A possível aplicação da Lei nº 11.232/05 à execução de alimentos ¹.

 

Ana Beatriz Araújo Portela e Maura Jorge Bordalo²

Christian Barros Pinto³

 

 

Sumário: Introdução; 1 Noções gerais acerca da Execução de Alimentos; 2 As alterações advindas com a Lei nº 11.232/05; 3A aplicação da Lei nº 11.232/05 à execução de alimentos; Considerações Finais; Referências

 

 

 

RESUMO:

 

Será abordado neste trabalho a execução alimentar nos termos dos arts. 732 e 733, de modo a explicar os meios executivos que dão azo a satisfação do crédito. Além disso, será levantada as modificações que a lei 11.232/05 trouxe a execução por quantia certa de título judicial, haja vista que tornou sincrético o processo, e instaurou o cumprimento de sentença. E por fim, as discussões causadas devido à omissão do legislador quanto aplicação dessa lei na execução alimentar, a qual é uma espécie de execução por quantia certa.

 

PALAVRA CHAVE: EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. LEI Nº 11.232/2005; OMISSÃO LEGISLATIVA; DIVERGÊNCIAS DOUTRINÁRIAS

 

INTRODUÇÃO

 

O estudo visa abordar a reforma do Legislador com a Lei n. 11.232/05 no que tange o procedimento de execução que modificou diversos artigos no CPC, mas que não altera expressamente à execução da prestação de alimentos. A supracitada Lei fez uma série de alterações no cumprimento de sentença por quantia certa, de forma a unificar o processo cognitivo e o executivo, instituindo o chamado processo sincrético. A partir disso, partiremos o estudo acerca da sua aplicabilidade à execução de alimentos, haja vista que, como já mencionado, a lei não alterou o Título II, Capítulo V, CPC, o qual trata da execução alimentar, mas como os alimentos, em regra, são fixados em dinheiro, torna-se imprescindível analisar as consequências que a Lei 2323/2005 acarretou em sede de execução de alimentos.

Destarte, o silêncio da lei ensejou longos debates doutrinários acerca da possibilidade da execução alimentar reger-se pela lei, pois atenderia melhor o princípio da razoabilidade do processo, além de mais célere, seria ainda menos dispendioso, retirando obstáculo ao acesso à Justiça. Contudo, este não é um posicionamento pacífico, porquanto, o Ordenamento Jurídico não admite revogação tácita, e a lei nº 11.232/05 não fizera nenhuma referencia à execução de alimentos, outra corrente doutrinária defende que esta execução se guiará pelo CPC.

O paper trabalhará com essas correntes doutrinarias antagônica, na qual parte defende que é possível a aplicação do processo autônomo na ação de alimentos, enquanto do outro lado, diz-se desnecessário a interposição do novo processo de execução. Considerando que prestação alimentar tem caráter de urgência, sendo questão de sobrevivência do alimentando, verifica-se a necessidade de manejar o presente trabalho, a fim de analisar a possível aplicação das inovações relativas ao cumprimento de sentença implementada pela mencionada Lei, mediante a omissão do legislador se tratando de débito alimentar.

 

1 NOÇÕES GERAIS ACERCA DA EXECUÇÃO DE ALIMENTOS

Marcelo Abelha Rodrigues (2009, p. 431) entende que “a execução da prestação alimentícia nada mais é do que uma execução para pagamento de quantia (execução por expropriação, só que com regras especiais em relação ao modelo comum previsto no CPC)”. Essas regras específicas estão na Carta Magna (art. 5º, XVII, nos arts. 732 e segs. do CPC e ainda na Lei nº 5478/1968).

A explicação da necessidade de um rito especial é trazida por Cassio Scarpinella Bueno (2008), ele considera que os alimentos devem ser entendidos como os valores devidos a subsistência e necessidades básicas de alguém que não tem condições, por si próprio, de garanti-las (arts. 1694, §1º, e 1695 do CC). O caput do art. 1694 do Código Civil inclui na obrigação alimentar o que for necessário para “viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive atender as necessidades escolares”.

