O PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA NO DIREITO BRASILEIRO: a transparência e os dispositivos de controle social nas licitações 

        Oscar Henrique Campos Coelho[1]

Saulo Freitas Loureiro[2]

RESUMO

O presente trabalho busca fazer uma breve análise do princípio da transparência no direito brasileiro, onde o objetivo geral deste estudo é verificar o que rege esse princípio, dispositivos que o asseguram e a sua observância no procedimento licitatório.  Para a construção dessa pesquisa, foram utilizados argumentos doutrinários, legais e jurisprudenciais que têm como escopo o aprofundamento da pesquisa utilizando-se de diferentes fontes do direito. As leis, a jurisprudência e os doutrinadores são uniformes, e defendem a transparência da Administração Pública, garantindo assim o controle desta por parte dos administrados. É o que acontece no procedimento de licitação, quando da realização de Audiências Públicas, publicação de editais, etc. 

Palavras-chave: Licitação. Princípio. Transparência. Administração. Publicidade. Audiência Pública. Edital. 

INTRODUÇÃO 

O Estado (JELLLINEK, 1954 apud DALLARI, 1991, p.100) é “a corporação territorial dotada de um poder de mando originário”. Para existência de um Estado é necessário três elementos fundantes e condicionantes, quais sejam um território, o povo e o governo soberano. O território demarcará o limite da soberania estatal, enquanto esta (SABBAG, 2012) “indica a independência e a supremacia deste Estado em relação ao povo”. Para entender a soberania exercida pelo Estado, é importante se atentar ao conceito de poder. Segundo Bobbio (1982, p.12), poder é uma relação entre sujeitos “um impõe ao outro sua vontade e lhe determina, mesmo que contra vontade, o comportamento”. Portanto, o poder nada mais é que a imposição da vontade de quem o detém, mesmo que contra a vontade de quem está na condição de subordinado.

A Constituição Federal, em seu artigo 1º, parágrafo único assim diz:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Entretanto, apesar de existirem representantes do povo apoiados constitucionalmente, além de todos outros poderes legitimados, é de suma importância que os atos da Administração Pública sejam fiscalizados de uma maneira mais ampla, por todo e qualquer cidadão. Nesse contexto, a transparência e a publicidade dos atos da Administração Pública se mostram essenciais.

É nesse sentido que o presente estudo busca entender melhor o chamado princípio da transparência, que torna possível uma Administração clara, evidenciando seus erros e acertos, além de permitir a manifestação dos administrados em relação àquela. Após esclarecer o melhor tal princípio, será mostrado a sua aplicação no instituto da licitação, que é (CRETELLA JÚNIOR, 1995, p. 119) é o “meio mais idôneo para possibilitar contratos mais vantajosos para o Estado, o que se dá conforme os princípios que regem a lei da oferta e procura [...] escolhendo não o preferido, mas aquele que, objetivamente, fez a melhor proposta”.

 

1 PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA NO DIREITO BRASILEIRO

 

O artigo 37 da Constituição Federal consagra o princípio da publicidade, que vem exigir (PIETRO, 2006, p. 89) “a ampla divulgação dos atos praticados pela Administração Pública, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas em lei”. Dessa maneira, Mello (2004, p. 104), argui a respeito do dever administrativo de garantir a plena transparência, pois em um Estado Democrático de Direito, no qual o poder pertence ao povo, não pode haver o “ocultamento aos administrados dos assuntos que a todos interessam, e muito menos em relação aos sujeitos individualmente afetados por alguma medida”. Portanto, nesse Estado (ALEXANDRINO; PAULO, 2012, p. 199) “é inconcebível a existência de atos sigilosos ou confidenciais que pretendam incidir sobre a esfera jurídica dos administrados, criando, restringindo ou extinguindo direitos, ou que onerem o patrimônio público”.

