AS NORMAS COLETIVAS E A FLEXIBILIZAÇÃO DOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS DO TRABALHADOR1

 

Amanda Ferreira Marques e Erica Alencar dos Santos 2

Ana Carolina Cardoso 3

 

 

Sumário: 1. Introdução. 2. Flexibilização nas relações de trabalho. 2.1. Hipóteses em que a lei autoriza a flexibilização dos direitos trabalhistas. 3. As normas coletivas e a flexibilização dos direitos constitucionais do trabalhador. 4. Conclusão.

RESUMO

 

O presente artigo versará sobre as normas coletivas e a flexibilização dos direitos constitucionais do trabalhador. No fluir do século XX, marcados por significativas modificações que oscilam desde dominações de uma nação por outra, por avanços em tecnologias, migrações de recursos, de altos investimentos econômicos e mão de obra especializada até mudanças nas condições de trabalho. Durante anos a fio embates travados têm ocorrido no que tange as relações de trabalho. E diante desse contexto, a natureza jurídica de ordem pública das normas de Direito do Trabalho tem sido flexibilizada pelo Poder Público. E neste particular, será apresentado uma breve explanação de alguns entendimentos de autores consagrados a respeito da temática de flexibilização nas relações de trabalho, conceitos dados ao neologismo “flexisegurança” e suas nuances trabalhistas atinentes ao posicionamento majoritário em voga. Serão abordadas ainda as hipóteses em que a lei autoriza a flexibilização dos direitos trabalhistas, seja por meio de convenções coletivas ou acordos coletivos de trabalho.Por fim, estudou-se a aplicação dasnormas coletivas e a mitigação dos direitos constitucionais do trabalhador.

Palavras-chave: As normas coletivas. Flexibilização. Relações de trabalho. Direitos constitucionais do trabalhador.

 

1 INTRODUÇÃO

 

Ao adentrarmos no estudo das revoluções industriais em meados do século XIX e revoluções tecnológicas ocorridas no século XX, nos deparamos posteriormente com a crise econômica refletida nos mercados cativos dos países menos desenvolvidos, dentro de sistemas industriais cada vez mais complexos sob a imperatividade das tecnologias mais sofisticadas. E com isso geram competitividade, desestabilização dos antigos equilíbrios econômicos, necessidade de diminuição de custos com mão de obra, desemprego, e assim acarretando reexame dos princípios protetivos ao trabalhador, análise mais apurada da legislação trabalhista, diminuição de benefícios aos trabalhadores, como também adoção de novas regras de contratação.

Prevalecia a lei de mercado, em que o empregador ditava as regras, sem que houvesse intervenção estatal, seria uma liberdade contratual. O contrato de trabalho, também recebe influencia da revolução tecnológica, considerado um instrumento jurídico técnico de realização das relações de trabalho, que se viabiliza um acordo de vontades, entre empregador e empregado, que norteia a relação de emprego válida e existente.

A evolução tecnológica deu ensejo ainda a uma maior fiscalização do trabalho, que significou uma invasão na privacidade do trabalhador. Novas profissões foi motivo de regulamentação especial, como a Lei de nº 12.009/09, que trata da contratação de moto entregadores ou moto taxistas, e ainda novas profissões como, os trabalhadores à distancia tele trabalhadores, os digitadores e de tele atendentes.

Durante o estudo do Direito do Trabalho ressalta-se a influencia do positivismo sobre o direito brasileiro, em que se consideravam jurídicas apenas as regras de produção estatal, e que depois se valorizou as normas emanadas da autonomia coletiva privada dos sindicatos ou grupos organizados.

A relevância desta pesquisa gira em torno do excesso de normas trabalhistas no Brasil que obstaculiza contra a livre negociação entre empregadores e empregados, e que esta, levaria a solução de muitos problemas econômicos enfrentados nas relações de trabalho. E assim dar-se-á a gênese da flexibilização, como um processo de maleabilidade à rígida legislação trabalhista e como possibilidade de intervir para solver os problemas enfrentados pela crise econômica.

A temática da flexibilização nas relações de trabalho, nos remete ao neologismo “flexisegurança”, que indica a combinação de flexibilidade e segurança, da visão econômica e social do empregador e do empregado. Que é traduzido na autorização para empregar medidas especiais em casos diversos. Advindas às alterações econômicas oriundas das crises, que incide exponencialmente nas relações de trabalho, a flexibilização dos direitos trabalhistas surge como normas jurídicas.

