Alunas: Rita de Cássia Freire Silva Disciplina: Direito Constitucional I Professora. Msc. Amanda Thomé Curso: Direito Noturno – 3º período PAPER: Supremo Tribunal Federal e Ativismo Judicial O Ativismo Judicial do Supremo Tribunal Federal frente à ineficácia do Poder Executivo Rita de Cássia Freire Silva Sumário: Introdução; 1 A organização dos Poderes e o papel do Supremo Tribunal Federal; 2 O papel do STF diante da ineficácia do Poder Executivo; 3 O ativismo judicial praticado pelo Supremo Tribunal Federal; Conclusão e Referências. RESUMO Este trabalho trata de um estudo acerca do ativismo judicial que vem sendo praticado pelo Supremo Tribunal Federal, especificamente em decorrência da ineficácia do Poder Executivo. O estudo procurou, primeiramente, destacar a origem da organização dos poderes e a atual atuação do STF frente às novas demandas sociais. O presente trabalho apresenta, ainda, uma breve análise sobre a visão pragmática do ativismo judicial, diante da ineficácia do sistema político em realizar as prestações positivas a eles atribuídas pela Constituição Federal da República e por fim apresentar casos específicos sobre a prática do ativismo judicial pelo STF. PALAVRAS-CHAVE: Organização dos Poderes; Supremo Tribunal Federal; Ativismo Judicial. 1- Introdução A Constituição de 1988 instituiu um Estado Democrático de Direito, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade justa, fraterna, pluralista e sem preconceitos. Entretanto, mais de duas décadas após a promulgação da Constituição Federal é possível afirmar que muitos desses direitos não são alcançados de forma efetiva. Diante dessa falta de efetividade e da cobrança cada vez maior pela sociedade, em decorrência da ineficácia de setores essenciais, que deveriam garantir os direitos individuais e sociais aos cidadãos brasileiros, surge uma pressão sobre o Estado, que, por sua vez, tem capacidade limitada para a prestação de todos os direitos estabelecidos por meio de suas políticas públicas. A limitação referida diz respeito, principalmente, à capacidade do Estado em alocar recursos suficientes aos diversos Programas de governo, voltados ao atendimento não só aos direitos sociais, mas também aos chamados direitos civis e políticos, em virtude da escassez de recursos públicos ou da falta de controle desses gastos, ou, ainda, da ineficácia de sua aplicação. Por outro lado, diante da ausência do Estado, seja pela ineficácia do Poder Executivo, seja pela inércia do Legislativo, o cidadão tem como último recurso a busca por seus direitos, através da justiça. Nesse contexto, é visível o papel relevante que o Poder Judiciário vem obtendo no meio social, com decisões sociopolíticas que têm afetado diretamente as relações sociais. Trata-se do fenômeno do ativismo judicial, que vem sendo desempenhado pelo Supremo Tribunal Federal. Muito se tem discutido em torno desse tema, alguns autores atribuem um aspecto positivo ao ativismo judicial, considerando que é dever do judiciário exercer o controle sobre a atuação do Poder Executivo na implementação das políticas públicas. Diante do exposto, este trabalho objetiva fazer uma análise sobre a visão pragmática do Ativismo Judicial que vem sendo praticado pela STF, diante da ineficácia do Poder Executivo. 2- A organização dos Poderes e o papel do Supremo Tribunal Federal A separação dos poderes foi esboçada pela primeira vez por Aristóteles, que descrevia a existência de três funções distintas, mas exercidas por uma única pessoa. John Locke e Montesquieu, pensadores do iluminismo, incomodados com o impedimento do desenvolvimento econômico e com a concentração das funções nas mãos do Estado, começaram a pensar em um Estado diferente. John Locke posteriormente detalhou a tripartição dos poderes no “Segundo Tratado do Governo Civil”, mas foi a teoria de Montesquieu, em “O espírito das leis”, que idealizou a separação das funções estatais, em três poderes autônomos e independentes e mais harmônicos entre si. O que Montesquieu fez foi propor uma divisão orgânica correspondente às funções fundamentais do Estado. Em verdade, o Poder do