Para Alexandrino e Paulo (2012, p. 199), a exigência de transparência da atuação administrativa deriva do princípio da indisponibilidade do interesse público, assegurando a possibilidade do controle da Administração Pública pelos administrados, da forma mais abrangente possível. Continuam, argumentando a respeito do direito de petição aos Poderes Públicos e do direito à obtenção de certidões em repartições públicas (CF, artigo 5º, XXXIV, “a” e “b”, respectivamente), os considerando com uma importante garantia individual para assegurar a transparência da Administração Pública. Também argúem sobre a motivação dos atos administrativos, in verbis:

Decorrência lógica do princípio da transparência é a regra geral segundo a qual os atos administrativos devem ser motivados. Com efeito, a motivação (exposição, por escrito dos motivos que levarem à prática do ato) possibilita o efetivo controle da legitimidade do ato administrativo pelos órgãos de controle e pelo povo em geral. De forma mais ampla, a cidadania fundamenta a exigência de motivação, uma vez que esta é essencial para assegurar o efetivo controle da Administração, inclusive o controle popular, uma das mais evidentes manifestações do exercício da cidadania. (ALEXANDRINO; PAULO, 2012, p. 200)

Em relação às hipóteses de sigilo, a própria Carta Magna (art. 5º, X, XIV, LX, LXXII e XXXIII) faz ressalvas, expondo preceitos que confirmam ou restringem o princípio da publicidade. Tomando como bases esses dispositivos, a lei poderá restringir a publicidade em casos de interesses sociais ou defesa da intimidade, entretanto a Administração Pública tutela interesses públicos, não satisfazendo os requisitos necessários para o sigilo. Todavia, pode o próprio interesse público determinar que assim seja, como nos casos em que estiver em jogo a segurança pública, ou quando o assunto exposto possa vir a ofender a intimidade de determinada pessoa, não trazendo qualquer vantagem para o interesse público. Nos casos em que se manifestarem conflitos entre o interesse público e o direito à intimidade, deve o último se subjugar ao primeiro em razão do princípio da supremacia do interesse público sobre o individual. Os artigos supracitados garantem, ainda, o acesso à informação e resguardando o sigilo da fonte quando necessário ao exercício profissional; e o direito do recebimento dos órgãos públicos de informações de seu interesse particular, geral ou coletivo, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. (PIETRO, 2006)

2 BREVE APANHADO SOBRE LICITAÇÃO

Licitação é um procedimento administrativo no qual um ente público, no exercício da função administrativa, abre disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. Baseia-se na ideia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e aptidões necessários ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir. (MELLO, 2004, p. 483)

A licitação é um procedimento integrado por atos e fatos da Administração e atos e fatos do licitante, todos assim, formando a vontade contratual. Pela parte da Administração, o edital ou convite, o recebimento das propostas, a habilitação, a classificação, a adjudicação, além de outros atos intermediários ou posteriores, como o julgamento de recursos interpostos pelos interessados, a revogação, a anulação, os projetos, as publicações, anúncios, atas etc. Por parte do particular, a retirada do edital, a proposta, a desistência, a prestação de garantia, a apresentação de recursos, as impugnações. (DI PIETRO, 2006, p. 348)

Segundo Celso de Mello (2004, p. 484), existem duas fases fundamentais na licitação: a da demonstração de tais atributos, chamada habilitação, e outra concernente à apuração da melhor proposta, que é o julgamento. Desta forma, visa alcançar um duplo objetivo: proporcionar às entidades governamentais possibilidades de realizarem o negócio mais vantajoso e assegurar aos administrados ensejo de disputarem a participação nos negócios que as pessoas governamentais pretendam realizar com os particulares, objetivos estes que a Lei 8.666/93, expressamente consigna em seu art. 3°.

As licitações devem também atender a três exigências públicas imprescindíveis: proteção aos interesses públicos e recursos governamentais; respeito aos princípios da isonomia e impessoalidade e, por fim, obediência aos reclamos de probidade administrativa, imposta pelos arts. 37, caput e 85, IV da Constituição Federal.

