INSOLVÊNCIA DE EMPRESAS COM RESPALDO TRANSNACIONAL E O PRINCÍPIO DA RECIPROCIDADE[1]

 

 

                                                                                              Gabriel Afonso Carvalho Fonseca[2]

                                                                                              Ricardo Albuquerque Ferro Alves²

                                                                                                               José Humberto Oliveira[3]

Sumário: 1 INTRODUÇÃO; 2 Falência de empresas e questões procedimentais; 3 UNCITRAL: Criação de uma Lei Modelo; 3.1 Lei Modelo no Brasil;  3.2 Princípio da Reciprocidade como solução; 4 Considerações Finais; Referências.

 

RESUMO

 

 

No presente projeto a ser desenvolvido, pretende-se analisar a falência das empresas e como isso vêm a repercutir em território estrangeiro, bem como a utilidade da Lei Modelo criada pela UNCITRAL e, portanto, a necessidade do princípio da reciprocidade entre países. Isso devido ao fato de que por conta do fenômeno da globalização, quando uma empresa venha a falir, pode não apenas envolver os indivíduos da mesma localidade desta ou localidades próximas. Com isso vêm a envolver indivíduos além das fronteiras desta empresa que vêm a falir, com isso, um procedimento que por si só já vêm a ser complexo e moroso, torna-se mais ainda difícil de ser resolvido, tornando-se imprescindível para o caso uma Lei que regule tais casos.

Palavras-chave: Falências de Empresas Internacionais; Lei Modelo. 

                                                                                    

1 INTRODUÇÃO

 

Nesta etapa do curso de Direito, quando se começa a estudar a disciplina de Falência e Recuperação de empresas, aquilo que se imagina é que o processo de falência pode vir a ser algo moroso e bastante complexo em alguns detalhes. Com isso, percebe-se o quanto vêm a ser algo complicado para os litigantes participar de tal procedimento. Ao se deparar com a possibilidade de haver procedimento para saldar essa dívida, que vai para além do território, a primeira coisa que vêm em mente é que isso irá envolver procedimentos mais e mais complexos e que no fim das contas, aqueles que visam a recuperação de seu capital investido, seja em algum produto ou como sócio da própria empresa, podem não sair com suas pretensões satisfeitas.

Quando, em tempos distantes, uma empresa falia, por menor ou maior que fosse a repercussão era apenas nacional e muita das vezes nem detinha respaldo para além das linhas que demarcavam o território do Estado ao qual pertencia a determinada empresa. Isso devido ao fato de que em tempos mais antigos não havia de se falar no fenômeno da globalização, ou seja, quando uma empresa falia, na maioria das vezes só interessavam aos credores das localidades próximas, entrar com ação para reaver seus lucros ou bens que lhe pertencem por direito (já que a empresa teria falido). Porém com a globalização, a falência de determinada empresa, seja ela média, grande ou até pequena, mas repercuti em cenário internacional, bastando para isso deter algum negócio com uma empresa estrangeira. Com isso, percebe-se que a extensão da fila dos credores para receberem seus ativos vai além do território nacional e com isso, surge complicações, pois, o processo para saldar as dívidas para com os credores em um país, pode não vir a corresponder com o procedimento adotado por outro.

Com isso percebe-se o quanto a modernidade nas relações de empresas trazem benefícios mas também tem seus malefícios como esse. O principal entrave em relação a saldar a dívida com os credores em territórios diferentes vêm a ser essa brevemente citada acima, em relação a legislação atuante em cada país, pois, dessa forma, como que se pode chegar a um consenso? Por conta disso viu-se a necessidade de criação de uma legislação única, específica, que venha a ser aplicada nos países os quais concordarem em aplicar a mesma e que venha a atender a todos esses padrões e que pudesse mediar o processo de falência quando este ultrapasse as barreiras nacionais.

Assim, a UNCITRAL criou uma Lei Modelo a qual, vários países vieram a aderir e com isso, obteve-se grande sucesso e êxito em relação a atender as demandas existentes em um processo de falência. Porém, entre tantos países que aderiram a essa legislação especial o Brasil foi um dos poucos que se recusaram a aderir essa Lei. Com isso, os processo de falência de empresas brasileiras que vêm a falir e que acabam por envolver mercado estrangeiro sempre geram muitas complicações, assim como o contrário, empresas estrangeiras, que até possuem filiais no Brasil vêm a falir e por envolver capital brasileiro, e com a ausência de uma legislação única que trate de tais casos, percebe-se a complexidade dos procedimentos gerados e também as dificuldades para que se chegue a um consenso. Por isso, nesse trabalho, averigua-se a possibilidade da aplicação do princípio da reciprocidade, ao qual o Brasil deveria também aplicar tal Lei, já que tantos outros países que se envolvem nesse processo de falência aplicam a mesma.

