ANDRESSA SAMPAIO MOTA

DANIEL PEREIRA ARAÚJO DE BRITO CARDOSO

DAVI SILVA MOURA

ELAINE VIEIRA PEREIRA

LUIZ ANÍZIO FARIAS FILHO

VITOR HUGO JALES DO NASCIMENTO



 

A IMPOTÂNCIA DO ÚLTERO DE SUB-ROGAÇÃO E A LATENTE NECESSIDADE DE NORMATIZAÇÃO



 

Trabalho apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina História e Estudo do Direito, do curso de Direito, da Universidade Federal do Ceará.

Professora Dra.: Márcia Correia Chagas 




 

FORTALEZA

2021



 

1. INTRODUÇÃO

O útero de sub-rogação é um método no qual uma mulher recebe o material genético de outros dois indivíduos, após ter sido realizada uma fertilização in vitro, para engravidar, devido a algo que impossibilite o casal de ter um filho. No caso de casais heterossexuais, recolhe-se o material genético dos dois para que a gravidez ocorra numa terceira pessoa. No caso de mulheres homossexuais, é utilizado o óvulo de uma das parceiras e o sêmen de um desconhecido, para que então a gravidez ocorra. No caso de homens homossexuais, utiliza-se o sêmen de um dos parceiros e o óvulo de uma desconhecida, ocorrendo a gravidez numa terceira pessoa. O método, além desses casos, pode ser adotado por pessoas que desejam ser pais ou mães solteiros, sendo recolhido, nesta situação, o material de um indivíduo doador de gametas para que seja feita a fertilização in vitro com o gameta do pai ou mãe solteiros.

Essa técnica é pauta de diversos debates, envolvendo problemáticas como a objetificação do ser humano, o apego da gestante solidária ao bebê, o pagamento para a mulher que irá ceder o útero como uma possível nova forma de exploração do corpo, entre outros. Dessa maneira, as normas para que ocorra essa prática variam muito em cada país, sendo inclusive proibida em algumas nações devido aos diferentes pontos de vista que permeiam essas problemáticas e as suas soluções. No Brasil, a maternidade de sub-rogação é permitida, mas existem alguns requisitos que devem ser seguidos para que ocorra, além de ser proibida no caso de contrato da mulher que gestará a criança.

O fato é que esse procedimento, uma vez devidamente regulamentado, pode ser bastante benéfico para pessoas impossibilitadas de terem filhos, visto que se torna mais uma opção para a realização da construção de uma família, o que, para muitos, é motivo de grande frustração e angústia.

2. OBJETIVOS

2.1 Objetivo geral

Defender a utilização do útero de sub-rogação, apresentando argumentos que evidenciam a importância dessa técnica como forma de solucionar questões relacionadas à procriação, as quais vão desde a infertilidade até a pressão social exercida nos indivíduos, sobretudo nas sociedades ocidentais, para que eles cumpram ritos parentais vistos como “padrões”. 

2.2 Objetivos específicos

  • Estabelecer os pontos positivos relacionados à utilização do útero de sub-rogação, evidenciando a necessidade dessa técnica de reprodução assistida para os indivíduos acometidos com alguma condição que dificulte a geração de filhos biológicos.

  • Discutir as lacunas normativas que dificultam a aplicação da técnica do útero de sub-rogação.

  • Elencar possíveis desvantagens inerentes à técnica em questão.

  • Ponderar os ganhos e os prejuízos inerentes ao útero de sub-rogação não apenas para os indivíduos envolvidos nessa técnica de reprodução assistida, mas também para a sociedade.

3. JUSTIFICATIVA

Tendo em vista a ampla discussão do tema útero de sub-rogação dentro das sociedades de diversos países pelo mundo, o presente trabalho é justificado pelo fato de haver a necessidade de se trazer à luz fatos que muitas vezes passam despercebidos dentro do debate acerca desse tema. É conhecido que não há consenso entre as nações sobre como o útero de sub-rogação deve ser encarado. Contudo, percebe-se que esse tema é pouco discutido dentro das sociedades, principalmente a brasileira, levando à desinformação do que seria a maternidade de sub-rogação e das nuances que envolvem esse procedimento de reprodução assistida. 

Nesse contexto, reconhecendo que a paternidade é um assunto crucial para a sociedade, mas principalmente para o indivíduo acometido com doenças ou com outras condições que impedem a procriação natural, esse estudo busca trazer a discussão sobre o útero de sub-rogação para fora do senso comum, abordando questões tanto principiológicas quanto pragmáticas, normativas, emotivas, as quais abrangem tanto a responsabilidade do indivíduo, da sociedade e do Estado. 