A competência para legislar sobre a licitação assiste às quatro ordens de pessoas jurídicas de capacidade política, ou seja, União, Estados, Municípios e Distrito Federal. Porém, compete à União editar normas gerais sobre o assunto, de acordo com o art. 22, XXVII da CF.    Por força do art. 37, caput e inciso XXI da Constituição, estão obrigadas a licitação pública tanto as pessoas de Direito Público de capacidade política quanto as entidades de suas Administrações indiretas, ou seja, autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações governamentais. Pela Lei 8.666 no art. 1° e parágrafo único, dispõe que suas normas aplicam-se aos três poderes e que a ela estão sujeitos os órgãos da Administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Município e Distrito Federal. (MELLO, 2004, p. 494)

A realização de qualquer licitação depende da ocorrência de certos pressupostos. Tais pressupostos são de três ordens: lógico, jurídico e fático. O lógico é a existência de uma pluralidade de objetos e de uma pluralidade de ofertantes. É pressuposto jurídico o de que, em face do caso concreto, a licitação possa se constituir em meio apto, pelo menos em tese, para a Administração auxiliar ao interesse que deve prover. E por fim, o pressuposto fático, que é a existência de interessados em disputá-la. (MELLO, 2004, p. 496-497)

Há ainda que se falar nas modalidades de licitação que conforme a Lei 8.666 são 5: concorrência, tomada de preços, convite, concurso e leilão. A concorrência é destinada a transações de maior vulto, precedida de ampla publicidade, à qual podem acorrer quaisquer interessados que preencham as condições necessárias e será obrigatória nos casos do art. 23, § 3°. A tomada de preços é destinada a transações de vulto médio, é a modalidade em que a participação na licitação restringe-se às pessoas previamente inscritas em cadastro administrativo, organizado em função dos ramos de atividades e potencialidades dos eventuais proponentes. O convite é a modalidade licitatória cabível perante relações que envolverão os valores mais baixos, na qual a Administração convoca para a disputa pelo menos três pessoas que operam no ramo pertinente ao objeto, cadastradas ou não, e afixa em local próprio cópia do instrumento convocatório. O concurso é uma disputa entre quaisquer interessados que possuam a qualificação exigida, para a escolha de trabalho técnico ou artístico, com a instituição de prêmio ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial. O leilão é a modalidade utilizável para venda de bens móveis inservíveis para a Administração ou legalmente apreendidos ou adquiridos por força de execução judicial ou, ainda, para a venda de imóveis cuja aquisição haja derivado de procedimento judicial ou dação em pagamento, a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao da avaliação. (MELLO, 2004, p. 512-516)

A concorrência é obrigatória nos casos mais de valores mais elevados, a tomada de preços, assim como o leilão, é prevista para os negócios de vulto médio e o convite para os de modesta significação econômica. Com exceção do convite, cuja divulgação se faz por carta e afixação de cópia do instrumento convocatório em local apropriado (art. 22, § 3°), todas as outras modalidades dependem da publicação de aviso contendo um resumo o edital com a indicação do local em que os interessados poderão obter-lhe o texto completo, bem como todas as informações sobre o certame. (MELLO, 2004, p. 509-511).

Segundo Celso de Mello (2004, p. 509), pode haver outra modalidade de licitação, qual seja: o pregão, utilizado para aquisição de bens e serviços comuns qualquer que seja o valor estimado da contratação, em que a disputa pelo fornecimento é feita por meio de propostas e lances em sessão pública. A princípio, essa modalidade nasceu viciada, mas foi regulada e liberada para toda a esfera Federal pela Medida Provisória 2.026/00 e a Lei 10.520/02 o fez aplicável a todo país.