Os art. 732 e seguintes prevêem várias técnicas de sub-rogação, dependendo do caso concreto, que pode ser, por exemplo, desconto em folha de pagamento. Se este não for possível, torna-se mais difícil a obtenção dos alimentos, e seguirá o Capítulo IV, Titulo II do Livro II. Essas técnicas variam sua incidência de acordo com a situação jurídica material apresentada. Podem ser adotadas “técnica de coerção pela multa processual a ser aplicada pela unidade de tempo, técnicas sub-rogatórias de desconto de folha de pagamento, adjudicação de bem penhorado, usufruto de imóvel ou bem móvel, alienação por iniciativa particular ou em hasta publica”. (RODRIGUES, 2009, p. 434)

Analisando o art. 732 “a execução de sentença, que condena ao pagamento de prestação alimentícia, far-se-á conforme o disposto no Capítulo IV deste Título” pode-se pensar na impossibilidade da execução alimentícia fundada em titulo extrajudicial. Entretanto Marcelo Abelha Rodrigues (2009, p. 432) diz que “nada impede que por escritura pública as partes convencionem o pagamento de alimentos, tendo-se ai um titulo executivo extrajudicial, nos moldes do art. 585, II d CPC”.

Em primeiro lugar, cumpre mencionar os meios executivos que satisfazem a execução alimentar, quais sejam: desconto em folha, expropriação e coerção indireta. Conforme apresenta Didier Jr. (2013), o primeiro meio executivo a ser tentado é o desconto em folha, devido ao alto índice de eficiência dessa medida, de forma que não sendo possível, é válido que haja a indisponibilidade a ser transformado em pagamento de outras fontes de renda do devedor. Se não houver, a execução deverá prosseguir com a expropriação de bens no limite do débito. Restando infrutífera esta última também, determinar-se-á a prisão civil.

Esta ordem de preferência é estabelecida pela lei nº 5.478/1968 com o intuito de evitar o abuso das medidas executórias, mas não sendo possível o desconto em folha ou expropriação de outras fontes de renda, o credor pode optar pela expropriação de bens ou prisão civil, já que não são técnicas compulsórias, percebe-se assim, que tal ordem de preferência não comporta uma rigidez absoluta.

Admitida exceção de alimentos fundadas em titulo judicial e extrajudicial, como foi visto, analisar-se-á os procedimentos e técnicas utilizados. Em relação ao título executivo judicial, é importante verificar o aspecto temporal do débito, pois não sendo recente, presume-se que não há urgência e isso pode influenciar no procedimento a ser adotado (RODRIGUES, 2009).

Não há razão para afastar do regime de execução de alimentos aqueles previstos em contrato, acerto ou negócio jurídico. Nesse caso, os alimentos decorrem, ordinariamente, de acerto prévio, autocomposição das partes (documentada em instrumento de transação), o que legitima sua efetivação com o uso de todos os meios previstos em lei. Na pior das hipóteses, ainda que se vislumbrasse a necessidade de confirmação judicial da existência do crédito, os processualistas seriam obrigados a admitir o uso de coerção pessoal após a sentença negativa de embargos, que ratificasse a prestação alimentar. (DIDIER JR. 2013. p. 722).

 

O STJ fixou na Súmula 309 que “o débito alimentar que autoriza a prisão do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores à citação e as que se vencerem no curso do processo”. Assim, caso o débito alimentar seja referente às três parcelas anteriores citação, o exequente deverá seguir as regras comuns da execução por quantia certa contra devedor solvente prevista no art. 475-J e segs. Já as prestações que vencerem no curso da execução ou as três últimas antecedentes a intimação do executado (art. 475-J, §1º), permite ao credor escolher o procedimento executivo que vai ser adotado sobre essas parcelas, entre as regras do art. 475- J ou pelo procedimento que admite a prisão civil do executado.

Sobre isso, Marcelo Abelha Rodrigues (2009, p. 437) assegura que “não poderá haver cumulação de procedimentos e nem pedido alternativo do exequente em relação ao procedimento escolhido. Devendo demonstrar a sua opção no requerimento inicial da execução”.

No que tange a “execução liminar ou tutela antecipada em ação em que esteja reconhecido o vinculo material que justifique o pagamento da prestação alimentícia, a execução é das parcelas que se seguem e não das atrasadas”. (RODRIGUES, 2009, p. 437). Desse modo, a regra que se segue é a expedição de mandando de pagamento da quantia, com técnica de coerção associado à multa e/ou prisão civil, referido nos termos do art. 273 §3º combinado com o art. 733 do CPC.

