SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

DANIEL JACINTO BORGES

DANNDARA PRUDENCIO SILVA

GABRIELA FREITAS DE OLIVEIRA

LETICIA PEREIRA DA SILVA

PAOLA CRISTINACARDOSO SANTOS

RESUMO:

 Com a Lei 11.690 de 2008, houve mudanças no direito processual penal no que diz respeito às provas, desse modo busca-se responder a seguinte indagação: a iniciativa probatória do Juiz no processo penal fere os princípios constitucionais? Para isso temos como objetivo geral demonstrar se a iniciativa probatória do juiz no processo penal fere princípios constitucionais. Delimitando o estudo através dos objetivos específicos que são: verificar se a prova de oficio determinada pelo juiz, a fim de apurar a verdade real, respeita o princípio da presunção de inocência; analisar se essa produção de prova de oficio vai de encontro com o princípio da imparcialidade, considerando que a jurisdição é inerte, e averiguar se as partes restam prejudicadas por essa produção de prova de oficio. A pesquisa foi desenvolvida pelo método dedutivo, pois se considera que a conclusão está implícita nas premissas, considerando que desde o inicio, a pesquisa desenvolvida apresenta a conclusão, de que essa produção de provas fere diversos princípios constitucionais e nos remete a resquícios do sistema inquisitório. O objetivo da atividade probatória é convencer seu destinatário: o juiz, na medida em que não presenciou o fato que é submetido a sua apreciação, é por meio das provas que o juiz poderá reconstruir o evento em questão, para decidir se a infração, de fato, ocorreu e se o réu foi seu autor. Os artigos 156 e 209 do CPP conferem ao juiz o poder de determinar prova de oficio, o que é razão para discussões e diferentes posicionamentos na doutrina e jurisprudência.  

Palavras-chave: Prova. Oficio. Princípios.

ABSTRACT:

In 2008, Law 11.690, have changed some parts of the criminal procedural law with regard to evidence, thus we seek to answer the following question: to request proof of evidence ex officio judge has constitutional support? For this we aim to demonstrate the general evidentiary initiative of the judge in the criminal proceedings hurts constitutional principles. Confining the study through specific objectives are: to determine whether the evidence ex officio by the judge in order to ascertain the real truth, respect the principle of presumption of innocence; analyze whether this production of proof of office goes against the principle impartiality, considering that the jurisdiction is inert and ascertain if the parties remain handicapped by such presentation of evidence ex officio. The survey was developed by the deductive method, as it is considered that the conclusion is implicit in the assumptions. The objective of the activity is probative convince your destination: the judge. To the extent not witnessed the fact that it is subject to its assessment is through evidence that the judge can rebuild the historical moment, to decide whether the offense actually occurred and whether the defendant was its author. But the articles 156 and 209 of the CPP give the judge the power to request proof of office, which is reason for discussions and different positions on doctrine and jurisprudence, since it refers to features of the inquisitorial system, confronting numerous constitutional principles.

Keywords: Proof. Office. Principles.

INTRODUÇÃO

O artigo tem como tema “Sistemas processuais penais e a Constituição Federal” em face do atual ordenamento jurídico. Nesta perspectiva, pretende-se elucidar acerca da seguinte indagação: A iniciativa probatória do Juiz no processo penal fere os princípios constitucionais?

Ao analisar os artigos do Código de Processo Penal 156 e 209, temos que o juiz pode solicitar de oficio a produção antecipada de provas, determinar diligencia para dirimir dúvida sobre ponto relevante e ouvir testemunhas além das indicadas pelas partes.

Dessa forma, temos como objetivo geral da pesquisa demonstrar se a iniciativa probatória do juiz no processo penal fere princípios constitucionais. Especificamente, verificar se a prova de oficio determinada pelo juiz, a fim de apurar a verdade real, respeita o princípio da presunção de inocência; analisar se essa produção de prova de oficio vai de encontro com o princípio da imparcialidade, considerando que a jurisdição é inerte, e averiguar se as partes restam prejudicadas por essa produção de prova de oficio.

