Eu, Willian Turner gostaria de começar esta história dizendo que eu vi como era fácil ser uma criança negra nos Estados Unidos, durante 1950 à aproximadamente 1975. Mais se eu contasse a minha história desta forma eu estaria mentindo. A ideia de escrever esta história e publica – lá em livro, veio de uma tarde que a minha neta chegou da escola chorando dizendo que não queria mais ser negra, pois, todas as suas amigas falavam mal de sua cor. Percebendo o que estava acontecendo pedi para que ela se acalmasse e por alguns instantes fui a outro cômodo pegar meu antigo diário, de quando eu tinha uns 7 anos de idade em 1963, para lhe mostrar o que havia presenciado com tão pouca idade e só depois ficando mais velho pude perceber o quão importante fui e que eu posso dizer que participei de um grande capítulo da história.

Vou começar falando da época que estava surgindo nos Estados Unidos em aproximadamente 1950, alguns anos antes de eu nascer. Meus pais se casaram em Dezembro deste mesmo ano. No início do casamento(eram jovens) e com ensino médio completo, mesmo com todas as dificuldades eles tinham um desejo em comum, além de formarem uma família, meu pai queria abrir seu negócio. Foi então que pegaram todas as suas economias e abriram a Padaria Turne’s. Na época pela segregação na maioria das vezes era frequentada somente por negros, somente alguns amigos da família que não tinham em mente a ideia de que: "Só porque somos brancos não podemos frequentar o mesmo lugar que eles!”, porque a maioria das pessoas eram bastante preconceituosas. E neste lugar certado pelas delícias que minha mãe preparava eu cresci muito feliz. Nunca infelizmente tive irmãos, mas, meus pais eram as melhores pessoas do mundo inteiro e nunca me deixaram me sentir só ou infeliz.

O início dos anos de 1950 foi marcado pela origem de um estilo de música, o Soul[1]·. Este tipo de música para muitos surgiu como uma forma de expressão libertadora para os negros. A maioria dos cantores ganhavam um pouquinho de espaço no cenário cultural americano, que na maioria das vezes eram por dias da semana determinados para se apresentarem suas músicas na rádio ou TV. Os negros quase não tinham voz na sociedade e consequentemente tão pouco direitos de fato. A sociedade assim como em grande parte do mundo era totalmente desigual, principalmente em questões  étnico – racial. Em todos os lugares se observava a verdadeira segregação.

A segregação racial pode manifestar-se quando as pessoas de determinada “raça”, ou de “raças” diferentes do grupo dominante, são impedidas ou desencorajadas de frequentar locais públicos, como restaurantes, cinemas, transportes ou mesmo de residir em determinados bairros. Ou pode assumir formas que atentam contra as leis do país, quando pessoas de determinadas “raças” não têm direito ao mesmo tratamento legal, como ainda acontecia na minha infância em certos locais. Até a década de 1950, os afro-americanos não tinham direito a voto, eram segregados socialmente e compunham a parcela mais pobre da população norte-americana.

Nos Estados Unidos com as Leis de Jim Crow[2] ou as Leis anti-miscigenação[3], ou apenas fruto das atitudes de uma parte da população. Em qualquer caso, é uma forma radical de racismo.

Minha neta ouvia atentamente cada detalhe que eu estava lhe contando das minhas anotações misturadas com tantas histórias que eu tinha naquele diário. E a principal que eu estava prestes a lhe contar, era sobre a causa de todo o marco, para a grande onda de mudanças, que mais tarde iria se espalhar por vários lugares.

Eu ainda  não era nascido, mais em um dos meus dias de curiosidade que todas as crianças têm sobre o que estão vendo em seu redor, resolvi perguntar o porquê de todas as verdadeiras injustiças com os negros. Meus pais explicaram que foi como um acúmulo de insatisfação geral, a começar por um episódio que é uma cena comum, presente no dia – a dia que todos. A luta pelos direitos civis começou com Rosa Parks[4], em 1955, quando esta recusou-se a ceder o seu lugar no ônibus a um homem branco, conforme mandava a lei estadual do Alabama. Rosa foi presa e liberada após pagar multa. Em consequência da sua atitude foi demitida do emprego e sofreu ameaças de morte, que a obrigaram a mudar-se para Detroit. Ou seja, ela simplesmente estava sentada em um ônibus e só porque um homem branco estava de pé ela deveria ceder seu lugar. Foi convocado pela liderança negra da cidade e com o apoio de diversos brancos, o boicote aos transportes públicos durou 386 dias, quase levando à falência o sistema urbano de transportes (a maioria dos passageiros era de negros pobres) e acabando somente quando a legislação que separava brancos e negros nos ônibus de Montgomery foi extinta.