Ademais, para enriquecer o debate, o presente estudo também trará uma visão de como os problemas que envolvem o útero de sub-rogação podem ser superados, sendo a sua elaboração justificada pelo fato de haver a necessidade de não apenas defender cegamente algo, mas sim aplicar da melhor forma possível, em prol da sociedade, aquilo que a medicina moderna é capaz de oferecer.

4. METODOLOGIA

O seguinte trabalho foi viabilizado a partir da consulta de artigos, de normativas, de resoluções e de fontes acerca do útero de sub-rogação em outros países. Contudo, vale ressaltar que o estudo focou notadamente na realidade brasileira, sendo analisado superficialmente o posicionamento de outras nações como uma forma de visualizar como o mundo enxerga essa técnica de reprodução assistida. Foi adotado esse direcionamento como uma forma de trazer o debate para um contexto mais próximo e mais palpável. 

Nesse contexto, o presente trabalho foi dividido em: benefícios do útero de sub-rogação, apoiando-se nas resoluções e nas normas vigentes no contexto jurídico brasileiro; desmistificando problemáticas do útero de sub-rogação, evidenciando as principais questões levantadas pelos indivíduos que são contra essa técnica e como elas podem ser contornadas; considerações finais e referências. 

5. BENEFÍCIOS

5.1 A procriação como projeto de realização e crescimento pessoal e a omissão estatal

Diante do que já foi exposto, devem ser ressaltados os benefícios à população proporcionados pelo método do útero de sub-rogação. O primeiro deles é a possibilidade de aliviar a pressão social externa ao indivíduo que envolve a paternidade e a maternidade, uma vez que a procriação não está apenas relacionada à formação de um núcleo familiar, existe, além disso, um senso comum de família como símbolo de prosperidade, de sucesso, além de realização e crescimento pessoal, como dito por Márcia Chagas e Maria Alice Pinheiro em artigo sobre “Maternidade de sub-rogação e direitos fundamentais” (2013, p.342).

O sonho do projeto parental, almejado por milhões de pessoas por todo o mundo, também faz parte de um processo de adequação social. Tendo isso em vista, a infertilidade de muitos casais atrapalha a realização desse sonho, sejam eles um casal homossexual, um em que somente um dos membros é infértil ou um em que a mulher não está mais na fase reprodutiva. A infertilidade afeta a saúde mental de muitas pessoas, que se vêem frustradas, fracassadas, envergonhadas, por não poderem atingir as expectativas de outros, o que acaba fragilizando as relações interpessoais, a autoestima e a perspectiva de futuro dos indivíduos. É nesse contexto de impossibilidade de gerar filhos que a maternidade de sub-rogação entra como uma solução, pois permite que a paternidade e a maternidade sejam alcançadas a partir da geração de um filho biológico, mas que somente foi gerado em um útero alheio ao casal.

Deve-se ressaltar também que a infertilidade humana deve ser encarada como uma problemática de saúde pública devido aos efeitos físicos e psicológicos acarretados por ela, assim, conclui-se que é responsabilidade do Estado promover a resolução dessa problemática, utilizando meios como a garantia da viabilidade da gravidez de sub-rogação. Entretanto, o que se percebe hoje é um Estado omisso a essa questão, em que, após o nascimento do primeiro bebê de proveta no Brasil em 1984, a discussão sobre essa prática foi iniciada com um atraso de uma década, e, até hoje, não existe uma legislação específica para o assunto, sendo este regulamentado apenas por resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM). A última delas, de 20 de setembro de 2022, demonstra a tentativa do CFM de trazer mais segurança jurídica a esse assunto, uma vez que esse órgão vem publicando nos últimos anos várias resoluções, porém essa segurança almejada não será alcançada até que uma lei disponha sobre o útero de sub-rogação de maneira clara e explícita. Vemos a seguir uma breve disposição do Conselho Federal de Medicina na resolução citada, de n° 2.320:

VII – SOBRE A GESTAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO (CESSÃO TEMPORÁRIA DO ÚTERO)

As clínicas, centros ou serviços de reprodução podem usar técnicas de reprodução assistida para criar a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista uma condição que impeça ou contraindique a gestação. 

1. A cedente temporária do útero deve:

a) ter ao menos um filho vivo;

b) pertencer à família de um dos parceiros em parentesco consanguíneo até o quarto grau (primeiro grau: pais e filhos; segundo grau: avós e irmãos; terceiro grau: tios e sobrinhos; quarto grau: primos);

c) na impossibilidade de atender o item b, deverá ser solicitada autorização do Conselho Regional de Medicina (CRM).

