FACULDADE INDEPENDENTE DO NORDESTE



POLIANE SANTOS SOUSA



A EFICÁCIA DA MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE MEIO ABERTO LIBERDADE ASSISTIDA : Uma Maneira de Impedir - Através Da Educação e Da Inclusão Social ? A Institucionalização Dos Adolescentes Em Conflito Com A Lei Nas Unidades De Internação.





VITÓRIA DA CONQUISTA ? BAHIA
MAIO-2009
POLIANE SANTOS SOUSA
















A EFICÁCIA DA MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE MEIO ABERTO LIBERDADE ASSISTIDA : Uma Maneira de Impedir - Através Da Educação e Da Inclusão Social ? A Institucionalização Dos Adolescentes Em Conflito Com A Lei Nas Unidades De Internação.

Monografia apresentada a Faculdade Independente do Nordeste, Curso de como pré-requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito.







ORIENTADOR: Carlos Maciel Públio
POLIANE SANTOS SOUSA


A EFICÁCIA DA MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE MEIO ABERTO, LIBERDADE ASSISTIDA: Uma Maneira de Impedir - Através Da Educação e Da Inclusão Social? A Institucionalização Dos Adolescentes Em Conflito Com A Lei Nas Unidades De Internação.




Aprovado em ____/____/_____.






BANCA EXAMINADORA / COMISSÃO AVALIADORA


________________________________________________________
Nome do orientador



_________________________________________________________
Nome do componente



___________________________________________________________
Nome do componente




















































Dedico o presente trabalho, aos meus pais Gildete e Maria da Glória, meus irmãos Danilo e Jamine, sobrinho queridos Alice e João Gabriel, avós, tios e tias, minhas queridas amigas cúmplices e parceiras, Lívia, Roseane e Giane. Aos sócio-educandos do Projeto Viver Amigo, responsáveis diretamente pela inspiração para realização deste trabalho.


A Deus, por todas as possibilidades que me foi dada, e a força que me foi concedida para que eu passa-se por este longo caminho.
A minha família, em especial meu pai e minha mãe, e todos àqueles que contribuíram diretamente ou indiretamente para que eu pudesse desenvolver este trabalho.


















































"Ainda que falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, eu nada seria.
O amor é sofredor, é benigno não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece; não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; não folga com a injustiça, mas sim com a verdade."
(Apostolo Paulo - Aos Coríntio, 13.)

RESUMO


Este trabalho tem como objetivo, conscientizar os leitores da realidade dos adolescentes em conflito com a lei, especialmente no município de Vitória da Conquista. Visa a informar a existência, disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente, demonstrar a desnecessidade de sua alteração, tendo em vista a sua grande eficácia quando efetivamente, aplicado em casos concretos.
Assim, o presente trabalho tem como finalidade de reacender questões polêmicas e contrapor posições bastante diversas sobre tema como: a natureza da medida sócio-educativa, reconhecendo sua índole sancionatória, no entanto, reivindicando a aplicação das garantias processuais.
Não se trata de um trabalho totalmente imparcial, visto que, apesar de apresentar pensamentos e dados verídicos e coerentes, assume um posicionamento claro contra o Direito Menorista, ainda enraizado em nossa cultura, e em contrapartida, a favor da plena aplicação da Doutrina da Proteção Integral e do Principio da Prioridade Absoluta, além de ir ao total encontro de qualquer argumento em defesa da redução da maioridade penal. Trata-se ainda, de um trabalho informativo, a respeito das medidas sócio-educativas em meio aberto e do SINASE, um novo instrumento que veio em 2006, amparar e orientar as instituições que trabalham com a execução das medidas sócio-educativas. Com relação à execução da medida em meio aberto, liberdade assistida, será demonstrado o trabalho desenvolvido pelo PEV ? Programa de Educação para a Vida no âmbito do município de Vitória da Conquista ? Ba.

Palavras-chave: adolescente; ato infracional; medida sócio-educativa de meio aberto, Liberdade Assistida; sócio-educação.









ABSTRACT


This work has as objective to acquire knowledge the readers of the reality of the adolescents in conflict with the law, especially, in the city of Victory of the Conquest. It aims at to inform of the existence, disposals of the Statute of the Child and the Adolescent, to demonstrate the desnecessidade of its alteration, in view of its great effectiveness when effectively, applied in concrete cases.
Thus, the present work has as purpose to relight questions controversies and to oppose sufficiently diverse positions on subject as: the nature of the partner-educative measure, recognizing its sancionatória nature, however, demanding the application of the procedural guarantees.
One is not about a total impartial work, since, although to present truthful and coherent thoughts and data, clearly assumes a positioning against the Menorista Right, still taken root in our culture, and, on the other hand, in favor of the full application of the Doctrine of the Integral Protection and of the beginning of the Absolute Priority, beyond going to the total meeting of any argument in defense of the reduction of the criminal majority. It is still treated, of an informative work, the respect of the partner-educative measures in open way and it SINASE, a new instrument that came, in 2006, to support and to guide the institutions that work with the execution of the partner-educative measures. With regard to the execution of the measure in opened way, attended freedom, will be demonstrated the work developed for the PEV - Program of Education for the Life in the scope of the city of Victory of the Conquest - Ba.

Word-key: adolescent; infracional act; partner-educative measure of opened way, Attended Freedom; partner-education.










LISTA DE ABREVIATURAS


ECA ? Estatuto da Criança e do Adolescente.
USP ? Universidade de São Paulo
SINASE ? Sistema Nacional de Atendimento Sócio-educativo.
SGD ? Sistema de Garantia de Direito.
CF ? Constituição Federal.
FUNDAC ? Fundação da Criança e do Adolescente.
ASSEV ? Associação de Educação para a Vida.
PEV ? Programa de Educação para a Vida.
FUNDAC ? Fundação da Criança e do Adolescente.
COMDICA ? Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente.
PIA - Plano Individual de Atendimento

















SUMÁRIO


LISTA DE ABREVEATURAS

LISTA DE GRÁFICOS

LISTA DE TABELAS

INTRODUÇÃO 12

1 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS DA CONCEPÇÃO QUE ORIENTA O DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 14

1.1 A Doutrina Da Situação Irregular E O Código De Menores De 1979 14

1.2 O Advento Da Constituição Federal De 1988 E As Garantias De Direitos Para A Criança E O Adolescente 16

1.3 A Doutrina da Proteção Integral 17

1.4Criança e Adolescente Sujeitos de Direito - O Estatuto da Criança e do Adolescente ? Lei 8.059/90 18

2 PROVÁVEIS ASPECTOS MOTIVADORES QUE LEVAM A RÁTICA DE ATOS INFRACIONAIS 20

2.1 O Convívio Familiar 20

2.2 O Sistema Educacional 21

2.3 As Desigualdades Sociais 22

3 NATUREZA DO SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ADOLESCENTE AUTOR DE ATO INFRACIONAL 23

3.1 A prática Do Ato Infracional 23

3.2 Hipótese De Apreensão de Adolescente Que Comete Ato Infracional 24

3.3 Apuração Do Ato Infracional 25

3.4 A Inimputabilidade Penal 27

3.5 SINASE ? Sistema Nacional de Atendimento Sócio-educativo 29

CAPÍTULO 4 AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS DE MEIOR ABERTO 32

4.1 Generalidade 32

4.2 Advertência 34

4.3 Reparação Do Dano 35

4.4 Prestação De Serviço a Comunidade 37

4.5 Liberdade Assistida 38

5 A LIBERDADE ASSISTIDA ? UM AVANÇO NO PROCESSO SÓCIO-EDUCATIVO 44

5.1Prevalências Da Sócio-educaÇÃO Sobre Os Aspectos Meramente Sancionatórios 44

5.2 A Medida Sócio-educativa E O Desafio De Educar O Adolescente 45

5.3 Programa De Apoio A Execução Das Medidas Sócio-educativas De Meio Aberto Em Vitória da Conquista 47

5.3.1 Programa De Educação Para Vida ? PEV 48

5.3.2Quem São Os Adolescentes Que Cumprem - Medida Sócio-educativa Liberdade Assistida Em Vitória Da Conquista ? 50

CONSIDERAÇÕES FINAIS 53

REFERÊNCIAS 55




















1 INTRODUÇÃO

O atendimento ao adolescente em conflito com a lei, em regime de liberdade assistida, é, para muitos especialistas, a forma mais humana e, pedagogicamente, a mais promissora de abordagem educativa. A razão disso está no fato de que o melhor lugar para se educar para o convívio social e no próprio convívio social. A liberdade assistida, quando bem orientada, permite uma saudável reestruturação do cotidiano do adolescente, de forma construtiva na direção de uma inserção social não conflitante com a lei.
Essa medida existe no Brasil, desde 1927, prevista no Código de Melo Matos, com o nome de liberdade vigiada. Em 1979, o novo Código de Menores mudou sua denominação para liberdade assistida. No Estatuto da Criança e do Adolescente, a liberdade assistida tem como finalidade orientar o adolescente em conflito com a lei com o objetivo de promovê-lo em todos os aspectos, ou seja, no âmbito familiar, social, comunitário, educacional e profissionalizante.
A importância deste trabalho está justamente em demonstrar o fim sócio-educacional da liberdade assistida, apresentando-se como a melhor alternativa, no tocante às medidas que privam a liberdade. Ao decorrer deste trabalho, serão relatados aspectos históricos que norteiam o Direito da Infância e Juventude, desde o Direito Menorista, sempre com foco no adolescente em conflito com a lei. Além disso, serão abordados e analisados alguns pontos do Estatuto da Criança e do Adolescente, no que diz respeito ao adolescente em conflito com a lei, analisando a aplicação das medidas sócio-educativas de meio aberto, isoladamente a liberdade assistida e os resultados da sua execução, bem como o que já está implementado na cidade de Vitória da Conquista e quais os resultados obtidos até o momento.
Com isto, o trabalho visa a fornecer ao leitor elementos para analisar a efetividade do Estatuto da Criança e do Adolescente, perspectivas de ampliação e sua implementação. Iniciar-se-á por uma abordagem histórica, no Brasil e no mundo, do Direito Juvenil, passando pela parte teórica sobre prováveis aspectos que levam o adolescente a infracionar, o que vem a ser ato infracional e o sistema de responsabilização, as medidas sócio-educativas de meio aberto, e finaliza concentrando-se na prática e resultados alcançados com a aplicação da medida sócio-educativa, liberdade assistida no âmbito do município de Vitória da Conquista.
2 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS DA CONCEPÇÃO QUE ORIENTA O DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE


2.1 A DOUTRINA DA SITUAÇÃO IRREGULAR E O CÓDIGO DE MENORES


A Doutrina da Situação Irregular, ao longo de décadas, foi base para todos os Códigos menoristas, uma verdadeira distorção no modo de tratamento em face das crianças e adolescentes por parte do Estado e da sociedade. A Doutrina da Situação Irregular não se dirigia ao conjunto da população infanto-juvenil. Limitava-se as crianças e adolescentes em situação irregular, categoria constituída basicamente por quatro tipos: 1. carentes, crianças e adolescentes em perigo moral em razão da manifesta incapacidade dos pais; 2.abandonados, crianças e adolescentes privados de representação legal pela falta ou ausência dos pais ou responsáveis; 3. inadaptados, crianças e adolescentes com grave desajuste familiar ou comunitários; 4.infratores, crianças e adolescentes em conflito com a lei.
Observando as quatro situações elencadas, duas delas requerem para sua resolução o exercício da função judicante: os casos de abando e os de infração. Ninguém pode destituir uma família do pátrio poder e colocar seus filhos em família substituta, guarda, tutela ou adoção, a não ser a justiça, como também, julgar crianças e adolescentes pelo cometimento de ato infracional e aplicar-lhe medida sócio-educativa. Nesses dois casos, existe um conflito de natureza jurídica a ser resolvido. Nas outras situações, carentes e inadaptados, não há necessariamente conflitos com base em lei, mas sim de natureza econômico e psicopedagógico.
Quando surgiram os primeiros Códigos de Menores, o legislador remeteu todas as ações relativas à criança e adolescente em situação de risco à justiça de menores. Foi assim que problemas de natureza social e psicopedagógica passaram a ser encaminhados aos tribunais de menores. Como não havia, nessas situações, espaço para o exercício da função judicante por parte do juiz que se limitava à recepção, estudo e encaminhamento de casos; a atuação da justiça de menores passou a desenvolver-se sob o signo do chamado direito tutelar do menor, uma forma de não direito, pela qual, ao invés de julgar, a função do juiz passou a ser a de atuar como "um bom pai da família".
A relação de tutela pressupõe a incapacidade, de um lado, e a proteção, do outro. Isso que dizer, na prática, que o preço a ser pago pela ação protetiva do tutor é a incapacitação do tutelado. Em outras palavras, a criança e o adolescente, em lugar de serem considerados detentores de direitos exigíveis com base na lei, tornam-se objetos de intervenção jurídico social do Estado.Dessa forma, carentes, abandonados, inadaptados e infratores vieram a ser encaminhados à justiça de menores, que passou a atuar como um pêndulo, oscilando com regularidade entre a compaixão pela carência e o abandono e a repressão sistemática à inadaptação e a prática de infrações.
O lado mais perverso de tudo reside no fato de que mecanismos normalmente utilizados para o controle social de infrações como a polícia, justiça e redes de internações passaram a ser utilizados em estratégias voltadas para o controle social da pobreza e das dificuldades pessoais e sociais de crianças e adolescentes considerados problemáticos, mas que não chegaram a cometer atos infracionais.
Assim, para as crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social, que tivesse ou não cometido ato infracional, a aplicação das leis baseadas na Doutrina da Situação Irregular significava, uma única e mesma realidade, caracterizando dessa forma, como ciclo perverso da institucionalização compulsória.
O ciclo da institucionalização compulsória, além dos danos causados ao desenvolvimento pessoal e social das crianças e adolescentes, era antijurídico em sua essência, uma vez que agredia frontalmente os mais elementares princípios do direito, ao privar pessoas da liberdade sem a garantia de devido processo legal.
A Doutrina da Proteção Irregular começou a declinar na primeira metade dos anos oitenta, especificamente no Brasil, através de atuações ético política solidaria e construtiva de pessoas, grupos e organizações do movimento social do mundo jurídico e das políticas públicas, começando a gerar um novo Direito da Infância e Juventude.


2.2 O ADVENTO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E AS GARANTIAS DE DIREITOS PARA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE

No ano de 1988, ocorreu a promulgação da primeira Constituição Federal que tinha como fundamento basilar a democracia. Sendo considerado por muitos, como a Constituição Cidadã e representou um verdadeiro sopro de vitalidade num país que fora submetido a muitas arbitrariedades e violência institucional no período anterior. Sua elaboração contou com a participação dos representantes da sociedade, escolhidos pela via política e assinalou uma grande conquista no aspecto dos direitos humanos.
A proteção da criança e do adolescente encontra-se presente na Constituição Federal no Capítulo VI ? Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso, o qual assegura que é um "dever da família, da sociedade e do Estado garantir, de modo prioritário, que crianças e adolescentes tenham o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, liberdade e uma convivência de caráter familiar e comunitário e também assegura a sua proteção contra a negligência, a discriminação, a violência e o abandono".
Ainda segundo a Constituição Federal, será dever do Estado à promoção de programas assistenciais para o atendimento da saúde de crianças e adolescentes, podendo participar, neste intuito, entidades não governamentais.
Nesta Constituição, existe ainda, a referência à outras formas de proteção para a criança e o adolescente. Por exemplo, tem-se o estabelecimento de punições severas para os casos em que se verifique a exploração sexual destes. Outro ponto interessante se refere à proibição de diferenças entre os filhos havidos no casamento ou não, ao estabelecimento do dever paterno de suprir as necessidades de assistência, educação e criação dos filhos menores de idade. No que se refere à criança e ao adolescente, adotou a Carta Magna um novo tratamento para estes, o qual será baseado na doutrina da Proteção Integral.

1.3 CRIANÇA E ADOLESCENTE SUJEITOS DE DIREITO -A DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL

A Doutrina da Proteção Integral tem como fundamento o tratamento igualitário para todas as crianças e adolescentes como sujeitos de direitos que são. Não é destinada a um determina segmento da população infanto-juvenil, mas a todas as crianças e adolescentes, sem exceção alguma. Diferenciando assim, da Doutrina da Situação Irregular que era direcionada para um grupo de crianças e adolescentes mal quistos pelo Estado e pela sociedade.
A Doutrina da Proteção Integral leva em consideração o valor da criança e do adolescente como ser humano, a necessidade de respeito à sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, percebendo assim que a criança e o adolescente são continuidade da família; reconhecendo sua vulnerabilidade, o que os tornam merecedores de proteção incondicionada por parte do Estado, da família e da sociedade.
A Doutrina da Proteção Integral tem como antecedente direto a Declaração dos Direitos da Criança (1959), condensando-se em quatro documentos internacionais fundamentais: a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil (Regras de Beijing), as Regras Mínimas das Nações Unidas para os Jovens Privados de Liberdade e as Diretrizes das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil.
No Brasil, a doutrina da proteção integral foi proclamada com o advento da Constituição Federal de 1988, que fixou os direitos da criança e do adolescente como prioridade absoluta, especificamente no artigo 277:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Desta forma, enquanto o Código de Menores preocupava-se tão somente com os adolescentes em situação irregular, o Estatuto da Criança e do Adolescente inovou ao abranger toda criança e adolescente na mesma situação jurídica, rompendo definitivamente com a doutrina da situação irregular, assegurando que cada brasileiro que nasce possa ter assegurado seu pleno desenvolvimento, mesmo que cometa um ato considerado ilícito.


1.4 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ? LEI 8.059/90


O Estatuto da Criança e do Adolescente Lei número de 8.059/1990 segue a doutrina da proteção integral, que se baseia no princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. Segundo essa doutrina, o Estado brasileiro tem o dever de garantir as necessidades da pessoa em desenvolvimento, velando pelo seu direito a vida, a saúde, educação, convivência, lazer, liberdade, profissionalização, com o objetivo de garantir o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.
O Estatuto da Criança e do Adolescente afastou-se da doutrina da situação irregular acolhida pelo Código de Menores, que compreendia como objeto de atenção apenas os "menores" em situação irregular, ou seja, aqueles em conflito com a lei ou por qualquer motivo, privados de assistência.
O Estatuto sintetizou um movimento de edificação de normas jurídicas ,assentado na participação popular, à luz da premissa da prevalência dos interesses de seus destinatários principais: crianças e adolescentes. Seu método de produção foi o da mobilização social, o do amplo debate, o do engajamento na luta pelos direitos humanos, e da solidificação da democracia.
Aplica-se o Estatuto da Criança e do Adolescente, como regra, ao adolescente até 18 anos de idade, parâmetro consagrado pela Constituição Federal como início da imputabilidade penal, e por exceção até aos vinte e um anos de idade. Baseado na psicologia evolutiva e adotando o critério cronológico absoluto, estabelece a diferença técnica entre criança, assim definida como a pessoa até dose anos incompletos, e adolescente, aquele entre dose anos e dezoito anos de idade.
A distinção é relevante, principalmente no que se refere à prática de ato infracional, porque ao adolescente que comete ato infracional, aplicam-se medidas sócio-educativas, como também medidas protetivas, ao passo que as crianças que cometerem ato infracional, somente podem ser aplicadas medidas protetivas.
Os direitos das crianças e dos adolescentes têm imperatividade de suas normas e interesses do Estado em sua formação. Com base na doutrina da proteção integral, o Estatuto estabelece os direitos específicos da criança e do adolescente, além de outros, inerentes à universalidade dos seres humanos.
Ocorreu grande inovação legislativa, ao se determinar a prioridade absoluta na implementação dos direitos estabelecidos no Estatuto da Criança e do Adolescente, em especial porque o legislador indicou que essa prioridade implica: receber, com primazia, em qualquer circunstância, proteção e socorro, precedência de atendimentos nos serviços públicos ou de relevância pública, preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas e destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e juventude.