Ressalte-se que o presente trabalho optou pela técnica de pesquisa bibliográfica, através da leitura de artigos científicos, livros e jurisprudência sobre o tema. Far-se-á uso do método de abordagem dedutivo, partindo de premissas gerais para o particular. Quanto ao método de procedimento, será o observacional, partindo da análise dos conceitos e institutos a serem abordados a fim de apontar suas particularidades.

2 FLEXIBILIZAÇÃO NAS RELAÇÕES DE TRABALHO

O conceito de flexibilidade aqui deve ser entendido e traduzido em medidas que refletem sobre as normas das relações de trabalho, trata-se de flexibilização dirigida para direcionar um contexto de mudanças da legislação trabalhista, enraizado especialmente na discricionariedade dos trabalhadores e empregadores, sob a aplicação dos dispositivos legais. Autorizando uma mitigação de significado nos conteúdos das normas, e assim diminuindo a sua qualidade de proteção da classe de trabalhadores.

Em alusão a flexibilidade, especificamente na visão de ArionRomita (2008), diz respeito às formas de contratação, à estipulação dos salários, à negociação coletiva, à jornada de trabalho e, sobretudo acerca do regime de dispensa (ROMITA, 2008, p.25), sempre com o fomento na ampliação da produtividade das empresas, e que segundo o autor o escalonamento da produtividade pode se dar de duas formas; direto, quando este resultar de produção adicional por empregado, e indireto, quando derivar de maior flexibilidade no trabalho.

A Flexigurança é um neologismo que exprime a estratégia de combinar flexibilidade e segurança, da ótica econômica e social do empregador e do empregado. Trata-se de uma nova forma de equilibrar a flexibilidade e a segurança no mercado de trabalho, em que se baseia na observância da globalização e do progresso tecnológico, que ocasionam uma rápida evolução da necessidade de flexibilização dos trabalhadores e das empresas. E assim desenvolve-se a aplicação da “flexibilização autônoma”, que é autorizada através de instrumentos coletivos particulares, tais quais as convenções coletivas e acordos coletivos. E a “flexibilização heterônoma”, esta autorizada por leis, decretos ou resoluções, com imposição unilateral do Estado, podendo inclusive permitir a substituição de normas ou a sua derrogação, mesmo que unilateralmente pelo empregador (CASSAR, Vólia Bomfim, 2010, p.54).

E, portanto neste sentido vem ocorrendo à criação de exceções às normas (regras) gerais, flexibilizando direitos trabalhistas e permitindo a redução de vantagens por meio de normas coletivas, e o Brasil tem-se como prática a adoção desses dois modelos supracitados.

É oportuno ressaltar que a falta ou a desregulamentação do direito do trabalho não se confunde com a flexibilização das regras trabalhistas, contudo discutem-se alguns autores afirmando não haver tal distinção. A rigor, refere-se a nomenclaturas distintas, no alcance de um mesmo resultado prático, qual seja, a mínima intervenção do Estado nas relações trabalhistas.

É imprescindível citar que a “flexibilização heterônoma” estar autorizada por leis, decretos ou resoluções, com imposição unilateral do Estado, relaciona-se com as mudanças realizadas pelo Estado, comumente chamada de desregulamentação normativa.

No entendimento de Vólia Cassar (2010, p.51), a falta de regulamentação pressupõe a ausência do Estado-estado mínimo, revogação de direitos impostos pela lei, é sucumbir total proteção legislativa, “permitindo a livre manifestação de vontade”, ou seja, ceder espaço a autonomia privada para regular as relações de trabalho, seja ela de forma individual ou coletiva.

A expressão em comento, flexibilização, remonta que a diminuição de direitos trabalhistas deve ser utilizada com cautela, de forma que revele juízo claro e seguro, e partindo do pressuposto que em alguns casos, será colocada em prática, apenas para manutenção da saúde da empresa ou da sociedade empresária, resguardando sempre a os direitos absolutos, tais quais: os direitos fundamentais do trabalho e o direito à dignidade humana.

