REPERCUSSÃO GERAL: O novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário regulamentado pela Lei n° 11.418/2006

Anna Carolina Matos e Juliana Nunes Lamar
Christian Barros Pinto


SUMÁRIO: Resumo; Introdução; 1.  Recurso Extraordinário e hipóteses de cabimento; 2. A Emenda Constitucional nº 45/2004 e o novo requisito de admissibilidade do RE 2.1 A Repercussão Geral regulamentada pela lei 11.418/06; 3. Análise do instituto da Repercussão Geral; 4. Razoável duração do processo x cerceamento do acesso ao Judiciário; Considerações Finais, Referências.

RESUMO
O presente paper trata da inovação trazida pela Emenda Constitucional de 45/2004, que introduziu a regra do parágrafo terceiro do artigo 102 na Constituição Federal. Passou assim a exigir para que um recurso extraordinário fosse admitido, a demonstração de repercussão geral das questões levadas ao Supremo Tribunal Federal. A regulação da matéria é objeto também da Lei n° 11.418/2006, que delineou os critérios para sua caracterização, bem como suas hipóteses de cabimento, competência e quorum para julgamento. Objetiva-se, com o presente estudo, analisar os aspectos mais relevantes desta alteração, o instituto da repercussão geral, sua incidência bem como bem como verificar a efetividade da repercussão geral para que o STF cumpra sua função constitucional.

Palavras-chave: recurso extraordinário; repercussão geral; STF; duração razoável.  


INTRODUÇÃO
A configuração atual do Recurso extraordinário inscreve-se na chama “crise do Supremo Tribunal”, nome que faz alusão ao grande número de processos submetidos ao julgamento dessa Corte. A configuração de fato tornava o STF uma nova instância jurisdicional para a qual poderia influir na decisão de praticamente todos os litígios. Necessário então se fez a criação de óbices à interposição desse recurso, de mecanismos que filtrassem a chegada de demandas de menor relevância ao Supremo Tribunal Federal, sendo um deles a Repercussão Geral.
A emenda constitucional n° 45/2004 acrescentou esse novo requisito, obrigando que fosse demonstrada pelo recorrente a repercussão geral das questões constitucionais discutidas, sob pena de não ter seu recurso conhecido. A partir do surgimento desse dispositivo, apenas os recurso que contenham questões de relevância econômica, jurídica, social ou política serão julgados pelo Supremo.
O aumento progressivo do número de pendências, assim como o surgimento, entre outras, de ações repetitivas e coletivas, clama pela adequação do processo que, sem dúvida, avançou consideravelmente com a instituição do requisito da repercussão geral. Saliente-se que esta espécie de limitação é a grande tendência dos atuais sistemas constitucionais, já existindo em diversos países, no Japão, Estados Unidos, Argentina e Alemanha.  O STF pode assim exercer sua função de guardião da Constituição Federal promovendo a unidade no direito preservando e dando maior credibilidade às decisões que transcendem interesses apenas das partes possuindo uma relevância de vários âmbitos destinando mais tempo para a apreciação de questões realmente fundamentais.
Sob essa perspectiva processual, a repercussão geral, como requisito formal imposto à estrutura do recurso extraordinário, diminui o afluxo dessa modalidade recursal ao STF e ao fazer uso dessa ferramenta, a Corte tem potencial para redimensionar aspectos da atuação do Poder Judiciário cumprindo ainda o seu desiderato de resguardar o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva.

 
1.  RECURSO EXTRAORDINÁRIO E HIPÓTESES DE CABIMENTO
 Antes da criação do Supremo Tribunal de Justiça pela Constituição Federal de 1988, o Supremo Tribunal Federal tinha competência recursal para julgar tanto causas em que houvesse violação ao direito federal quanto causas em que a suposta ofensa fosse dirigida a Carta Magna. Com o advento dessa nova instância, ocorreu uma distribuição de competência, de modo que violações à legislação federal ordinária passaram a ser revistas por meio do recurso especial.
O Recurso Extraordinário, também conhecido como recurso de estrito direito, examina aspectos exclusivamente jurídicos da decisão recorrida, sendo que por meio dele se busca alterar decisão que ofenda direito objetivo, que transcende o interesse subjetivo das partes. Segundo Teresa Wambier (2008, p. 247), “trata-se de recurso de fundamentação vinculada e o único fundamento que pode embasá-lo é a ofensa a Constituicao Federal, desde que a questão discutida no recurso apresente repercussão geral”.