2 PROVÁVEIS ASPECTOS MOTIVADORES QUE LEVAM A PRÁTICA DE ATOS INFRACIONAIS


Atualmente, existem inúmeros estudos que apontam os prováveis aspectos que motivam adolescentes a cometerem atos infracionais. Segundo o núcleo de estudos de violência da USP, em pesquisa realizada recentemente, os principais fatores que levam adolescentes a se envolverem com a prática reiterada de atos infracionais são: a convivência família, o sistema educacional e as desigualdades sociais.


2.1 CONVIVÊNCIA FAMILIAR


A família é a base fundamental de qualquer ser humano, pois é onde inicia- se a aprendizagem de como se deve viver em grupo, respeitar o outro, e a ter limites. As pessoas que não têm referencial e uma boa estrutura familiar, provavelmente terão dificuldades para se adaptarem ao convívio social.
O enfraquecimento da família em nossa sociedade dá-se em função de vários fatores: a falta de diálogo entre pais e filhos, a permissividade e omissão dos pais, o abandono material e moral dos filhos, por parte dos pais não assumindo as responsabilidades sobre estes. A rejeição e a violência nas relações familiares, como: maus-tratos contra crianças e adolescentes, práticas abusivas, também são fatores da desestrutura familiar.
A maioria dos adolescentes que ingressam no mundo da prática de atos infracionais são frutos de famílias desestruturadas, verifica-se que, no geral, os adolescentes que tiveram como pai, homens cujo modo de vida e comportamentos caracteriza o seu abandono, tendem a ter atitudes desregradas e violentas.
Os pais, tentando repreender as condutas inadmissíveis dos seus filhos, acabam punindo severamente, ou muitas vezes sendo permissivos e omissos, o que colabora para que esses adolescentes evidenciem condutas agressivas e tenha comportamento não sociável.
Sendo assim, o convívio familiar é um dos principais responsável pela formação dos adolescentes, sendo que na maioria das vezes a agressividade destes é devido ao ambiente familiar violento e desajustado.



2.2 SISTEMA EDUCACIONAL


O que tem se confirmado a cada dia é que, a violência doméstica é um dos principais contribuintes para o baixo desempenho das crianças e adolescentes nas escolas. Estes enfrentam dificuldades de se incluírem no meio social, e ter um bom relacionamento com seus colegas. Normalmente, Crianças e adolescentes que foram expostas à violência familiar apresentam sintomas internos como: ansiedade e inquietação; e externos: agressividade e hostilidade. O comportamento anti-social advém do próprio lar, devido à falta de ternura, amor e carinho dos próprios pais.
O sistema educacional do Brasil é notoriamente deficitário, principalmente no ensino público, não existem trabalhos educacionais de base que possam ocupar de maneira pedagógica o tempo das crianças e dos adolescentes. A escola primária começa muito tarde, e no caso das famílias menos favorecidas, as crianças ficam entregues à própria sorte, pois os pais saem para o trabalho com intuito de prover o sustento familiar.
O ensino no Brasil especificamente o ensino público tem se defasado a cada dia, os professores, muitas vezes não têm motivação, não têm recursos para realizarem um bom trabalho pedagógico e são mal remunerados.
O baixo desempenho das crianças e dos adolescentes nas escolas é atribuído muitas vezes a questão familiar, por outro lado, o sistema educacional, também tem sua parcela de culpa, pois não proporciona um trabalho adequado de inclusão escolar, o que proporciona a evasão das escolas.


2.3 AS DESIGUALDADES SOCIAIS


A problemática da prática de atos infracionais, por parte dos adolescentes, tem como um dos principais fatores, o conjunto das desigualdades sociais, não se pode desconsiderar que os adolescentes que cometem atos infracionais, em sua maioria, são oriundos da grande parcela da população brasileira vitimas da pobreza. Desta forma, a análise dos aspectos motivadores à prática de atos infracionais pelos adolescentes, não pode ser vista separadamente do contexto sócio-econômico, combinadas com outras determinações, pois as condições de vida desses adolescentes, certamente, contribuem para a construção do quadro de violência em que vivem.
A falta de perspectiva de um futuro melhor, a inexistência de uma devida educação, a ausência de oportunidades de um trabalho digno, o apelo do sistema capitalista para o consumo principalmente entre os jovens, são fatores sócio-econômicos que favorecem como muita intensidade a prática infrações, especificamente atos infracionais análogos aos crimes contra o patrimônio.
As desigualdades e a exclusão social são fatores extremamente relevantes, cujos efeitos podem ser sentidos em todos os aspectos relacionados à questão da infância e juventude; nenhum olhar sobre o tema "adolescentes e atos infracionais" seria possível, caso estes fatores fundamentais fossem desconsiderados.










3 NATUREZA DO SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ADOLESCENTE AUTOR DE ATO INFRACIONAL


3.1 A PRÁTICA DO ATO INFRACIONAL



Considera-se ato infracional todo fato penalmente típico, ou seja, descrito como crime ou contravenção.
A doutrina triparticipe afirma que crime é fato típico, antijurídico e culpável, enquanto que a finalista considera que crime é fato típico e antijurídico, sendo a culpabilidade mero pressuposto de aplicação da pena. Por esse entendimento, os adolescentes com 18 anos incompletos podem cometer infrações, não se sujeitando, entretanto, às sanções penais correspondentes por inimputabilidade decorrente do desenvolvimento mental incompleto em razão da idade.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, ao definir, os crimes e as contravenções como atos infracionais, adotou a corrente triparticipe, aponta como elementos do delito a tipicidade, a antijuricidade e a cupabilidade.
Ao exigir para caracterização do ato infracional, a demonstração de que o fato praticado também se subsume a uma figura típica, o Estatuto acolheu o princípio da reserva legal, segundo o qual não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. Por conseqüência, não pode haver ato infracional sem lei penal anterior que o defina, nem medida sócio-educativa sem prévia cominação legal.
Depreende-se portanto, que para a caracterização de um ato infracional, há que ficar demonstrada a ocorrência de crime ou contravenção, com todos os seus elementos constitutivos, subjetivo, objetivo e normativo, bem como com todas as circunstâncias e demais requisitos do fato delituoso. Não demonstrando tipicidade da conduta, aplica-se apenas as medidas protetivas com base no caso concreto.
Será analisado adiante, que a medida sócio-educativa não pode ser equiparada à sanção penal, apesar de ter uma pequena similitude. Em função disso, eventuais circunstâncias, como qualificadoras ou causas especiais de aumento de diminuição de pena, em sede da justiça da Infância e da Juventude, somente tem importância para se traçar um perfil comportamental do adolescente, mas não influem de forma determinante na aplicação do direito.
Se um imputável pratica um crime de homicídio simples, a reprimenda penal será mais amena que aquela dispensada ao autor, da forma qualificada. Na área da infância e juventude, em ambos os casos, a medida sócio-educativa será fixada com base na análise subjetiva do adolescente em conflito com a lei, e não propriamente na gravidade da infração. A medida sócio-educativa não visa à punição, mas à adequação do adolescente às regras sociais. Para que possa ser aplicada, basta que haja a prática do fato definido como crime ou contravenção.
Os atos infracionais podem ser praticados tanto por criança, como por adolescentes. Às crianças aplicam-se apenas medidas protetivas. Aos adolescentes que cometem ato infracional, a autoridade judiciária pode aplicar medidas protetivas cumuladas ou não com medidas sócio-educativas, na dependência do fato praticado e da existência de situação de risco.


3.2 HIPÓTESES DE APREENSÃO DE ADOLESCENTE QUE COMETE ATO INFRACIONAL


A regra baseia-se no artigo 5º da Constituição Federal, segundo o qual "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada pela autoridade judiciária competente". citação
A tutela da liberdade, com a conseqüência limitação do poder estatal sobre status libertatis, é uma das maiores conquistas do direito moderno e dela não poderia ter-se afastado o Estatuto da Criança e do Adolescente, ao prever a possibilidade de cerceamento em caráter excepcional e taxativo. O artigo 106 afirma que "nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente".


Note-se que o dispositivo refere-se ao adolescente, deixando claro que a criança nunca pode ser privada de sua liberdade, mas, no máximo, encaminhado imediatamente para a autoridade competente como: Conselho Tutelar ou autoridade judiciária, para análise e aplicação de medida protetiva.
O adolescente pode ser privado de sua liberdade em duas únicas circunstâncias. Ou por apreensão em flagrante ou por mandado emanado da autoridade judiciária competente.
As hipóteses de apreensão em flagrante são as mesmas do artigo 302 do Código de Processo Penal:

Art. 302 - Considera-se em flagrante delito quem:
I - está cometendo a infração penal;
II - acaba de cometê-la;
III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;
IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

O artigo prevê duas espécies de flagrante, o obrigatório e o facultativo. Por flagrante, entende-se aquele praticado pela autoridade policial que, ao presenciar a prática de ato infracinal, deverá efetuar a apreensão imediata do adolescente, sob pena de prevaricação.
Todos os procedimentos afetos à Justiça da Infância e da Juventude, na área de adolescentes em conflito com a lei, são de natureza pública incondicionada, seguindo, portanto, as regras do impulso oficial e da obrigatoriedade.
De outro lado, por flagrante facultativo entende-se a apreensão feita por pessoa comum, estranha aos quadros policiais, que não tem obrigação legal de praticar o ato de restrição da liberdade.
Fora destas hipóteses, a apreensão será ilegal e poderá configurar o delito previsto no artigo 230 do Estatuto da Criança e do Adolescente, "privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à sua apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autoridade judiciária competente. Pena - detenção de seis meses a dois anos".