 A provável resposta para o questionamento é que a produção de provas ferem diversos princípios constitucionais e nos remete a resquícios do sistema inquisitório. O objetivo da atividade probatória é convencer seu destinatário: o juiz, na medida em que não presenciou o fato que é submetido a sua apreciação, é por meio das provas que o juiz poderá reconstruir o evento em questão, para decidir se a infração, de fato, ocorreu e se o réu foi seu autor. Os artigos 156 e 209 do CPP conferem ao juiz o poder de determinar prova de oficio, o que é razão para discussões e diferentes posicionamentos na doutrina e jurisprudência.  

A presente pesquisa se justifica pela alta relevância social e acadêmica, pois traz a lume a questão de que ainda existem resquícios do processo inquisitorial no sistema processual penal vigente, uma vez que no sistema atual devem ser distintos os indivíduos na função de acusação, defesa e julgamento, entendendo que no caso de solicitar de oficio provas o julgador passa a ser imparcial. Nesta perspectiva tem-se a finalidade de relatar discutir o ônus da prova no processo penal vigente.

 

 

DO SISTEMA PROCESSUAL VIGENTE:

No que tange ao sistema processual penal vigente no Brasil atua-se o sistema acusatório que tem como característica principal a distinção das partes no processo. O Ministério Público tem responsabilidade para promover a ação de acusação, tendo assim a garantia de provar o que está sendo alegado; na defesa, resguarda-se o direito de impugnar as alegações do MP. E ao Juiz caberá analisar as alegações contidas no processo e suas respectivas provas, formando por último instante a sua sentença de condenação ou não.

Entretanto, ao juiz é conferida a liberdade de buscar provas conforme está disposto nos artigos 156 e 209 do Código de Processo Penal, se assim julgar necessário para o processo, ferindo desta forma o sistema acusatório e alguns dos princípios constitucionais, em especial o da imparcialidade e o da inércia.

                  Considerando o critério de proporcionalidade, ensinamento fundamental consagrado pela nova ordem constitucional, a lesão causada por essa iniciativa jurisdicional é flagrante, tendo em vista que não existe ação penal instaurada ou acusação protocolada de forma regular, lesando assim o Princípio da Imparcialidade, da Inercia, bem como o Devido Processo Legal, além de ser formuladas provas de forma contaminada, o texto do artigo 156 do Código de Processo Penal tem um nítido caráter retroativo, pelo fato que quando o juiz determina a produção de provas está agindo de acordo com o sistema inquisitivo, que já não mais vigora no Brasil.

Para Coutinho no que diz respeito a parcialidade o magistrado deve ser consciente de suas limitações:

O importante, enfim, neste tema, é ter-se um julgador consciente das suas próprias limitações (ou tentações?), de modo a resguardar-se contra seus eventuais prejulgamentos, que os tem não porque é juiz, mas em função da sua ineliminável humanidade. [1]

Quando o juiz determina a produção de provas sem requerimento prévio, ele estaria agindo como um inquisidor, não respeitando o princípio da imparcialidade e violando o devido processo legal. Nesse sentido já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:

ADI 1570 / DF - DISTRITO FEDERAL

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

Relator(a):  Min. MAURÍCIO CORRÊA

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 9034/95. LEI COMPLEMENTAR 105/01. SUPERVENIENTE. HIERARQUIA SUPERIOR. REVOGAÇÃO IMPLÍCITA. AÇÃO PREJUDICADA, EM PARTE. "JUIZ DE INSTRUÇÃO". REALIZAÇÃO DE DILIGÊNCIAS PESSOALMENTE. COMPETÊNCIA PARA INVESTIGAR. INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. IMPARCIALIDADE DO MAGISTRADO. OFENSA. FUNÇÕES DE INVESTIGAR E INQUIRIR. MITIGAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DAS POLÍCIAS FEDERAL E CIVIL. 1. Lei 9034/95. Superveniência da Lei Complementar 105/01. Revogação da disciplina contida na legislação antecedente em relação aos sigilos bancário e financeiro na apuração das ações praticadas por organizações criminosas. Ação prejudicada, quanto aos procedimentos que incidem sobre o acesso a dados, documentos e informações bancárias e financeiras. 2. Busca e apreensão de documentos relacionados ao pedido de quebra de sigilo realizadas pessoalmente pelo magistrado. Comprometimento do princípio da imparcialidade e conseqüente violação ao devido processo legal. 3. Funções de investigador e inquisidor. Atribuições conferidas ao Ministério Público e às Polícias Federal e Civil (CF, artigo 129, I e VIII e § 2o; e 144, § 1o, I e IV, e § 4o). A realização de inquérito é função que a Constituição reserva à polícia. Precedentes. Ação julgada procedente, em parte.