Do outro lado, tem-se o titulo executivo extrajudicial que se inicia por meio de petição inicial, dando início a um processo autônomo, conforme os arts. 646 e segs. do CPC, no qual o exequente poderá valer-se das técnicas sub-rogatórias e da técnica de desconto em folha, todavia a utilização do procedimento que enseja a pena coercitiva de prisão civil, não se tem admitido, pois sua previsão é restrita aos casos de execução de sentença ou decisão que fixa alimentos, segundo art. 733. (RODRIGUES, 2009).

Visto isso, cabe discorrer sobre a prisão civil, disposto nos parágrafos do art. 733, que determina antes da prisão que na execução de sentença ou de decisão, que fixa os alimentos provisionais, o juiz mandará citar o devedor para, em 3 (três) dias, efetuar o pagamento, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo”.

Scarpinella (2008) afirma que o art. 733, caput, deve prevalecer sobre o art. 475-J e o art. 652, determinando para que o executado pague o valor que se reputa devido a titulo de alimentos seja acompanhada da cominação de prisão. Passado esses três dias sem pagamento ou sem justificativa ou prova de tal tem inicio aos atos de penhora, avaliação e alienação do patrimônio do executado para que possa satisfazer o credito alimentício. A efetiva prisão não afeta a existência do débito alimentar e sua exigibilidade imediata.

Sobre a defesa do executado trata-se no paragrafo único do art. 732 que “recaindo a penhora em dinheiro, o oferecimento de embargos não obsta a que o exequente levante mensalmente a importância da prestação”.

A respeito da aplicação do efeito suspensivo nos embargos, Cassio Scarpinella Bueno (2008) diz que se e o executado comprovar o preenchimento das exigências do parágrafo 1º do art. 739, os embargos podem ser recebidos com efeito suspensivos, e consequentemente ser sustado o levantamento de dinheiro. É imperioso ressaltar que a oposição de embargos não tem efeito suspensivo quanto à execução definitiva, pois tal efeito só será concedido em casos excepcionais, uma vez que se trata do direito à vida.

O paragrafo único do art. 732 não pode ser interpreta isoladamente, sem levar em consideração o atual sistema processual civil. Sua regra é clara e sobrevive, mas isto não significa dizer que não se pode dar efeito suspensivo aos embargos, quando presentes os pressuposto exigidos pela lei e, com isto, determinar-se a prática da suspensão dos atos executivos, quaisquer que sejam eles. A crítica sobre isso é a necessidade da prestação de alimentos. (BUENO, 2008, p. 378)

Depois dessas breves linhas sobre como ocorria (ou ocorre) a execução alimentar, cabe, ainda, antes de nos adentrarmos ao mérito do estudo, entender a lei 11.232/2005 que altera a execução por quantia certa, para só então discutir a possibilidade de aplicação desta a execução retro estudada e como a afetaria.

2 AS ALTERAÇÕES ADVINDAS COM A LEI Nº 11.232/05

A priori, faz-se interessante ao estudo, destacar que antes da referida lei já havia discussões doutrinárias se o processo cognitivo e o processo de execução eram independentes ou não. Demonstram Richard Pae Kim e Amanda Goveia Ezequiel (2012) que, enquanto para parte da doutrina, representada por Cândido Rangel Dinamarco, o processo executivo era diferente do processo de conhecimento, e autônomo, mesmo que necessitasse deste para a deflagração daquele, como nos casos de execução fundada em titulo judicial; Para a outra parte, encabeçada por Humberto Theodoro Júnior, defendia que não havia tal dualidade, pois não seria congruente exigir do credor de passar por dois processos para alcançar uma única pretensão.

O Código de Processo Civil Brasileiro passou por várias reformas legislativas, como é sabido, e dentre as mudanças realizadas veio a Lei n° 11.232/2005, que alterou a sistemática da execução de sentença de obrigação de pagar quantia. Essa lei é considerada como um marco, pois instaura o sincretismo entre o processo de conhecimento e o de execução no mesmo processo. Com essa reforma o legislador cessou a controvérsia mencionada sobre a dependência de um processo ao outro, e previu a garantia de maior celeridade e efetividade nas prestações jurisdicional.

