A Educação e o Processo de Mudança Social

(Extraído do estudo da obra Educação e Mudança de Paulo Freire)

O compromisso do profissional com a sociedade

“Somente um ser que é capaz de sair de seu contexto, de distanciar-se dele para ficar com ele; capaz de admirá-lo para, objetivando-o, transformá-lo e, transformando-o, saber-se transformado pela sua própria criação; um ser que é e está sendo no tempo que é o seu, um ser histórico, somente este é capaz, por tudo isto, de comprometer-se” (p.17)

 

INTRODUÇÃO

No prefácio da obra, concebido por Moacir Gadotti, pôde-se ficar sabendo um pouco da trajetória de Paulo Freire quando retorna de quinze ano de exílio.  

Retorna ao Brasil “distante do qual estava há 14 anos, mas distante do qual nunca estava também”, significando que Freire sempre ficou informado a respeito dos acontecimentos de seu país natal durante o exílio.

Gadotti diz ainda que a teoria de Paulo Freire tem como ponto de partida, sua opção radical pela libertação dos oprimidos, sendo o sentido mais profundo de sua obra, a “expressão” dos oprimidos.      

Tendo como temática a questão da mudança e o caráter de dependência da educação em relação à sociedade, pareceu-me que o ponto central desta obra de Paulo Freire encontra-se no capitulo referente à Educação e o Processo de Mudança Social, ao qual tomei a liberdade de me ater mais profundamente. 

 

A EDUCAÇÃO E O PROCESSO DE MUDANÇA SOCIAL

Neste capítulo, Paulo Freire organiza em doze tópicos sua teoria sobre a educação e o processo de mudança social. 

Segundo ele, não é possível fazer uma reflexão sobre o que é a educação sem primeiramente refletir sobre o próprio homem e que não haveria educação se o homem fosse um ser acabado, se não estivesse mais em constante busca no sentido da construção do seu conhecimento.

“O homem deve ser o sujeito de sua própria educação. Não pode ser o objeto dela. Por isso ninguém educa ninguém (...) O homem não é uma ilha. É comunicação. Logo, há uma estreita relação entre comunhão e busca.” (p.28)

Saber-Ignorância: Paulo Freire nos diz que a educação tem caráter permanente, que não existem seres educados e não educados e que estamos todos nos educando, afinal, o saber se constrói  através de uma superação constante.   

“O homem, por ser inacabado, incompleto, não sabe de maneira absoluta, Somente Deus sabe de maneira absoluta.” (p.29)

Ouso compartilhar minha opinião com Freire no sentido de que não existem ignorantes absolutos. Posso saber sobre as teorias sociológicas, mas muito pouco entendo sobre saber semear a terra ou consertar o motor de um automóvel.

Por isso, diz ele, não podemos nos colocar na posição do ser superior que ensina um grupo de ignorantes, mas sim na posição humilde daquele que comunica um saber relativo a outros que possuem outro saber relativo.   

 Amor-Desamor: Para o Autor o amor é um tarefa do sujeito. “É falso dizer que o amor não espera retribuições”.

Não existe educação do medo. Nada se pode temer da educação quando se ama. Ama-se na medida em que se busca comunicação, integração a partir da comunicação com os demais

 Esperança-Desesperança: Na visão de Freire uma educação sem esperança não é educação.

Quem não tem esperança na educação dos camponeses, por exemplo, deverá procurar trabalho em outro lugar.

 O Homem - um ser de relações: Aqui, pode-se observar o inicio do processo de integração, pois propõem-se que o homem está no mundo e com o mundo, sendo assim, capaz de relacionar-se; de sair de si; de “transcender”. 

Estas relações não se dão apenas com os outros, mas se dão no mundo, com o mundo e pelo mundo.

 Características: A educação não é um processo de adaptação do indivíduo a sociedade, pois se existisse uma educação que pretendesse adaptar o homem, a mesma estaria matando suas possibilidades de ação, transformando-o em “abelha”.

 O homem tende a captar uma realidade fazendo-a objeto de seus conhecimentos e o papel da educação deve ser o de estimular a opção e afirmar o homem como homem. “Adaptar é acomodar, não transformar.” (p.32)

 O ímpeto criador do homem: Segundo Freire em todo homem existe um ímpeto criador que  nasce da inconclusão do homem. É necessário darmos oportunidade para que os educandos sejam eles mesmos, pois um educador que restringe os educandos a um plano pessoal impede-os de criar.  

O desenvolvimento de uma consciência crítica que permite ao homem transformar a realidade se faz cada vez mais urgente. Na medida em que os homens, dentro de uma sociedade, vão respondendo aos desafios do mundo, vão temporizando os espaços geográfico se vão fazendo história pela sua própria atividade criadora.

 Conceito de sociedade em transição: Paulo Freire adverte: Toda a transição é mudança, mas não vice-versa. Não há transição que não implique um ponto de partida, um processo e um ponto de chegada. todo  amanhã se cria num ontem, através de um hoje. De modo que o nosso futuro baseia-se no passado e se corporifica no presente. Temos de saber o que fomos e o que somos, para saber o que seremos.

 Características de uma sociedade fechada: A sociedade fechada se caracteriza pela conservação do status ou privilégio e por desenvolver todo um sistema educacional para manter este status.

Nestas sociedades se instala uma elite que governa conforme as ordens da sociedade diretriz. Esta elite impõe-se às massas populares. Esta imposição faz com que ela esteja sobre o povo e não com o povo.

