TESTAMENTO BIOLÓGICO PARA UTILIZAÇÃO DE ÓVULOS E SÊMEN POST MORTEM: LIMITES E POSSIBILIDADES DO DIREITO À HERANÇA.[1]

 

 

 

Rayssa Lorena Machado e

Rayssa Nayhara Souza Furtado[2]

Anna Valéria de Miranda Araújo Cabral Marques[3]

 

 

 

SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 Testamento e o testamento biológico; 3 O ordenamento jurídico brasileiro e a fecundação post mortem; 4 Direito à herança: limites e possibilidades; 5 Considerações Finais.

 

 

RESUMO

 

Os avanços científicos trouxeram grandes mudanças para o contexto social, dentre estas, podemos destacar a utilização de sêmen e óvulos para fecundação. Casais impossibilitados de terem filhos de maneira natural, passam a ter através da ciência essa possibilidade. Entre casais vivos e possuidores de direito, podemos considerar normal a realização do desejo de ambos, mas quando a situação muda de contexto e um dos membros falece deixando um testamento garantindo o direito ao outro, essa história abre sérias discussões. O presente trabalho tem por finalidade analisar a utilização do testamento biológico que tem como escopo a utilização de sêmen e óvulos para fecundação post mortem. Com base nisso será visto os direitos de herança e sucessão do recém-nascido.

Palavras Chave: Inseminação Artificial post mortem – Direitos Sucessórios – Direito de Família – Testamento Biológico – Técnicas de Reprodução Humana Assistida.

 

1 INTRODUÇÃO

O nascer com vida garante ao homem a personalidade civil segundo ordenamento jurídico brasileiro e essa personalidade se extinguir com a morte. Apesar da morte ser um assunto considerado negativo entre os brasileiros, o ordenamento jurídico traz formas de assegurar aos falecidos e aos familiares deste a proteção de seus bens.  Sabendo que a sucessão de patrimônio entre os familiares ocorrerá o código civil traz três possibilidades jurídicas para essa sucessão, estão são: legitima, testamentária, e, testamentária e legitima.

O testamento é uma possibilidade jurídica encontrada no Código Civil Brasileiro para que o homem possa dispor de seus bens após a morte. O Código traz três possibilidades de testamento. O testamento público, o cerrado e o particular. Cabe ao autor escolher a possibilidade que mais lhe convém. Entre as possibilidades de testamento, podemos destacar o testamento biológico, modalidade nova surgida em Israel aonde futuros pais e mães congelam sêmens e óvulos visando o prolongamento familiar após a morte. Esses sêmens e óvulos são deixados como heranças para os futuros avós ou companheiros deixados em vida.

Em relação as técnicas de reprodução cientificas, o ordenamento jurídico brasileiro não possui uma legislação especifica, apesar disso não proibe a realização da fertilização post mortem.  Apenas existe considerações trazidas pelo Conselho Federal de Medicina e na jurisprudência nacional. A concepção de um filho após a morte de um dos companheiros é um tema novo e que possui diversos questionamentos.

Esses questionamentos giram em torno do direito sucessório e de filiação desse recém-nascido. O Código Civil Brasileiro traz algumas menções sobre o assunto, porém é vago. A doutrina diverge sobre o assunto, principalmente entre a questão sucessória.

 

2 TESTAMENTO E O TESTAMENTO BIOLÓGICO

 

No Direito Brasileiro o indivíduo passa a ter personalidade civil com o nascimento, com vida e ver ela se acabar com a morte. O patrimônio deixado se sucederá entre os herdeiros, essa sucessão se dar de três formas: legitima, testamentária e testamentária e legitima.

A sucessão legítima ocorre quando o falecido não fez testamento e a sucessão se dará entre seus herdeiros necessários. A sucessão testamentária ou voluntária ocorre quando o falecido dispõe sobre a totalidade de seus bens em um documento válido e a terceira hipótese é quando o falecido dispõe de seus bens apenas em parte e a outra parte se divida entre os herdeiros sem nomeação, seguindo as regras da sucessão legítima.

   O testamento é um ato irrevogável, de acordo com a lei aonde alguém dispõe do seu patrimônio. Esse patrimônio pode ser disposto em todo ou em parte. Entre as características do testamento destaca-se que é um ato personalíssimo, privado ao autor da herança, não podendo assim ser feito por procuração, nem mesmo com poderes especiais. É um negócio jurídico, unilateral. Podendo ser revogado ou alterado a qualquer momento.