Estado é uno e indivisível. Portanto a divisão de poderes, na verdade, é divisão de órgãos, ou separação relativa de órgãos para exercitarem as distintas funções do Estado. Montesquieu inovou, afirmando que as funções estatais seriam repartidas a poderes autônomos e independentes, mas harmônicos entre si. A cada órgão caberia uma função típica, inerente a sua natureza, assim Montesquieu idealizou as funções de cada Poder: ao Legislativo fazer leis; ao Judiciário punir e ao Executivo executar leis. A Constituição da República Federativa do Brasil dispõe em seu artigo 2º que: Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. No capítulo III do seu título IV, artigos 92 a 126 cuida a Constituição Federal do Poder Judiciário, ditando normas gerais, fixando garantias e impondo impedimentos aos magistrados e também estabelecendo a estrutura jurídica do país. Os artigos 101 a 103 dispõe sobre o Supremo Tribunal Federal, sua composição, sua competência e forma de escolha e nomeação de seus componentes. O STF tem competência preponderantemente constitucional, ou seja, configura-se como o mais alto intérprete da Constituição. Nesse sentido, mediante os procedimentos adequados, garante a primazia da Constituição e julga a conformidade ou não das leis e outros atos normativos à Carta Magna. Com sede na Capital da União e competência sobre todo o território nacional, o STF tem a função básica de manter o respeito à Constituição e sua unidade substancial em todo o país, além de encabeçar o Poder Judiciário inclusive em certas causas sem conotação constitucional. Como cabeça do Poder Judiciário, compete-lhe a última palavra na solução das causas que lhe são submetidas. Além das competências previstas nos artigos 102 e 103 da Constituição Federal, o STF tem a função de editar súmulas vinculantes, nos termos do art. 103-A, que têm autêntica força de lei e por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia, com generalidade para se imporem em todos os casos nos quais ocorreram as situações de fato nelas descritas. 2- O papel do STF diante da ineficácia do Poder Executivo A Constituição Federal de 1988 atribui ao STF a competência para apreciar os casos de omissão inconstitucional, mediante a Ação de Inconstitucionalidade por Omissão e o Mandado de Injunção, assim como trouxe, também, para apreciação do Supremo, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental e a Ação de Constitucionalidade. Nesse sentido, a CF de 1988 conferiu ao STF a função de controlar as omissões constitucionais dos órgãos políticos do Executivo e do Legislativo. Embora o Brasil tenha apresentado, ao longo dos últimos anos, certo grau de desenvolvimento, sabe-se que a desigualdade social no Brasil é um fato e essa realidade exige do governo políticas públicas voltadas à garantia da igualdade de direitos à população brasileira. Nesse contexto a Constituição Federal de 1988 garante além dos direitos individuais os denominados direitos sociais, assim estabelecidos no art. 6º da CF. Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Segundo Elival da Silva Ramos, “a transformação do Estado liberal-democrático em um Estado social-democrático fez com que se alterasse profundamente o modo de expressão institucional do princípio da separação dos poderes...”, ou seja, a partir da garantia dos direitos sociais, o papel do Poder Executivo está sendo constantemente colocado à prova, pois os cidadãos esperam do governo ações voltadas à garantia mínima desses direitos. Entretanto, sabe-se que a capacidade do Poder Executivo em implementar as políticas públicas está diretamente relacionada à sua capacidade orçamentária, sem falar de outros aspectos relacionados à sua estrutura e competência normativa e administrativa. Tudo isso leva a uma nova configuração dos órgãos que desempenham as funções de cada Poder, tanto no seu modo de atuação, quanto no exercício de suas funções. Ainda Segundo Elival da Silva Ramos: O que se observa é que a função de governo, na maioria das vezes, se desenvolve mediante a elaboração de programas de governo, de planos de ação, globais e