2 Falência de empresas e questões procedimentais

 

Neste presente tópico serão abordadas a falência com suas questões procedimentais e seus pressupostos. Uma das primeiras coisas que podem ser lecionadas e apreendidas ao processo de falência das empresas é que os mesmos envolvem procedimentos morosos que, muita das vezes, não levam aos benefícios esperados por todos os credores. A falência por si só, não pode ser requerida de qualquer forma ou em qualquer situação, devendo serem preenchidos determinados pressupostos os quais venham a determinar em quais condições essa falência pode vir a ser requisitada. Isso sem falar no processo em si e o quanto o mesmo vêm a ser difícil por se tratar não apenas das questões procedimentais e das medidas a serem tomadas, tudo elencado na Lei 11.101 (Lei de falências), mas também por tratar de interesses que talvez não venham a serem satisfeitos e a difícil situação de um empresário que está falindo abrir mão de sua condição como tal.

Para Fábio Ulhoa Coelho (2012), a falência de uma empresa nem sempre vêm a ser algo negativo, pois, na opinião do mesmo, muitas empresas possuem atrasos em relação aos seus recursos humanos, materiais e financeiros e com isso não conseguem acompanhar o mercado em si, produzindo capital o suficiente para se manterem e também a prestar as devidas obrigações com seus credores. Com isso, a falência das mesmas vêm a ser algo benéfico, para que o capital investido na mesma seja devolvido aos seus respectivos credores. Porém deve-se afirmar que o mesmo autor, tratara de modo superficial a falência, pois é certo que na falência, pode haver alguns benefícios, mas por toda complexidade dos processo, juntamente com toda a repercussão da falência de um determinado empresário na renda de quaisquer empresários que detinham sua renda da relação com essa suposta falida empresa, não vêm a ser em todo caso benéfica a falência.

Em tempos antigos, segundo enuncia Fábio Ulhoa (2012), os devedores eram escravizados pelos seus credores, havendo também a possibilidade de haver a prisão e a morte, principalmente em relação aos devedores de má fé. Antigamente, havia muito essa preferência pela prisão e morte do devedor de má fé e quanto a isso uma coisa pode ser dita, aos devedores sempre eram atribuídas penas severas. Porém com o passar do tempo, segundo Fábio Ulhoa Coelho (2012) o patrimônio do devedor passou a ser a garantia de saldar a dívida com o credor. Com o passar do tempo, a falência vêm a se dar de modo diferente e quanto ao devedor, esse, segundo Fábio Coelho (2012), viria a ser qualquer indivíduo que desempenhe atividade de cunho empresarial, ou seja, o empresário.

Porém, deve-se destacar aquilo que enuncia o artigo 2 da Lei de falências 11.101, pois a mesma enuncia que nem todas as empresas podem vir a falir. São essas as empresas públicas ou sociedades de economia mista ou quaisquer tipos de outras sociedades que venham a ser equiparadas a esta. É necessário também que se diga que empresas ligadas a prestação de saúde ou a prestação de energia elétrica não podem vir a falir, com exceção destas descritas no artigo 2° da Lei de falências o restante das empresas podem falir. Essa falência, segundo o artigo 97 da Lei de falências, pode ser requerida por quatro indivíduos diferentes: I- O próprio devedor, que segundo Fábio Ulhoa Coelho (2012), vêm a ser considerada a falência voluntária, na qual o próprio devedor reconhece que não há condições de prosseguir e com isso acaba requisitando sua própria falência, sendo que para que o próprio faça isso, também deve estar de acordo com o artigo 105 da referida lei, trazendo consigo os documentos necessários que comprovem essa situação, como o balanço patrimonial, demonstração de resultados acumulados, demonstração do resultado desde o último exercício social e o relatório do fluxo da caixa.

O inciso segundo já trata, segundo o já referido autor (2012), da falência tida como póstuma, pois nesse caso é requerida pelo cônjuge sobrevivente ou então pelos seus descendentes ou até seu inventariante. Prosseguindo com o mesmo raciocínio, o inciso terceiro trata da falência paritária, no qual é requisitado pelo cotista ou acionista da empresa e por último, essa falência pode vir a ser requisitado por quaisquer dos credores, a chamada, segundo o referido autor (2012), falência involuntária. Porém, quanto a esta última, torna-se necessário para que os credores peçam a falência do devedor, que a dívida atinja a quantia de 40 salários mínimos, podendo é claro os credores unirem-se em litisconsórcio, conforme enuncia o parágrafo 1° do artigo 94 da Lei de falências (11.101), para que com isso, somando o valor das obrigações que possuem o devedor para com os credores, possa ser atingido esse valor de 40 salários mínimos, para que, em litisconsórcio, essa falência do respectivo devedor possa ser requisitada e com isso dar início a esse processo de falências.

Segundo o artigo 96 da referida Lei de falências, o devedor pode contestar esse pedido se apresentar uma das causas apresentadas nos referidos incisos, como por exemplo: Vício no protesto ou em seu instrumento; a nulidade da obrigação ou de título; prescrição; falsidade de título e um dos principais, tidos como inovação trazida pela própria Lei, apresentação do pedido de recuperação judicial, dentro do prazo permitido para apresentação da contestação, conforme enunciam os artigos 95 da lei e também artigo 98 (este último determina o prazo da contestação). Esse último vêm a ser uma das inovações trazidas pela nova Lei de Falências, pois, segundo Fábio Ulhoa Coelho (2012), antigamente era utilizada a figura da concordata sendo que essa poderia vir a ser suspensiva, para suspender os efeitos de um processo de falência que já estaria em rigor, e o preventivo que serviria justamente para que o devedor empresário fosse abarcado por essa chance de se recuperar antes da vigência de quaisquer processo de falências.