O testamento não fica apenas restrito ao patrimônio, podendo testar sobre assuntos não patrimoniais desde que nos limites estabelecidos em lei. Podendo assim o falecido reconhecer filhos havidos fora do casamento ou nomear tutor dos filhos menores, de acordo com o artigo 1.857, do Código Civil.

 O Código Civil Brasileiro traz três espécies ordinárias de testamento:

1)   Testamento Público:

 Artigo 1.632 - São requisitos essenciais do testamento público: 
I - que seja escrito por oficial público em seu livro de notas, de acordo com o ditado ou as declarações do testador, em presença de cinco testemunhas;              II - que as testemunhas assistam a todo o ato; 
III - que, depois de escrito, seja lido pelo oficial, na presença do testador e das testemunhas, ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e do oficial; 
IV - que, em seguida à leitura, seja o ato assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo oficial. 
Parágrafo único - As declarações do testador serão feitas na língua nacional. 

2)   Testamento Cerrado:

Artigo 1.638 - São requisitos essenciais do testamento cerrado: 
I - que seja escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rogo; 
II - que seja assinado pelo testador; 
III - que não sabendo, ou não podendo o testador assinar, seja assinado pela pessoa que lho escreveu; 
IV - que o testador o entregue ao oficial em presença, quando menos, de cinco testemunhas; 
V - que o oficial, perante as testemunhas, pergunte ao testador se aquele é o seu testamento, e quer que seja aprovado, quando o testador não se tenha antecipado em declará-lo; 
VI - que para logo, em presença das testemunhas, o oficial exare o auto de aprovação, declarando nele que o testador lhe entregou o testamento e o tinha por seu, bom, firme e valioso; 
VII - que imediatamente depois da sua última palavra comece o instrumento de aprovação; 
VIII - que, não sendo isto possível, por falta absoluta de espaço na última folha escrita, o oficial ponha nele o seu sinal público e assim o declare no instrumento; 
IX - que o instrumento ou auto de aprovação seja lido pelo oficial, assinando ele, as testemunhas e o testador, se souber e puder; 
X - que o tabelião o cerre e cosa, depois de concluído o instrumento de aprovação 

3)   Testamento Particular:

Artigo 1.645 - São requisitos essenciais do testamento particular: 
I - que seja escrito e assinado pelo testador; 
II - que nele intervenham cinco testemunhas, além do testador; 
III - que seja lido perante as testemunhas, e, depois de lido, por elas assinado. 

Entre as espécies de testamento podemos destacar ainda, uma modalidade nova que surgiu recentemente em Israel, porém não é abrangida pelo ordenamento jurídico brasileiro. O testamento biológico, como assim ficou conhecido dispõe sobre a possibilidade de o testador ser pai ou mãe após a sua morte. A concepção e o nascimento dos bebes se dar através de óvulos ou sêmens congelados deixados como “heranças” por pais mortos. Isso se dar de forma escrita, na presença de testemunhas.

Essa modalidade de testamento traz serias discussões, há quem alegue que a criança já nasce sem pai ou mãe, com filiação indefinida e a questão do direito sucessório do recém-nascido, teria esse direito à herança. Só que a discussão fica principalmente em relação ao testador dispor de seu material genético num testamento.

3 O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E A FECUNDAÇÃO POST MORTEM

 

Quando criança, aprende-se o chamado “Ciclo da Vida” que diz que, o homem nasce, cresce, reproduz e morre. Nota-se portanto que a reprodução é algo que o ser humano conhece desde cedo e com o tempo vai incorporando essa ideia, algumas pessoas sonham com a chegada desse dia, outras se casam só por esse motivo e esse mesmo motivo também pode ser justificativa para o desfazimento de uma união.

A vontade de ter filhos aliada a impossibilidade deste, gera diversos problemas para o casal ou para a pessoa infértil, problemas estes emocionais, interpessoais, psicológicos, entre outros. Com base nesses problemas e nessa vontade é que a ciência tem evoluído cada dia mais em busca de uma solução e tem conseguido resultados cada vez melhores.

 A primeira experiência de inseminação artificial, feita com humanos aconteceu em 1791 quando o inglês Hunter, realizou-a entre marido e mulher, essa técnica consistia em injetar o esperma no útero ou na vagina. Contudo, apenas no ano de 1799 é que Hunter conseguiu gerar gravidez em seres humanos com o emprego de seu método. (Rotania, 2003).