De acordo com Maria Berenice Dias e Roberta Vieira Larratéa (2008) “a Lei 11.232/2005 transformou a antiga execução dos títulos executivos judiciais em um incidente processual, com o nome de cumprimento da sentença”. Essa reforma veio com intuito de dar mais celeridade à atividade jurisdicional.

A Lei 11.232/05 trata mais do que novas formas do cumprimento de sentença, muda o próprio contexto da atividade jurisdicional para tornar concretas todas às garantias constitucionais do devido processo e eficiência processual (art. 5°, inciso LXXVIII da CF /88).

Como bem salientado pelo processualista Christian Barros Pintos (20-?), toda mudança legislativa passa por uma fase de adaptação, que é sempre recheada de questões. Assim, cabe-nos discorrer de forma breve e geral sobre as principais mudanças advindas da Lei nº. 11.232/2005, das quais já existem inúmeras produções acadêmicas e doutrinárias.

Nota-se que após a vigência da Lei nº 11.232/05 não há necessidade de instauração de uma nova relação processual executiva. O credor só precisa peticionar nos autos do processo de conhecimento para que haja o cumprimento da sentença condenatória por quantia certa. Ou seja, mesmo que não exista mais a ação de execução, ainda é necessária a provocação da parte para que enseje à fase executiva do processo. (DIAS, 2007).

A respeito da citação do devedor, esta não ocorre, porque não se está em sede de nova demanda, basta o término do prazo que flui do trânsito em julgado da sentença que condena para que, automaticamente, se expeça o mandado de penhora e avaliação de bens.

Outra inovação é a da defesa do devedor, não é mais admitida à interposição de embargos à execução de títulos judiciais, exceto quando utilizados nas execuções contra a Fazenda Pública. Porém, há a possibilidade de impugnação por parte do devedor que deve ser apresentada nos próprios autos do processo de conhecimento. Essa nova figura é prevista no art. 475-L e deve ser oferecida no prazo de 15 (quinze) dias, contados da intimação da penhora, que versa sobre matérias específicas:

Dentro do contexto da reforma, a troca dos embargos pela impugnação na defesa do devedor teve como finalidade dar celeridade ao processo e reduzir a incidência de recursos meramente procrastinatórios, que em nada contribuíam ao processo se não somente em retardá-lo. (COSTA, 2007, p. 84)

 

Além deste artigo, é imperioso destacar o caput do art. 475-J que trouxe a multa no valor percentual de 10% que incidirá sobre a quantia certa ou já liquidada que fora o devedor condenado a pagar, e, além disso, cederá seu direito de nomear bens a penhora para o credor. O exequente requererá, instruído do demonstrativo do débito atualizado à data da propositura da ação (art. 614, II, CPC), ao juiz, a expedição do mandado penhora e avaliação.

A liquidação de sentença também foi alvo das transformações da lei em baila, pois passou a ser tratada no capitulo do livro de processo de conhecimento, e, ainda, como dissertam Graziela Santos da Cunha e Wanessa de Cássia Françolin (2006. p. 06) “a Lei permitiu que seja iniciada a liquidação ainda na pendência de recurso, hipótese em que se processará em autos apartados. Na verdade, com isso, foi instituída a "liquidação provisória”. Observam também que este recurso pendente deverá ser desprovido de efeito suspensivo.

É inegável que o processo tornou-se mais célere após a lei em epígrafe, mas assim como o rol exemplificativo de mudança que acabamos de levantar, a omissão quanto aos encargos de natureza alimentícia também gera muitas dúvidas. Haja vista que não houvera revogação expressa ou alteração do Capítulo V do Título do Livro II do Código de Processo Civil que trata da execução de prestação alimentícia, tampouco menção a execução alimentar nos novos dispositivos inseridos pela Lei. A respeito disso, o doutrinador Marcelo Abelha Rodrigues (2009, p. 433) assegura que “com o advento da Lei 11.232/2005, o legislador unificou a cognição e a execução em um mesmo processo, porém nada comentou sobre as regras especiais – técnicas executivas especiais – da execução por quantia da prestação de alimentícia”.