2. A cessão temporária do útero não pode ter caráter lucrativo ou comercial e a clínica de reprodução não pode intermediar a escolha da cedente.

3. Nas clínicas de reprodução assistida, os seguintes documentos e observações devem constar no prontuário da paciente:

a) termo de consentimento livre e esclarecido assinado pelos pacientes e pela cedente temporária do útero, contemplando aspectos biopsicossociais e riscos envolvidos no ciclo gravídico-puerperal, bem como aspectos legais da filiação;

b) relatório médico atestando a adequação da saúde física e mental de todos os envolvidos;

c) termo de Compromisso entre o(s) paciente(s) e a cedente temporária do útero que receberá o embrião em seu útero, estabelecendo claramente a questão da filiação da criança;

d) compromisso, por parte do(s) paciente(s) contratante(s) de serviços de reprodução assistida, públicos ou privados, com tratamento e acompanhamento médico, inclusive por equipes multidisciplinares, se necessário, à mulher que ceder temporariamente o útero, até o puerpério;

e) compromisso do registro civil da criança pelos pacientes, devendo essa documentação ser providenciada durante a gravidez; e

f) aprovação do(a) cônjuge ou companheiro(a), apresentada por escrito, se a cedente temporária do útero for casada ou viver em união estável. 

Vale dizer que as resoluções do CFM têm legitimação apenas para que profissionais da área médica as cumpram, ou seja, não são coercivas para a população como um todo, diferente da legislação que deve ser cumprida por todos os cidadãos, independente da área de atuação profissional, sob cumprimento de sanção/pena caso não seja respeitada.

5.2 A pragmática do direito ao planejamento familiar

O segundo benefício proporcionado pelo útero de sub-rogação é a possibilidade de pragmatização do direito ao planejamento familiar, que sai apenas do aspecto teórico e passa a ser mais ativo na prática. Esse direito é fundamentado pelo artigo 226, §7°, da Constituição Federal de 1988, que diz:

“Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.”

 

Além disso, se encaixa nessa discussão uma frase de Márcia Correia Chagas, (2005, p.61), em tese de Doutorado, a qual esclarece que:

Como todos os direitos fundamentais, o direito à liberdade do planejamento familiar, pode ser depreendido de outros princípios de direitos fundamentais, pois todos se referem à realização, a mais plena possível, do máximo das potencialidades do ser humano como pessoa.

 

O planejamento familiar é um dispositivo exposto na própria Constituição de 1988, o que corrobora mais ainda com a urgência do Estado em viabilizar os recursos para a sua realização. Nessa conjuntura de defesa da dignidade humana, destaca-se também o fato do útero de sub-rogação não diminuir em nenhum grau esse princípio e nem precificar os indivíduos, como é trazido por muitos contraditores desse método. Mais especificamente sobre a precificação, esta não se torna possível no Brasil, uma vez que aqui não é permitido pagar para que uma mulher possa gestar o filho de outros, sendo autorizada apenas a “barriga solidária”, em que uma mulher voluntariamente se dispõe a oferecer seu útero para a geração do feto.

Contudo, na ilegalidade, são feitos contratos de “barriga de aluguel”, nos quais, geralmente, pessoas com alto poder econômico contratam mulheres em situação de vulnerabilidade social para terem seu útero sub-rogado, o que acaba se tornando uma forma de sustento dessas vulneráveis e, nesse caso sim, degrada a dignidade humana dessas pessoas, que se vêem expostas a riscos para sua saúde física e mental em uma gravidez que também gera riscos para o bom desenvolvimento do feto. Entretanto, essas consequências da prática ilegal, não são possíveis de serem geradas se o procedimento for feito de acordo com as práticas autorizadas pelo Conselho Federal de Medicina, pois ele não oferece riscos à gestante nem ao feto, sendo realizado com todo o aparato psicológico e clínico necessário.