3.3 APURAÇÃO DO ATO INFRACIONAL


O adolescente que for apreendido pela prática de ato infracional deverá ser apresentado, imediatamente, á autoridade policial com atribuição na Comarca para formalizar o procedimento investigatório. Em seguida, constatando que o ato infracional foi praticado com violência ou grave ameaça, lavrará auto de apreensão, ouvindo-se testemunhas, e o adolescente, apreendendo, ainda, os produtos do ato infracional e os instrumentos utilizados, requisitando-se a realização de exames e perícias indispensáveis para a comprovação da materialidade do ato infracional. A autoridade policial está obrigada a comunicar o fato imediatamente à autoridade judiciária competente ? Juiz da Vara da Infância e Juventude da Comarca, bem como aos familiares do adolescente, prioritariamente os pais ou responsáveis. Todavia, se não for possível, por qualquer motivo ? falecimento, ausência ? a autoridade deve comunicar qualquer pessoa indicada pelo adolescente. Deve o adolescente ser cientificado pela autoridade dos seus direitos, inclusive de permanecer em silêncio e de conhecer os pela sua apreensão.
A autoridade policial deve analisar, após a formalização do procedimento investigatório, a possibilidade de colocar o adolescente em liberdade, entregando-o aos pais ou responsáveis, com o compromisso de comparecer ao órgão do Ministério Público em data predeterminada. Se essa for a alternativa, a autoridade policial fará com que os pais ou responsáveis, juntamente com o adolescente, se comprometam a comparecer ao Ministério Público no mesmo dia, ou no primeiro dia imediato. Como se infere, mesmo em se tratando de atos infracionais praticados com violência ou grave ameaça à pessoa, a regra é que o adolescente readquira o seu direito natural à liberdade.
Existem casos que causam clamor público, revolta, instabilidade e muita repercussão social, principalmente em face da violência empregada pelo adolescente, reveladora de extrema agressividade e insensibilidade moral para com a vítima, o que se dá, normalmente, nos atos infracionais análogos aos crimes contra a vida e contra os costumes, deve ser feita a segregação temporária do adolescente, até mesmo para salvaguardar a sua incolumidade física.
Todavia, o adolescente deverá ser apresentado ao Ministério Público pela entidade de atendimento ou autoridade policial, no prazo máximo de vinte e quatro horas, sobe pena de responsabilidade. Nesse caso, o adolescente deverá aguardar a apresentação em dependência distinta daquela destinada aos adultos.
A autoridade policial deverá representar junto ao Ministério Público pela decretação do internamento provisório do adolescente. Destarte, se tratar de um ato grave praticado com violência ou grave ameaça, o Ministério Público poderá, até antes do oferecimento da representação, requerer o internamento provisório do adolescente, e o juiz, aferindo os indícios suficientes da autoria e a prova da materialidade e adequação da medida extrema. Caso decrete o internamento, deverá estabelecer, na decisão, que o prazo máximo de cumprimento da medida não excederá quarenta e cinco dias, nos termos estabelecidos do artigo 108 do Estatuto da Criança e do Adolescente, "a internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias" .
. Período dentro do qual o procedimento judicial deverá estar concluído. Alguns julgados têm admitido certa flexibilidade, com relação ao prazo máximo estabelecido para o internamento provisório, principalmente quando a defesa, de alguma forma, concorre para a extrapolação do prazo legal.



3.4 A INIMPUTABILIDADE PENAL

A Constituição Federal traz expressamente em seu artigo 228 que são ? penalmente inimputáveis os menores dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial. O mesmo texto encontra-se presente no Código Penal Brasileiro e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
A inimputabilidade é justificada, pelo Principio do Respeito à Condição Peculiar de Pessoa em Desenvolvimento.
Toda a pessoa, enquanto viva, está em permanente desenvolvimento de sua personalidade, porém na infância e na adolescência, tal desenvolvimento é mais intenso, portanto peculiar. O estágio especial do desenvolvimento da personalidade não implica total desresponsabilização, mas sim a percepção inequívoca de diferentes níveis de desenvolvimento e, assim sendo, de diferenciados níveis de responsabilidade.
Para crianças e adolescentes até dezoito anos incompletos, o nível de desenvolvimento não permite uma responsabilização. Ou seja, o cometimento de uma infração penal não gera a imposição de nenhuma medida coercitiva propriamente dita, e sim de medida protetivas e sócio-educativas.
Em se tratando de uma conduta anti-social praticada por uma criança ou adolescente, a imposição de uma medida protetiva parece adquirir conotação pré-delituais, haja vista que, embora o Estatuto da Criança e do Adolescente tenha abandonado por completo os conceitos da Doutrina da Situação Irregular, sua justificativa assenta-se na constatação de uma situação de risco pessoal ou social da criança ou adolescente.
No caso dos adolescentes, a legislação autoriza uma cumulação de medidas sócio-educativa com medidas protetivas, quando da comprovação de autoria de ato infracional concomitante à situação de risco social e pessoal.
A medida sócio-educativa, no entanto, para ser aplicada, depende da verificação da prática de ato infracional pelo adolescente. Levando a uma responsabilização diferenciada dos maiores de dezoito anos. Significando dizer que a inimputabilidade e o Principio do Respeito à Condição Peculiar de Pessoa em Desenvolvimento não têm o condão de fazer desaparecer o poder punitivo do Estado, ou ainda autorizar uma indiferença penal diante do cometimento de ato típico e antijurídico de um adolescente, e sim de estabelecer procedimentos e regras diferenciados àqueles dos penalmente culpáveis.
A condição peculiar de pessoa em desenvolvimento dos adolescentes é o princípio que fundamenta a distinção acerca dos equipamentos adequados para execução das sanções quando o sancionado é a adolescente até dezoito anos incompletos. O texto Constitucional, especifica no artigo 5º, "a pena será cumprida em estabelecimento distinto, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado". Como também, o Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe no artigo 123, "a internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distintos daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração".
O artigo 37 da Convenção Internacional indica que a consideração da idade é elemento decisivo na execução das medidas de privação de liberdade, recomendando que, "toda criança privada da liberdade seja tratada com a humanidade e o respeito que merece a dignidade inerente à pessoa humana, e levando-se em consideração as necessidades de uma pessoa de sua idade" .


3.5 SINASE ? SISTEMA NACIONAL DE ATENDIMENTO SÓCIO-EDUCATIVO



Na perspectiva de estabelecer as diretrizes da política de atendimento ao adolescente em conflito com a lei, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê um conjunto de ações desenvolvidas e articuladas pela sociedade civil no sentido de efetivar os direitos e garantias previstos no diploma legal referido.
Em 2006, visando implementar as ações do sistema de garantias de direitos a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República e o Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente apresentaram o Sistema Nacional de Atendimento Sócio-educativo ? SINASE, fruto de uma construção coletiva que envolveu, nos últimos anos, diversas áreas de governo, representantes de entidades e especialistas na área.
O SINASE é um conjunto de princípios, regras e critérios de caráter jurídico, político, pedagógico, financeiro e administrativo que envolve, desde o processo de apuração de ato infracional, até a execução de medida sócio-educativa.
A construção do SINASE tem como referencial o enfrentamento das situações de violência, que envolvem adolescentes enquanto autores de ato infracional ou vítimas de violação de direitos. Tal sistema visa a trazer avanços não só na discussão sobre o tema, mas, principalmente, na efetivação de uma política que contemple os direitos humanos, buscando transformar a problemática atual em oportunidade de mudança. O SINASE inclui os Sistemas Estaduais, Distrital e Municipais, bem como todas as Políticas, Planos e Programas específicos de atenção ao adolescente em conflito com lei.
Os órgãos deliberativos do SINASE são articuladores da atuação das diferentes áreas da política social. Neste papel articulador, a incompletude institucional é um princípio fundamental norteador de todo o direito da adolescência que deve permear a prática dos programas sócio-educativos e da rede de serviços.
São princípios do SINASE:
? Respeitar os direitos humanos;
? Responsabilidade solidária da família, sociedade e Estado pela promoção e a defesa dos direitos da criança e do adolescente ? art. 227, CF e 4º do ECA;
? Adolescente como pessoa em situação peculiar de desenvolvimento, sujeito de direitos e responsabilidades;
? Prioridade absoluta para a criança e o adolescente;
? Legalidade;
? Respeitar o devido processo legal;
? Excepcionalidade, brevidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;
? Incolumidade, integridade física e segurança;
? Respeitar a capacidade do adolescente em cumprir a medida, a circunstância, a gravidade da infração e as necessidades pedagógicas do adolescente na medida, com preferência que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários;
? Incompletude institucional, caracterizada pela utilização do máximo possível de serviços na comunidade, responsabilizando as políticas setoriais no atendimento aos adolescentes. Assim sendo, a política de aplicação das medidas sócio-educativas não pode estar isolada das demais políticas públicas;
? Garantia de atendimento especializado para adolescentes com deficiência;
? Municipalização do atendimento;
? Descentralização político-administrativa mediante a criação e manutenção de programas específicos;
? Gestão democrática e participativa na formação das políticas e no controle das ações em todos os níveis;
? Co-responsabilidade no financiamento do atendimento às medidas sócio-educativas;
? Mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade.
O SINASE vem, finalmente, regulamentar a execução das medidas sócio-educativas, estabelecendo como deve ser feito o atendimento sócio-educativo em cada medida, geral e especificamente, tratando-a em todos os seus detalhes, desde os parâmetros pedagógicos aos arquitetônicos, especialmente no que tange às medidas privativas de liberdade.





