SINOPSE DO CASE ¹

Gabriela Felix Marão Martins²

Viviane de Brito³

1 DESCRIÇÃO DO CASO

José da Silva e Mirinha Batista casaram-se em 2007 com separação total de bens e, durando o casamento José da Silva comprou um imóvel para que ambos residissem com seus próprios recursos. No entanto, o mesmo não transferiu o imóvel para seu nome, tendo consigo apenas a escritura e instrumento de procuração com poderes para transferir para si ou para outrem o referido bem.

No ano de 2012 o casal se separou de fato e somente Mirinha continuou morando no imóvel. O juiz, por meio da sentença de divórcio, decide que o apartamento é pertencente somente a José da Silva e os bens adquiridos em comum deviam ser partilhados. Mirinha, porém, afirmando que só desocuparia tal imóvel após a liquidação da sentença referente aos bens partilhados, continuou morando no tal mesmo após a sentença transitar em julgado.

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

Quais medidas judicias pode propor José da Silva para garantir o seu direito ao imóvel? Quais as consequências da não devolução do imóvel por Mirinha?

2.1 DESCRIÇÃO DAS DECISÕES POSSÍVEIS

2.1.1 José da Silva deve entrar com uma ação de reintegração de posse em face de Mirinha Batista

2.1.2 José da Silva deve entrar com uma ação de reivindicatória em face de Mirinha Batista

2.1.3 José da Silva deve entrar com uma ação de busca e apreensão do imóvel em face de Mirinha Bastos

2.2 ARGUMENTOS PARA A FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES POSSÍVEIS

2.2.1 José da Silva deve entrar com uma ação de reintegração de posse em face de Mirinha Batista

No dizer de RODRIGUES (2003, p. 61): “Dá-se o esbulho quando o possuidor é injustamente privado de sua posse.”. No mesmo sentido, Sílvio de Salvo Venosa que ressalta: “Esbulho existe quando o possuidor fica injustamente privado da posse. Não é necessário que o desapossamento decorra de violência. Nesse caso, o possuidor está totalmente despojado do poder de exercício de fato sobre a coisa.” (VENOSA, 2007, p. 130). E levando-se em consideração o artigo 1200 do Código Civil, que diz “É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária” bem como o artigo 1201 do Código Civil: “É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.”; tem-se que a posse de Mirinha sobre o imóvel é: injusta por precariedade (posto que é uma posse advinda de uma relação de confiança, em que a pessoa tem a obrigação de restituir a coisa, mas assim não o faz), é também de má-fé, pois mesmo após a sentença judicial, declarando que o imóvel pertence somente a José, ou seja, não ignorando o vício, a mesma se nega a sair do imóvel, impedindo o exercício de posse do possuidor legítimo que é José, sendo configurado aí o esbulho.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves, a ação possessória é o meio de tutela da posse perante uma ameaça, turbação ou esbulho, sendo instaurada no juízo possessório, em que se discute o ius possessionis (posse autônoma ou formal) (GONÇALVES, 2008, p.121) e conforme o artigo 927 do CPC: “No mérito, em sede de demanda possessória, o que se discute é apenas a posse, reservada a discussão do domínio às ações reivindicatórias ou de imissão de posse. Na ação de reintegração incumbe ao autor provar a sua posse, o esbulho praticado pelo réu, bem como sua data, e a perda da posse”, José tendo direito de posse diante do imóvel, deve entrar com uma ação possessória para reaver o bem em face de Mirinha, basta que o mesmo prove sua posse, o esbulho praticado, bem como a sua data.

Mister se faz ressaltar que no art. 920, do CPC, temos o princípio da fungibilidade dos processos possessórios, onde deve o Juiz, no final, julgar a pretensão que venha a ser reconhecida no curso da ação, tenha sido ela ajuizada pelo autor. Assim, se vier a ser proposta uma reintegração, pode o Juiz entender se tratar de uma manutenção ou vice-versa, portanto, entrando José com uma ação de manutenção de posse, o juiz, pelo princípio da fungibilidade deve assim compreender como sendo de reintegração de posse, não ficando José prejudicado por conta de tal.