Esse pedido de recuperação judicial, segundo o já referido autor (2012), é uma chance concedida ao empresário de poder se restabelecer, pagando as dívidas que possui com seus credores. Primeiramente deve o mesmo apresentar um plano de recuperação, caso não seja aceito pelos credores, um administrador judicial, determinado pelo juiz, na forma do artigo 21 da referida lei 11.101. Com isso, é uma das formas do devedor empresário possui de impugnar a falência, e uma chance também de se tornar um bom empresário, mas quando isso toma proporções que ultrapassem as fronteiras as coisas já são bem mais complicadas. 

3 UNCITRAL: Criação de uma Lei Modelo

 

Este vêm a ser um dos tópicos essenciais para o presente trabalho, já que serão explanados de modo claro essa Lei Modelo criada pela UNCITRAL e o contexto histórico que levou a criação da mesma. O contexto histórico torna-se importante, pois, assim como enuncia Eronides dos Santos (?) a simples falência de empresas nos tempos atuais, sejam elas de quaisquer tamanhos e relevâncias no cenário nacional, podem implicar em choques entre legislações. Isso devido ao fato da própria globalização e toda modernização nos meios de compras e vendas trazidas por ela. Segundo o mesmo autor (?), em tempos antigos, a falência de uma determinada empresa, só implicaria ao devedor e aos credores das localidades mais próximas, pois, naquele tempo, o mundo ainda se apresentava com fronteiras extensas separando cidades, Estados e até nações.

Com o passar do tempo e com a chegada da globalização, tudo ficou mais fácil, inclusive comprar e vender. Logo tais fronteiras deixaram de ser extensas, encurtando a distância entre o empresário e o credor das mais diversas localidades. Com isso, tendo em vista o Estado, nos diversos meios de compra e venda, dentre eles o principal que é a internet, procurou criar legislações específicas, não apenas para proteger o credor, mas também tendo em vista que, em caso de eventual descumprimento para com a obrigação com os credores e a possibilidade do empresário ser levado à falência, para garantir que o credor receba aquilo que vêm a ser seu por direito.

Com isso, tendo em vista que cada Estado possui uma legislação diferente, viu-se, portanto, a necessidade de criar uma legislação específica, única, que atendesse a todos esses padrões e que pudesse mediar o processo de falência quando este ultrapassa as barreiras nacionais, assim a UNCINTRAL, criou uma Lei Modelo a qual vários países já vieram a aderir a mesma. A grande finalidade dessa Lei, além de envolver os países que aderiram à mesma, é segundo o autor já referenciado acima (?) proporcionar sistemas que cooperem uns com os outros, em termos judiciais transnacionais e falênciais multijurisdicionais, com isso favorece a diplomacia entre juízos falimentares de países diversos.

Prosseguindo com o mesmo raciocínio, segundo Eronides (?), essa Lei, além das utilidades já citadas e do grande benefício que é tornar menos complexas as questões de falências transnacionais, outros benefícios que também merecem destaque são: Ajuda a evitar as fraudes internacionais e os prejuízos que a mesma poderia acarretar aos credores, inviabiliza as possibilidades de lavagem de dinheiro (algo muito combatido pela ONU que trabalhou com muito ímpeto também na criação dessa Lei Modelo por conta disso), maior segurança jurídica para o comércio internacional bem como o investimento no mesmo e a maior agilidade em casos de recuperação de empresas protegendo também os empregos dos indivíduos que trabalham na mesma.

O mesmo autor (?), enuncia que o Brasil, embora não tenha aderido à essa Lei Modelo criada pela UNCITRAL, já se fez uso da mesma em casos de falências de empresas brasileiras como por exemplo no caso da Varig, mas ainda assim se recusa a aderir a mesma, gerando com isso muitas complicações em caso de empresas brasileiras que venham a falir, tendo com isso respaldo internacional. Ou até empresas estrangeiras que venham a falir e que envolvam o mercado brasileiro. 

  

 

 

REFERÊNCIAS

 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Volume 3: Direito de empresa, 13° edição, São Paulo: Saraiva, 2012.

SANTOS, Eronides Aparecido Rodrigues. A INSOLVÊNCIA TRANSNACIONAL E A ADOÇÃO DA LEI MODELO DA UNCINTRAL. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Civel_Geral/ms_falencias/ms_fal_diversos/falencias%20doutrina%20UNCITRAL.pdf, acessado em: 19 de fevereiro de 2014.

Vade Mecum / obra coletiva de autonomia da editora Saraiva com a colaboração de Luiz Roberto Curia, Lívia Céspedes e Juliana Nicoletti. – 13° edição. Atual. Ampl. – São Paulo, Saraiva, 2012.



[1] Paper a ser apresentado à disciplina de Falência e Recuperação de Empresas, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco-UNDB.

[2] Alunos do 6° período do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor, orientador.