A partir deste período acontecia um marco não só para a história americana, mas, para o mundo. Houve o aparecimento de movimentos negros como o Black Power e os Panteras Negras no meio dos anos 60, o clamor da sociedade negra por igualdade racial acabou aumentando seu pleito para a dignidade racial, igualdade econômica, autossuficiência política e libertação da autoridade branca do país.

Minha neta ouvia a minha história atentamente com um brilho no olhar que eu nunca tinha visto em uma menina de 10 anos de idade. Ela não queria nem tomar banho para almoçar, queria saber mais sobre a minha história e como eu era uma figura central de tudo isso. Após lhe contar sobre o boicote, lembro que um dos personagens principais de tudo isso e um dos responsáveis por este protesto em defesa contra Rosa Parks: a figura lembrada e mencionada por todos Martin Luther King Jr[5].

Eu e meus pais morávamos em Montgomery, capital do estado do Alabama, local onde toda a comunidade ouvia os sermões que mais tarde se tornariam um dos mais históricos e importantes de toda uma nação. Nós íamos a todos os cultos, principalmente porque meus pais me contaram que a partir do momento que eu nasci várias vezes a padaria, estava sempre sofrendo com algo e meus pais sempre foram muito cristãos e frequentar os cultos, era para eles ter esperança que dias melhores estavam por vir e ganhavam forças para sempre se reerguer do que acontecesse.

Apesar de em 1954 a Suprema Corte do país ter declarado inconstitucional a segregação em instituições de ensino, a separação entre negros e brancos era intensamente praticada em diversos espaços públicos, principalmente nos Estados americanos do sul. A situação de desigualdade racial provocou milhares de atos de desobediência civil e de manifestações que foram reprimidos, na maior parte das vezes, com violência.

Minha neta a essa altura da minha história, já não ligava mais para o problema que lhe aborreceu na escola e estava me questionando já rindo, que os da minha época eram bem piores e de maiores proporções do que havia acontecido em sua escola pela manhã.

Em meio há uma série de fatos bem piores que aconteciam seguidamente com os negros, Martin Luther King Jr. convoca a comunidade negra e a todos os que apoiassem a causa pelos direitos civis americanos a marchar em protesto até Washington. Meus pais se empolgaram,assim como toda a nossa comunidade e as outras,e resolveram participar. Eu era muito pequeno, mas como as outras famílias, meus pais também resolveram me levar.

Durante Marcha em Washington, que reuniu milhares para clamar, discursar, orar e cantar por liberdade, trabalho, justiça social e pelo fim da segregação racial contra a população negra do país. Este protesto estava causando grande preocupação ao governo do Presidente John Kennedy, mas, esses temores não se concretizaram, com o ato transcorrendo em profunda ordem e civismo, e sua repercussão mundial o tornou na maior força política para a aprovação das leis de direitos civis e direito de voto, em 1964 e 1965.

Minha neta me olhava deslumbrada e ao mesmo tempo emocionada, por saber que eu e meus pais havíamos participado e ajudado a escrever um importante pedaço na história, de fato algo que estaria marcado sempre na família, já que nesta marcha que Martin Luther King Jr. profere seu famoso discurso: "Eu tenho um sonho". Mal sabia ela que a melhor parte da minha história estaria por vir. Naquele dia logicamente, a multidão em volta do espelho d´água do Monumento à Washington, era algo espetacular. Eu e meus pais conseguimos ficar muito perto do palco onde Martin Luther King Jr. discursava. Eis que ele começou:

"[...]Eu digo a você hoje, meus amigos, que embora nós enfrentemos as dificuldades de hoje e amanhã. Eu ainda tenho um sonho. É um sonho profundamente enraizado no sonho americano.

Eu tenho um sonho que um dia esta nação se levantará e viverá o verdadeiro significado de sua crença - nós celebraremos estas verdades e elas serão claras para todos, que os homens são criados iguais.

Eu tenho um sonho que um dia nas colinas vermelhas da Geórgia os filhos dos descendentes de escravos e os filhos dos desdentes dos donos de escravos poderão se sentar junto à mesa da fraternidade.

Eu tenho um sonho que um dia, até mesmo no estado de Mississippi, um estado que transpira com o calor da injustiça, que transpira com o calor de opressão, será transformado em um oásis de liberdade e justiça.

Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em uma nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu caráter. Eu tenho um sonho hoje!

Eu tenho um sonho que um dia, no Alabama, com seus racistas malignos, com seu governador que tem os lábios gotejando palavras de intervenção e negação; nesse justo dia no Alabama meninos negros e meninas negras poderão unir as mãos com meninos brancos e meninas brancas como irmãs e irmãos. Eu tenho um sonho hoje![...]

