AS DIFERENÇAS PERCEBIDAS ENTRE O REALISMO-NATURALISMO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX, E O NEORREALISMO DA DÉCADA DE 1930
Publicado em 02 de março de 2022 por Thalita Brandão Alves
RESUMO
Esta dissertação visa descrever, com base na história da Literatura Portuguesa, faça um texto dissertativo, as diferenças que podem ser percebidas entre o Realismo-Naturalismo da segunda metade do século XIX, de autores como Eça de Queiroz, e o Neorrealismo da década de 1930, de autores como Alves Redol e Fernando Namora.
Palavras-chave: Literatura Portuguesa; Realismo - Naturalismo; Neorrealismo.
Antes de apontar as diferenças entre os movimentos literários requisitados na questão, faz-se necessário a contextualização apresentando os conceitos e caracterização desses movimentos. Anteriormente ao século XIX, a regra estilística clássica transmitia o ponto de vista das classes dominantes. Os personagens eram, nobres que realizavam peripécias surpreendentes. A linguagem utilizada era a mais elevada possível e o que predominava era a separação rígida entre o sublime e o vulgar.
O Realismo Português foi um movimento iniciado em 1865 no século XIX, com a Questão Coimbrã, a partir de um prefácio do autor romântico Feliciano de Castilho criticando a nova tendência literária presente na poesia de Antero de Quental, que por sua vez, respondeu-lhe em uma carta aberta, na qual defendia a liberdade de expressão e de existência da nova escola. No Realismo, enfatizava-se a necessidade de enxergar o mundo com base na realidade, sendo assim, esse movimento não reconhecia a existência de deuses, fadas, monstros e outras criaturas fantásticas, além disso, o movimento discursava sobre temas, considerados polêmicos, como a loucura, racismo e a violência. Segundo Villanueva, pode-se classificar o realismo como “um período ou escola na literatura moderna e contemporânea; realismo como uma marca constante de todas essas escolas, bem como de suas precursoras; e, finalmente, realismo como um objeto de reflexão teórica” (VILLANUEVA, 1997, p. 2 apud: FORTUNA,2012,p.479).
O principal romancista do realismo português foi Eça de Queirós sua obra pode ser dividida em três fases: a de preparação, composta por produções veiculadas na imprensa (1866-1867) e alguns textos ainda de cunho romântico; realismo agudo, quando escreve os grandes romances críticos O crime do padre Amaro (1875/1876/1880), O primo Basílio (1878) e Os Maias (1888); e de maturidade, publica A ilustre casa de Ramires (1900) e A cidade e as serras (1901).
No movimento Naturalista, as obras eram escritas em uma linguagem parecida com a fala cotidiana e tinham longas descrições de pessoas e lugares. Além disso, os personagens tinham seu destino determinado por seus instintos, pelas características que herdavam da família e pelo ambiente em que viviam. Além do senso do real, é fundamental que o escritor naturalista saiba descrever a realidade de maneira original, colocando nos fatos e/ou nas personagens “a vivacidade de sua ironia e a suavidade de sua ternura” (ZOLA, 1995, p. 32 apud: FORTUNA,2012, p.480).
É incontestável que a obra “O primo Basílio” de Eça de Queirós, em Portugal no ano de 1878 influenciou significativamente o Naturalismo brasileiro. Porém, segundo a crítica, na tentativa de se espelhar nesses autores, os escritores brasileiros acabaram por deixar de fora temas cruciais da época, como as experiências raciais, já que como afirma Pereira (1988, p.128):
“seguiam os temas de (...) Eça de Queirós, sem atentarem nas diferenças entre as sociedades (...) e o nosso meio em formação, sem perceberem que o que lá refletia a desagregação da burguesia, aqui não passava de anedota isolada” (apud FORTUNA,2012, p.486).
A datar do seu surgimento, no Brasil, o Naturalismo sofreu duros ataques por parte dos críticos, que não só o condenavam como escola literária, como anulavam a relação entre o Naturalismo e o Realismo. Já que consideravam o Naturalismo brasileiro uma tendência importada e que, por esse motivo, não representaria verdadeiramente o caráter nacional. Sobre isso escreve Pereira (1988):
Na Europa, onde eram outras as condições sociais e outro o nível de cultura, [o Naturalismo] foi a resultante de tendências generalizadas; no Brasil permaneceu estranho às exigências mais profundas do meio e às reações da sensibilidade. Assumiu um caráter de imposição, de disciplina formal. (PEREIRA,1988,p.136 apud FORTUNA,2012, p.488)
No que diz respeito ao Neorrealismo, observa-se que ele é compreendido como o movimento literário que surgiu como uma movimentação cultural em 1938 e se consolida nos anos 40, durante esse período Portugal vivia em tempos caótios resultante da consolidação do Estado Novo Português, que era pautado na censura e repressão sob o governo fascista de Antônio de Oliveira Salazar. O movimento possuía como traço definidor, uma forma explícita de solidariedade e de intervenção transformadora.