setoriais, compreendendo, ainda, a busca do engajamento dos demais Poderes e da sociedade civil em relação às diretrizes traçadas. Ora essas atividade raramente assumem forma jurídica, permanecendo, via de regra, adstrita à esfera política. A sua vocação natural, entretanto, é a de se espraiar por todas as atividades estatais, deflagrando providências legislativas, administrativas e até mesmo jurisdicionais, sempre sob a impulsão do Governo, a quem as Constituições social-democráticas conferem poderes para tanto.” ( RAMOS-2010, pág. 154). Em complementação, segundo Ramos “ ...a função de governo se reveste de forma legislativa, se manifestando por meio de diplomas legais que não veiculam normas gerais e abstratas e sim programas de ação governamental...". As leis a que se refere o autor são: o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e Lei Orçamentária Anual, que correspondem ao planejamento administrativo do governo quanto aos programas e ações que direta e indiretamente atingirão a sociedade, por meio das funções relacionadas aos direitos sociais dispostos no art. 6º da Constituição Federal. O STF entendia que as leis orçamentárias, ou a lei de diretrizes orçamentárias não poderiam ser objetos de controle, já que se tratava de leis com efeito concreto, ato administrativo em sentido material. (LENZA, 2010, p.252). Entretanto, esse entendimento evoluiu, ou seja, o STF passou a admitir o controle de constitucionalidade das leis orçamentárias, pois estas são “... um ato de efeito concreto na aparência, já que, como decidido, para que seja executada, dependerá da edição de muitos outros atos, estes sim de efeito concreto.” ( LENZA, 2010, p.252). As ADI 4.048/2008 e 4.049 inauguraram um novo posicionamento do STF, admitindo o controle dos requisitos de imprevisibilidade e urgência para edição de Medidas Provisórias para abertura de crédito extraordinário. ( LENZA, 2010, p. 486). Conforme o art. 167, § 3º da CF a abertura de crédito extraordinário somente será para atender as despesas imprevisíveis e urgentes, o que dá uma ampla margem de discricionariedade por parte do Presidente da República, podendo então, o STF realizar o controle.( LENZA, 2010, p .486). O que se conclui é que o STF, em cumprimento ás suas competências constitucionais, tem atuado ativamente nas questões de competência exclusiva do Poder Executivo, em uma demonstração clara de ativismo judicial em favor do cidadão e de seus direitos sociais, fazendo surgir uma nova configuração institucional entre os Poderes, principalmente, quanto ao “engajamento” a que se refere Elival da Silva Ramos, em favor de maior eficácia das políticas públicas delineadas no âmbito do Poder Executivo e, principalmente, de uma maior efetividade na destinação dos gastos públicos. Diante dessa “ineficácia” do Poder Executivo, o judiciário tem conquistado um papel relevante no meio social, com decisões abrangentes que afetam diretamente as relações sociais. Nesse contexto, os cidadãos, quando não obtêm esses direitos de forma espontânea pelo Estado, têm procurado por meio da justiça. Embora, muita das vezes, esta não esteja ao alcance da maioria, seja por desconhecimento, seja por falta de recursos ou apoio do próprio Estado, mas quando alcançam esse direito, o Poder judiciário, em cumprimento à sua função jurisdicional ( art. 5º, inciso XXXV), tem cumprido o seu papel, concedendo de forma individualista, medicamentos, tratamentos de saúde ou vagas em sala de aula, tratando direitos sociais como direitos individuais. 