4 AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS DE MEIO ABERTO


4.1 GENERALIDADE


Transitado em julgado a sentença procedente a representação ou homologada a transação sócio-educativa, pela qual o adolescente, seus pais ou responsável e seu defensor concordaram com aplicação de alguma medida sócio-educativa em meio aberto, o Estado estará autorizado a determinar o início do cumprimento da medida sócio-educativa aplicada na sentença ou acordo judicial. Destarte, a correta aplicação da medida sócio-educativa é fator de prevenção, pois em se tratando de uma pessoa em processo de desenvolvimento físico, moral, intelectual e espiritual, a sanção pedagógica, adequadamente aplicada, determinará o futuro do adolescente em conflito com lei.
O conteúdo da medida deve ser permeado por um atendimento que atinja não somente o adolescente em si, mas toda a sua dimensão humana, ou seja, social, psicológica e cultural. A medida sócio-educativa deve procurar tratar o problema de forma transindividual, fortalecendo os laços familiares, estimulando o adolescente na escola ou no exercício de alguma atividade laboral ou de oficinas, reinserindo-o no contexto de sua comunidade, aumentando assim, a sua auto-estima e despertando outros valores de cidadania, como solidariedade, afeto, honestidade, sociabilidade, respeito. Por fim, a medida reclama a interação de diferentes órgãos ou segmentos da sociedade como Poder Judiciário, Ministério Público, Polícia, cultura, esporte, organizações não governamentais, entidades de educação e saúde, todas as instituições comprometidas com os interesses relativos à criança e ao adolescente, para a efetiva sócio-educação do adolescente em conflito com a lei.
O Estatuto da Criança e do Adolescente permite uma ampla participação da sociedade civil na sócio-educação dos adolescentes em conflito com a lei. Experiências bem sucedidas realizadas em diversos pontos do país demonstram claramente que uma aplicação correta das medidas sócio-educativas, feita em conjunto com os familiares do adolescente, com a comunidade e com as organizações não-governamentais, resulta em redução significativa da prática de atos infracionais. Tanto é assim, que segundo dados dos CONANDA, o índice de novas práticas de atos infracionais, por adolescentes já submetidos às medidas sócio-educativa, incluindo internação, perfaz setenta e cinco por cento, enquanto no sistema carcerário, quarenta e sete por cento de todos os egressos voltam a infracionar.
As medidas sócio-educativas, portanto, devem pautar-se fundamentalmente, na adoção pedagógica de mecanismos de inclusão social, que seja capaz de penetrar, no adolescente ainda em formação, valores, ampliando os seus horizontes, criando assim, expectativas de um futuro melhor. Ressaltando as suas potencialidades, que ficaram esquecidas diante da vida dura e desumana que o fez esquecer de "ser" e o obrigou a lutar para "sobreviver". Este, sem dúvida, é o grande desafio dos juízes, promotores, equipe interdisciplinar e de todos os que trabalham com a sócio-educação de adolescentes em conflito com a lei: resgatar esse adolescente, impedindo assim que ingresse a fileira dos penalmente culpáveis. As medidas sócio-educativas aplicadas aos adolescentes podem ser cumuladas com outras medidas protetivas, desde que sejam compatíveis e adequadas.
Note-se que é comum a aplicação de uma medida de internação, cumulada com uma medida protetiva de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos, mormente quando o adolescente cometeu ato infracional grave, mediante violência ou grave ameaça e se encontra envolvido com uso ou tráfico de drogas, muitas vezes já figurando como dependente químico, necessitando, assim de um tratamento de desintoxicação, para que possa receber a devida orientação pedagógica que o auxiliará a se afastar do mundo da prática reiterada de atos infracionais, trabalhando a sua inclusão social. Constituem medidas sócio-educativas de meio aberto: Advertência; Reparação do Dano; Liberdade Assistida e prestação de Serviço a Comunidade.


4.2 ADVERTÊNCIA

A medida sócio-educativa a advertência é destina ao adolescente que praticou um ato infracional de menor potencial ofensivo, ou seja, praticou um ato infracional de pouca lesividade ou de natureza leve, que merece uma reprovação mais branda. Entende-se que o ato de advertir, admoestar está inserido uma relação de poder, objetivando, em última análise, orientar ou conduzir o adolescente em conflito com a lei a redirecionar o seu comportamento para o modelo exigido pelo sistema social dominante. Constitui uma das medidas sócio-educativas mais tradicionais da história do Brasil, pois já era prevista no Código de Melo Matos.
Impõe-se que o magistrado não banalize ou minimize o caráter sancionatório e sócio-educativo da advertência, sob pena de não produzir os efeitos almejados, sobretudo quando se trata de adolescente que mantém o primeiro contato com o Poder Judiciário. Algumas vezes, a forma hostil, agressiva ou constrangedora verificada na aplicação da medida sócio-educativa pode levar a resultados indesejáveis, graves e, eventualmente, irreversíveis. Essa simplificação ou banalização da advertência e de seus efeitos será um equívoco tanto mais grave quanto mais frágil e sensível for a estrutura psicológica e quanto mais problemática for a situação vivenciada pelo adolescente.
Destarte, que o magistrado tenha plena consciência da importância da adequada aplicação da medida e se posicione em conformidade com as exigências pedagógicas da medida. Com efeito, não há necessidade de agressividade ou hostilidade em relação ao adolescente em conflito com a lei, mas de forma serena e comedida levar o adolescente a refletir sobre o ato infracional, mostrando os desdobramentos possíveis e enfatizando a necessidade de percorrer caminhos que o façam crescer como pessoa.
A medida sócio-educativa só deve ser aplicada quando houver indícios suficientes de autoria e prova da materialidade do ato infracional. O eminente jurista Paulo Lúcio Nogueira, em sua conhecida obra, afirma que com relação à medida sócio-educativa da advertência, "a advertência é a primeira medida prevista a ser aplicada ao adolescente que pratique ato infracional, mas independe de prova de autoridade e da materialidade para ser imposta".
Não obstante, esse posicionamento do notável magistrado e jurista, vai de encontro com todas as garantias processuais e constitucionais, ferindo assim os mandamentos do texto constitucional. Não se pode olvidar do caráter sancionatório da advertência, muito embora prepondere o seu conteúdo pedagógico, sendo certo que, no âmbito de um Estado Democrático de Direito, a interferência estatal na esfera individual só se justifica ou só se legitima, nos casos previamente estabelecidos em lei, desde que haja justa causa e se observe os princípios da presunção da inocência, ampla defesa e contraditório.


4.3 REPARAÇÃO DO DANO


Toda vez que o ato infracional praticado pelo adolescente acarretar prejuízos com reflexos patrimoniais, juiz poderá aplicar a medida sócio-educativa de obrigação de reparação do dano.
Entende-se que medida reparação de danos pode ser aplicada na remissão clausulada, no âmbito da justiça consensualizada, principalmente quando há consenso com relação ao ressarcimento dos danos causados pelo ato infracional, seja material ou moral. Evidentemente que essa medida não será destinada à maioria esmagadora dos adolescentes em conflito com a lei, oriundos, principalmente, de lares desafortunados, desestruturados, sem quaisquer condições de arcar com algum prejuízo, tendo em vista que compõem a grossa fileira dos o excluídos e miseráveis que sobrevivem à margem da sociedade tão desigual.
Não resta a menor dúvida que esta medida visa, precipuamente,a atender os interesses da vítima, em face do prejuízo causado pela prática do ato infracional. A obrigação de reparar o dano é uma medida sócio-educativa aplicada ao adolescente, mas que por via da representação (culpa in vigilando), quem acaba respondendo pela sanção é o representante legal. O que se apresenta como um contra senso, pois a medida sócio-educativa só deve ser aplicada ao adolescente que praticou determinado ato infracional, não devendo se estender a outras pessoas, sob pena de ferir o princípio da intranscendência um dos princípios constitucionais da pena no processo penal, e que tem perfeita aplicação na seara do Estatuto da Criança e do Adolescente, de sorte que somente aquele adolescente a quem se atribui a prática doa ato infracional é que, de fato, poderá suportar os efeitos da imposição coercitiva da medida de reparação de danos.
Evidentemente que a maioria dos casos referir-se-ão aos casos de atos infracionais análogos aos crimes patrimoniais, como furto, apropriação indébita, roubo, dentre outros, mas também podem ocorrer em atos infracionais similares a lesões corporais, homicídio, crimes contra a honra, ou, mesmo, o caso de lesões culposas ou homicídio culposo decorrente de acidente de veículo provocado por adolescente que ainda não tenha completado dezoito anos, capaz, portanto, de gerar prejuízos de caráter material, danos emergentes e lucros cessantes, como danos de natureza moral.
Não se pode impor aos responsáveis do adolescente, no âmbito da Justiça da Vara da Infância e Juventude, o ressarcimento dos danos com fundamento na culpa in vigilando. A justiça da infância e juventude, no que toca à prática de atos infracionais, não julga atos de adultos, mas o ato infracional imputado ao adolescente é que poderá ensejar a aplicação de uma medida sócio-educativa.
Nada impede, ao contrário, recomenda-se que a questão da responsabilidade civil seja buscada através de via própria, ou seja, a jurisdição cível. É bem possível, entretanto, que ainda na fase pré-processual, proposta de remissão clausulada com reparação de danos feita pelo Ministério Público, os responsáveis legais pelo adolescente intervenham, no sentido de compor o litígio, assumindo o compromisso de ressarcir o prejuízo causado pelo adolescente, mas aí não haverá imposição coercitiva da medida e sim consenso. Observa-se que esta medida vem sendo aplicada, reiteradamente, por vários juízes, nos casos de pichadores de prédios públicos, principalmente em se tratando de adolescentes de classes altas, o que não deixa de ter certa eficacidade, no sentido de exigir que o adolescente desfaça o que não deveria fazer, obrigando-o a refletir sobre o ato que praticou; entretanto, o juiz deve analisar cada caso e evitar os excessos que possam submeter o adolescente a situação de extrema humilhação ou constrangimento, capaz de ferir o princípio da dignidade humana.
Finalmente, quando se tratar, por exemplo, de atos infracionais similares a furto, roubo, apropriação indébita, a simples devolução da res furtiva ou objeto do ato infracional já satisfaz às exigências do cumprimento da medida de reparação de danos. Não sendo possível o cumprimento da medida por qualquer motivo, a alternativa é substituir a medida por outra que possa ser aplicada, efetivamente, adolescente.
4.4 PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE


Constitui uma das principais medidas cumpridas em meio aberto pelo adolescente. Consiste na prestação de serviços a entidades hospitalares, assistenciais, educacionais e congêneres, por período não superior a seis meses, e visa, fundamentalmente,a aferir o senso de responsabilidade do adolescente e sua aptidão para cumprir a medida em meio aberto, ou seja, o adolescente continuará estudando ou trabalhando, normalmente, convivendo na sua comunidade junto com seus familiares e amigos. Essa medida deve ficar a cargo de alguma entidade responsável pela sua execução, que possua uma estrutura física adequada, composta por uma equipe interdiciplinar, que faça o devido acompanhamento do adolescente no andamento do cumprimento da medida sócio-educativa.
A coordenação pedagógica juntamente com equipe interdisciplinar deve fazer um diagnóstico do adolescente, procura compatibilizar o horário do cumprimento da medida com as atividades educacionais ou laborativas do educando e remeter periodicamente, relatórios circunstanciados sobre a situação do adolescente.
A prestação de serviço à comunidade, como já á dito anteriormente, deve ser oferecida ao adolescente, conforme suas aptidões, nível de instrução ou formação, de sorte a não perder o caráter pedagógico e se transformar numa mera expiação, submetendo o adolescente, ainda em formação, a situação de constrangimento.
Na verdade, a medida sócio-educativa de prestação de serviço a comunidade guarda coerência com a corrente minimalista, que prevê a intervenção mínima do Estado na esfera individual do adolescente a quem se atribui a prática do ato infracional.
Como enfatizado no início, o sucesso da medida depende da existência de uma entidade de execução de medidas sócio-educativas em meio aberto que, com sua equipe interdisciplinar e toda a sua estrutura, possa estudar cada caso, conhecer a história do adolescente em conflito com a lei, e a de sua família, distribuir adequadamente as tarefas em conformidade com suas aptidões, acompanhá-las, fiscalizá-las, remeter a Vara da Infância e Juventude os relatórios circunstanciados periodicamente.
Nessa perspectiva, atuando diretamente na raiz do problema, estimulando a auto-estima do adolescente ainda em desenvolvimento, introjetando regras mínimas de convivência social e fortalecendo os vínculos familiares, é de se esperar que o adolescente que eventualmente cometeu algum ato infracional possa redirecionar seus passos para o exercício da cidadania.


4.5 LIBERDADE ASSISTIDA


A medida sócio-educativa liberdade assistida esta prevista nos artigos 118 e 119 do Estatuto da Criança e do Adolescente e constitui, sem dúvida, a principal medida de cunho eminentemente pedagógico, pois, sem que o adolescente em conflito com lei perca a sua liberdade, submete-se construção de um verdadeiro projeto de vida permeado pela liberdade, voluntariedade, senso de responsabilidade e controle do poder público. A medida se reveste, normalmente, de caráter compulsório, pois o juiz, no âmbito do processo de conhecimento, aplica a medida que lhe parecer mais adequada, para aquele caso concreto, de conformidade com as provas e demais dados constantes dos autos, relatório de equipe interdisciplinar, depoimentos e demais documentos, levando em consideração a gravidade do fato, as circunstâncias, as aptidões ou as condições pessoais do adolescente, bem como as condições de cumpri-la, podendo este, através de seu representante legal, recorrer da decisão. É de se ver, entretanto, que a medida pode ser aplicada no âmbito da justiça consensualizada, quando vier acompanhada de uma remissão clausulada. Na verdade, seja compulsoriamente, seja consensualmente, a liberdade assistida, na sua executoriedade, exige a voluntariedade do adolescente e de seus familiares, no sentido de que se estabeleça um vínculo de responsabilidade com os sócio-educadores.
Nesse sentido, após o estudo do caso pela equipe interdisciplinar da instituição responsável pela execução da medida, é imperativo que, conhecendo a história do adolescente, os sócio-educadores, permita que o adolescente contribua no planejamento do cumprimento de sua medida, ouvindo suas necessidades, suas angústias, suas metas de vida, seus relacionamentos na família e na comunidade, enfim, seus anseios, ajustando, assim, a medida a ser executada de acordo com as condições pessoais do adolescente, objetivando, sempre, a superação de conflitos familiares e comunitários, de sorte a reunir as condições para o cumprimento eficaz da medida sócio-educativa.
A liberdade assistida, pelo menos no seu aspecto estrutural, já era conhecida da legislação "menorista" e identificada como "liberdade vigiada" no Código de Mello Matos, de 1927, já no Código de Menores de 1979 modificou a nomenclatura para "liberdade assistida", mas, sem perder as características essenciais de uma medida repressiva, sem qualquer conteúdo pedagógico, pois alcançava o "menor com desvio de conduta". Os adolescentes eram vigiados e fiscalizados, nos mesmos moldes do que acontece com o imputável em relação ao sursis, sem que houvesse um programa de atendimento ou instituição responsável para promover ou orientar, socialmente, o adolescente, no sentido de afastá-lo do mundo da criminalidade, oportunizando-lhe ou criando condições para a sua reinserção social.
O objetivo era só vigiar, fiscalizar, reprimir, restringir, transportando o conteúdo do direito penal para a justiça diferenciada da infância e juventude, sem levar em conta a condição do adolescente de pessoa em desenvolvimento.
A liberdade assistida, no formato concebido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, foi inspirada nas regras de Beijing ? Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores, cuja resolução foi aprovada na cidade de Beijing, China, em 18 de maio de 1984 e previa a liberdade assistida como uma medida alternativa à institucionalização do adolescente em conflito com a lei. Estabelece o artigo 18.1, b da referida resolução:

Art. 18.1uma ampla variedade de medidas deve estar à disposição da autoridade competente, permitindo a flexibilidade e evitando ao máximo a institucionalização. Tais medidas, que podem algumas vezes ser aplicadas simultaneamente, incluem: a liberdade assistida.

O sistema de aplicação de medidas sócio-educativas do Estatuto da Criança e do Adolescente é diferenciado do sistema adotado pelo Código de Penal, pois não estabeleceu para cada infração um tipo penal, uma sanção correspondente, transferindo, o legislador, para o juiz, considerável carga de discricionariedade, no sentido de encontrar a medida adequada para determinado caso concreto, sem estabelecer parâmetros objetivos para tanto. O sistema do Estatuto da Criança e do Adolescente é fluido, flexível e pode comportar a aplicação de medidas desproporcionais e injustas, capazes de comprometer a própria segurança jurídica, principalmente quando o magistrado encarna o perfil do juiz positivista - legalista do direito penal.
O juiz, ao sentenciar o adolescente em conflito com a lei, poderá aplicar a liberdade assistida em qualquer ato infracional, mesmo naqueles análogos aos crimes de grande potencial ofensivo, como homicídio, roubo, dentre outros, desde que, consideradas as demais circunstâncias e a condição pessoal do adolescente, seja a medida mais apropriada para aquele caso, pois não há, como se vê, qualquer vedação legal. O objetivo da sanção educativa não é, simplesmente, a expiação, embora não se negue a carga retributiva da medida. Nem sempre a gravidade do ato infracionalb cometido impõe a aplicação da medida excepcional do internamento ou semiliberdade, pois o fato pode ter sido isolado na vida do adolescente, o qual pode reunir condições de cumprir a medida em meio aberto. Essa medida se nos afigura como a mais importante do Estatuto da Criança e do Adolescente, pois, além da forte carga pedagógica que acompanha, mantém o adolescente no seu status natural ? liberdade ? convivendo, normalmente, com a sua família e seu meio social, o que contribui, decisivamente, para sua reeducação, como sustenta a professora Martha Toledo no livro A Proteção Constitucional de Crianças e Adolescente e os Direitos Humanos:

[...]a interação do adolescente com o meio social na sua condição de normalidade do relacionamento humano (o que não se dá no cárcere) também potencializa a possibilidade de o adolescente modificar seu comportamento anterior, para ajustá-lo às regras do convívio social.