A expressão “extraordinário”, presente na Constituicao Federal, é utilizada para diferenciar este recurso dos demais recursos previstos no Direito Processual. Enquanto nestes a principal preocupação é com a exatidão das decisões de instancias inferiores, ou seja, com a correta aplicação do Direito ao caso concreto, tendo em conta a situação fática apresentada pelas partes, no recurso extraordinário a preocupação central é com o direito objetivo. Sua existência destina-se a manter a integridade da Constituicao Federal e a uniformizar a aplicação do direito constitucional em todo o território nacional, e não a corrigir eventuais injustiças cometidas em julgamentos de instancias ordinárias, tanto que é vedado ao STF reexaminar aspectos fáticos do caso julgado (BERMAN, 2009, p.96).


Importante ressaltar que apesar de seu aspecto objetivo, essa espécie de recurso acaba por apresentar também um aspecto subjetivo. Quando há a possibilidade de revisão dos julgamentos anteriormente proferidos, o caso será efetivamente reanalisado a luz da interpretação constitucional do STF, mediante provocação de um particular, podendo ter o resultado alterado, mesmo que seja apenas uma consequência reflexa de tal julgamento (BERMAN, 2009, p.97).
A competência para julgamento, mediante Recurso Extraordinário, de causas decididas em única ou última instância é do Supremo Tribunal Federal. A Súmula n. 456, diz que “o Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie”, demonstrando assim que desde que reconhecida qualquer uma das hipóteses de cabimento do RE, o STF deverá aplicar essa orientação ao quadro fático encontrado.
O Recuso extraordinário precisa atender a alguns requisitos específicos, de modo que se os mesmos não forem observados, o direito do recorrente restará prejudicado, uma vez que não poderá ter sua pretensão examinada. Os pressupostos de admissibilidade, exigências estabelecidas pela lei, deverão necessariamente ser obedecidos para que haja a apreciação do mérito da causa, sendo que nesse gênero os requisitos são: cabimento, legitimação para recorrer, interesse em recorrer, tempestividade, preparo, regularidade formal e fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer. Com o advento da Emenda Constitucional 45/04 criou-se ainda a obrigatoriedade de demonstração da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, também sob a forma de requisito de admissibilidade do recurso.
A Constituição enumerou em seu artigo 102, inciso III, alíneas a, b, c e d as hipóteses de cabimento, primeiro requisito intrínseco, quais sejam:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:
a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal


A legitimação para recorrer no recurso extraordinário obedece o que dispõe o artigo 499 do Código de Processo Civil: são legitimados a parte vencida no processo, o Ministério Publico e o terceiro prejudicado pela decisão impugnada. Também o interesse em recorrer é aferido normalmente, com referencia ao binômio utilidade-necessidade como integrantes desse pressuposto recursal (BERMAN, 2009, p. 98).
Os requisitos da tempestividade, do preparo e da regularidade formal devem obedecer o disposto no artigo 541 do Código de Processo Civil, sendo de 15 dias o prazo para interposição  do referido recurso. Já as causas impeditivas ou extintivas do poder de recorrer são: ausência de pré-questionamento e presença de matéria já decidida anteriormente ou sumulada.
Importante ressaltar que esse julgamento de admissibilidade do RE é feito tanto na instância em que se deu a decisão recorrida quanto pelo STF. Se o tribunal inferior não o admitir, de acordo com o artigo 544 do Código de Processo Civil, será cabível agravo de instrumento nos próprios autos, no prazo de 10 dias, a ser analisado pela própria Corte Suprema. Já a competência para realizar o exame de admissibilidade dos recursos extraordinários em relação à repercussão geral é exclusiva do STF.
Sendo assim, a ausência de qualquer desses pressupostos leva ao não conhecimento do recurso, pois descaracterizada a admissibilidade, o exame do mérito da questão sequer será feito. Esses mecanismos de “filtragem”, inclusive o da repercussão geral introduzido pela Emenda Constitucional 45/04, são utilizados visando diminuir a sobrecarga que atinge o STF, excluindo de sua apreciação demandas de menor relevância e racionalizando sua função. Por outro lado, se presentes os requisitos, o órgão competente deverá examinar a pretensão recursal, dando ou negando-lhe provimento.