Esse silêncio deu início a estudos quanto à possibilidade de aplicação do cumprimento de sentença na execução alimentícia, e os estudos concatenados de vários doutrinadores serão trabalhados adiante.

3 A APLICAÇÃO DA LEI Nº 11.232/05 À EXECUÇÃO DE ALIMENTOS

 

Sobre aplicabilidade da Lei nº 11.232/05 no que tange a execução de alimentos, é possível notar que o legislador foi silente acerca desse tema, pois não houve nenhuma revogação expressa, nem alteração no Código de Processo Civil. Desse modo, parte da doutrina entende que a obrigação alimentar continua a submeter-se ao regime anterior, ou seja, o processo executivo continua sendo autônomo.

A corrente doutrinaria que defende a aplicabilidade da lei, sustenta que a simples omissão do legislador não significa sua intenção de excluir a aplicação para execução de alimentos. Defendem que foi um descuido do legislador, e que não há razões severas para tal exclusão. A execução de alimentos trata de matéria que é de grande importância e clama por urgência, celeridade e efetividade. Não utilizar-se do processo sincrético seria uma forma cruel e não aplicação da justiça

Assim os alimentos devem ser cobrados pelo modo mais célere que se encontra no sistema jurídico. A omissão do legislador é considerada como um mero “descuido” e não pode ser usada com a intenção de afastar o procedimento mais eficaz da obrigação alimentar, cujo bem tutelado é a vida (DIAS; LARRATEA, 2008).

Em outro artigo publicado, Maria Berenice Dias (2007, p. 07) reforça esse pensamento e afirma que “pela natureza da dívida não é possível concluir que a omissão do legislador, em atualizar os dispositivos que regulam a execução dos alimentos, desautoriza o uso da forma simplificada e célere que as reformas visaram implementar. O resultado seria dos mais perversos”.

Considerando esta corrente, ter-se-á a hipótese de execução alimentar por cumprimento de sentença, na qual o devedor condenado terá 15 dias para pagar espontaneamente a divida, ou seu debito será majorado em 10%, conforme art. 475-J, caput, CPC.

Deste modo, Richard Pae Kim e Amanda Goveia Ezequiel (2012) salientam que “não haveria mais distinção entre execução de alimentos pretéritos (art. 732 do CPC) e recentes (art. 733 do CPC), eis que previsto no CPC apenas um único procedimento de cumprimento de sentença, previsto em seus arts. 475-I e ss.”.

Asseveram, ainda, que se acolhido a hipótese de execução alimentar por cumprimento de sentença, não seria possível falar em prisão civil, o que poderia acarretar o não pagamento do débito, devido à ineficácia do sistema de cobrança.

Do mesmo modo Alexandra Câmara (2009. p. 317) defende a utilização da Lei 11.232, pois considera que “não seria razoável supor que se tivesse feito uma reforma do CPC destinada acelerar o andamento da execução de títulos judiciais e que tal reforma não seria capaz de afetar aquela execução do credor que mais precisa de celeridade: execução de alimentos”.

Por outro lado, tais fundamentos já expostos, esbarram na corrente contrária que defendem a não aplicação da Lei nº 11.232/05 na execução alimentar, ou seja, que a lei mencionada assegura o adimplemento dos alimentos indenizatório, enquanto a simples garantia do alimento ainda é regido pelo art. 733, tanto os advindo de titulo executivo judicial, quanto de acordo das partes (títulos executivos extrajudiciais). “A possibilidade de prisão e rito próprio do art. 733 do CPC não decorre da espécie de título executivo, mas resulta da natureza da obrigação a ser cumprida pelo devedor”. (DIDIER JR. 2013).

Araken de Assis (2013, p.1033) assim aduz que a execução de alimentos “não se realizará consoante o modelo o art. 475-J e seguintes. Continua em vigor a remissão dos arts. 732 e 735 ao capitulo IV do Tributo II do livro II do CPC, em que pese tais disposições mencionarem, explicitamente, a execução de sentença”. O legislador reformista não modificou o Capitulo V do Titulo II do Livro II e as remissões ao Capitulo IV do mesmo Livro II. Logo, para essa vertente, nem todo titulo executivo judicial (art. 475- N, I) será executado na forma do art. 475-J, porque se excluem os que comtemplam as obrigações alimentares. (ASSIS, 2013).