Por fim os casos excludentes da licitação, quais sejam: a) Licitação dispensada – A lei 8.666/93, no art. 17, I e II, declarou dispensada a licitação para os casos ali enumerados. Trata-se de norma de regramento vinculado. Não há margem de opção para a Administração. b) Licitação dispensável – A Lei, no art. 24, incisos I a XXVII, traz as hipóteses em que a licitação é dispensável (que formam um rol taxativo). IV – Emergência ou calamidade pública; V – Desinteresse pela licitação anterior; XXVI – Celebração de contratos públicos para prestação de serviços públicos nos termos autorizados em contratos de consórcios públicos. c) Inexigibilidade de licitação - Ocorre quando há impossibilidade jurídica de competição entre contratantes, quer pela natureza específica do negócio, quer pelos objetivos sociais visados pela Administração, de acordo com os seguintes incisos do art. 25; I – produtor ou vendedor exclusivo; II – serviços técnicos profissionais especializados; III – contratação de artistas. (MELLO, 2004, p. 497 – 505)

Vale ressaltar que toda licitação é passível de anulação, a qualquer tempo de acordo com o art. 49 da Lei 8.666/93, alem de também poder ser revogada, ou seja, invalidada por motivo do interesse público, devendo a revogação ser justificada. A anulação e a revogação devem obedecer ao princípio do devido processo legal, concedendo aos interessados o direito ao contraditório e a ampla defesa.

3 O PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA NO PROCESSO DE LICITAÇÃO

 

Há certo consenso na doutrina de que a publicidade é na verdade, um subprincípio da Transparência Administrativa, inerente a Estados Democráticos de Direito, tal como o criado na Constituição da República de 1988. Neste sentido Wallace Paiva Martins Junior (2004, p. 20, 21 e 33) expressa que “a ampla e efetiva publicidade da atuação administrativa, a motivação de seus atos e a participação do administrativo na condução dos negócios  públicos  são  subprincípios  (e instrumentos) do princípio da transparência”.

As vantagens da transparência administrativa são indicadas ainda pelo autor:

“É a partir da transparência administrativa que se propicia o desenvolvimento de linhas de atuação administrativa contando com a participação do administrado – não apenas espectador passivo ou destinatário e fiscal da conduta, senão agente colaborador na tomada de decisões administrativas – para realce do caráter público da gestão administrativa de diálogo aberto, de feição contraditória, de consenso (...). Num modelo de Estado em que a intervenção estatal é crescente, a opacidade administrativa compromete a eficiência e a moralidade de suas decisões. (...) Quando se arrolam entre os contemporâneos meios de atuação da transparência institutos participativos (v.g., as audiências e consultas públicas), a participação decorre e é proporcionada pela transparência administrativa, com a finalidade de, a partir do conhecimento (informação) viabilizado pela publicidade, possibilitar uma atuação mais ativa do administrado. A transparência, para além da publicidade, só prevalece com ampla participação do povo no governo.”

O procedimento licitatório, segundo Cretella Júnior (1995, p. 119), tem uma finalidade bem clara, pois é o “meio mais idôneo para possibilitar contratos mais vantajosos para o Estado, o que se dá conforme os princípios que regem a lei da oferta e procura [...] escolhendo não o preferido, mas aquele que, objetivamente, fez a melhor proposta”.

Para que exista uma fiscalização e acompanhamento efetivo dos órgãos de controle externo e externo e dos administrados em geral, torna manifesta a observância ao princípio da publicidade e transparência no procedimento licitatório. Como exercício desse poder de fiscalização, quaisquer atos lesivos à moralidade administrativa ou ao patrimônio público podem ser sustados ou impugnados, assim como podem os legitimados representar contra ilegalidades ou desvios de poder, apresentar denúncias ao Ministério Público, aos tribunais de contas, etc. (ALEXANDRINO; PAULO, 2012)

Há ainda, em decorrência desse princípio, a imposição da exposição dos motivos determinantes em qualquer etapa do procedimento, caso contrário as decisões dotadas de omissão de motivos tornaria impossível o controle efetivo por parte dos cidadãos e envolvidos na licitação. (ALEXANDRINO; PAULO, 2012)

Quanto ao princípio da publicidade no procedimento supracitado, Mello aduz:

O princípio da publicidade impõe que os atos e termos da licitação – no que se inclui a motivação das decisões – sejam efetivamente expostos ao conhecimento de quaisquer interessados. É um dever de transparência, em prol não apenas dos disputames, mas de qualquer cidadão. De resto, a Lei 8.666, no § 3º do art. 3º, estatui que: ‘A licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas até a respectiva abertura’. Acresce que o art. 4º também menciona o direito de qualquer cidadão acompanhar o desenvolvimento do certame. Demais disto, existem outros preceptivos que facultam uma fiscalização do certame por qualquer pessoa. (por exemplo: arts. 15, §§ 2º e 6º; 16; 41; § 1º; e 113, § 1º). (MELLO, 2004, p. 492)

A Lei 8.666/93 consagra vários dispositivos que dão aplicação ao princípio da publicidade no procedimento licitatório: o artigo 3º, § 3º, repete-se, estabelece a respeito da publicidade e acessibilidade em relação aos atos do procedimento da licitação, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura; o artigo 4º, também citado na contribuição de Mello (2004), em sua parte final, permite que todos os cidadãos acompanhem o desenvolvimento do procedimento em tela, condicionado a não interferência prejudicial na realização dos trabalhos; o artigo 15 § 2º faz exigência à publicação trimestral para orientação da Administração dos preços registrados, na imprensa oficial; o artigo 16 (redação dada pela lei nº 8.883/94) impõe a publicação da relação de todas as compras feitas pela Administração direta ou indireta, possibilitando a melhor visualização do bem comprado, seu preço unitário, quantidade adquirida, nome do vendedor e o valor total da operação; o artigo 21 funda normas que regem a publicação dos avisos contendo o resumo do edital, e o seu § 4º exige a divulgação de modificações pela mesma forma que seu texto original; o artigo 34, § 1º explicita a necessidade da ampla divulgação do registro cadastral e sua permanente abertura a todos os interessados, criando uma obrigação a quem esteja responsável, pelo chamamento público, através da imprensa oficial e de jornal diário, no mínimo anualmente, para atualização dos registros existentes e para a entrada de novos interessados. (DI PIETRO, 2006)

No que diz respeito à marcha do procedimento licitatório, encontram-se vários atos que deixam claro o interesse em manter a “estrita conformidade” com os princípios básicos contidos no art. 3º da Lei nº 8.666/93. É nesse sentido que, a seguir, serão abordados alguns atos procedimentais que demonstram de maneira mais significativa a atenção dada ao princípio da transparência.

4 DISPOSITIVOS QUE GARANTEM A TRANSPARÊNCIA, PUBLICIDADE E CONTROLE SOCIAL NO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO

A divulgação do procedimento para conhecimento de todos os interessados, assim como também os atos da Administração Pública praticados nas varias fases do procedimento, podem e devem ser abertos aos interessados, para assegurar a todos a possibilidade de fiscalizar sua legalidade.

Sendo a licitação um procedimento, desdobra-se em fases. A realização e regular exaurimento de cada qual é pressuposto e requisito da fase subsequente.

Nem todas as modalidades de licitação apresentam todas as fases do procedimento e é por esse fato que iremos adotar nesse tópico somente a fase de edital e a audiência pública, além do mais, essas duas figuras irão traduzir a importância da transparência e publicidade no procedimento licitatório.

4.1 Audiência Pública

Nas concorrências de valor muito elevado (acima de 150 milhões de reais), há uma exigência anterior à própria publicação do edital, a audiência pública, disposta no art. 39 da Lei 8.666/93:

Art. 39.  Sempre que o valor estimado para uma licitação ou para um conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas for superior a 100 (cem) vezes o limite previsto no art. 23, inciso I, alínea "c" desta Lei, o processo licitatório será iniciado, obrigatoriamente, com uma audiência pública concedida pela autoridade responsável com antecedência mínima de 15 (quinze) dias úteis da data prevista para a publicação do edital, e divulgada, com a antecedência mínima de 10 (dez) dias úteis de sua realização, pelos mesmos meios previstos para a publicidade da licitação, à qual terão acesso e direito a todas as informações pertinentes e a se manifestar todos os interessados.

