Emanuela Mendes Kruschewsky**

A identidade é algo construído individualmente pelo sujeito, algo único, que pode ser modificado pelo meio social e pode ser atribuído pela origem do sujeito. O conceito de identidade funciona como elemento que preenche os vazios da memória coletiva e fornece pontos de ancoramento do sentimento de identidade,essencial ao ato de se auto afirmar.Para existir uma consolidação de um concepção identitária,o sujeito,o sujeito emergente procura uma reapropriação do ambiente em que vive.Lévi-Staruss(1977) definiu identidade como uma comunidade abstrata,sem uma existência real,mas indispensável como ponto de referência.Uma identidade erguida revela como a mesma se constrói como unidade discreta e circunscreve a realidade em um único quadro de referências,visto que são inumeráveis os referentes que podem intervir para "identificar" um indivíduo:ordem psicológica,biológica,sociológica,histórica,etc.

Uma identidade que venha a negar a outra permanece estagnada em seu meio, excluindo o outro pode-se levar a uma visão apenas de si próprio,o é reducente.É praticamente impossível idealizar o ser que está fora de sua relações.Por outro aspecto,identidade não se solidifica em função de um único sujeito,mas de vários,uma identidade que toma consciência de si toma um ângulo na tensão entre olhar sobre si mesmo e o olhar sobre o outro,uma identidade reflexiva.

As identidades são construídas por diferentes grupos socias, diferenciando-se em suas histórias, encarando com uma noção de pluralidade, o que vem a acontecer no Brasil, onde a população é formada por uma miscigenação de raças, entre elas, índios, portugueses e africanos, que deixaram marcas culturais importantes no país. Porém, para ocorrer à idéia de identidade nacional é preciso que a nação possua a consciência das suas várias culturas e povos.

No inicio da República deu-se então um exagero nativista, ao mesmo tempo em que se repudiava o português enalteceu-se a etnia indígena e aspectos, genuinamente, nacionais, idealizando um ufanismo acerca da identidade brasileira. Lima Barreto satirizou tal ufanismo, criando seu famoso personagem, tipo acabado do patriota exaltado: o Major Policarpo Quaresma, narrando a vida de um modesto funcionário público em três distintos estágios, correspondentes a partes da obra.

A caricaturar o artificialismo de seu tempo, o autor Lima Barreto relata de forma descontraída e informal o cotidiano de um grande centro. O romance se focaliza no mundo carioca em níveis diferentes e que se complementam: a vida simples do subúrbio, o cotidiano familiar e político da zona rural e a atmosfera política que se vivia na época da primeira República. A obra que revela não só a ilusão de uma idealização criada pelos escritores românticos, mas também a dificuldade em articular um conceito de identidade nacional no país. Baseado no modelo e moldura das ações do protagonista, a trama não está apenas aderida a uma forma que remete somente a identidade e a pátria, mas, principalmente, a um discurso exagerado acerca de uma idéia nacionalista proposta por Quaresma, que direcionava sua vida a um ideal de pátria.

Publicado em 1915, a obra é vista pelos modernistas como uma referência à liberdade da linguagem cotidiana. É um romance social, tem como núcleo principal um patriota puro e ardente, um tanto quanto ingênuo, um visionário, não porque seja louco ou porque seus objetivos aparentam ser absurdos, mas porque o são por não se adequarem e até contrariam aos interesses dos grupos que detêm o poder.

Policarpo quaresma era um homem extremamente nacionalista,um sonhador que defendia com unhas e dentes o que eu sua terra tinha de mais belo,ama sua pátria acima de si mesmo e por conta disto abriu mão para viver em prol do engrandecimento de sua nação.Dedicado ao serviço público, ironizado pelos que queriam levar ao ridículo aquele que trabalhava em silêncio para a grandeza e a emancipação da Pátria, o herói patriota leva a vida, metade na repartição (burocrática), sem ser compreendido, e a outra metade em também sem ser compreendido,pelos amigos e pela irmã.Era um exaltado patriota, e seu nacionalismo era tão extremado que em sua mesa, em sua biblioteca e em seu jardim havia lugar exclusivamente para comidas, livros e flores legitimamente nacionais.Eis que de repente surge sua obsessão,salvar a nação por meio de uma reforma nos costumes.

A obra dividiu-se em três partes: na primeira, Quaresma por meio de uma carta tenta convencer a Câmara de Deputados solicitando a doação do tupi como língua oficial do país no lugar da língua portuguesa (chegou ao extremo de produzir documentos oficiais em Tupi) e foi preso em um sanatório por isso. Ao sair do sanatório, o Major Quaresma desistiu da idéia de transformação dos costumes nacionais, passou a acreditar que a solução dos males brasileiros sucederia de uma reforma na agricultura, e querendo provar que as nossas terras são mais férteis do mundo, mas vencido pela má qualidade do solo, pelas saúvas e pela mesquinharia da política local. Resolve voltar ao Rio de Janeiro para salvar a pátria dos perigos da Revolta Armada que emergiria na capital federal. Alistando-se no exercito, a favor do Marechal Floriano, se empenha nas reformas políticas do "florianismo", onde se decepciona com a política. Entretanto, essa realidade era tão forte que o maior sonho de Quaresma se concretiza, a ordem republicana foi bem sucedida, indiscrinadamente, penitencia a todos que ousam discordar dela e de tão arbitrária alcançou Policarpo, que tanto a defendia, ao entrar em defesa de alguns prisioneiros, é preso e enviado para a Ilha das Cobras, onde teria o mesmo fim dos prisioneiros por cujos direitos protestava.

O protagonista da obra Triste fim de Policarpo Quaresma, acreditava em um país onde a identidade nacional é o meio de se chegar à sua própria identidade, a conseqüência de um povo sem identidade cultural poderia se catastrófica.Lima Barreto faz pequenas criticas a aspectos da sociedade no período da República Velha,a história se mostra tensa quando o autor faz uma análise no final do livro,quando são feitas severas criticas ao positivismo e ao então presidente Floriano Peixoto.O romance discute a questão nacionalista,mas também expõe uma lacuna existente entre os idealistas e pessoas que apenas se preocupam com seus interesses e sua vida habitual.A narrativa desconstrói o mito romântico de um Brasil superior,evidenciando a distância entre o real e o sonho de Policarpo,usando de críticas sobre o idealismo inconseqüente,incapaz de ver as verdadeiras dimensões do real.Abordando o tema do patriotismo brasileiro,a obra problematiza um dos conceitos mais inveterado do caráter nacional,expondo-o ao ridículo,numa impiedosa anatomia da alma coletiva.

Uma transformação e também algumas mudanças nas identidades pessoais, pode desviar do conceito que o sujeito tem de si próprio como individuo unificado. Com a perda de um sentido de si mesmo pode ocorrer uma descentralização do sujeito,segundo Hall,esse duplo deslocamento,descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos – constitui uma "crise de identidade" para o sujeito,e consequentemente para a sociedade e para o país.