Esta é nossa esperança. Esta é a fé com que regressarei para o Sul. Com esta fé nós poderemos cortar da montanha do desespero uma pedra de esperança. Com esta fé nós poderemos transformar as discórdias estridentes de nossa nação em uma bela sinfonia de fraternidade. Com esta fé nós poderemos trabalhar juntos, rezar juntos, lutar juntos, para ir encarcerar juntos, defender liberdade juntos, e quem sabe nós seremos um dia livre. Este será o dia, este será o dia quando todas as crianças de Deus poderão cantar com um novo significado.

"Meu país, doce terra de liberdade, eu te canto.

Terra onde meus pais morreram, terra do orgulho dos peregrinos,

De qualquer lado da montanha, ouço o sino da liberdade!"

E se a América é uma grande nação, isto tem que se tornar verdadeiro.

E assim ouvirei o sino da liberdade no extraordinário topo da montanha de New Hampshire.

Ouvirei o sino da liberdade nas poderosas montanhas poderosas de Nova York.

Ouvirei o sino da liberdade nos engrandecidos Alleghenies da Pennsylvania.

Ouvirei o sino da liberdade nas montanhas cobertas de neve Rockies do Colorado.

Ouvirei o sino da liberdade nas ladeiras curvas da Califórnia.

Mas não é só isso. Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Pedra da Geórgia.

Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Vigilância do Tennessee.

Ouvirei o sino da liberdade em todas as colinas do Mississipi.

Em todas as montanhas, ouviu o sino da liberdade.

E quando isto acontecer, quando nós permitimos o sino da liberdade soar, quando nós deixarmos ele soar em toda moradia e todo vilarejo, em todo estado e em toda cidade, nós poderemos acelerar aquele dia quando todas as crianças de Deus, homens pretos e homens brancos, judeus e gentios, protestantes e católicos, poderão unir mãos e cantar nas palavras do velho spiritual negro:

"Livre afinal, livre afinal.

Agradeço ao Deus todo-poderoso, nós somos livres afinal. [...]"

Neste momento minha neta me olhava ainda mais encantada e riu com que eu disse em seguida: Antes que ele pudesse terminar de ler a última frase eu sai de perto dos meus pais e consegui pular no palco. Algumas pessoas a volta dele se assustaram,mais ele mesmo deve ter pensado: O que um menino fará comigo?! Eu pedi que ele se abaixasse e perguntei em seu ouvido: Será que o senhor pode me dar o papel com seu discurso? Por que várias coisas eu não consegui ouvir pelo barulho e gostaria de guardar. Com um largo sorriso no rosto ele me entregou o papel e ainda fez um carinho em minha cabeça. Meus pais não acreditava naquela cena e eu nem sabia e/ou tinha noção do que acabara de fazer e conseguir. Desci do palco e fui à direção dos meus pais me abraçaram emocionados.

Minha neta já não ligava mais para nada que tinha lhe acontecido, e só sentia orgulho de tudo o que eu lhe contara e ainda mais orgulhosa da nossa família. Quando terminei ela só me abraçou. Depois deste momento, eu só fiquei olhando para o discurso original, já marcado pelo tempo, mais que sem dúvida mudou a história e a minha história.

  • Referências:

 

  • http://pt.wikipedia.org/wiki/Soul
  • Acessado em 21/10/2013 às 21h12min.
  • http://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_dos_direitos_civis
  • Acessado em 23/10/2013 às 20h21min.
  • http://pt.wikipedia.org/wiki/Segrega%C3%A7%C3%A3o_racial
  • Acessado em 23/10/2013 às 20h32min.
  • http://pt.wikipedia.org/wiki/Leis_de_Jim_Crow
  • Acessado em 23/10/2013 às 20h35min.
  • http://pt.wikipedia.org/wiki/Leis_anti-miscigena%C3%A7%C3%A3o
  • Acessado em 23/10/2013 às 20h40min.
  • http://www.jblog.com.br/hojenahistoria.php?itemid=12005
  • Acessado em 23/10/2013 às 20h50min.
  • http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=776
  • Acessado em 23/10/2013 às 20h55min.
  • http://educacao.uol.com.br/biografias/martin-luther-king.jhtm
  • Acessado em 23/10/2013 às 21h12min.
  • http://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/2013-08-28/saiba-os-principais-fatos-na-luta-pelos-direitos-civis-nos-eua.html
  • Acessado em 24/10/2013 às 20h46min.

