SINOPSE DO CASEAriosvaldo, e o roubo[1]

 

Haroldo Lima de Melo Neto[2]

Adriano Antunes Damasceno[3]

 

  1. DESCRIÇÃO DO CASO 

 

Com fome e sem dinheiro para comprar comida, Ariosvaldo, mediante grave ameaça exercida com o emprego de uma faca, subtraiu a bolsa de Ariana. Na bolsa, havia apenas documentos pessoais e o valor da bolsa em si era insignificante.

Ariosvaldo foi preso em flagrante, mas logo obteve liberdade provisória, pois não possuía outros antecedentes criminais e tampouco era reincidente. O crime foi julgado 5 anos após o ocorrido. Nesse intervalo, Ariosvado concluiu o ensino médio e o ensino técnico-profissionalizante, sendo posteriormente contratado por uma empresa de grande porte.

Em que pese estar trabalhando e não ter nenhum outro registro criminal além do fato mencionado, Ariosvaldo foi condenado pela prática da conduta descrita no art. 157 do CPB, circunstanciada pela causa de aumento prevista no inciso I do §2º do mesmo dispositivo. Na dosimetria não foram reconhecidas circunstâncias atenuantes ou agravantes e a pena imposta resultou em 05 anos e 04 meses de reclusão em regime inicialmente semiaberto.

 

  1. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DO CASO

 

  1. Descrição das decisões possíveis

 

Na descrição acima, é possível entender o caso de Ariosvaldo mediante a consumação do roubo qualificado. Porém, é necessário compreender as minucias do problema, relacionando-o com as normas morais e com as normas jurídicas. Dessa forma, apresentam-se as seguintes proposições:

 

a) Qual função cumpre a pena imposta a Ariosvaldo?

b) O juiz poderia deixar de impor pena a Ariosvaldo?

c) A dosimetria da pena encontra-se correta?

 

  1. Argumentos capazes de fundamentar cada decisão

 

  1. Qual função cumpre a pena imposta a Ariosvaldo?

 

Diante da urgência em saciar sua fome, Ariosvaldo não pode alegar que cometeu roubo famélico em estado de necessidade por devido existirem demais meios para se angariar fundos que o permitissem se alimentar, sem necessidade do crime. a desembargadora Marli Mosimann Vargas, em julgamento na terceira vara da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina afirmou que:

 

[...] a simples alegação de dificuldades financeiras ou desemprego não é motivo plausível para a caracterização da excludente de ilicitude do estado de necessidade, tampouco pode ser admissível para absolver pela prática de crimes dessa natureza, cometidos, inclusive, com violência [...].

 

Dessa forma, posiciona-se também o STF De acordo com o Ministro Luiz Fux (2012), na decisão proferida no Habeas Corpus 112.262/MG:

 

O furto famélico subsiste com o princípio da insignificância, posto não integrarem binômio inseparável. É possível que o reincidente cometa o delito famélico que induz ao tratamento penal benéfico. Deveras, a insignificância destacada do estado de necessidade impõe a análise de outros fatores para a sua incidência. É cediço que a) O princípio da insignificância incide quando presentes, cumulativamente, as seguintes condições objetivas: (a) mínima ofensividade da conduta do agente, (b) nenhuma periculosidade social da ação, (c) grau reduzido de reprovabilidade do comportamento, e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada; b) a aplicação do princípio da insignificância deve, contudo, ser precedida de criteriosa análise de cada caso, a fim de evitar que sua adoção indiscriminada constitua verdadeiro incentivo à prática de pequenos delitos patrimoniais.

 

Analogamente por Ariosvaldo não cumprir os requisitos de mínima ofensividade da conduta e nenhuma periculosidade da ação, pode-se dizer que para o STF, o mesmo teria seu pedido negado.

A função imposta ao réu é a da Teoria Unificada das Penas que nada mais é que uma compilação entre teses retributivas e preventivas especiais e gerais visando suprir os problemas de ambas individualmente que são predominantes no ordenamento Alemão.

Segundo Fabio Bozza, (2013, p. 87, apud ROXIN) as funções dessa teoria são:

 

1) Retribuição do injusto, por meio da compensação ou expiação da culpabilidade; 2) prevenção especial positiva, com o objetivo de emenda do autor do crime, pela ação correcional da execução da pena; 3) prevenção especial negativa, com a finalidade de atingir a segurança da sociedade por meio do mero isolamento do indivíduo; 4) prevenção geral negativa, através da intimidação de potenciais delinquentes, pela ameaça contida na ameaça de sanção contida na lei penal e; 5) prevenção geral positiva como reforça da confiança da população no ordenamento jurídico.

 

Podemos encontrar no ordenamento brasileiro as teorias unificadas presentes no CPB no artigo 59º em que constam as circunstancias judiciais, primeira fase na definição da dosimetria da pena. Sobre a questão Bozza (2013, p. 88) afirma que “[...] O juiz, [...] estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”.