Parágrafo único.  Para os fins deste artigo, consideram-se licitações simultâneas aquelas com objetos similares e com realização prevista para intervalos não superiores a trinta dias e licitações sucessivas aquelas em que, também com objetos similares, o edital subseqüente tenha uma data anterior a cento e vinte dias após o término do contrato resultante da licitação antecedente.

No artigo acima citado, a Lei 8.666, a fim de ampliar a transparência, a publicidade e o acesso a informações relativas ao contrato a ser firmado com a administração, estabelece a obrigatoriedade da realização da audiência pública. O aludido dispositivo prevê divulgação da audiência pública com antecedência mínima de 10 dias de sua realização e esta com no mínimo 15 dias da data para a publicação do edital, toda vez que o valor for superior a 150 milhões de reais. (ALEXANDRINO; PAULO, 2012)

O parágrafo único define como licitações simultâneas como sendo aquelas com objetos similares e com realização prevista para intervalos não superiores a 30 dias e, licitações sucessivas, como duas ou mais licitações quando, sendo similares seus objetos, o edital da segunda seja publicado antes de 120 dias após o término do contrato resultante da primeira licitação.

Na audiência pública os interessados terão acesso a todas as informações pertinentes ao objeto da licitação e terão oportunidade de se manifestar a respeito.

4.2 Edital

O edital é o ato pelo qual a administração torna pública a realização de uma licitação, divulga a abertura da concorrência, fixa os requisitos para participação, define o objeto e as condições básicas do contrato e convida a todos os interessados para que apresentem suas propostas. De acordo com Maria Di Pietro (2006, p. 383), “costuma-se dizer que o edital é a lei da licitação; é preferível dizer que é a lei da licitação e do contrato, pois o que nele se contiver deve ser rigorosamente cumprido, sob pena de nulidade”. O edital está previsto nos termos do art. 21 na Lei 8.666/93.

Na modalidade pregão, determina a Lei 10.520/02 que a divulgação deve ser feita por meio de aviso publicado no diário oficial do respectivo ente federado ou, não existindo, em jornal de circulação local. É facultado, ainda, a divulgação do aviso por meios eletrônicos.

De acordo com o art. 40, o edital é numerado, em séries anuais e deve conter o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida pela Lei 8.666, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes. Além dessas, o edital deve conter varias outras informações importantes ainda presente no mesmo dispositivo:

I - objeto da licitação, em descrição sucinta e clara;

II - prazo e condições para assinatura do contrato ou retirada dos instrumentos, como previsto no art. 64 desta Lei, para execução do contrato e para entrega do objeto da licitação;

III - sanções para o caso de inadimplemento;

IV - local onde poderá ser examinado e adquirido o projeto básico;

V - se há projeto executivo disponível na data da publicação do edital de licitação e o local onde possa ser examinado e adquirido;

VI - condições para participação na licitação, em conformidade com os arts. 27 a 31 desta Lei, e forma de apresentação das propostas;

VII - critério para julgamento, com disposições claras e parâmetros objetivos;

VIII - locais, horários e códigos de acesso dos meios de comunicação à distância em que serão fornecidos elementos, informações e esclarecimentos relativos à licitação e às condições para atendimento das obrigações necessárias ao cumprimento de seu objeto;

IX - condições equivalentes de pagamento entre empresas brasileiras e estrangeiras, no caso de licitações internacionais;

X - o critério de aceitabilidade dos preços unitário e global, conforme o caso, permitida a fixação de preços máximos e vedados a fixação de preços mínimos, critérios estatísticos ou faixas de variação em relação a preços de referência, ressalvado o disposto nos parágrafos 1º e 2º do art. 48;

XI - critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela;

XIII - limites para pagamento de instalação e mobilização para execução de obras ou serviços que serão obrigatoriamente previstos em separado das demais parcelas, etapas ou tarefas;