Pode-se perceber o quão associada encontra-se a educação com o grau de desenvolvimento quando Paulo Freire diz que também se caracteriza uma sociedade fechada  pelo analfabetismo e pelo desinteresse pela educação básica dos adultos, esta ultima motivo de muitos estudo seus.

 Sociedade Alienada: Aparece então a crítica de Freire à “sociedade alienada” a qual julga não ter consciência de seu próprio existir. “Um profissional alienado é um ser inautêntico”, diz ele. “Seu pensar não está comprometido consigo mesmo, não é responsável.” O ser alienado não olha para a realidade com critério pessoal, mas com os olhos alheios.

O ser alienado não procura um mundo autêntico. Isto provoca uma nostalgia: deseja outro país e lamenta ter nascido no seu. Tem vergonha de sua realidade.      

“A sociedade alienada não se conhece a si mesma; é imatura, tem comportamento exemplarista, trata de conhecer a realidade por diagnósticos estrangeiros” (pg.36) 

Geralmente as elites acusam o povo de fraqueza ou incapacidade e por isso suas soluções não dão resultado. Assim, as atitude dos dirigentes oscilam entre um otimismo ingênuo ou um pessimismo ou desespero. É ingenuidade pensar que a simples importação de soluções salvará o povo.    

 Uma sociedade em Transição: Talvez, este seja o tópico mais importante, pois aqui, Paulo Freire começa a explicar que existe uma série de fenômenos sociológicos que têm ligação com o papel do educador.

 Quando uma sociedade passa por um processo de transição, começam a surgir novos valores para as massas populares, até então, espectadoras passivas. Por conseguinte, quando a sociedade se incorpora nelas, começa um processo chamado democratização fundamental.

As massas passam a exigir voz e voto no processo político da sociedade. Percebem que outros têm mais facilidade que eles e descobrem que a educação lhes abre uma perspectiva.

Elas descobrem na educação um canal para um novo status e começam a reivindicar mais escolas. Começam a ter um sentimento que não tinham. Existe uma correspondência entre a manifestação das massas e a reivindicação. Segundo Paulo Freire é o que chamamos de educação das massas.

“Uma sociedade justa dá oportunidade às massas para que tenham opções e não a opção que a elite tem, mas a própria opção das massas. A consciência criadora e comunicativa é democrática.”(p.38)    

 A “Consciência Bancária” da Educação:  “As sociedades latino-americanas começam a se inscrever neste processo de abertura, umas mais que outras, mas a educação ainda permanece vertical” (p.39)

O professor ainda é um ser superior que ensina a ignorantes. Isto forma o que o Paulo Freire classifica como uma “Consciência Bancária”. O educando recebe passivamente os conhecimentos, tornando-se um depósito do educador.   

A consciência Bancária pensa que quanto mais se dá mais se sabe. Mas a experiência revela que com este mesmo sistema só se formam indivíduos medíocres, por que não há estimulo para a criação. 

 A Consciência e Seus Estados: “A Consciência se reflete e vai para o mundo que conhece: é o processo de adaptação. A consciência é temporalizada. O Homem é consciente e, na medida em que conhece, tende a se comprometer com a própria realidade.” (Pg.40)

No que concerne às características gerais das consciências pode-se afirmar que na consciência ingênua há uma busca de compromissos; na Crítica há um compromiso e, na fanática, uma entrega irracional.

 Características da Consciência Ingênua: Revela uma certa simplicidade, (simplismo na interpretação dos problemas). Não se aprofunda na casualidade do próprio fato. Sua conclusões são apressadas superficiais. Há uma tendência a considerar que o passado foi melhor. Subestima o homem simples. É frágil na discussão dos problemas. O Ingênuo parte do principio de que sabe tudo. Diz que a realidade é estática e não mutável.

 Características da Consciência Crítica: Anseio de profundidade na análise de problemas. Não se satisfaz com as aparências. Procura verificar ou testar as descobertas. Ao deparar com um fato, faz o possível para livrar-se de preconceitos. É intensamente inquieta, indagadora. Ama o diálogo, nutre-se dele. Reconhece que a realidade é mutável.   

 Portanto, o passo para a consciência crítica somente se dá com o processo educativo de conscientização. E este passo exige um trabalho de promoção e critização.

  

CONCLUSÃO & Considerações Finais

Dado o momento histórico da concepção desta obra de Paulo Freire, a mesma acaba por se confluir com a questão social e política brasileira da época. Sufocado por um longo período no exterior, o autor vê a oportunidade de exprimir suas idéias para a concepção de um novo modelo de Educação.

Apesar disto, seu livro não pode ser considerado de forma alguma desatualizado. Pelo contrário. Ele é bastante atual, pois propõe não apenas um novo modelo de Educação como também um novo modelo social, que teria como celeiro a Educação.

Na concepção de Paulo Freire, a eliminação da “Consciência Bancária” (educação tecnicista) e da Alienação das massas em detrimento da aplicação de uma pedagogia progressista libertadora nas Escolas, seria a mola mestra da proposta para um desenvolvimento democrático e participativo no país.

E para que esta proposta se concretize, para que se saia do processo de transição com uma vitória da participação das massas, é importante o envolvimento de todos.    

“Uma sociedade esta se abrindo quando começa o processo de desalienação com o surgimento de novos valores. Assim, por exemplo, a idéia da participação popular no poder.” (p.37)

 REFERÊNCIA:

FREIREPauloEducação e Mudança. 12ª Edição. Paz e Terra. Rio de Janeiro, 1979