Ademais, é imperioso ressaltar que atualmente, a flexibilização é utilizada pelas empresas como meio de aumento de lucro e diminuição dos direitos dos trabalhadores, não existindo a preocupação de delimitar as hipóteses de flexibilização àqueles efetivamente previstas na Constituição Federal, ou apenas em casos de comprovada dificuldade econômica da empresa ou sociedade empresária (CASSAR, Vólia Bomfim. 2010, p.41).

A flexibilização antever a intervenção estatal, gradualmente intensa, vislumbrando a proteção dos direitos do trabalhador, ainda que, apenas para garantia de direitos básicos (CASSAR, Vólia Bomfim. 2010, p.52), este que é um núcleo de regras (normas) de ordem pública que deve permanecer inatingível, pois não havendo estas, não se poderá conceber a dignidade do trabalhador , que é indispensável para “manutenção do Estado Social”.

Ademais, e nesse mesmo sentido Mauricio Delgado (2002) denomina o núcleo básico de “patamar mínimo civilizatório”. E ao dividir os direitos trabalhistas, em direitos de indisponibilidade absoluta e direitos de indisponibilidade (ou disponibilidade) relativa, tenta restringir a flexibilização ampla. Para o autor, apenas os direitos de “disponibilidade relativa” poderiam ser flexibilizados, em contrapartida os direitos de indisponibilidade absoluta não, pois congregam a um “patamar mínimo civilizatório” (DELGADO, 2002, p. 212).

2.1 HIPÓTESES EM QUE A LEI AUTORIZA A FLEXIBILIZAÇÃO DOS DIREITOS TRABALHISTAS

Em todos os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, o Poder Constituinte conferiu a possibilidade que fossem flexibilizados por simples acordo entre sindicatos, como demostrado no artigo 611, caput, da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas): “convenções coletivas de trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais do trabalho” ou entre sindicatos e empregadores, como no artigo 611, §1º, da CLT: “ é facultado aos sindicatos representativos de categorias profissionais celebrar acordos coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho”.

Por disposição constitucional registra-se no artigo 7º, que direitos trabalhistas podem sofrer mitigação por simples negociação coletiva, entre associações, em que é gênero, e do qual a associação profissional e o sindicato são espécies ou entre essas e empregadores.

Destaca-se ainda que o aproveitamento máximo do mesmo trabalhador para operar inúmeras tarefas, dar-se denominada pela flexibilização funcional, segundo o doutrinador Arnaldo Sussekind, é que neste sentido é descrito no artigo 57, da Lei de nº 8.630/93: “no prazo de cinco anos contados a partir da publicação desta lei, a prestação de serviços por trabalhadores portuários deve buscar, progressivamente, a multifuncionalidade do trabalho, visando adequá-lo aos modernos processos de manipulação de cargas e aumentar a sua produtividade” (SUSSEKIND, Arnaldo. 1999, p.49).

É sabido que existe farta jurisprudência mitigando o arcabouço de proteção do trabalhador, e nesse sentindo, no que tange a flexibilização dos direitos trabalhistas, há jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), de cunho de flexibilização de qualquer direito. Existindo argumentos no sentindo de que se há autorização da Constituição para redução de maior de todos os direitos - o salário, mediante acordo coletivo ou convenção, poder-se-á concluir que o “menos” é permitido também. Essa tendência foi comprovada pela Súmula nº 364, II (TST), que ficou nítida, a autorização da prevalência da norma coletiva sobre a lei, para autorizar a redução neste caso, de percentual do adicional de periculosidade.  Haja vista que esse ato implica na violação às regras de medicina e segurança do trabalho, direito este também garantido na Constituição.

Vê-se ainda enfatizar que o artigo 58-A, § 2º, da CLT, que trata sobre contrato por tempo parcial, autoriza a redução dos salários em mais de cinquenta por cento, desde que exista a correspondente redução da jornada de trabalho, autorização normativa e individual do empregado. A saber: “considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a vinte e cinco horas semanais”, § 2º: “para os atuais empregados, a adoção do regime de tempo parcial será feita mediante opção manifestada perante a empresa, na forma prevista em instrumento decorrente de negociação coletiva”.