Com o tempo, essas técnicas foram se aperfeiçoando e hoje são divididas entre baixa e alta complexidade, onde as primeiras consistem no coito programado e na inseminação intrauterina que se dá com a introdução do material genético masculino no útero e a partir daí a gravidez se desenvolve naturalmente, essa inseminação artificial pode ser tanto heteróloga (quando o sêmen é de um doador), como homóloga (quando o sêmen é doado pelo marido ou companheiro). E as técnicas de alta complexidade são as fertilizações in vitro convencional e a injeção intracitoplasmática de espermatozoide.

O ordenamento jurídico brasileiro no que tange as técnicas de reprodução humana assistida não há nenhuma normatização especifica, a única regulamentação é uma Resolução do Conselho Federal de Medicina de 1992. O Código Civil de 2002 não regula o assunto, mas traz as possibilidades de presunção de paternidade em seu artigo 1.597:

Art. 1.597 – presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

I – nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal.

II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido. (grifo nosso)

Nota-se, a preocupação do legislador em amparar essas crianças concebidas a partir de técnicas de reprodução humana, pois mesmo não sendo concebidas da forma tradicional, também são filhos do casal e devem ter seus direitos preservados. No caso da inseminação artificial heteróloga deve ter a autorização do marido, pois como visto anteriormente o sêmen nesse tipo de inseminação é de um doador, se houver essa autorização terá essa criança todos os direitos de um filho nascido do casamento.

Com o passar dos anos, as prioridades dos casais passaram a ser outras e o sonho de constituir uma família começa a ser adiado, nos dias atuais um casal antes de pensar em ter filhos, pensa primeiro em ter uma casa própria, em concluir uma faculdade, em se estabilizar financeiramente e só depois disso tudo é que querem ter filhos para poderem proporcionar a eles tudo de melhor: escola, saúde, lazer.

Tendo em vista essa nova realidade, as técnicas de reprodução assistida deixaram de ser utilizadas somente por aqueles que tinham problemas relacionados à fertilidade, alguns casais resolvem congelar seus materiais genéticos para que futuramente possam utilizá-los sem que os mesmos tenham sofrido com “a ação do tempo”, mas muitas coisas podem acontecer nesse período e o sonho de constituir uma família pode ser abalado, como por exemplo, com a morte do parceiro, que pode ser uma realidade não esperada, como também pode ser já esperada e por esse motivo foi congelado os materiais de um ou de ambos, para que no futuro o parceiro vivo pudesse utilizá-los.

Com base nisso, em Israel a justiça abriu precedentes para um experimento inédito no mundo, o chamado “Testamento Biológico”, como visto no capítulo anterior, que seria a possibilidade da concepção e o nascimento de bebês a partir de óvulos ou de sêmen deixados como “herança” por pais já mortos, que de acordo com a advogada Irit Rosenblum é um meio de mesmo após a morte ser respeitada a vontade de dar continuidade a vida.

 Nesse caso, esse material genético não necessariamente será usado por sua esposa ou companheira, mas será entregue aos pais, por exemplo, para que eles escolham uma “candidata” para a doação, abrindo assim, uma discussão sobre a inseminação artificial post mortem.

A inseminação post mortem acontece da mesma forma que as outras técnicas de reprodução assistida que foram vistas anteriormente, o que torna essa técnica diferente das demais e bastante discutida é o fato de que a mulher se utiliza para fecundar seu ovulo, os gametas que foram doados em vida pelo seu marido ou companheiro. Nas palavras de Eduardo Leite (2004, p. 38):

A inseminação post mortem é a inseminação de uma mulher realizada com o esperma de seu marido, após a morte deste [...] O homem que congelou seu esperma em bancos de esperma pode morrer e à viúva faculta-se, então, reclamar a devolução do material coletado, para se inseminar com o esperma do marido falecido [...]

Nota-se que a fecundação, como o próprio nome post mortem já sugere, é feita após a morte do referido marido ou companheiro e após a dissolução do casamento ou união estável, tendo em vista que a mesma foi desfeita com o falecimento do cônjuge ou companheiro.

Por essa diferença é que há diversos entendimentos doutrinários sobre a possibilidade de haver ou não essa inseminação artificial após a morte do doador. Dentre esses argumentos pode-se destacar:

a)   Contra: os argumentos contra a inseminação artificial post mortem estão ligados a impossibilidade da criança concebida por esse método de conhecer o seu pai, ferindo assim o princípio da paternidade responsável, tendo em vista que o falecido não pode gerar um ser humano, mesmo que expressa sua manifestação de vontade antes de morrer e também estão ligadas as questões psicológicas.

b)   A favor: já os argumentos a favor dessa técnica, são fundamentados na condição prévia e expressa de concordância do cônjuge ou convivente, pois em termos gerais, “não se pode impor uma paternidade que não existe e que não é desejada”, de acordo com Milena Caggy. Ainda sobre seu raciocínio “não se pode proibir que as pessoas, mesmo depois de mortas realizem aquilo que, em vida não conseguiram, sob o simples fundamento de que ‘pode ser que cause esse ou aquele efeito’”. A Constituição Federal no artigo 226, § 4º, também protege a família monoparental.