Assim conforme Fabio Bozza (2013, p. 7, 31) venha esclarecer, embora Ariosvaldo tenha cometido o roubo com o objetivo de se alimentar, sua condenação é justa em sentido retributivo pela violação do direito e grave ameaça de Ariana, havendo sua retribuição in malam partem justificado pela pratica de seu ato ilícito mediante direito positivado em que o mesmo estava consciente da ilicitude de seus atos. Contudo, pode-se afirmar que em sentido preventivo mediante condenação do réu, há o objetivo de ressocialização do individuo e o de educa-lo juridicamente e socialmente (prevenção especial positiva). Além de que, há também a mensagem implícita ao próprio réu de que este não venha a cometer novos crimes (prevenção especial negativa). Portanto, podendo-se afirmar ainda em prevenção positiva e negativa onde ainda que seja clara a mensagem da negativa a sociedade evitando que novos cidadãos venham cometer novos delitos se tem a transmissão e garantia da segurança do cumprimento de suas leis.

 

  1. O juiz poderia deixar de impor pena a Ariosvaldo?

 

Não haveria possibilidade de omissão do juiz mediante acusação do réu diante dos fatos expostos. Mesmo que o mesmo não seja reincidente ou possua maus antecedentes, uma vez provocado o judiciário, este sai de sua inércia e tem a função de definir uma decisão  mediante vontade das partes. Embora a primeira impressão pareça justificado o roubo diante da necessidade de se alimentar, não há justificativa para a grave ameaça a vida de Ariana, ainda agravada pelo porte da faca por Ariosvaldo durante o fato, sendo a este assegurado sua defesa e garantia de influenciar a decisão do juiz a qualquer uma das partes, inclusive ao réu pelos princípios processuais do Contraditório, Ampla Defesa e Motivação das Decisões.

 

  1. A dosimetria da pena encontra-se correta?

 

A respeito da primeira fase da dosimetria das penas que trata o art. 59 do CPB, sobre a culpabilidade do réu pode ser considerada neutra uma vez que o mesmo para chegar ao estado de roubar para comer sofria com dificuldades financeiras há algum tempo; o mesmo a não possui antecedentes; a luz conduta social o mesmo vivia uma vida saudável além de anterior a sentença transitada em julgado o mesmo concluiu seu ensino médio profissionalizante e já está empregado; sobre a personalidade do agente não cabe a Ariana defini-la mesmo sob acusação de agressividade, devendo o juiz aguardar um laudo pericial de um psicólogo ou psiquiatra; tendo como motivo saciar sua fome; circunstancias de um crime não sendo também prejudiciais uma vez que o tipo penal cometido já é previsto no código; a respeito das consequências do crime não houveram consequências maiores mencionadas além das naturais intrínsecas a pratica do crime; e comportamento da vítima poderia “[...] ocorrer, inclusive, o afastamento do crime pelo comportamento da vítima, a exemplo da injúria retorcida que enseja o perdão judicial para os envolvidos”. Podendo o “[...] comportamento da vítima figurar como agravante, atenuante, qualificadora, privilegiadora ou elementar, como ocorre no homicídio privilegiado, no qual o agente comete o delito logo após injusta provocação da vítima”. (CAETANO, 2014).

Conforme mencionado, não foram reconhecidas circunstancias agravantes ou atenuantes previstas na segunda fase da dosimentria, porém tendo uma causa de aumento de pena previsto no art. 157 do CPB, circunstanciada no inciso I do §2º, e por não haver causas de redução de pena, torna-se, portanto, justa a pena de Ariosvaldo.

 

  1. DESCRIÇÃO DOS CRITÉRIOS E VALORES (EXPLÍCITOS E/OU IMPLÍCITOS) CONTIDOS EM CADA DECISÃO POSSÍVEL

 

Dosimetria da Pena: Composta por três fases a fim de definir pena que o réu terá, sendo a primeira das circunstancias judiciais, a segunda dos agravantes e atenuantes e a terceiras das causas de aumento e diminuição de pena.

Teoria Unificada das Penas: Tese que reuni conceitos retributivos e preventivos do razões de aplicação das penas.

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

BOZZA, Fábio da Silva. Teorias da Pena: do Discurso Jurídico à Crítica Criminológica. 2013.

 

BRASIL. Superior Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 112.262/MG. Relator Min. Luiz Fux. DJU, Brasília, 10 abr. 2012, Seção 1, p. 2/13.

 

CAETANO, Wesley. Dosimetria da pena: as circunstâncias judiciais. Disponível em < http://wesleycaetano.jusbrasil.com.br/artigos/240508415/dosimetria-da-pena-as-circunstancias-judiciais>. Acesso em 13 out. 2016.

 

GOMES, Luiz Flávio. SOUSA, Áurea Maria Ferraz de. Desempregado e furto famélico. Disponível em . Acesso em 13 out. 2016.

 

 

[1] Case apresentado à disciplina de Teoria da Pena e Punibilidade, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluno do 3º Período, do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor Orientador.