No que diz respeito à perda da posse que o artigo 927 traz, temos que, conforme Sílvio de Salvo Venosa: “O esbulho é a perda dos poderes inerentes à posse, que pode dar-se de forma violenta ou não.” (VENOSA, 2007, p.78) e ainda conforme o artigo 1223 do Código Civil: “Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do possuidor, o poder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196”, portanto, provado o esbulho, provado está a perda da posse. Conforme o artigo 924 do CPC, o possuidor tem prazo de ano e dia a contar da turbação ou esbulho para obter a concessão de liminar na ação possessória, esse é, portanto o prazo de José para entrar com a ação de reivindicação da posse, sendo, portanto, uma ação de força nova, a contar da sentença emitida pelo juíz.

Carlos Roberto Gonçalves traz sobre o esbulho: “O esbulho é a mais grave das ofensas, porque despoja da posse o esbulhado, retirando-lhe por inteiro o poder de fato que exercia sobre a coisa e tornando assim impossível a continuação do respectivo exercício. Em suma: o esbulhado perde a posse. A ação de reintegração objetiva restaurar o desapossado na situação fática anterior, desfeita pelo esbulho” (GONÇALVES, 2008, p.133).

Nesse caso de não devolução do imóvel, Mirinha poderá, inclusive, responder por perdas e danos e despesas e débitos do tempo em que estava injustamente com o imóvel caso José se sinta lesado pelo tempo em que ficou impedido pela mesma de exercer sua posse sobre o imóvel, “alegando que foi ofendido em sua posse, demandar proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho”, conforme artigo 922. Além de que José tem a possibilidade de reivindicar que o juiz aplique a ela uma multa diária, chamada de astreintes, no caso de não cumprimento de sentença condenatória..

2.2.2 José da Silva deve entrar com uma ação reivindicatória em face de Mirinha Batista

            A propriedade, conforme legislação brasileira, configura-se na existência de registro ou transcrição, é o que podemos ver nos artigos 531 e 532 do CC. Portanto, primeiramente e antes de tudo, José deve registrar devidamente o seu imóvel em seu nome e conforme determinação legal, já que possui uma procuração e escritura, sendo que tal sentença declaratória servirá de título para o registro no Cartório de Imóveis competente.  

“Reivindicar consiste justamente na possibilidade de o proprietário sancionar aquele que possui injustificadamente a coisa”. (FARIAS; ROSENVALD, 2009, p.169). No mesmo sentido, Maria Helena Diniz conceitua a propriedade como sendo “o direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicar de quem injustamente o detenha” (DINIZ, 1995, pag. 400) e ainda no artigo 1228 do CC, temos que: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”. Clóvis Bevilaqua (1976) afirma que a expressão “reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua” se refere à ação de reivindicação. Afonso Fraga, nesse mesmo sentido, afirma que a ação reivindicatória é uma “ação real que compete ao proprietário pleno de uma coisa contra o possuidor da mesma coisa, para que lhe a restitua com seus frutos, acessões e indenizações dos danos sofridos”.

Em vista do explorado temos que é direito de José, portanto, reivindicar o imóvel diante de Mirinha, que injustamente o detém. Importante ressaltar que, para efeitos reivindicatórios, a expressão “injustamente a possua” é diferente da ideia de posse injusta na ação possessória, posto que para a segunda posse injusta é aquela posse que apresenta certos vícios, enquanto para a primeira posse injusta é aquela que não possui uma causa jurídica (título, por exemplo) que a justifique, configurando então a posse injusta, para efeitos reivindicatórios, de Mirinha e justificando mais uma  vez a propriedade e posse legítima de José. 

2.2.3 José da Silva deve entrar com uma ação de busca e apreensão do imóvel em face de Mirinha Bastos no caso de não cumprimento da sentença

Em conformidade com o artigo 461-A, do CPC: “Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.§ 2º Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel.”, José tem também a possibilidade de entrar com uma ação de busca e apreensão de imóvel para reaver seu imóvel, caso Mirinha não faça como determinado por sentença dentro do prazo devido.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS:

BRASILCódigo Civil. São Paulo: Saraiva, 2012.

DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. Saraiva, São Paulo, 1995.

BEVILAQUA, Clóvis. Direito das coisas. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1976.

FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Direito das Coisas, Volume V. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008

RODRIGUES, Sílvio. Direito civil: direito das coisas. v. 5. São Paulo: Saraiva, 2003.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais v. V. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2007.

SEMIÃO, Filipe Rezende. Legitimidade Ativa Na Ação Reivindicatória. Jurisway. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=7946>. Acesso em: 20 mar. 2014.