2. A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004 E O NOVO REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE DO RE
Fora promulgada a Emenda Constitucional 45, na data 08 de dezembro de 2004 que introduziu no art. 102 da Constituição Federal um novo parágrafo, o§ 3º que disciplina: “No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros”. Exigindo-se assim para o reconhecimento do recurso extraordinário a necessidade da demonstração da repercussão geral da controvérsia constitucional ali debatida sendo analisado pelo Supremo Tribunal Federal.
As características desse novo instituto apresentado demandam uma comunicação mais próxima e direta entre os órgãos do poder Judiciário principalmente no que diz respeito ao ser compartilhado as informações sobre os temas em julgamento bem como de uma sistematização das decisões e uniformização de procedimentos. Tendo a finalidade em um primeiro momento de se fazer valer a realização de uma tutela jurisdicional efetiva prestada em um prazo razoável e ainda de estimular a compatibilização das decisões judiciais racionalizando a atividade judiciária.


2.1 A REPERCUSSÃO GERAL REGULAMENTADA PELA LEI 11.418/06
A inserção do pressuposto de admissibilidade da repercussão geral foi inspirada no “writ of certionari”. Este é o instituto utilizado para triagem dos recursos a serem analisados na superema corte Norte-Americana a qual com fundamento do poder discricionário poderá ou não exercer sua função jurisdicional conforme as questões expostas na peça. No ano de 2006, a lei n° 11.418/2006 surgiu regulamentando o dispositivo constitucional que tratava da repercussão geral, inserindo dois novos artigos no Código de Processo Civil, o arts. 543- A e 543 – B:
Art. 543-A. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário, quando a questão constitucional nele versada não oferecer repercussão geral, nos termos deste artigo.
§ 1o Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa.
§ 2o O recorrente deverá demonstrar, em preliminar do recurso, para apreciação exclusiva do Supremo Tribunal Federal, a existência da repercussão geral.
§ 3o Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal.
§ 4o Se a Turma decidir pela existência da repercussão geral por, no mínimo, 4 (quatro) votos, ficará dispensada a remessa do recurso ao Plenário.
§ 5o Negada a existência da repercussão geral, a decisão valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
 § 6o O Relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
§ 7o A Súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão.


Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo.
§ 1o Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte.
§ 2o Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos.
§ 3o Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se.
§ 4o Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada.
§ 5o O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da repercussão geral.

Embora o requisito de repercussão geral tenha sido regulamentado por Lei que alterou o Código de Processo Civil, é aplicável a todos os recursos extraordinários, nos processos trabalhistas, penal, eleitoral e militar, uma vez que a norma constitucional não fez nenhuma ressalva e que as regras do Código de Processo Civil são aplicáveis subsidiariamente às demais espécies processuais.
As principais finalidades estabelecidas com a repercussão geral é a de delimitar a competência do STF, no julgamento de recursos extraordinários às questões constitucionais com relevância social, política, econômica ou jurídica, que transcendam os interesses subjetivos da causa e que tenham relevância para além daquelas partes, e ainda de uniformizar a interpretação constitucional sem exigir que o STF decida vários casos idênticos sobre a mesma questão constitucional.
Ressalte-se aqui, que antes da instituição da repercussão geral como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário foi experimentado o requisito da arguição de relevância da questão firmada para o seu conhecimento em sede extraordinária. Os dois não se confundem apesar da função recursal de “filtro”. A arguição de relevância funcionava como um instituto que possibilitaria o conhecimento de um recurso extraordinário que a priori incabível enquanto a repercussão geral visa excluir da analise do STF controvérsias que assim não são caracterizadas. Ainda, enquanto a arguição está voltada para o conceito de relevância, a repercussão exige para além da relevância da controvérsia constitucional a transcendência da questão. E quanto ao formalismo, a repercussão geral é analisada em sessão publica com julgamento motivado diferente da outra que ocorria sessão secreta dispensando a fundamentação (MARINONI; MITIDIERO, 2007, p. 30 31).