5.3 O avanço das técnicas médicas envolvendo a maternidade de sub-rogação

O terceiro benefício a ser destacado é a constante atualização dos procedimentos envolvendo a maternidade de sub-rogação, pois as técnicas médicas estão em constante avanço, oferecendo cada vez mais segurança para a gestante e para o bebê no caso do útero de sub-rogação. Alguns contraditores dessa prática utilizam o argumento do risco gerado pelo procedimento, entretanto isso se configura como uma grande falácia, tendo em vista que ele possibilita a transferência e o uso de órgãos alheios para a necessidade de outros, gestando um feto com características genéticas desses outros, perspectiva que não poderia ser imaginada há apenas 100 anos atrás. É verdade que a gestação causa uma série de mudanças no organismo de uma mulher e que exige um esforço grande dela para a manutenção de uma gravidez saudável, entretanto, se a pessoa que se ofereceu para gestar o bebê receber o devido acompanhamento médico clínico e psicológico durante toda a gestação e o período puerpério, raramente a gravidez produzirá riscos.

Alguns podem oferecer a adoção como solução para a efetivação do planejamento familiar, porém deve-se considerar, sobretudo, dois aspectos: a priori, a demora exaustiva da realização do processo adotivo no Brasil, onde casais chegam a esperar décadas para finalmente concluir a adoção e, a posteriori, a necessidade de alguns indivíduos, para conquistar a plena realização pessoal, de ter filhos biológicos. Diante disso, reafirma-se, como comentado, que a maternidade de sub-rogação permite a geração de um feto com características genéticas dos futuros mães e pais com a única diferença de uma gravidez tradicional de que ele será gerado em um útero solidário alheio ao dos parentes.

Indubitavelmente, é sabido que o útero de sub-rogação possui seus pontos de construção, que precisam ser melhorados, mas atitudes, como a maior presença do Estado na regulação dessa prática, podem servir de soluções a esses pontos, os quais inclusive serão melhor abordados a seguir.

6. DESMISTIFICANDO PROBLEMÁTICAS

Com relação às problemáticas que envolvem o útero de sub-rogação, tem-se que muitas delas partem de lacunas normativas, as quais possibilitam que situações de exploração do corpo da mulher ocorram, principalmente das mais vulneráveis economicamente que tentam utilizar o seu próprio ventre como uma forma de sustento.

Nesse contexto, desenvolvendo esse primeiro ponto e analisando principalmente o cenário presente no Brasil, percebe-se que não existem normas reguladoras que tentam garantir qualquer tipo de segurança jurídica para as partes que tentam dar procedimento à prática do útero de sub-rogação. O que existe na verdade, fato já explicado anteriormente, é apenas uma resolução do Conselho Federal de Medicina, o qual apenas permite que familiares de até quarto grau de parentesco e que já possuam pelo menos 1 filho possam ser “barrigas solidárias”. Existe uma crença de que, ao restringir a questão do útero de sub-rogação ao ciclo familiar, os imbróglios jurídicos dificilmente irão ocorrer. Todavia, o que de fato ocorre é que a atual omissão do estado brasileiro dá margem para que a prática clandestina do contrato de sub-rogação do ventre da mulher ocorra. Na grande maioria, mulheres em estado de vulnerabilidade econômica se submetem a negociações com casais dispostos a pagar pelo “serviço” oferecido por essas pessoas, visto que aqueles, muitas vezes, não têm parentes ou amigos a quem possam recorrer. Por mais que exista uma tendência em se acreditar que o problema mora na técnica do útero de sub-rogação, a verdade é que muitas dessas situações poderiam ser evitadas caso, de fato, existisse um amparo jurídico que coibisse (não apenas por meio de resoluções) ou que regulamentasse a prática da “barriga de aluguel”. O que não pode ocorrer é o Estado adotar uma postura morosa diante dessa prática recorrente, deixando várias mulheres desamparadas, as quais têm que assumir compromissos, muitas vezes abusivos, que vão desde a objetificação e precificação precária do corpo da mulher até o cerceamento de sua liberdade de escolha durante a gravidez sub-rogada.

Ademais, outro ponto fundamental que é tido como problemático em relação à técnica do útero de sub-rogação é justamente o fato de se colocar em risco a vida de uma mulher que não será a mãe biológica do bebê. Nesse sentido, o que se pode afirmar é que a gravidez é um processo que sempre envolve algum risco. A ideia do útero de sub-rogação é justamente evitar que aquelas pessoas com mais riscos ou que são incapazes fisiologicamente de conceber um filho biológico por conta própria sejam submetidas à gravidez. Contudo, vale ressaltar que é necessário existir acompanhamento físico e psicológico da mulher que se voluntariou (no caso de o procedimento ter sido realizado de forma legal no Brasil), o qual tenta garantir ao máximo a segurança não apenas da gestante, mas também do bebê. Diante disso, o ato de ser uma “barriga solidária” é um dos maiores símbolos de altruísmo, de amor e de coragem que uma mulher pode realizar. Até mesmo a tão condenada “barriga de aluguel” deve ser reconhecida, desde que devidamente regulamentada e fora do contexto jurídico brasileiro, no qual ela é proibida, como um ato de extrema importância para a política de planejamento familiar de um país, dando alternativas para aqueles casais ou indivíduos que querem profundamente ser mães e pais biológicos. Desse modo, desde que sejam respeitadas a liberdade individual e a vontade da mulher que irá receber o embrião, não se pode proibir que ela solidariamente torne seu útero disponível à sub-rogação, mesmo que existam riscos envolvidos, tendo em vista que é gerado um grande benefício para a sociedade ao se tomar essa atitude.