No Brasil ainda não há lei que regule a inseminação artificial post mortem e nem que defina como deve-se proceder quando o marido ou companheiro falecer e tiver seus sêmens guardados, se ela pode ou não usá-los e o que ela precisa para que seja realizada. No artigo 1.597, inciso III, do Código Civil, já citado anteriormente, o legislador não faz nenhuma referência a necessidade ou não da prévia autorização do marido. Dessa forma, o Conselho de Justiça Federal, se pronunciou sobre o tema através do Enunciado Nº 106, aprovado nas Jornadas de Direito Civil 02, afirmando que, para que seja presumida a paternidade do marido falecido, será obrigatório que a mulher esteja na condição de viúva ao se submeter a essa técnica e ainda que haja autorização escrita do marido para que ela possa se beneficiar de seu material genético.

Pode-se destacar o caso inédito no Brasil, de Nara, que conseguiu autorização judicial para retirar sêmen do noivo já falecido e agora tenta na justiça o direito de ter um filho do ex-noivo por meio de uma fertilização in vitro. Outro caso ocorrido também no brasil é o da Kátia que conseguiu uma autorização judicial para ter um filho do seu falecido marido e o médico conhecendo o caso, sabendo da pretensão de ambos em ter a criança, pois os mesmos já haviam procurado uma clínica de fertilização e não concluíram o tratamento porque o marido faleceu antes, realizou o procedimento mesmo sem a prévia autorização exigida.

Dessa forma, como não há nenhuma normatização, as clínicas de reprodução e laboratórios se baseiam somente nas normas do Conselho Federal de Medicina, que não tem poder de lei. No Brasil, ao contrário de países como a Alemanha e a Suécia, não há lei que proíba essa prática, na França também não é aceita pela justificativa de que o consentimento expresso sem vida, perde seu efeito.

É importante lembrar que houve no Brasil três tentativas de regulamentar a reprodução assistida, sendo os projetos de leis apesentados em 1993, em 1997 e em 1999 que, até os dias atuais não foram aprovados. Portanto, o que a lei não proíbe, é permitido, por mais que esse tipo de técnica de reprodução assistida seja mais complicado, o ordenamento jurídico reconhece esses filhos e seu maior “problema” encontra-se nos direitos sucessórios, como serão vistos no próximo capítulo.

 

4 DIREITO À HERANÇA: LIMITES E POSSIBILIDADES

 

Como citados no capítulo anterior, não há proibição expressa da inseminação artificial post mortem, logo, ela é permitida no Brasil, porém dessa técnica advém diversas discussões também já citados no capítulo anterior: no que diz respeito à filiação e seu maior problema, no que diz respeito aos direitos sucessórios.

No que diz respeito a filiação, o Código Civil já regulamentou em seu artigo 1.597, inciso III, afirmando que será reconhecida a paternidade dessas crianças nascidas a partir dessas técnicas, o seu maior problema encontra-se nos direitos sucessórios, ou seja, no direito à herança, pois esse filho já nasce após o falecimento de seu pai.

Como foi visto em capítulos anteriores, a sucessão dos bens pode ser testamentária, sucessória, e, testamentária e sucessória. O falecido poderá dispor de toda sua herança no testamento, seria a sucessão testamentária; pode não fazer testamento e então a herança será dividida entre os herdeiros necessários (sucessão legitima) e a última o falecido sucede alguns bens por meio do testamento e o restante será divido sob as regras da sucessão legítima.

Muitas são as discussões acerca da possibilidade ou não do direito sucessório das crianças concebidas por meio de inseminação artificial post mortem, o artigo 1.798 do Código Civil, dispõe que “legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão”, esse momento é imediatamente após a morte, pois é quando acorre a sucessão. De acordo com o advogado Jesualdo Eduardo de Almeida Júnior “[...] o embrião fecundado post mortem não teria direito sucessório algum, pois não é pessoa concebida e muito menos pessoa nascida”.