Na mesma vertente, Theodoro Junior (2006. p. 368) assevera que “continua prevalecendo na ação de alimentos o primitivo sistema dual, em que o acertamento e execução forçada reclamam o manejo de duas ações separadas e autônomas: uma para condenar o devedor a prestar alimentos e outra para forçá-lo a cumprir a condenação”.

A partir da corrente que pontua que não se deve aplicar a lei 11.232\2005, chega-se a uma segunda hipótese de execução alimentar, abordada por Richard Pae Kim e Amanda Goveia Ezequiel (2012):

Para os que acolhem esta acepção, não houve alteração na forma de execução dos alimentos à luz da novel lei. Os direitos aos alimentos podem ser executados via processo autônomo de execução. Aqueles, considerados pretéritos, devem se valer da execução de quantia certa contra devedor solvente, nos termos dos arts. 652 e ss. do CPC (LGL\1973\5), com as alterações da Lei 11.382/2006, ao passo que, os recentes, por meio da via executiva de alimentos (art. 733 do CPC (LGL\1973\5)).

Nesta hipótese, haveria uma exceção à regra prevista na Lei 11.232/2005, que trouxe uma cisão ao sistema de execução de título judicial. A sentença que condena ao pagamento de alimentos, no caso de alimentos recentes e, se for do interesse do credor utilizar o procedimento contido no art. 733 do CPC (LGL\1973\5), acarretará a instauração de um processo autônomo. No tocante à execução fundada no art. 733 do CPC (LGL\1973\5), não houve modificações procedimentais, o que autorizaria a aplicação integral do sistema precedente.

 

Logo, a execução alimentar dar-se-á nos moldes dos arts. 732 a 735, CPC, modalidade especial em razão à natureza da prestação cujo cumprimento se pretende, na qual há a possibilidade de coerção pessoal, consistente na prisão civil do devedor. (CÂMARA. 2009).

Daniel Roberto Hertel (2008) corrobora com esse posicionamento, pois assevera que se o cumprimento de sentença se aplica a todas as execuções de quantia certa contra devedor solvente fundada em titulo judicial, também teria que aplicá-la a execução contra Fazenda Pública quando também oriunda de título judicial, e como este autor bem observa, a doutrina não reporta-se a esta possibilidade, e, portanto, não há porque discutir no âmbito da execução alimentar. Além disso, prevê a insegurança jurídica que a adoção de tal medida poderia causar, pois essa hipótese, por ser muito confusa sua aplicação no que tange os alimentos, geraria diferentes aplicações em casos muito similares.

Há ainda mais duas hipóteses suscitadas no artigo de Richard Pae Kim e Amanda Goveia Ezequiel (2012), a terceira hipótese é poder pleitear os alimentos por ambas as vias já mencionadas, qual seja: cumprimento de sentença e via executiva autônoma. “Os alimentos atuais seriam executados de forma autônoma, conforme o disposto no art. 733 do CPC, enquanto que os pretéritos seriam pleiteados via fase do cumprimento da sentença, nos termos do art. 475-I e ss. do CPC.” Para alcançar essa hipótese, é mister não apegar-se à redação do art. 732, CPC, pois neste os alimentos pretéritos seriam pleiteados por ação autônoma, e a Lei 11.323/2005 não fizera nenhuma revogação aos artigos referente à execução alimentar.

A justificativa para que os alimentos previstos no art. 733, CPC, intitulado de recente, é que estes são urgentes, e é imprescindível uma coerção maior junto ao devedor. Fredie Didier Jr. (2013. p. 729) é um dos processualistas que adota essa tese, “aplicam-se as regras do cumprimento de sentença (arts. 475-J e segs.), inserida pela Lei nº. 11.232/2005, à execução de sentença de alimentos, com base no art. 732 do CPC (execução por expropriação).” Enquanto adota para a execução de sentença de alimentos com base no art. 733 o rito padrão do art. 647.

