AS DESOCUPADAS

“...O homem foi andando.......... andando................... andando..........................e crescendo.... crescendo.... crescendo....”

É muito feio, mas muito feio mesmo fofocar, fazer comentários maldosos, como também; espiar a vida alheia. Mas, quantos de nós e quantas vezes, não fazemos como o macaco que senta em cima do próprio rabo e aponta a existência de rabo no outro.

             A comadre Mariana e eu morávamos perto da casa, ou melhor dizendo, na mesma quadra de uma “mulher dama“.  Era assim que muitos chamavam, na década de 50 mais ou menos, viúvas ou largadas do marido, moças perdidas, como se dizia, na maioria, que ficaram com a dor da perda e filhos, enfim, vivendo então de amores fúteis e úteis, recebendo em suas casas cavalheiros afoitos por prazeres carnais.

            A comadre e eu não éramos exatamente do clube das beatas, das faladeiras e linguarudas, porém não resistíamos ao desejo de espiar as brigas domésticas e o entra e saí masculino na casa daquela mulher despudorada e desfrutável.

              Numa noite, estávamos tomando um tacacá, quando resolvemos ir até a cerca do fundo para observar a possível chegada de quem aguardava a vizinha meretriz. Nos agachamos e com as duas mãos nos apoiamos nas balaustras da cerca esperando que alguma visita houvesse para ela. Logo um carro bonito e aparentemente caro se aproximou, sem ruído de motor parou em frente da casa e um homem alto, vestindo um terno azul, desceu, mas ao contrário do que esperávamos, não entrou na casa dela.     

             O homem foi andando... Andando... Andando... E crescendo... Crescendo... Crescendo... E nós não podíamos nos soltar da cerca, como se nela houvesse cola instantânea. Não podíamos fechar os olhos, nem piscar, o que causava uma sensação de ardor na vista. Nem virar o pescoço para lado nenhum, nem falar. Era como se algo maior nos tivesse paralisado. O homem continuou andando mais ainda, de repente nos viu ali, grudadas na cerca, e veio vindo... Veio vindo... Vindo em nossa direção e nos olhando com raiva. Neste momento sua cabeça e seus olhos começaram a crescer e estufar. Apavoradas e paralisadas por sabe-se lá o quê, acompanhávamos o transformar daquela aberração. E sua cabeça estufou... Estufou... E estufou tanto que seus olhos saltaram de sua face vindo em nossa direção como se fossem duas balas assassinas, espocando-se em nossos rostos. Ficamos ainda mais aterrorizadas olhando para o tal homem quando daquelas suas petecas de olho que colaram em nós, uma gosma amarga, quente e fedida escorria sobre nossos rostos imóveis e pálidos, entrando em nossas bocas. Ele continuou vindo vagarosamente, com os dois buracos negros no lugar de seus olhos. Depois começou a soltar fumaça e fogo pelo seu narigão, explodindo em seguida, como também seu carro. Ambos desapareceram em faíscas luminosas e fumaça grossa, deixando exalar um cheiro muito forte de enxofre.

             Desgrudamos da cerca e caímos sentadas ainda perplexas. Nossas falas demoraram algum tempo para voltar. Achamos melhor não comentar o acontecido com ninguém, nem mesmo com o padre, qual foi nosso primeiro pensamento. De qualquer forma decidimos nunca mais espiar a vida dos outros.                                                                                                  Atiana e Mara