3. ANÁLISE DO INSTITUTO DA REPERCUSSÃO GERAL
A Constituição Federal de 1988 preservou o Supremo Tribunal Federal como órgão de cúpula do Poder Judiciário, conferindo ênfase não mais ao sistema difuso, mas ao modelo concentrado, uma vez que, praticamente, todas as controvérsias constitucionais relevantes passaram a ser submetidas ‘a Corte Suprema. Como já mencionado anteriormente, o STF deve contribuir para a unidade do Direito no Estado Constitucional brasileiro, de modo que o instituto da repercussão geral surge como uma das formas de concretizar esse fim, pois com ele o STF analisará a demanda apenas quando sua apreciação for imprescindível para a concreção dessa unidade, tratando de questões realmente relevantes que transcendam o interesse subjetivo das partes.
A demonstração da repercussão geral da questão constitucional debatida deverá ser feita na peça do recurso extraordinário, preliminarmente e em tópico próprio, sendo essa uma exigência formal, uma vez que cabe ao recorrente o ônus de arguição da mesma. Trata-se de requisito intrínseco de admissibilidade recursal, devendo ser examinada previamente, pois é um pressuposto para que o mérito do recurso seja enfrentado. Caso não seja demonstrada, o direito de recorrer ao Supremo Tribunal Federal por meio de recurso extraordinário deixa de existir, como dispõe o artigo 543-A do Código de Processo Civil. Ainda que haja a perda desse poder nessa instância, Marinoni e Mitidiera (2007, p.18) acertadamente afirmam que “a adoção desse mecanismo de filtragem recursal, encontra-se em absoluta sintonia com o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva e, em especial, com o direito fundamental a um processo com razoável duração”, não havendo que se falar em cerceamento de defesa.
A apreciação acerca da existência ou não de repercussão geral da controvérsia versada no recurso extraordinário é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, não admitindo-se que outros tribunais se pronunciem a respeito do assunto. O artigo 102 da Constituição Federal, § 3o, dispõe acerca dessa demonstração, que deverá ser feita nos termos da lei, a fim de que o exame de admissão possa ser feito pelo Tribunal, o qual somente poderá recusar o recurso pela manifestação de dois terços de seus membros. Importante ressaltar que o julgamento que decide a respeito da existência ou inexistência de repercussão geral vincula a Corte Constitucional, sendo que essa decisão tem eficácia vinculante justamente para concretizar o principio da razoável duração do processo (MARINONI E MITIDIERA, 2007, p.33).
Em se tratando do quorum: como já foi mencionado, o Supremo Tribunal Federal só poderá recusar o RE por ausência de repercussão geral pela manifestação de dois terços de seus membros. Para Marinoni e Mitidiera (2007, p.45), essa rigidez ocorre porque “há uma presunção de repercussão geral das questões levadas ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal pela via do recurso extraordinário”, ou seja, presume-se que há questão constitucional relevante justificadora da admissão de recurso extraordinário.
 Em se tratando do procedimento: como cabe ao relator proceder previamente o exame de admissibilidade do recurso, poderá ele não admitir o RE, se for observado, por exemplo, caso de intempestividade ou ausência de afirmação de violação de questão constitucional na decisão recorrida (MARINONI; MITIDIERO, 2007, p.46). Não sendo caso de não admissão do recurso extraordinário pelo relator, deverá levá-lo à Turma para apreciação da existência ou não da repercussão geral, de modo que, segundo o artigo 543-A do CPC, § 4o, “se a Turma decidir pela existência da repercussão geral por, no mínimo, 4 (quatro) votos, ficará dispensada a remessa do recurso ao Plenário”. Importante notar a possibilidade da participação de terceiros intervindo como amicus curiae, o qual poderá ofertar razões por escrito a fim de convencer a Corte de umas das posições, democratizando assim o debate. Por fim, pronunciando-se o STF, a súmula do julgamento constará de ata e será publicada no Diário Oficial, servindo essa publicação como acórdão, para que seja atendida a exigência do julgamento público e motivado.
Destaca-se que a relevância e transcendência da questão debatida, binômio que caracteriza a repercussão geral da controvérsia segundo Marinoni e Mitidiero (2007, p.33) só podem ser analisadas no caso concreto, porém, se forem caracterizadas, o Supremo Tribunal se encontra obrigado a conhecer do recurso, ou seja, a admiti-lo e apreciar o seu mérito, o que não significa que deva lhe dar provimento. Sendo assim, caso a existência da repercussão geral seja reconhecida, o STF julgar o mérito da irresignação, negando ou dando provimento ao recurso, entretanto, caso não seja reconhecida, nega-se seguimento ao recurso, não o conhecendo.
No reconhecimento da existência de repercussão geral, a decisão recorrida, com o juízo de admissibilidade já ultrapassado, vai ser substituída pela decisão a ser prolatada pelo STF, independentemente da sorte do recurso (MARINONI; MITIDIERO, 2007, p.52). Já quando não há esse reconhecimento, também não ocorre substituição da decisão recorrida pela do STF. Marinoni e Mitidiero (2007, p. 52) afirmam ainda que “o efeito pragmático oriundo do não-reconhecimento esta em que os outros recursos fundados em idêntica matéria não serão conhecidos liminarmente, estando o STF autorizado a negar-lhes seguimento de plano”.
De acordo com o artigo 543-A, caput, a decisão do Supremo Tribunal Federal que não conhece do Recurso Extraordinário por ausência de relevância e transcendência é irrecorrível. Esse dispositivo, entretanto, não exclui o cabimento de embargos de declaração, em caso de obscuridade, contradição ou omissão da decisão. Já o não recebimento de RE pela ausência de Repercussão Geral de maneira equivocada, pode desafiar também, em tese, mandado de segurança, utilizado como sucedâneo recursal (MARINONI; MITIDIERO, 2007, p.57).


4. RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO X CERCEAMENTO DO ACESSO AO JUDICIÁRIO
A EC n. 45/2004 introduziu norma que assegura a razoável duração do processo judicial e administrativo (art. 5 CF, LXXVIII). Positivando-se, assim a ideia de proteção judicial efetiva, no princípio da duração razoável do processo que significa o reconhecimento de um direito subjetivo a um processo que seja célere, impondo ao Poder Público em geral, e ao Poder Judiciário, em particular, a adoção de medidas a realizar tal objetivo. Envolvendo temas complexos e pretensões diversas, como a modernização simplificação do sistema processual, a criação de órgãos judiciais em relacionadas à efetividade do justo acesso à justiça (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p.545).
A análise do instituto da repercussão não pode ser dissociada do perfil constitucional da Corte Suprema. O STF é órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro, ao qual compete zelar, precipuamente, pela Constituição Federal, nos termos do art. 102 da Constituição Federal Brasileira de 1988. Com a constitucionalização do direito, iniciada no século XX, a proteção dos direitos fundamentais é mais evidente funcionando os tribunais como guardiões da constituição destacando-se no momento em que resguardam certos direitos (BERMAN, 2009, p.128).
Deve assim o STF atender ao interesse público no sentido de concretizar e fazer uma interpretação uniforme do direito de maneira a estabilizá-lo bem como desenvolvê-lo unitariamente no cotidiano social. E para desempenhar essa função há a adoção de um mecanismo recursal que se encontra em absoluta sintonia em especial com a duração razoável do processo, que passa o tribunal referido a ganhar um status que tende a se aproximar de uma corte constitucional. A utilização do pré-requisito da repercussão geral não consiste em uma atividade pura e simples de “filtar” recursos e as demandas que seriam apreciadas pela suprema corte. O que de certo, nada impede o acesso ao judiciário visto que não foi criado um meio de repulsa para a busca das soluções das lides existentes e sim um instituto que pudesse agir com eficiência sob a perspectiva de uma duração razoável do processo visando a função do STF como diferenciadora, não devendo ser vista como um grau a mais na jurisdição brasileira, como uma 3° ou 4° instância.
A utilização de mecanismos recursais, por uma determinada Corte Constitucional, mediante a escolha de questões que serão por ela apreciadas, como forma selecionar, e não de cercear o acesso, os processos a serem julgados é utilizada em diversos países. No direito alemão o acesso ao Supremo Tribunal é subordinado quando a causa decidida ostentar uma “significação fundamental”. No direito argentino, por exemplo, “por falta de agravio federal suficiente o cuando las cuestiones planteadas resultaren insustanciales o carentes de transcendência” conforme o art.280 Código Procesal Civil y Comercial de La Nación Argentina. Encontra-se em todos os casos a razão de prezar pela unidade do direito sem sobrecarregar o Supremo Tribunal com exames de casos em que não haja um interesse notório nem cuja solução não importe transcendência e relevância nas causas apreciadas (MARINONI; MITIDIERO, 2007, p.20).
Assim, o STF deixa de funcionar como uma outra instância processual e poderá produzir uma jurisdição efetiva e de melhor qualidade, no seu real papel de guardar a Constituição Federal. Sendo a repercussão geral totalmente constitucional e que de maneira alguma impedirá o acesso de demandantes ao judiciário uma vez que já fora acessível anteriormente nas instâncias ordinárias bem como permite ainda o acesso à ordem jurídica justa e de certa maneira mais eficaz.