 

  • http://pt.wikipedia.org/wiki/Marcha_sobre_Washington
  • Acessado em 24/10/2013 às 21h00min.
  • http://iipdigital.usembassy.gov/st/portuguese/texttrans/2013/06/20130626277689.html
  • Acessado em 24/10/2013 às 21h05min.

 



[1] Soul (em inglês: alma) é um gênero musical dos Estados Unidos que nasceu do rhythm and blues e do gospel durante o final da década de 1950 e início da década de 1960 entre os negros. Durante a mesma época, o termo soul já era usado nos Estados Unidos como um adjetivo usado em referência ao afro-americano, como em "soul food" ("comida de alma").Esse uso apareceu justamente numa época de vários movimentos de liberalismo social, tanto com a revolução dos jovens com o uso das drogas, como os movimentos anti-guerra e anti-racial. Por consequência, a "música soul" nada mais era que uma referência à música dos negros, independente de gênero.

Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Soul

Acessado em 21/10/2013 às 21h12min.

[2] As leis de Jim Crow foram leis estaduais e locais decretadas nos estados sulistas e limítrofes nos Estados Unidos, em vigor entre 1876 e 1965, e que afetaram afro-americanos, asiáticos e outros grupos. A "época de Jim Crow" ou a "era de Jim Crow" se refere ao tempo em que esta prática ocorria. As leis mais importantes exigiam que as escolas públicas e a maioria dos locais públicos (incluindo trens e ônibus) tivessem instalações separadas para brancos e negros. Estas Leis de Jim Crow eram distintas dos Black Codes (1800-1866), que restringiam as liberdades e direitos civis dos afro-americanos. A segregação escolar patrocinada pelo estado foi declarada inconstitucional pela Suprema Corte em 1954 no caso Brown v. Board of Education. Todas as outras leis de Jim Crow foram revogadas pelo Civil Rights Act de 1964.

Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Leis_de_Jim_Crow

Acessado em 23/10/2013 às 20h32min.

 

[3] Leis anti-miscigenação, também conhecidas como leis da miscigenação, foram leis que proibiam casamentos inter-raciais e por vezes sexo inter-racial entre brancos e membros de outras raças. Nos Estados Unidos, casamento, coabitação e sexo inter-raciais foram denominados como miscigenação a partir de 1863.

Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Leis_anti-miscigena%C3%A7%C3%A3o

Acessado em 23/10/2013 às 20h35min.

[4] Rosa Parks, a costureira negra que, em 1955, se recusou a obedecer à lei de apartheid racial no Alabama, marcando o início da luta pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos, morreu aos 92 anos. O advogado de Rosa afirmou que ela morreu dormindo em sua casa, na cidade de Detroit, estado do Michigan.

Rosa se recusou a ceder seu banco em um ônibus a um homem branco, o que levou a um boicote em massa dos negros ao transporte público do estado. O protesto levou ao fim da segregação nos transportes públicos e culminou em 1964, com a Lei dos Direitos Civis, que transformou a segregação racial em um ato fora da lei nos Estados Unidos.

Disponível em http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=776

Acessado em 23/10/2013 às 20h55min.

[5] Martin Luther King Jr. era filho e neto de pastores protestantes batistas. Fez seus primeiros estudos em escolas públicas segregadas e graduou-se no prestigioso Morehouse College, em 1948.

Formou-se em teologia pelo Seminário Teológico Crozer e, em 1955, concluiu o doutorado em filosofia pela Universidade de Boston. Lá conheceu sua futura esposa, Coretta Scott, com quem teve quatro filhos.

Em 1954 Martin Luther King iniciou suas atividades como pastor em Montgomery, capital do estado do Alabama.

Em 1957 tornou-se presidente da Conferência da Liderança Cristã do Sul, intensificando sua atuação como defensor dos direitos civis por vias pacíficas, tendo como referência o líder indiano Mahatma Gandhi.

Em 1959, King voltou para Atlanta para se tornar vice-pastor na igreja de seu pai. Nos anos seguintes participou de inúmeros protestos, marchas e passeatas, sempre lutando pelas liberdades civis dos negros.

Os eventos mais importantes aconteceram nas cidades de Birmingham, no Alabama, St. Augustine, na Flórida, e Selma, também no Alabama. Luther King foi preso e torturado diversas vezes, e sua casa chegou a ser atacada por bombas.

Em 1964, Martin Luther King recebeu o Prêmio Nobel da Paz. No início de 1967, King uniu-se aos movimentos contra a Guerra do Vietnã. Em abril de 1968, foi assassinado a tiros por um opositor, num hotel na cidade de Memphis, onde estava em apoio a uma greve de coletores de lixo.

Disponível em http://educacao.uol.com.br/biografias/martin-luther-king.jhtm

Acessado em 23/10/2013 às 21h12min.