconde de Taunay deve ser considerado também um escritor com breve passagem pelo Estado. Foi excelente romancista Romântico do Brasil. Foi o herói da "Retirada da Laguna", comandante da expedição de Mato Grosso na guerra do Paraguai. Sua obra é bastante extensa. A "Retirada da Laguna" é um retrato fiel do episódio do mesmo nome. Suas obras falam algo sobre nosso rincão. Além da obra citada, temos: "Diário do Exército", "Em Mato Grosso invadido", "Paisagens Brasileiras", "Biografia de Augusto Leverger","Inocência" e muitas outras. Em "Inocência", ele descreve aspectos físicos da região, bem como mostra termos ainda hoje usados. Com a divisão do Estado, todo este acervo fiou para o lado do sul.

Deixamos para último plano, dois ilustres viajantes alemães, que muito gostaram da região, comparando Cuiabá a uma cidade balneária alemã. São eles: Herbert H. Smith e Karl Von Den Steinen. Steinen chefiou uma expedição ao rio Xingu. Penetrou no pantanal, saindo no Rio Cuiabá e de lá chegando até a capital.

Os documentos escritos por eles "Durch Central-Brazilian" e "Entre aborígenes do Brasil Central", descrevem Cuiabá, seu povo, usos e costumes, a flora e a fauna, aspectos culturais, a comunicação, o comércio e o modo de vida. Num trecho dizem: "Em frente à Matriz, ergue-se um alto cruzeiro de pau; ao lado vêem-se algumas figueiras e na praça, o quartel do 21o. batalhão, bem como algumas lojas e duas boticas, numa das quais funciona no 1o. andar, a Sociedade Terpsícore. Passando a catedral, chega-se a um bonito sítio com bancos para descanso, canteiros floridos e árvores novas; aqui, nos domingos, com a música militar, julga-se a gente transplantada a alguma linda estação balneária da Alemanha.

Em outro trecho, continua Steinen: "é impossível haver no mundo, cidade em que mais se cultive a música, mais se dance, mais se joguem cartas, impossível que, em qualquer outro lugar mais frequentemente se agitem as bandeiras de procissões, melhor se saiba combinar as devoções coletivas com os prazeres sociais". Isto mostra, claramente, o grande senso de observação dos autores. "A vida social é o lado esplêndido de Cuiabá". Uma festa rende a outra; por toda a parte a gente é bem vinda". Também aí o autor não mudou. Cuiabá é, por natureza, uma festa e o seu povo, muito hospitaleiro.