E ademais, é oportuno citar que a Lei de nº 11.101/05 (Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência), em seu artigo 50, inciso VIII, também admite a redução salarial, compensação de horários e redução de jornada, todos também mediante acordo ou convenção coletiva, a saber: “constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros”, inciso VIII: “redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva”.

Em face a esse raciocínio tudo que não seja o próprio salário base do trabalhador, será “menos”, e que, portanto o direito pode ser suprimido, flexibilizado, mesmo que seja apenas para aumentar a lucratividade da empresa ou do empresário (CASSAR, 2010, p.49). Em sentido contrário, sobrepondo a natureza protetiva da norma trabalhista a qualquer interesse de ordem econômica-empresarial, aduz Alice Monteiro de Barros (2006, p. 82), que:

A gênese do Direito do Trabalho, por várias razões e principalmente pelo seu conteúdo normativo, possui, sem dúvida, um sentido político-econômico refletido de forma clara não só nas leis que dispõe sobre matéria salarial, mas também naquelas disciplinadoras das licenças, dos descansos e das férias, além de outras, pois nesses períodos, a empresa necessitará de mais empregados para manter os níveis de produção. Lembre-se, entretanto, que, não obstante essa vinculação estreita com a economia, o Direito do Trabalho é motivado, essencialmente, por objetivos de ordem político-social, que visam a corrigir as diferenças, elevando o nível social da classe trabalhadora, como imposição da solidariedade, que nos torna responsáveis pela carência dos demais (BARROS, 2006, p. 82).

3. AS NORMAS COLETIVAS E A FLEXIBILIZAÇÃO DOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS DO TRABALHADOR

 

A denominada “flexibilização autônoma”, que é autorizada através de instrumentos coletivos particulares, tais quais as convenções coletivas e acordos coletivos, indica, portanto, o Estado cedendo aos particulares à possibilidade de negociação acerca de determinadas condições e relações de trabalho. Ver-se assim, encarada com raciocínio civilista de pactuação, fundamentada na autonomia da vontade dos particulares. E assim o Poder Público transferindo aos atores da relação jurídica trabalhista, a capacidade de estipularem normas-regras atinentes ao exercício da atividade do empregado.

No artigo 7º já supracitado da Constituição Federal, identificamos os incisos VI, XIII e XIV: “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva”, em que estes deixam claro que é possível estabelecer regras voltadas ao quantum salarial, assim como referente à jornada dos trabalhadores, sendo viabilizado através de convenção ou acordo coletivo de trabalho.

É sabido que é possível a flexibilização para manutenção da saúde da pessoa jurídica, em que ocorre a redução ou supressão de vantagens, benefícios, com a finalidade de transpor a crise econômica enfrentada pelas empresas, e que assim, porém a extremada medida só deve ser autorizada por meio de norma coletiva (CASSAR, Volia Bomfim. 2010, p. 43).

Neste sentido a corroborar, o artigo 503 da CLT, autorizou a redução dos salários em hipótese de força maior e se prejuízos especificamente comprovados, em vinte e cinco por cento. Contudo, o artigo 2º da Lei de nº 4.923/65 (que institui o cadastro permanente das admissões e dispensas de empregados, estabelece medidas contra o desemprego e de assistência aos desempregados, e dá outras providências), autorizou a redução do salário também em vinte e cinco por cento, por três meses e prorrogáveis por mais três, na condição de ser reduzida proporcionalmente a jornada, em hipóteses de comprovada dificuldade econômica.

Em contrapartida tais regras não foram recebidas pela Constituição Federal, pois se conclui que contrariam a parte final do inciso VI do artigo 7º da mesma, em que refere à exigência por meio de norma coletiva para se autorizar a redução salarial. E percebe-se também que o principio constitucional da função social da empresa sendo infringido, em que a redução proposta de vinte e cinco por cento, é pequena e muitas vezes não salva a economia periclitante da empresa.

Encontra-se ainda outros preceitos constitucionais, também analisados no artigo 7º, da Carta Magna que flexibilizam as regras do Direito do Trabalho, todavia em outros moldes, isso ocorre por que denunciam direitos que assiste aos trabalhadores, submetendo-os a regulamentação posterior por ato do legislador infraconstitucional. A saber: “art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; X - proteção do salário na forma da lei [...]; XI - participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei; XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei; XIX - licença-paternidade, nos termos fixados em lei; XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei; XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei”.