Por fim, com relação a um dos tópicos mais polêmicos relacionados ao útero de sub-rogação, é dito, pelos indivíduos que são contrários a essa técnica, que a possibilidade de um apego pelo bebê por parte da mulher que disponibilizou seu útero para a gravidez deve ser um motivo para que essa técnica não seja adotada.  Nesse caso, deve-se salientar que, de fato, isso pode ocorrer. Na condição de seres humanos, algumas mulheres podem acabar gerando um sentimento que dificulta ou que, até mesmo, impede-as de entregar o bebê para a mãe biológica. Contudo, isso não deve ser visto como a regra geral da situação, mas sim como uma exceção, visto que existem formas de diminuir a possibilidade de tal fato ocorrer. Uma dessas formas é o estabelecimento de condições para que uma mulher possa ser barriga solidária, por exemplo, ter pelo menos um filho, condição que já é exigida pelo Conselho Federal de Medicina em suas resoluções. Além disso, testes psicológicos podem também ser utilizados como uma forma de identificar pessoas que possam ter comportamento incompatível com aquele necessário para ser uma “barriga solidária” ou “barriga de aluguel”. Assim, o que não pode de forma alguma acontecer é justamente a técnica de útero de sub-rogação ser caracterizada como inviável, fato que seria extremamente prejudicial para todos aqueles indivíduos que almejam ser pais biológicos e que precisam de ajuda para alcançar tal realização.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todos os aspectos abordados sobre o útero de sub-rogação, pode-se perceber a potencialidade desta prática para a garantia do direito à formação de família, previsto na Constituição Federal de 1988, tendo o Estado o papel de fazer cumprir essa prerrogativa. Além disso, destaca- se, também, que diversas problemáticas sociais, como as relacionadas aos danos físicos e psicológicos causados a indivíduos inabilitados a gerarem filhos de modo autônomo, poderiam ser evitadas, se esses casais tivessem acesso de maneira segura a este procedimento. 

Destaca-se que grande parte das intempéries decorrentes do útero de sub-rogação estão diretamente relacionadas à ausência de uma regulamentação estatal ou ao preconceito, o qual é consequência do desconhecimento acerca do procedimento, causado por uma supérflua abordagem dessa temática em nossas instituições sociais. 

Destarte, essas instituições e o Estado devem orientar os cidadãos sobre essa técnica, de maneira a mitigar esses errôneos pensamentos e orientar de maneira correta a população. Ademais, ressalta-se a importância de as autoridades brasileiras criarem leis que orientem a realização desse procedimento, com auxílio de profissionais técnicos e considerando os impactos sociais decorrentes, para assim regulamentar essa prática e evitar possíveis problemáticas, resguardando a integridade de todos os indivíduos envolvidos com o útero de sub-rogação e garantindo que o direito à família seja assegurado para mais cidadãos em nosso país.

 

 

 

REFERÊNCIAS 

 

CHAGAS, M.C. Tecnologias Médico-Reprodutivas e Direito Fundamental ao Planejamento Familiar: pressupostos conceituais e normativos para uma reflexão bioética. 2005. 186f. Tese (Doutorado em Direito) – Centro de Ciências Jurídicas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife. 2005.

 

BRASIL. Conselho Federal de Medicina. Resolução n° 2.320, de 20 de setembro de 2022. Disponível em: . Acesso em: 18 de janeiro de 2024.

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Capítulo VII, art. 226, §7°. Disponível em: <https://www.senado.leg.br/atividade/const/con1988/con1988_07.05.2015/art_226_.asp>. Acesso em: 17 de agosto de 2021.

 

CHAGAS, M.C. Maternidade de Sub-rogação e Direitos Fundamentais: o planejamento familiar e a gestação em útero alheio. 2013. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará - UFC, Fortaleza, vol. 34, n. 1, p 333-354. 2013.