Aplicação da medida sócio-educativa liberdade assistida passa, necessariamente, pela existência de uma instituição responsável pela sua execução que possua uma estrutura física e humana capaz de prover, socialmente, o adolescente e sua família, fortalecendo os laços de afetividade, orientando-o e inserindo-o em programas de auxílio à família do adolescente, incluindo-a em programa de auxílio, como programa de emprego e renda, casas populares, entre outros, supervisionando a freqüência e o aproveitamento escolar do adolescente.
Torna-se imperioso que a instituição faça um trabalho de conscientização e de parceria com as Secretarias de Educação e de Saúde do município e com outros órgãos, no sentido de assegurar o atendimento prioritário do adolescente em conflito com a lei, como preceitua o dispositivo constitucional. Entende-se que a questão envolvendo adolescente em conflito com a lei, transcende a questão meramente jurídica, pois a solução do problema é de ordem multidisciplinar, exigindo a concorrência de outras áreas do conhecimento humano, como psicologia, antropologia, assistência social, pedagogia, enfim, o juiz deve se valer de subsídios fornecidos por uma equipe interdisciplinar, no sentido de encontrar a medida mais adequada.
O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que o prazo mínimo para cumprimento da liberdade assistida será de seis meses, admitindo-se a sua prorrogação, o que sugere a idéia inicial de que o prazo é indeterminado. Impõe-se, de logo, afastar essa assertiva, pois se a legislação penal brasileira não admite prisão perpétua, a medida liberdade assistida prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, por se tratar de uma sanção sócio-educativa aplicada a uma pessoa em desenvolvimento, não pode ter caráter perpétuo, indefinido.
O fato da medida sócio-educativa liberdade assistida, semiliberdade e internação não comportar prazo determinado, não induz, necessariamente, a pensar que não possa ter uma duração máxima. Com efeito, consoante o disposto no parágrafo terceiro do artigo 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente sócio-educativa do internamento não comporta prazo determinado, mas o período máximo de internamento não excederá o prazo de três anos. Ora, na medida mais grave o prazo máximo não poderá ultrapassar três anos, por uma interpretação analógica, entende-se que a medida de liberdade assistida não poderá exceder três anos, devendo o adolescente ser avaliado, periodicamente, no sentido de aferir a possibilidade de se desligar do programa de atendimento, antes de completar período máximo permitido, ou até que venha a completar 21 anos de idade, quando então o desligamento é compulsório. A professora Martha Toledo de Machado partilha desse mesmo entendimento, como se pode depreender:

O juiz deve simplesmente fixar qual sanção incide no caso concreto, escolhendo, por exemplo, entre a liberdade assistida, a semiliberdade ou a internação. Mas a lei não impõe que ele concretize, delimite, na sentença, a duração da sanção escolhida. Ao contrário, a lei estabelece que esta sanção não comporta prazo determinado. O que a lei faz é impor o prazo máximo de duração de cada sanção cominada e impor a reavaliação da necessidade de manutenção da sanção periodicamente.
O prazo máximo cominado em lei é de três anos, em relação a todas essas três sanções. Em relação à internação e à semiliberdade. Já em relação à liberdade assistida, por aplicação analógica do mesmo dispositivo, já que não há norma específica e a Constituição Federal, por força da reserva legal, impede a existência de pena completamente indeterminada, para considerar o mínimo do conteúdo da reservar legal, e a sanção sócio-educativa não deixa de contemplar, em boa medida, esse caráter de pena.

Dessa forma, baseando-se em experiências bem sucedidas, entende-se que a liberdade assistida é, de fato, a principal medida pedagógica do Estatuto da Criança e Adolescente, quando aplicada de maneira acertada.





5 A MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA LIBERDADE ASSISTIDA ? UM AVANÇO SOBRE A MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE INTERNAÇÃO


5.1 A PREVALÊNCIA DA SÓCIO-EDUCAÇÃO SOBRE OS ASPECTOS MERAMENTE SANCIONATÓRIOS


A sanção sócio-educativa tem finalidade pedagógica, em uma proposta de sócio-educação. Não há, porém sendo sanção, deixar de lhe atribuir natureza retributiva, na medida em que somente ao adolescente que cometeu ato infracional se lhe reconhece aplicação.
Como preconiza as Regras de Beijing, estas sanções levam em conta as necessidades do adolescente a que se lhe aplica, mas também a necessidade da própria sociedade, eis que se constitui em um mecanismo de defesa social, na medida em que afirma que a resposta à infração será sempre proporcional não só ás circunstâncias e à gravidade da infração, mas também a situação de vulnerabilidade e necessidades do adolescente em conflito com a lei.
Faz-se elementar a inclusão do conjunto das medidas sócio-educativas entre os mecanismos disponibilizados pelo Estado para o controle social. Como leciona, Warat, "toda sociedade controla mediante gratificações e punições o comportamento de seus membros para conseguir que realizem as condutas socialmente desejadas e evitem as negativamente valoradas".
A medida sócio-educativa é uma resposta do Estado diante de um fato a que a lei define como crime ou contravenção.
Nesse aspecto, embora penalmente inimputável à luz da legislação penal, faz-se o adolescente em conflito com lei responsabilizável em face do Estatuto da Criança e do Adolescente.
A natureza retributiva, com finalidade pedagógica, contida na medida sócio-educativa, decorre da própria sistemática adotada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente com fundamento na Doutrina da Proteção Integral.
Mesmo sendo sanção, prevalece o caráter educativo, inserido nas medidas sócio-educativas, destinada ao adolescente em conflito com a lei, eis que, por mandamento constitucional, os adolescentes com idade inferior a dezoitos anos ficam sujeitos às normas da legislação especial. Entenda-se, sujeitos às sanções que a legislação especial se lhes reserva em face de sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, de modo que não se pode confundir a inimputabilidade penal com impunidade. Nesse aspecto, insere-se a medida sócio-educativa, o caráter restaurador da condição cidadania do adolescente.


5.2 A MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA E O DESAFIO DE EDUCAR O ADOLESCENTE


É absolutamente relevante abordar as medidas sócio-educativas em sua dimensão educacional. E, como ponto de partida, é necessário discriminar as medidas de meio aberto e de privação da liberdade. A diferenciação entre as medidas é bastante importante naquilo que se propõe de individualização dos adolescentes e da finalidade de cada uma delas. É importante diferenciar as medidas de meio aberto e as de privação de liberdade, pois o adolescente é colocado, em cada uma delas, em situação absolutamente diferente no que se refere ao exercício, de um valor básico, universal da humanidade: a liberdade.
As medidas de meio aberto têm uma característica fundamental e óbvia: não retirar o adolescente do convívio social; pretendendo que ele se organize em um padrão de conduta no presente e elabore um projeto de percurso existencial de ruptura com a prática do ato infracional. Esta é a finalidade da medida atribuída, da aplicação da lei: a tentativa de garanti os padrões de convivência coletiva.
Essa finalidade só pode ser obtida, junto ao adolescente em conflito com a lei, em um processo educacional que considere as características do adolescente como ponto de partida e os objetivos propostos pela a equipe interdisciplinar da instituição que irá assisti-lo no cumprimento da medida sócio-educativa. A educação implica em objetivos e finalidades de ruptura com a prática do ato infracional, e consistindo na construção de novos objetivos: profissionalizar o adolescente e colocá-lo no mercado de trabalho ou criar condições objetivas para que o adolescente construa um projeto de vida autônomo, decida sobre o seu destino. Isso revela concepções diferentes quanto ao adolescente no presente e no futuro. E esses só são atingidos em um processo planejado e organizado que parte do presente do adolescente. Como vive? Quais são suas necessidades? E seus conflitos? Quais são seus compromissos com a criminalidade, com as drogas? São muitas as perguntas no momento de conhecer o adolescente para empreender a jornada que se realiza no encontro entre sócio-educador e sócio-educando.
Vale ressaltar, que é necessário entender que a educação implica em uma relação compartilhada entre sócio-educador e sócio-educando; uma relação de acolhimento, em que cada um tem importância para o outro. È nessa relação que as palavras, as coisas têm e ganham significados no processo de aprendizagem. Portanto, não adiantam projetos, propostas se na relação não há investimento, não há crença na capacidade de mudança; é na relação dialógica que os conteúdos éticos, intelectuais, afetivos, instrumentais são transmitidos e assimilados. E quem deve conquistar o sócio-educando para essa jornada é o sócio-educador. Restaurar e fortalecer a capacidade humana que implica um conjunto de experiências gratificantes que podem ser iniciadas ou retomadas.
Essa concepção que torna a experiência educacional algo importante na vida do adolescente, não deve produzir o equívoco de conceber o projeto de executor das medidas de meio aberto como concentrador de todas as ações necessárias para supri a vasta gama de necessidades do adolescente. O projeto é uma referência, um ponto de ancoragem que irá auxiliar e viabilizar sua inserção e trânsito nos diferentes equipamentos educacionais, culturais, de saúde, esportivos dentre outros. Para isso, o projeto executor da medida deve estar situado em uma rede de serviços e equipamentos públicos e privados, uma rede de retaguarda, o que garante o fundamento da incompletude institucional.
O aprendizado do exercício dos direitos de cidadania ocorre na inserção do sócio-educando nos espaços de convivência, no transito e uso dos equipamentos e serviços da comunidade. Nesse sentido as instituições que executam as medidas de meio aberto devem evitar o máximo realizar todas as atividades sócio-educativas no seu espaço, pois a instituição não pode suprir sozinha as necessidades do sócio-educando.
As medidas de meio aberto são alternativas preciosas à medida de privação de liberdade. Por isso, o empenho para que elas dêem certo com projetos bem realizados, para cada um dos sócio-educandos atendidos. As instituições que realizam atividades meramente burocráticas que se caracterizam apenas pela interpretação da medida pouco funcionam e em raros casos obtêm sucesso.


5.3 PROGRAMA DE APOIO A EXECUÇÃO DAS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS DE MEIO ABERTO NO MUNICÍPIO DE VITÓRIA DA CONQUISTA


A Constituição Federal de 1988 reconhece a importância do Município como base de sistema federativo. Como resultado dessa política, afastou o governo federal do exercício das funções especificas da administração municipal, que ganharam importância dentro do sistema federativo em face da descentralização político-administrativa ampliando sua autonomia. Diante dessa postura o município é considerado uma entidade político-administrativa e não mais uma entidade meramente administrativa.
A descentralização político-administrativa gerou a conseqüente municipalização das ações relativas à criança e ao adolescente, prescrita na Constituição Federal. Tendo grande relevância, no tocante a execução de medidas sócio-educativas de meio aberto, pois o município passa a ser a fonte primária dessas ações. Nesse sentido, esclarece Amaral Cury:

É no município que se desenvolve e estão implantas as necessárias redes de atendimento que servem de suporte para as medidas sócio-educativas em meio aberto. È também do município com as suas estruturas e recursos locais, costumes e tradições, que se pode avaliar a maior e melhor adequação dos hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, às exigências pedagógicas do adolescente em conflito com a lei, submetido à medida sócio-educativa de prestação de serviço a comunidade. Da mesma forma, é somente no município, dotado de perfil próprio de condições de escolaridade e cultura, família, sociabilidade e trabalho, que poderá surgir a figura ideal do orientador prevista e exigida para o êxito da medida sócio-educativa de liberdade assistida.