Diante disso, surgem os escritores da segunda geração modernista empenhados em produzir uma literatura voltada para a realidade, e, portanto, às questões sociais, culturais, políticas e econômicas pelo qual passava a sociedade, portanto, de caráter social, documental, combativa e reformadora. Esse movimento apresentava como características o anticapitalismo, marxismo e psicanálise; suas obras possuíam temática social, econômica, histórica e regional; além de utilizar a linguagem popular, coloquial e regional, apresentava ainda repúdio às formas tradicionais e a vulgarização de personagens, dentre outros aspectos que podem ser empregados tanto na Literatura como também nas outras artes.
O Neorrealismo teve seu início marcado pela publicação do romance, de Alves Redol, “Gaibéus” escrito em 1940. Alves Redol foi um escritor português que vivenciava e reconhecia os problemas sociais, por meio do contato que mantinha com os locais e grupos sociais desfavorecidos. O escritor era empenhado na luta pela melhoria independente das classes trabalhadoras, o que resultou em sua prisão em 12 de maio de 1944, sob a ameaça, que se concretizou, nem um lápis nem um papel para escrever. “Gaibéus” foi o primeiro romance neorrealista escrito em Portugal, é dedicado “à memória de Venâncio Alves e João Redol, ao ferreiro e ao campino”, seus avós. Com este romance Alves Redol inaugura o ciclo de ficção de temática social sobre os camponeses e pescadores. Na obra acima citada, é possível notar o reconhecimento de uma pirâmide social descrita pela ficção. E essa pirâmide, segundo Reis (1983), é transcrita da seguinte forma:
Dominada no topo pela “Senhora Companhia”, ela compreende degraus sociais extremamente nítidos, que vão de Agostinho Serra à base ocupada pelo grupo dos gaibéus, passando pelos capatazes e rabezanos. Se este esquematismo é só por si, capaz de suscitar ilações importantes no domínio da representação e da pragmática ideológica, ele permite desde já apreender um aspecto também relevante da economia diegética do romance. De fato, notar-se-á facilmente que esta descida do topo à base corresponde, de forma gradual, a uma passagem do individual ao coletivo; e este último acaba por se definir, de acordo com o observado pela crítica redoliana, como dominante fundamental na caracterização da que é indiscutivelmente a personagem nuclear: o grupo de ceifeiros que, desde início e sintomaticamente, ocupa uma das epígrafes que abrem a obra. A projeção do coletivo em Gaibéus decorre de um conjunto de procedimentos inaugurados pelo título do primeiro capítulo (“Rancho”) e prosseguido com a entrada dos gaibéus na cena da ação”. (REIS, 1983, p.481-482 apud PONTES,2005, p.51)
A respeito das diferenças que podem ser percebidas entre os movimentos literários português, será salientado as discrepâncias que se refere à ideologia e ao herói de cada movimento. No que concerne à ideologia é possível identificar que o Realismo oitocentista é burguês e sua compreensão, com relação aos fatos históricos e a condição do homem na sociedade, é ingênua ou insuficiente, sendo que ao Neorrealismo sucede o inverso. Sua visão dos fatos históricos, da sociedade e da vida humana é crítica o suficiente para incitar uma luta literária contra a alienação.
No que tange o herói, no movimento realista ele continua sendo o protótipo do cidadão moldado pelo individualismo e o Liberalismo filosófico, já que, o Realismo reduzirá seu comportamento ao individualismo, e isto se deve a um condicionamento biológico determinista. Já no romance neorrealista o herói é coletivo, os nomes dos homens em certos casos são dispensáveis. O Neorrealismo, não é determinista já que atribui ao homem a característica de ser um ser determinado pela natureza humana e pela sociedade em que vive, porém, seu processo de apropriação do real dá-se a partir do ganho efetivo da consciência que lhe possibilita agir para transformar o mundo e construir seu próprio destino e história.
REFERÊNCIAS
FORTUNA, Daniele Ribeiro. Do naturalismo ao Realismo sujo: A tendência realista na literatura brasileira. Cadernos do CNLF. Volume XVI, Nº 04. Rio de Janeiro. 2012.
MARGATO, Izabel. Notas sobre o Neorrealismo português: um desejo de transformação. PUC, Rio de Janeiro.2009.
PONTES, Roberto. Realismo de 70 e Neorrealismo Português. Revista de Letras – Nº27.Ceará, 2005.