SINOPSE DO CASEGothan Bane, Batman em “O Cavaleiro das Trevas Ressurge”[1]

 

Haroldo Lima de Melo Neto[2]

Thales da Costa Lopes[3]

 

  1. DESCRIÇÃO DO CASO 

 

Oito anos depois dos eventos de Batman – O Cavaleiro das Trevas, segundo filme da saga Batman, a lei e a ordem prevalecem em Gotham City: sob os poderes do Ato Dent, o comissário Gordon praticamente erradicou o crime violento e organizado. Bruce Wayne, no entanto, que não atua mais como Batman vive isolado na própria Mansão enquanto sua empresa desmorona depois de ter investido em um projeto de energia limpa criado para aproveitar a energia nuclear, mas encerrado quando ele descobriu que o núcleo poderia ser transformado em uma bomba. Miranda Tate, membra do conselho administrativo da Wayne Enterprises, convence Wayne a refazer a sociedade e continuar com seus trabalhos filantrópicos.

Surge Bane: líder terrorista e antigo membro da Liga das Sombras. Ao descobrir a movimentação de Bane, Wayne retorna como Batman e confronta Bane, que afirma ter assumido a Liga das Sombras após a morte de Ra’s Al Ghul. Depois de deixar Batman gravemente ferido em um combate corpo a corpo, Bane o coloca numa prisão de onde é praticamente impossível fugir. Seus companheiros de prisão contam para Wayne a história da única pessoa que conseguiu escapar: uma criança motivada pela necessidade e pela mera força de vontade. Enquanto o prisioneiro Wayne se recupera dos ferimentos e se prepara para ser Batman de novo, Bane consegue transformar Gotham City em uma cidade-Estado isolada. Primeiro ele atrai para o subsolo a maior parte dos policiais de Gotham e os prende lá; depois provoca explosões que destroem a maioria das pontes que conectavam Gotham City ao continente, anunciando que qualquer tentativa de deixar a cidade resultaria na detonação do núcleo de Wayne, do qual se apoderou e transformou em uma bomba.

A tomada de poder por parte de Bane acontece junto com uma vasta ofensiva político-ideológica. Bane revela publicamente o acobertamento da morte de Dent e liberta os prisioneiros detidos pelo Ato Dent. Condenando os ricos e poderosos, ele promete devolver o poder ao povo, convocando as pessoas comuns a “tomarem a cidade de volta”. Segue-se então a ideia do filme de poder do povo: uma sequência mostra uma série de julgamentos e execuções dos ricos, as ruas tomadas pelo crime e pela vilania… alguns meses depois, enquanto Gotham City continua sofrendo o terror popular, Wayne consegue fugir da prisão, retorna à cidade como Batman e convoca os amigos para ajudá-lo a libertar a cidade e desarmar a bomba nuclear antes que ela exploda. Batman confronta e domina Bane, mas Miranda intervém e o apunhala – a benfeitora social revela-se como Talia al Ghul, filha de Ra’s: foi ela que escapou da prisão quando criança e foi Bane que a ajudou a fugir.

Depois de comunicar seu plano de terminar a tarefa do pai de destruir Gotham, Talia foge. Na confusão que se segue, Gordon destrói o dispositivo que permitia a detonação remota da bomba enquanto Selina mata Bane, permitindo que Batman vá atrás de Talia. Ele tenta forçá-la a levar a bomba para a câmara de fusão onde pode ser estabilizada, mas Talia inunda a câmara. Talia morre quando seu caminhão bate, confiante de que a bomba não pode ser detida. Usando um helicóptero especial, Batman transporta a bomba para além dos limites da cidade, onde ela explode sobre o oceano e supostamente o mata.

Essa é uma breve descrição do filme “Batman: o cavaleiro das trevas ressurge”, de 2012, dirigido por Christopher Nolan. Apesar de ser analisado sob várias perspectivas, cabe aqui a seguinte análise: em decorrência das circunstâncias de instabilidade institucional, no sentindo de manutenção de uma ordem jurídica, cabe a pergunta abaixo:

 

  1. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DO CASO

 

  1. Descrição das decisões possíveis

 

Na descrição acima, é possível entender o caso dos justiceiros diante de tantas desigualdades buscando transformar a sociedade em lugar melhor. Porém, é necessário compreender as minucias do é se tornar um justiceiro, relacionando-o com as normas morais e com as normas jurídicas. Dessa forma, apresentam-se as seguintes proposições:

 

a) Qual o limite de atuação do Estado na manutenção da ordem e da paz em face aos “justiceiros”, especialmente o Bane, que fala em devolver o poder do povo ao próprio povo?

b) Os justiceiros, em nome do povo, podem agir no lugar do Estado?

c) O Direito pode ser encontrado “na rua”?