3- O ativismo judicial praticado pelo Supremo Tribunal Federal Os tribunais têm passado a ocupar cada vez mais uma posição de destaque no sistema do governo, ao serem demandados para concretizar demandas de atribuições constitucionais não cumpridas pelos Poderes Executivo e Legislativo. Nesse sentido, segundo Ramos “não há um sentido negativo na expressão Ativismo Judicial.” “Ao contrário, o ativismo pode ser considerado positivo por proporcionar a adaptação do direito de novas exigências sociais e de novas pautas axiológicas...” Daí porque a discussão passa para o plano da filosofia jurídica, em que a indagação central não é a consistência jurídica de uma atuação mais ousada do Pode Judiciário e sim a sua legitimidade, tendo em vista a ideologia democrática que permeia o sistema político (RAMOS 2011, pág 110). A ineficácia do Poder Executivo e a consequente não efetividade de suas ações tem resultado em decisões do STF, que bem exemplificam o ativismo judicial que o mesmo vem praticando. Em relação à saúde, por exemplo, o Plenário do Supremo Tribunal Federal indeferiu recursos interpostos pelo Poder Público contra decisões judiciais que determinaram ao Sistema Único de Saúde o fornecimento de remédios ou tratamentos não oferecidos pelo sistema a pacientes de doenças graves que recorreram à Justiça. Com esse resultado, as pessoas ganharam o direito de receber os medicamentos ou tratamentos pedidos pela via judicial. Entretanto, discute-se se essas decisões não estariam interferindo no próprio resultado das políticas públicas, visto que o Poder Executivo, muita das vezes, está sendo obrigado a atender decisões judiciais para garantir direitos individuais em prejuízo do atendimento da população mais necessitada. Como pode ser observado, o ativismo judicial que vem sendo praticado pelo STF merece muitas análises e discussões, tanto no campo jurídico como em diversos outros campos, como: o econômico, o social, o administrativo e, principalmente, o político, sem falar em questões mais abrangentes que envolvem todo um contexto onde a sociedade, também, é partícipe, tanto no aspecto político, como cidadão, que elege seus representante, assim como cidadão que espera do poder público, ações concretas para garantia dos seus direitos individuais e sociais. Segundo Bonavides (2010): A hegemonia trasladas-se, então, para a Sociedade, com as novas gerações de direitos fundamentais incorporados ao constitucionalismo contemporâneo, transformando a Constituição em ordenamento jurídico fundamental da Sociedade, e não apenas do Estado. CONCLUSÃO O presente trabalho procurou apresentar uma análise sobre a prática do ativismo judicial pelo Supremo Tribunal Federal. Diante do tema procurou-se em primeiro lugar fazer uma análise sobre as causas da interferência do Poder Judiciário em questões relacionadas às competências constitucionais do Poder Executivo. Por todo o exposto pode-se concluir que a inércia do Poder Executivo está relacionada à sua incapacidade de cumprir com a garantia dada pela Constituição Federal em estabelecer políticas públicas voltadas aos cidadãos, como forma de garantir seus direitos sociais. Diante de tal inércia, tanto do Poder Executivo quanto do Poder Legislativo surge não somente a atuação dos juízes ativistas, mas, principalmente, a atuação significativa do STF, em vista das suas competências constitucionais. Em suma, os Poderes Legislativo e Executivo, que estão à frente do processo democrático, estão passando por uma crise de legitimidade e em contrapartida o Poder Judiciário vem moldando-se a um novo perfil, voltado à garantia dos direitos fundamentais e sociais dos cidadãos. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Malheiros, 2010. BONAVIDES, Paulo. Ciência Política, São Paulo: Malheiros, 1995. GRINOVER, Ada Pellegrini ( em colaboração com CINTRA, Antonio Carlos de Araújo, DINAMARCO, Cândido Rangel)- Teoria Geral do Processo, 27ª Ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2011. FERREIRA, Danilo. Ativismo Judicial no STF?. Disponível em: .Acesso em: 24 fev 2010. PEDRO, Lenza, Direito Constitucional Esquematizado, 14 ed. Saraiva. RAMOS, Elival da Silva. Ativismo Judicial: parâmetros dogmáticos. São Paulo: Saraiva, 2010. SILVA, Virgílio Afonso da Silva. O judiciário e as políticas públicas. In: Cláudio Pereira de Souza Neto & Daniel Sarmento, Direitos Sociais: fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécie. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008: 587-599. BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Fonte: http://www.webartigos.com/articles/14026/1/Ativismo-Judicial-no-STF/pagina1.html#ixzz1MTLNza5n http://www.sbdp.org.br/ver_monografia.php?idMono=161