XIV - condições de pagamento, prevendo:

a) prazo de pagamento não superior a trinta dias, contado a partir da data final do período de adimplemento de cada parcela;

b) cronograma de desembolso máximo por período, em conformidade com a disponibilidade de recursos financeiros;

c) critério de atualização financeira dos valores a serem pagos, desde a data final do período de adimplemento de cada parcela até a data do efetivo pagamento;

d) compensações financeiras e penalizações, por eventuais atrasos, e descontos, por eventuais antecipações de pagamentos;

e) exigência de seguros, quando for o caso;

XV - instruções e normas para os recursos previstos nesta Lei;

XVI - condições de recebimento do objeto da licitação;

XVII - outras indicações específicas ou peculiares da licitação.

Os prováveis interessados em licitar necessitam de um prazo que permitam elaborar suas propostas, um tempo para que se preparem para a disputa. Tais prazos variam conforme a modalidade de licitação: 45 dias para concurso e concorrência (quando o contrato a ser celebrado contemplar o regime de empreitada integral ou quando a licitação for do tipo melhor técnica ou técnica e preço); 30 dias para concorrência (as demais) e tomada de preços (quando a licitação for do tipo melhor técnica ou técnica e preço); 15 dias para tomada de preços (as demais) e leilão; 5 dias para convite; e ,por fim, de 8 dias para o pregão, contados a partis da publicação do aviso.

O edital pode ser impugnado sempre que for discriminatório ou omisso em pontos essenciais ou, ainda, apresentar qualquer irregularidade que prejudique a licitação. Tal impugnação pode ser feita pelos participantes ou por qualquer cidadão, mais uma prova da transparência nessa fase. Esse cidadão, de acordo com o art. 41, § 1°, da Lei 8.666, pode impugnar o edital que apresente irregularidades, caso em que deverá protocolar o pedido até 5 dias úteis antes da data determinada para abertura dos envelopes de habilitação, o pedido deverá ser analisado, julgado e respondido no prazo de 3 dias. O licitante, por sua vez, de acordo com o § 2°, pode impugnar o edital diante da administração até o segundo dia útil antes da abertura dos envelopes de habilitação em concorrência, ou a abertura dos envelopes com as propostas em convites, tomada de preços ou concurso, ou a realização de leilão.

Além da possibilidade de impugnação do edital, qualquer licitante, contratado ou pessoa física ou jurídica, de acordo com o art. 113, poderá representar ao Tribunal de Contas ou aos órgãos integrantes do sistema de controle interno contra irregularidades na aplicação da Lei 8.666/93, para fins de controle das despesas decorrentes dos contratos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Em face do exposto, observou-se que a licitação é um procedimento administrativo importante e que, é através dela, que a administração mantém a moralidade no processo de aquisição de bens e serviços, onde os próprios interessados e os cidadãos comuns poderão analisar a transparência do processo, pois é um procedimento onde tudo deve ficar exposto aos interessados através do princípio da publicidade, havendo também as regras do instrumento convocatório a serem cumpridas.

Neste artigo foi apresentado um conhecimento prévio e breve sobre licitações a fim de melhorar e possibilitar o entendimento a respeito do princípio da transparência nesse instituto.

Foi possível também notar a existência de duas figuras importantíssimas para o controle social e que confirmam a presença do princípio da transparência no procedimento licitatório, as figuras são: audiência pública e edital.

 Tudo isso como forma de obter uma maior fiscalização e informação a respeito da licitação, além do um bom uso do dinheiro público na administração.

REFERÊNCIAS

 

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 20. ed. Rio de Janeiro: Método, 2012

CRETELLA JUNIOR, José. Das licitações públicas. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 1991.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

FRANÇA, Maria Adelaide de Campos. Comentários à lei de licitações e contratos da administração pública. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Transparência Administrativa: publicidade, motivação e participação popular. São Paulo: Saraiva, 2004.

MELLO, Celso Antônia Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

SABBAG, Eduardo. Curso de Direito Tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.



[1] Aluno do décimo período noturno do curso de Direito, na Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluno do décimo período noturno do curso de Direito, na Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.