Dessa forma, há o entendimento de que de forma alguma a criança concebida a partir dessa técnica teria direito a herança do falecido pai, sendo essa sucessão testamentária ou sucessória. Porém o artigo 1.799, também do Código Civil, abre margens para outra corrente doutrinária, defendida por Maria Helena Diniz:

Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:

I – os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão;

II – as pessoas jurídicas;

III – as pessoas jurídicas, cuja organização for determinada pelo testador sob a forma de fundação. (grifo nosso)

   Nota-se que de acordo com esse artigo os filhos ainda não concebidos, ou seja, a prole eventual não poderá herdar na sucessão legítima, mas poderá na sucessão testamentária, desde que seja da vontade de seu testador, logo, se for da sua vontade, pode ele beneficiar em testamento, seres que ainda não foram concebidos, filhos de pessoas por ele indicadas desde que essas pessoas sobrevivam até a sucessão, como afirma o artigo.

O artigo 1.800, do Código Civil, regula o que foi disposto no artigo anterior, afirmando como deve cuidado desses bens até a chegada do herdeiro e também dando-lhe um limite de tempo caso o testador não tenha se manifestado sobre o prazo. A redação do artigo dispõe:

Art. 1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.

§ 1o Salvo disposição testamentária em contrário, a curatela caberá à pessoa cujo filho o testador esperava ter por herdeiro, e, sucessivamente, às pessoas indicadas no art. 1.775.

§ 2o Os poderes, deveres e responsabilidades do curador, assim nomeado, regem-se pelas disposições concernentes à curatela dos incapazes, no que couber.

§ 3o Nascendo com vida o herdeiro esperado, ser-lhe-á deferida a sucessão, com os frutos e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte do testador.

§ 4o Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos.

Uma terceira corrente doutrinária fala sobre os embriões fecundados e congelados até a morte do pai sem a necessidade de existir um testamento, uma vez mesmo não possuindo personalidade, já está biologicamente vivo, um dos defensores dessa corrente é José Luiz Gavião Almeida, afirmando que não se pode privar dos efeitos patrimoniais o filho nascido após a morte do pai, pois seria confrontar o princípio constitucional da igualdade entre os filhos

A forma correta de proteger os direitos sucessórios da criança seria, após o nascimento da mesma, entrar com uma ação de petição de herança, prevista no artigo 1.824, do Código Civil onde afirma que “o herdeiro pode, em ação de petição de herança, demandar o reconhecimento de seu direito sucessório, para obter a restituição da herança, ou parte dela, contra quem, na qualidade de herdeiro ou mesmo sem título, a possua”. Logo, percebe-se que esta é a via judicial pela qual o herdeiro procura ser reconhecido judicialmente para que possa recuperar em todo ou em parte seu patrimônio sucessório.

Dessa forma, após conhecer esse dispositivo da lei que assegura o direito do herdeiro em reclamar a sua parte, pode-se afirmar que o filho nascido a partir dessa técnica de reprodução assistida terá direito a sua parte da herança do seu genitor falecido no estado em que ela se encontrar, independente de este ter sua sucessão de forma testamentária ou legítima, pois esse direito decorre de lei e não de um contrato.

Contudo, há um limite no que diz respeito a ação de petição de herança quando a sucessão se der pela forma legítima, pois esta pode prescrever no prazo de dez anos a contar da data da abertura da sucessão. Quando a criança nasce, esse prazo é congelado até quando ela se tornar absolutamente capaz, depois disso o prazo volta a contar normalmente, mas é importante lembrar também que nos casos em que se fizer necessário o reconhecimento de paternidade, esse prazo começará contar da data em que for reconhecido e não na data da abertura da sucessão.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O testamento como já vimos é uma ferramenta jurídica utilizada para que o falecido dispor do seu patrimônio. No ordenamento brasileiro além de patrimônio pode se fazer outras consideração ao testar, desde que não fira a lei. Outra modalidade de testamento, surgida recentemente tem levantado fortes discussões.

A inseminação post mortem é um tema controverso dentro do direito, seja ele brasileiro ou não. Após o surgimento em Israel do testamento biológico, uma possibilidade jurídica de se deixar formalmente escrito o desejo de ser pai ou mãe após a morte, essa discussão só aumentou.  O principal função do testamento biológico é deixar óvulos e sêmens como herança para o companheiro vivo ou para futuros avos.

No direito brasileiro apesar de controvérsia a inseminação post mortem não é proibida, fortes discussões giram em torno do direito sucessório. Em relação a filiação o Código Civil Brasileiro traz expressamente. Em se tratando de direito sucessório esses correntes que defendem o direito do filho nascido post morte e outras que alegam que o mesmo não possui direitos.

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

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[1] Paper apresentado à Disciplina Direito de Família e Sucessões, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Alunas do 6º Período do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor, orientador.