CONSIDERAÇÕES FINAIS
No curso do presente paper pretendemos analisar o instituto da Repercussão Geral, pressuposto de admissibilidade do recurso extraordinário criado pela Emenda 45/04 e regulamentado pela Lei 11.418/06, cujo principal objetivo foi tentar solucionar a sobrecarga de trabalho do Supremo Tribunal Federal e concretizar o direito a prestação de tutela jurisdicional efetiva, uma vez que o STF estava ocupando-se de litígios de toda espécie, fazendo com que sua função precípua de Guardião da Constituicao e seu papel de unificador do Direito no Estado Constitucional restassem prejudicados.
    A Lei 11.418/06 exigiu para fins de caracterização da repercussão geral, que fosse demonstrada a relevância e a transcendência do interesse subjetivo das partes, sendo que para seu efeito será considerada a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico. A decisão acerca de sua existência ou não caberá ao Supremo Tribunal Federal, exclusivamente, de modo que a inadmissão do recurso por inexistência devera ser feita pelo quorum de dois terços de seus membros, já que as questões levadas ao seu conhecimento gozam de “presunção de repercussão”.
    Dessa forma, consideramos de extrema importância a criação de um mecanismo como esse, capaz de reduzir consideravelmente a carga de trabalho a que são submetidos os ministros do STF, racionalizando assim sua atividade. Entendemos, portanto, ser constitucional a exigência de demonstração de repercussão geral, não havendo que se falar em cerceamento de defesa ou dificuldade de acesso ao judiciário e sim em eficaz prestação de tutela jurisdicional e garantia do direito a duração razoável do processo.
























REFERÊNCIAS


ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.


BERMAN, Jose Guilherme. Repercussão geral no Recurso Extraordinário: origens e perspectivas. Curitiba: Juruá, 2009.


CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. vol. 2. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.


DA CUNHA, Sérgio Sérvulo. Recursos Extraordinários e Recurso Especial. São Paulo: Saraiva, 2010.


LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.


MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Repercussão Geral no Recurso Extraordinário. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2007.



MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.


MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. vol. V. Rio de Janeiro: Forense, 2012.


NERY JR., Nelson Nery; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.


WAMBIER, Teresa Arruda Alvin.  Recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória. 2. ed. reform. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.