É importante ressaltar que se nos incisos VI, XIII e XIV, do referido artigo 7°, da Carta Magna se encontram dispositivos que autorizam que algumas condições de trabalho sejam estipuladas por simples negociação coletiva; agora, com os incisos I, X, XI, XII, XIX, XXIII e XXVII, do mesmo artigo constitucional, se autoriza que o legislador infraconstitucional possa disciplinar sobre as condições de trabalho no que tange à proteção da relação trabalhista, ao salário, à participação nos lucros e gestão da empresa, ao salário-família, à licença-paternidade, aos adicionais de penosidade, insalubridade e periculosidade, bem como, sobre a proteção em face de automação.

Portanto, é contrário ao padrão de proteção do trabalhador, fundamentada em preceitos de ordem pública, de caráter imperativo, que designa ordem que deveria ser cumprida. O instrumento utilizado é um processo legislativo menos formal do que aquele para alteração do texto constitucional permitiu-se a possibilidade de regulamentação da matéria, sem estabelecer requisitos bem criteriosos e definidos de atuação de direitos mínimos.

Nesse contexto enfim, seja a partir da adoção de simples negociações coletivas que subvertam o padrão protetivo dos direitos constitucionais do trabalhor, ou de disposições infraconstitucionais normativas que autorizem a flexibilização da legislação trabalhista, conclui-se, assim atualmente, um enredo e histórico de discussões entorno de melhores condições de vida dos trabalhadores, gradativamente, sucumbindo à idéia de adequação do Direito do Trabalho às exigências sociais, e que ordenamentos positivados vêm diminuindo o alcance protetivo dos preceitos trabalhistas, mitigando a força cogente dos princípios justrabalhistas.

 

4 CONCLUSÃO

 

Viu-se, inicialmente, no estudo do conceito de flexibilidade, que este deve ser traduzido em medidas que reflitam sobre as normas das relações de trabalho, para fins de flexibilização capaz de direcionar um contexto de mudanças na legislação trabalhista, a qual encontra-se enraizada na discricionariedade dos trabalhadores e empregadores face a aplicação dos dispositivos legais, autorizando-se mitigar o sentido do conteúdo das normas e diminuir a qualidade da proteção da classe de trabalhadores.

Flexigurança, por sua vez, é um neologismo que exprime a estratégia de combinar flexibilidade e segurança, da ótica econômica e social do empregador e do empregado. Verificou-se que se trata de uma nova forma de equilibrar a flexibilidade e a segurança no mercado de trabalho, baseada na observância da globalização e do progresso tecnológico, que ocasionam uma rápida evolução da necessidade de flexibilização dos trabalhadores e das empresas. Em vista disto, desenvolveu-se a aplicação da “flexibilização autônoma” e da “flexibilização heterônoma”, devidamente autorizadas por lei. Para além da falta ou a desregulamentação do direito do trabalho, viu-se que não se pode confundir com a flexibilização das regras trabalhistas, ocorrendo apenas o fato de que alguns autores afirmam não haver tal distinção.

Aferiu-se que em todos os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais confere-se a posibilidade de flexibilização, por acordo entre sindicatos, conforme disposto no artigo 611, caput, da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). Observou-se, ainda, conforme disposição constitucional (artigo 7º, CF), os direitos trabalhistas podem sofrer mitigação mediante negociação coletiva entre associações. Dentre os tipos de flexibilização, destacou-se a flexibilização funcional, a qual consiste em aproveitar o máximo de um único trabalhador em tarefas diversas, conforme exemplo contido na Lei nº 8.630/93, em seu artigo 57.

No bojo da Flexisegurança é possível verificar jurisprudência que já mitiga o arcabouço da proteção do trabalhador, em especial no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e, tendo em vista que existem argumentos voltados à autorização constitucional para redução salarial, perante acordo coletivo ou convenção, conclui-se pela autorização da flexibilização de previsões além do salário. O que se pretende, na verdade, seja a partir da adoção de simples negociações coletivas que subvertam o padrão protetivo dos direitos constitucionais do trabalhor, ou de disposições infraconstitucionais normativas que se autorize a flexibilização da legislação trabalhista, mitigando a força cogente dos princípios justrabalhistas.

REFERÊNCIAS

 

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