Por fim, a última hipótese a ser abordada é a execução de alimento e a aplicação da multa disposta no art. 475 –J, CPC, a qual apresenta a mesma proposta da hipótese anterior, na qual os alimentos pretéritos serão pleiteados nos moldes da Lei 11.232/2005, e os alimentos recentes mantêm-se pela via anterior de cobrança. Acontece que quanto aos alimentos pretéritos, se o devedor não efetuar o pagamento, após o prazo da intimação para que pague em 15 dias, “incidirá a multa de 10% e será expedido mandado de penhora e avaliação após o advento do requerimento do credor, conforme giza o art. 475-J do CPC” (KIM; EZEQUIEL. 2012)

Nesta vertente, posicionam-se os doutrinadores Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2008. p. 396):

Não cumprida a sentença, o montante de alimentos será acrescido de multa, no percentual de 10%. De acordo com o art. 475- do CPC, o não cumprimento da sentença, além de sujeita o devedor a tal multa, faculta ao credor o requerimento de penhora e avaliação.

O art. 475-J, ao fazer menção à penhora e à avaliação, prevê uma forma de execução, exatamente a execução por expropriação. Acontece qye, tratando-se de execução alimentar, a expropriação é apenas uma das várias formas de execução disponíveis ao credor.

 

Esta sanção pecuniária visa fazer com que o devedor pague seu débito, e que o retardamento da execução não seja uma via vantajosa, considerando que este poderia protelar o pagamento e mesmo assim não ser penalizado.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A reforma trazida pela Lei 11.232/2005 ensejou atender os anseios da sociedade moderna, como a busca por um processo de execução eficiente e moderno, que seja adequado e célere para o cumprimento das sentenças. Em decorrência dessa lei, houve tanto o afastamento da rigidez e formalismo, que antes acompanhava o processo autônomo, como também a quebra da dicotomia entre o processo de conhecimento e o de execução.

A prestação alimentícia tem cunho muito importante, visto que cumpre suprir as necessidades básicas do exequente, protegendo, assim, o direito à vida. O inadimplemento do crédito alimentício fere o principio da dignidade humana, por isso a importância de se aplicar um método mais célere e eficaz.

Entretanto, o legislador foi silente a respeito da aplicação dessa Lei perante a obrigação alimentar, causando uma profunda discussão doutrinária sobre a possibilidade da sua aplicação no que tange a execução alimentícia, o qual se pautou o estudo. De modo que foram apresentadas quatro teorias, que combinavam de diferentes formas a lei nº 11.232/ 2005 com os arts. 732 e 733.

Isto posto, considerou-se que a não aplicação da lei também à execução de alimentos seria até um contrasenso com a importância que é o alimento para a vida do indivíduo. Em outras palavras, se o alimento é indispensável para a própria sobrevivência humana, é mister que a pretensão que visa a aquisição da prestação de alimento seja realizada da forma mais célere. Contudo, também se abordou que, caso seja adotada a lei, não será mais possível a prisão civil como medida de coerção indireta, pois o cumprimento de sentença não a adota, e isto poderia ser visto pelo devedor como precedente para o inadimplemento.

Destarte, como as regras especiais para satisfação dos alimentos fundados em provimento judicial não foram revogadas, poderão ser utilizadas em conjunto com as novas regras disciplinadas no Capitulo X, incluído no titulo VII do Livro I do CPC. Desse modo poderão ser tutelados os direitos do alimentante, que geralmente é a parte mais vulnerável na relação processual, de forma eficaz e célere.

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REFERÊNCIAS

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BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil: Tutela Jurisdicional Executiva. São Paulo: Saraiva, 2008.

 

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COSTA, Ulisses de Souza. Reforma Processual: Problemáticas na Aplicação da Lei 11.232/05. Publicado em: 2007. Disponível em: <http://www.uems.br/portal/biblioteca/repositorio/2012-02-03_08-18-29.pdf>. Acesso em: 18 de abril de 2014.

 

CUNHA, Graziela Santos da; FRANÇOLIN Wanessa de Cássia. Considerações sobre as principais alterações feitas pela Lei 11.232/2005 para a generalização do sincretismo entre a cognição e execução. Revista de Processo, São Paulo, vol 135, p. 132-151, maio 2006.

 

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DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 5ª Ed., Vol. 5, Bahia: Editora JusPodivm, 2013.

 

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