  1. Argumentos capazes de fundamentar cada decisão

 

  1. O povo enquanto legítimo detentor da soberania constitucional em face do direito extradogmático.

 

Diante da urgente estabilização de mazelas a sociedade como a crescente criminalidade, crise no transporte público, decadência do sistema educacional e inexistência de um planejamento para melhorar e até mesmo implantar um sistema saneamento básico,  em face da ineficaz atuação do Estado na proteção e garantias básicas como a segurança pública entre outras responsabilidades, em meio ao povo, é natural emergirem cidadãos revoltados com as atuais condições e decididos a terem seus direitos garantidos, mesmo que devam opor-se ao Estado ocasião esta, que se remete as principais revoluções históricas onde o povo, demonstrou o real detentor do poder sendo tão significativos movimentos da Revolução Francesa, Inglesa e Americana que foram a base para instauração dos princípios constitucionais e para revelar a soberania do povo. Ambas as revoluções declaravam o povo como detentor legítimo do poder constituinte

Segundo Livia Lamas (apud Ferdnand Lassalle, 1862) a Constituição deve refletir os fatores reais:

 

Lassalle acrescenta, ainda, que tal lei vigora e é respeitada devido ao fato de haver uma coação geradora da noção de obrigatoriedade. Esta coação é impulsionada por forças denominadas por ele de fatores reais do poder, fatores estes que ao atuar no seio de cada sociedade são a força ativa e eficaz que informa todas as leis e instituições jurídicas vigentes, determinando que não possam ser em substância, a não ser tal como elas são [...].

[...] A essência de uma Constituição consiste, portanto, na soma entre os fatores reais do poder e o que vai ser escrito. Colhem-se estes fatores reais de poder, registram-se em uma folha de papel, (...) e, a partir desse momento, incorporados a um papel, já não são simples fatores reais do poder, mas que se erigiram em direito, em instituições jurídicas, e quem atentar contra eles atentará contra a lei e será castigado

 

Porém, os fatores refletidos, obviamente não são os de interesse da sociedade se tornando uma constituição simbólica, defendida pelo constitucionalista brasileiro Marcelo Neves parafraseado por Kyev Maia (2013):

 

Marcelo Neves diz que a constituição simbólica é caracterizada pela falta de eficácia das normas/valores constitucionais. Isso é perceptível, segundo o autor, através da legislação e constitucionalização simbólicas.

Alguns elementos se destacam dentro do universo da constitucionalização simbólica: a legislação simbólica, ou legislação-álibi, sendo necessário para sua compreensão o próprio entendimento de símbolo que para Neves é aquilo que representa tudo e ao mesmo tempo nada, devido a tamanha ambiguidade e acepção da palavra.

 

Assim nota-se o estabelecimento de uma crise no direito dogmático identificando rupturas pelas faltas nos deveres do Estado que além de cobrar o dever-ser da sociedade diante das normas positivas, deveria garantir os direitos da mesma cobrada. Sobre o direito alternativo extradogmático, Bernardo Santos (2013, apud ADEODATO) afirma:

 

[...] visto que a inércia estatal o impede de impor suas diretrizes e permear seus benefícios a todos, acarretando a necessidade da construção de uma alternativa viável que possibilite a sua recuperação com instância representativa das aspirações sociais. Esse movimento alternativista é uma verificação sintomática de que o Estado, mesmo sendo produtor de Direito, não é o único a produzi-lo e a interpretá-lo, discutindo-se, assim, a existência de um verdadeiro Direito Alternativo.

Entretanto, isso vai de encontro aos princípios do direito dogmático, que para se modernizar, assevera João Maurício Adeodato, é preciso de três pressupostos sociológicos: primeiro, a pretensão por parte do Estado, do monopólio das normas jurídicas; depois, a ascensão das fontes estatais em detrimento das demais fontes do Direito; e por último, a autopoiese, que significa a emancipação do subsistema jurídico dos demais subsistemas normativos éticos, aquele deve estar imune de fatores sociais, morais e religiosos.

