Dias destes procurei em meu corpo alguns indícios de escamas, em virtude de alguns simpatizantes do evolucionismo terem afirmado – e aceito por milhões – que no início da vida havia desordem biológica, com seres unicelulares, os protozoários, em meio ao caos reinante. Só mais tarde, devido à ousadia de espécimes mais evoluídos durante milhões de anos, a esta altura já transformados em seres multicelulares, alguns começaram a se destacar, como o atrevido ser de minha história. Sim, um dos representantes da evolução, certamente cansado do ambiente aquático e, por desejar um lugar ao sol – se é que essa estrela teria a intensidade luminosa de milhões de anos luz posterior a esse acontecimento – impetrou uma medida a si mesmo, pulando fora da água. Graças às suas  barbatanas que lhe davam sustentação, o aventureiro pôde firmar-se em terra, partindo para conquistar novos horizontes, à medida que a evolução lhe permitia. Nesse afã, mesmo locomovendo-se com dificuldade, engendrou planos visando compensar suas deficiências.

-“E os demais seres? Perguntaria o leitor interessado em minha assertiva. Ora, estes ficaram naquele ambiente encharcado, enfrentando as agruras de predadores vorazes! Mais perguntas surgiriam, tais como estas: - Por que somente uma espécie contou com o concurso do acaso para lançar-se, sozinho, num mundo desconhecido, fazendo uso de sua própria “inteligência”? E por que os demais seres, seus contemporâneos, não seguiram os passos do afortunado ser, galgando postos mais elevados?
                 Ora meu amigo - diria eu! Terei que responder suas questões com outra afirmação chamada científica! Lembra-se do caso do macaco que se transformou em um notável homo sapiens? Pois é! Os demais símios, representantes da mesma espécie, a exemplo dos protótipos dos demais seres que jaziam sob as águas, permaneceram como tais, sem nenhuma oportunidade em acompanhar o inteligente macaco. Aliás, não foi só o chipanzé que possuía inteligência, a ponto de, graças ao deus acaso; graças a usarem suas massas cinzentas, puderam galgar postos elevados na escala dos superiores. Quanto ao candidato ao eretismo; quanto a firmar-se em duas patas...quero dizer, pernas, a esta altura, somente ele foi agraciado com a comenda da racionalidade, permanecendo as demais espécies nos obscuros meandros da inferioridade mental.
             Volto à minha ausência de escamas. Decepcionado por não ter visto em minha pele nenhuma protuberância escamosa; nem mesmo uma pontinha da suposta cartilagem modificada, entreguei-me às divagações permeadas de questões. Por que não eu? Qual a razão em eu ser tolhido desse sinal primário, que atestaria minha origem como um minúsculo ser que teve inteligência própria, a ponto de vislumbrar horizontes promissores? Como provar aos meus iguais, que de fato meus ancestrais foram originários de um microscópico pontinho vivo; de um mundo em que seres tiveram que se virarem se quisessem encontrar o eldorado? Que desolação! Sem escamas sem provas! Quem irá acreditar em mim, ao repetir para meus descendentes a versão que aprendi, quando era obrigado a concordar com o que consta nos alfarrábios científicos, posteriormente lançado nos libretos dos discentes? Sim, fui um deles! Fui um dos que esquentaram bancos escolares, sempre absorvendo os postulados que me lançaram goela abaixo, melhor, incutiram nas mentes de milhares como eu. Pobres descendentes de macaco! Sem mesmo terem consciência de como o processo se desenrolou, muitos, assim como eu, provavelmente descerão ao túmulo sem uma escama, ou mesmo, sem nenhum indício de que pertceram ao mundo siamesco. Melhor estaria se tivesse esse minúsculo ponto que pudesse ter ficado da metamorfose dos idos de bilhares de anos-luz. Terei muita sorte se, em meu mergulho no âmago da terra, alguma enxurrada penetrando em minha última morada como filho de um peixe, possa me levar às águas novamente. Quem sabe se lá encontro alguns dos meus contemporâneos, de quando eu era um escamoso, para removerem esta dúvida cruel: Partindo do quase nada; passando por metamorfoses mil, consegui chegar a este patamar sem que minha curiosidade fosse satisfeita.
             Vou, sim vou terminar meus dias! E quem não vai? Sim, todos vão. Muitos aceitando as premissas dos sábios, estampadas em centenas de páginas, as quais foram ingeridas obrigatoriamente pelos rebentos dos concordinos. Alguns seres, perfilando-se comigo, terão as mesmas dúvidas, os mesmos temores e o desconforto em terem sido efeitos sem causas definidas, originados não de uma Causa Suprema, mas de um deus chamado Acaso, como é apregoado entre as classes do saber dominante.