A Constituição Federal, em seu artigo 236, caput, dispõe que as atividades notariais e de registro serão exercidas em caráter privado, por delegação do poder público. Em consequência da previsão constitucional, os serviços notariais e de registro são serviços públicos (imputados, portanto, ao estado), mas transferida a particulares, por delegação. Não se trata de uma inovação, pois este é o modelo que tradicionalmente existe no Brasil, desde a proclamação da República.

No entanto, a previsão de que são exercidas em caráter privado constituiu-se em importante inovação. Fixou-se, assim, que os cartórios, ou seja, onde são realizadas as atividades notariais e de registro, não são órgãos públicos, mas sim empresas privadas. Em consequência, os notários e registradores deixaram de ser enquadrados no âmbito dos serventuários da justiça ou dos serviços auxiliares da justiça.

A grande inovação, no entanto, ocorreu com a exigência de concurso público de provas, ou de provas e títulos para receber a delegação, como fixado pelo § 3º, art. 236, da Constituição Federal:

Art. 236.

  • 3º.  O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.

Da análise do texto constitucional, resta evidenciado que os novos delegatários terão, necessariamente, de serem concursados para assumirem o serviço notarial ou de registro. Em consequência, o STF tem declarado inconstitucional previsões em  constituições estaduais e outras legislações que permitiam acesso sem concurso público.  

Neste sentido, destacamos o ARE 742.200-Ag.R, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 22/10/2013, em decisão com a seguinte ementa:

DIREITO CONSTITUCIONAL. SUBSTITUIÇÃO DE TITULAR DE SERVENTIAL EXTRAJUDICIAL. VACÂNCIA APÓS A VIGÊNCIA DA CONSTITUIÇAÕ FEDERAL DE 1988. DIREITO ADQUIRIDO A SER EFITIVADO NO CARGO DE TITULAR. NÃO OCORRÊNCIA. IMPRESCINDIBILIDADE DE APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. ADI 363 E 1.573/SC.

A jurisprudência do STF assentou que o substituto de titular de serventia extrajudicial não tem direito adquirido a ser efetivado no cargo de titular na hipótese de ter ocorrido a vacância após a vigência da Constituição da República de 1988, que exige a realização de concurso público para ingresso na atividade notarial e de registro.  

Em caso de vaga em alguma das serventias, exige-se também concurso, seja para provimento, seja para remoção. No ano de 2011, o Supremo Tribunal Federal, na ADI 3.253/PR, Relator Min. Ricardo Lewandowski, decidiu pela inconstitucionalidade da Lei paranaense nº 14.351/2004, em decisão assim ementada:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Art. 299 DA LEI PARANAENSE 14.351/2004. CIRTÉRIOS PARA REMOÇÃO DE NOTÁRIOS E REGISTRADORES PARA SERVENTIAS VAGAS. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE.

   

Em 2016, o Supremo Tribunal Federal, no Ag. Reg. nos Embargos de Declaração em Mandado de Segurança 29.302, DJe 06.06.2016, tendo por Relator o Ministro Teori Zavascki, decidiu controvérsia sobre a obrigatoriedade de concurso público, em caso de permuta entre titulares de serventias extrajudiciais.

A questão teve origem quando o Conselho Nacional de justiça desconstitui um decreto judiciário editado pelo Tribunal de Justiça do Paraná que removia, por permuta, dois delegatários. Como se tratava de uma troca, não havia concurso público, o que foi considerado, pelo Conselho, como um procedimento que violava o mandamento constitucional do concurso.

O STF confirmou o ato do CNJ, em decisão assim ementada:

  1. A jurisprudência do STF é no sentido de que o art. 236, caput, e o seu § 3º da CF/88 são normas autoaplicáveis, que incidiram imediatamente desde a sua vigência, produzindo efeitos, portanto, mesmo antes do advento do advento da Lei 8.935/1994. Assim, a partir de 5/10/1988, o concurso público é pressuposto inafastável para a delegação de serventias extrajudiciais. As normas estaduais editadas anteriormente, que admitem a remoção na atividade notarial e de registro, independentemente de prévio concurso público, são incompatíveis com o art. 236, § 3º, da Constituição, razão pela qual não foram recepcionadas.
  2. É legítima, portanto, a decisão da autoridade impetrada que considerou irregular o provimento de serventia extrajudicial, sem concurso público, decorrente de remoção, com ofensa ao art. 236, § 3º, da Constituição. Jurisprudência reafirmada no julgamento do MS 28.440 AgR, de minha relatoria, na sessão do Plenário de 19/06/2013.

                        O Relator destacou, em seu voto:

Assim, a partir de 05/10/1988, o requisito constitucional do concurso público é inafastável em ambas as hipóteses de delegação de serventias extrajudiciais: no ingresso, exige-se o concurso público de provas e títulos; na remoção (a partir da redação dada pela Lei 10.506/2002 à Lei 9.835/94), concurso de títulos. Essas exigências aliás excluiriam logicamente a possibilidade de permuta (dupla remoção simultânea) até mesmo entre titulares de serventias extrajudiciais e ainda que os permutantes tivessem, quando do ingresso, se submetido ao regular concurso público.      

            Da análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores, resta evidenciado que a obrigatoriedade de concurso público para a delegação de serventias extrajudicias, ou para remoção, encontra-se, hoje, pacificada.