Nesse sentido, nota-se que tais pressupostos são raramente observados, e consequentemente, é dito que o Estado é insuficiente no direito moderno ao desconsiderar muitos aspectos da realidade, o que leva a crer na existência de outras "esferas de juridicidade".

Essa é a realidade dos países periféricos onde frequentemente se encontra espaços sociais completamente impermeáveis ao conjunto civilizador de normas jurídico-estatais demandando a criação de um pretenso Direito Alternativo para a possibilidade de subsistência das pessoas.

 

Dessa forma, é cabível e natural aos justiceiros, novos representantes da sociedade, a luta e defesa de seus direitos.

 

  1. O Estado enquanto soberano.

 

Segundo Eduardo Bittar (2005), o homem evolui de um estado natural quando adere ao contrato social buscando por garantias aos seus direitos como a vida e a liberdade, ou seja, sendo assim cabe ao Estado zelar pois tais garantias e não ao indivíduo retroceder a um Estado Natural onde ele próprio em sua individualidade, estaria a ponto de lesar outrem, invadir, usurpar ou prejudicar outros em nome da defesa de seus próprios interesses.

Segundo Bittar (2005, apud HOBBES):

 

No Estado de Natureza há o estado de guerra de uns contra os outros, e o homem pode ser chamado de lobo do próprio homem (homo homini lupus). Ou seja, no lugar de atacar outras carniças, outros animais, como lobo do próprio homem, o homem morde o próprio rabo, acaba com seu próprio semelhante, destrói aquele que poderia acabar por auxiliá-lo na caça, isso se caçarem juntos contra terceiros, e não uns contra os outros. Eis estado nefasto de autodestruição, em que os homens se colocam, na leitura do estado de natureza, pré-cívico [...].

[...] a existência de um Estado como artifício humano para o aperfeiçoamento da natureza, e a superação do estado de natureza. Assim, é uma convenção que cria o Estado, é um acordo de vontades, é um pacto, que dá início a vida civil, no sentido de abolir a guerra e a impunidade geral contra violência.

 

Portanto não se pode afirmar que tais justiceiros representam um povo agindo em prol de suas individualidades alegando devolver o poder ao povo, ainda mais libertando criminosos que deveriam quitar seu débito com o Estado em face da garantia de segurança publica.

O real poder do povo encontra-se presente na Carta Magna, onde Hans Kelsen em sua teoria pura afirma que:

 

A Constituição é puro dever-ser, norma pura, não devendo buscar seu fundamento na filosofia, na sociologia ou na política, mas na própria ciência jurídica. Logo, é puro"dever-ser".

 

Cabe ao Estado tutela do dever de legislar e executar suas normas conforme consta em no texto constitucional e poder transmitido pelo próprio povo durante assembleia constituinte:

 

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil.

 

  1. DESCRIÇÃO DOS CRITÉRIOS E VALORES (EXPLÍCITOS E/OU IMPLÍCITOS) CONTIDOS EM CADA DECISÃO POSSÍVEL

 

Extradogmática: poder além das normais estatais.

Teoria Pura: Normais Constitucionais acima de qualquer outras.

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

BITTAR, Eduardo. Curso de Filosofia do Direito. 2005.

 

MAIA, Kyev Moura. Breve análise acerca da Constituição Simbólica de Marcelo Neves. Disponível em . Acesso em 21 out. 2016.

 

LAMAS, Livia Paula de Almeida. Uma análise contemporânea da Constituição Sociológica de Lassalle. Disponível em . Acesso em 21 out. 2016.

 

SANTOS, Bernardo Vidal Domingues dos. apud ADEODATO, João Maurício. Ética, Jusnaturalismo e Positivismo no Direito. Disponível em . Acesso em 21 out. 2016.

 

SOUZA JÚNIOR, Luiz Lopes de. A Constituição e seus sentidos: sociológico, político e jurídico. Disponível em < https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/1516539/a-constituicao-e-seus-sentidos-sociologico-politico-e-juridico >. Acesso em 21 out. 2016.

 

 

[1] Case apresentado à disciplina de Filosofia do Direito II, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluno do 3º Período, do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor Orientador.