O município tem como compromisso de executar as medidas sócio-educativas em meio aberto, com o assessoramento do Estado em uma proposta de cooperação técnico-financeiro. Trata-se de um, reordenamento institucional com implicações nas ações desenvolvidas pelo município com alusões ligadas à sua operacionalização.
No entanto, o município de Vitória da Conquista ainda não assumiu diretamente a sua função político-administrativa, pois quem executa as medidas de meio aberto, especificamente as medidas sócio-educativas de prestação de serviço a comunidade e liberdade assistida, é uma organização não governamental, financiada pela FUNDAC, uma fundação estatal, não existindo, assim, nenhum investimento por parte do município.


5.3.1 PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PARA A VIDA ? PEV


Associação de Educação para a Vida ? ASSEV, conhecida como PEV ? Programa de Educação para a Vida, é uma organização não governamental, sem fins lucrativos ou comerciais, existente desde 1995, cuja missão é contribuir para a melhoria da qualidade dos serviços públicos de atenção à saúde e à educação da comunidade de Vitória da Conquista.
As atividades desenvolvidas pela organização são em diversas áreas como: saúde, educação, meio ambiente, e especificamente o protagonismo juvenil.
Em janeiro de 2006 o PEV ? Programa de Educação Para a Vida, deu inicio ao Projeto Viver Amigo, financiado pela Petrobrás, através do COMDICA. O projeto tem como objetivo atender os adolescentes em conflito com a lei no município de Vitória da Conquista, executando as medidas sócio-educativas de meio aberto, especificamente, liberdade assistida e prestação de serviços comunidade.
O Projeto Viver Amigo é composto por uma coordenação pedagógica e uma equipe interdisciplinar, formada por: assessoria jurídica, pedagógica, psicológica, assistência social e educadores de mais áreas, como também, orientadores sociais voluntários, que são pessoas da comunidade que se dispõe a acompanhar o adolescente no cumprimento da medida liberdade assistido. A figura do orientador voluntario é prevista no Estatuto da Criança e a Adolescente, e segundo a equipe interdisciplinar do Projeto Viver Amigo, é de fundamental importância no processo sócio-educacional dos adolescentes em conflito com a lei, pois confirma o trabalho desenvolvido pela equipe interdisciplinar, no tocante a reinserção social dos adolescentes acompanhado pelo projeto.
Atualmente, são acompanhados pelo projeto, cerca de noventa adolescentes em cumprimento de medidas sócio-educativas em meio aberto. O modelo de atendimento adotado para a execução da medida sócio-educativa liberdade assistida, consiste primeiramente no acolhimento do adolescente encaminhado pelo juiz da Vara da Infância e Juventude ou pelo Promotor de Justiça da Infância e Juventude, por um dos sócio-educadores da pedagogia. Posteriormente o adolescente acompanhado do seu representante legal, são submetidos a uma entrevista inicial, na qual são colhidas informações necessárias para o atendimento, como também realizada a interpretação da medida sócio-educativa, por um dos sócio-educadores da equipe de assessoria jurídica, e encaminhado para os atendimentos de psicologia e com assistente social; inserção na oficinas pedagógicas e grupos terapêuticos.
O próximo passo consiste na formação do PIA - Plano Individual de Atendimento. O PIA é um instrumento de registro, acompanhamento e planejamento que visa conhecer a história do sócio-educando e as necessidades a serem trabalhadas. Também são realizados estudos de casos, objetivando avaliar o aproveitamento do sócio-educando no cumprimento da medida sócio-educativa, analisando suas necessidades e as medidas a serem tomadas.
São realizadas pelos sócio-educadores da equipe de assistência social, visitas domiciliares, com o intuito de conhecer o convívio familiar e comunitário do adolescente, mensalmente é realizada um encontro com as famílias dos sócio-educandos, onde são trabalhada questões relativas as dificuldades de convivência e as contribuições que a família pode propiciar ao sóscio-educando no processo sócio-educacional.
Em três anos de existência do Projeto Viver Amigo, já foram acompanhados cerca de cento e cinqüenta e sete adolescentes, tendo até o atual momento, setenta e cinco por cento de adesão ao projeto.


5.3.2 QUEM SÃO OS ADOLESCENTES QUE CUMPREM - MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA, LIBERDADE ASSISTIDA EM VITÓRIA DA CONQUISTA?


Em pesquisa realizada no PEV- Programa de Educação Para a Vida, sobre os adolescentes que cumpriram e ainda estão cumprindo a medida sócio-educativa, liberdade assistida, tem-se as seguintes informações: 92% dos adolescentes que recebeu a referida medida, são do sexo masculino, enquanto apenas 8% do sexo feminino. A idade predominante dos adolescentes em cumprimento de medida sócio educativas é dezessete anos, sendo o percentual de 48% dos adolescentes; 67% dos adolescentes acompanhados fizeram ou faz uso de alguma droga lícita ou ilícita, dentre elas: álcool, cigarro, maconha, crak, cocaína e tiner; 78% cumpriram ou estão cumprindo a primeira medida sócio-educativa. Vide anexo 1.
No que consiste à prática de ato infracional entre os adolescentes acompanhados pelo Projeto Viver Amigo, pode se observar que em primeiro lugar, estão os atos infracionais análogos aos crimes contra o patrimônio, roubo e furto, apresentando o percentual de 58%. O ato infracional análogo ao tipo porte de arma de uso permitido, também tem um percentual significativo de 23%, tendo em vista que, a prática dos atos infracionais furto e roubo, têm um liame com a prática do ato infracional porte de arma, pois em regra a arma é utilizada como meio para praticar os atos infracionais análogos aos crimes contra o patrimônio. Os atos infracionais análogos ao tráfico e uso de drogas e os crimes contra a vida, aparecem também como os mais cometidos pelos adolescentes assistidos pelo Projeto Viver Amigo, apresentando o percentual entre 10% e 8%. Vide anexo 2.











































CONSIDERAÇÕES FINAIS


Apesar dos avanços obtidos até aqui, a implementação das medidas sócio-educativas, em especial as de meio aberto, continua a ser o "calcanhar de Aquiles" do Estatuto da Criança e do Adolescente. As mudanças de conteúdo, de método e de gestão requeridas nas políticas de segurança pública, no Ministério Público, na Defensoria e na Justiça da Infância e da Juventude ainda não foram efetivadas de fato. Enquanto isso, o sistema de execução das medidas passa por inúmeras mudanças, que permanecem muito aquém do que a realidade necessita e requer.
Em termos de conteúdo, há que substituir as práticas assistencialistas e repressivas por um modelo garantista, capaz de trazer as conquistas do estado democrático de direito para o interior do sistema de administração da justiça juvenil.
Em referência ao método, deve se lembrar de que não estamos diante de infratores que por acaso são adolescentes, mas diante de adolescentes que por circunstâncias se envolveram na prática de atos infracionais. Portanto, tudo que serve para trabalhar com adolescentes servem para trabalhar com adolescentes em conflito com a lei.
No que diz respeito à gestão, cabe lembrar que o sistema de execução das medidas sócio-educativas é parte co-constitutiva do Sistema de Justiça. Em razão disso, deve ser estruturado como uma política pública no sentido mais amplo e profundo do termo. Infelizmente, isso não tem ocorrido. O atendimento ao adolescente em conflito com a lei é uma terra de ninguém, um terreno baldio entre as áreas de justiça, segurança pública e assistência social, e cada uma delas espera que as outras cumpram o papel de fazer o que precisa ser feito sem, de fato, assumir seus deveres e obrigações institucionais em relação a esse segmento da população juvenil.
Por fim, entende-se que a execução das medidas sócio-educativas requer a participação da sociedade como um todo. E no que tange às medidas de meio aberto, especificamente a liberdade assistida, é preciso que haja a municipalidade desenvolvendo e executando programas de sócio-educação, capacitados, que primam pela interdisciplinaridade das atividades do programa de sócio-educação, assim, juiz, promotor de justiça, advogado, pedagogo, assistente social, educador social e demais áreas, todos devem estar imbuídos do processo sócio-educativo redirecionando os valores dos adolescentes em conflito com a lei, garantindo uma execução de medidas sócio-educativas eficaz, alcançando os objetivos sócio-educacional.
Nesse sentido, embasado nas experiências bem sucedidas, conforme demonstrado no conteúdo deste trabalho, o modelo de execução adotado pelo Projeto Viver Amigo, revelou-se que a liberdade assistida é, de fato, a principal medida sócio-educativa do Estatuto da Criança e do Adolescente, quando aplicada, criteriosamente, por uma equipe interdisciplinar, constituindo-se numa das grandes alternativas direcionada ao adolescente em conflito com a lei.


























REFERÊNCIAS



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BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente, lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.

BRASIL. Código de Processo Penal, Lei nº 3.689 de 03 de outubro de 1941.

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CURY, Amaral e Silva. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo: Malheiros, 1992.

MACHADO, Martha de Toledo. A Proteção Constitucional de Criança e Adolescentes e Direitos Humanos. Barueri-SP: Manole, 2003.

NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Estatuto da Criança e do Adolescente, São Paulo: Saraiva, 1991.

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PEV - Programa de Educação para a Vida. Bahia. Disponível em:
< http://www.pev.org.br/> Acesso em: 18 de abril. 2009

Universidade de São Paulo. Possíveis aspectos motivadores que induzem a prática de atos infracionais, Núcleo de Estudos da Violência, 2008.
VERONESE, Josiane Rose Petry. Direito da Criança e do Adolescente. Santa Catarina, OAB/SC, 2006.
WARAT. Luis Alberto. Introdução Geral ao Direito, Porto Alegre ?RS, Editora - EDUNISC, 2000.