Decisão: - O Tribunal, por maioria, julgou procedente, em parte, a ação para declarar a inconstitucionalidade do artigo 3º da Lei nº 9.034, de 03 de maio de 1995, no que se refere aos dados "fiscais" e "eleitorais", vencido o Senhor Ministro Carlos Velloso, que a julgava improcedente. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Maurício Corrêa. Plenário, 12.02.2004.”[2]

Os artigos 156 e 209 do Código de Processo Penal, vão além dos princípios basilares da Constituição Federal e do sistema acusatório, uma vez que, quando o juiz ádetermina a produção de provas, está agindo de acordo com o sistema inquisitivo, ferindo a Carta Magna de 1988, . O ato de buscar provas faz com que o juiz agregue a função de acusar e julgar o que faz ele tender para as provas produzidas por si mesmo, assim podendo não fazer um julgamento verdadeiro e puro como se espera.

DAS PROVAS:

As provas no processo penal são o meio pelo qual a verdade chega ao espirito do juiz, para formar seu convencimento, o magistrado tem o dever de investigar a verdade, por isso lhe é concedido a possibilidade de buscar provas, se necessárias.

O princípio da imparcialidade é tido como um dos princípios basilares dentro do sistema acusatório, tendo em vista que o Estado-Juiz deve estar em uma posição de imparcialidade dentro do processo, não podendo favorecer nenhuma das partes. Esse princípio tem como objetivo que o magistrado dê sentença para a partes de forma mais imparcial possível, eliminando quaisquer vícios que possam interferir na decisão do juiz.

Nesse mesmo contexto o professor Paulo Rangel nos passa que: “A imparcialidade do juiz, portanto, tem como escopo afastar qualquer possibilidade de influência sobre a decisão que será prolatada, pois o compromisso com a verdade, dando a cada um o que é seu, é o principal objetivo da prestação jurisdicional.”[3]

Na prática a imparcialidade é muito difícil de ser alcançada, uma vez que leva em conta a personalidade, a formação moral, psíquica, religiosa do juiz e observando que ele pode ser contaminado com o mérito da causa durante o processo, na colheita de provas ou na oitiva das testemunhas.

Nesse mesmo seguimento, observa-se que o sistema acusatório é corruptível, bem como o não cumprimento do princípio da imparcialidade, pois como já propusemos, o juiz pode se contaminar com os fatos e julgar uma lide de forma que não seja justa e pura como deveria ser.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul se manifesta a respeito, nos transparecendo o seguinte procedimento:

Juiz na produção de prova, mesmo que sob a escusa da pretensa busca da verdade real, é procedimento eminentemente inquisitório e que agride o critério basilar do Sistema Acusatório: a gestão da prova como encargo específico da acusação e da defesa. Precedentes da Câmara. 2. A condenação só pode emergir da convicção plena do julgador ¿ sua base ética indeclinável. A prova controversa, insegura e que não afasta todas as dúvidas possíveis enseja um desate favorável ao acusado, em homenagem ao consagrado princípio in dubio pro reo. Deram provimento ao apelo. UNÂNIME. (Apelação Crime Nº 70026105965, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amilton Bueno de Carvalho, Julgado em 17/09/2008[4]

ATENTADOS AO PUDOR CONTINUADOS. SISTEMA ACUSATÓRIO. GESTÃO DA PROVA. TESTEMUNHA OUVIDA DE OFÍCIO PELO JUIZ. NULIDADE. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. ABSOLVIÇÃO. 1. A oficiosidade do Novamente, o mesmo ilustre Relator ensina sobre a distinção das funções, necessária aplicação ao sistema de acusação e defesa:

“PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. SISTEMA ACUSATORIO. PROVA. GESTAO. PROVA TESTEMUNHAL PRODUZIDA DE OFICIO PELO JUIZ. ILEGITIMIDADE. - NULO E O ATO PROCESSUAL EM QUE RESTAM AGREDIDOS OS MANDAMENTOS CONSTITUCIONAIS SUSTENTADORES DO SISTEMA PROCESSUAL PENAL ACUSATORIO. - A OFICIOSIDADE DO JUIZ NA PRODUCAO DE PROVA, SOB AMPARO DO PRINCIPIO DA BUSCA DA VERDADE REAL, E PROCEDIMENTO EMINENTEMENTE INQUISITORIO E AGRIDE O CRITERIO BASILAR DO SISTEMA ACUSATORIO: A GESTAO DA PROVA COMO ENCARGO ESPECIFICO DA ACUSACAO E DA DEFESA. - LICAO DE JACINTO NELSON DE MIRANDA COUTINHO. - ORDEM CONCEDIDA, POR UNANIMIDADE. (Habeas Corpus Nº 70003938974, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amilton Bueno de Carvalho, Julgado em 24/04/2002[5]

O Professor Luiz Flavio Gomes nos adianta que:

 é inconstitucional a interpretação literal do dispositivo supracitado, pois o juiz não poderia determinar a produção de provas de ofício, sobretudo antes de iniciada a ação penal, sob pena de ofensa ao sistema acusatório previsto na CF/88.[6] 

 Temos como determinação do senhor Jacinto Nelson de Mirando Coutinho a declaração de:

 Como se sabe, o princípio do devido processo legal exige que o órgão julgador seja submetido ao princípio da inércia, buscando garantir, ao máximo, a sua imparcialidade e equidistância das partes.Com efeito, quando se autoriza ao juiz a instauração ex-officio do processo, como era típico no sistema inquisitório puro, permite-se a formação daquilo que Cordero chamou de "quadro mental paranoico", ou seja, abre-se ao juiz a “possibilidade de decidir antes e, depois, sair em busca do material probatório suficiente para confirmar a 'sua' versão, isto é, o sistema legitima a possibilidade da crença no imaginário, ao qual toma como verdadeiro.[7] 

O critério do livre convencimento acaba sendo incentivo para o solipsismo e a alucinação, quando o juiz busca as provas, pois o juiz pode tender a dar mais importância e valor à prova por ele obtida.

No que concerne à prova, a necessidade de existência de regras de distribuição do ônus da prova deriva da constatação de que nem sempre o juiz consegue superar o estado de dúvida em relação a determinado fato ou circunstância relevante para a causa, e, ainda, da proibição de que, nessa situação de incerteza, opte por não julgar a lide – non liquet.

 É baseado nessas regras, portanto, que indicarão ao juiz como decidir quando os fatos submetidos a sua apreciação não estiverem suficientemente elucidados.

Além disso, os princípios sobre a distribuição do ônus da prova orientam o esforço das partes no tocante à demonstração da tese que defendem, estabelecendo as consequências e prejuízos que advirão de seu desempenho processual.

Averbe-se que o ônus não pode ser entendido como um dever ou obrigação da parte, na medida em que seu descumprimento não lhe acarreta nenhuma sanção. É uma faculdade outorgada pela norma para que um sujeito de direito possa agir no sentido de alcançar uma situação favorável no processo.

A lei assegura-lhe, no entanto, meios de, supletivamente, reunir elementos que possibilitem optar pela condenação ou absolvição do acusado. Assim é que poderá, em busca da verdade real, ordenar, de ofício, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes e, ainda, no curso da ação, determinar a produção de provas que possibilitem a elucidação do fato criminoso (art. 156, I e II, do CPP).

O ônus probatório é, portanto, atribuído às partes, que repartem a incumbência de demonstrarem as respectivas alegações. Por isso, reza o art. 156 do CPP que a prova da alegação incumbirá a quem a fizer.

É importante lembrar, porém, que essa regra geral tem de ser interpretada à luz do princípio in dubio pro reo, uma vez que milita, em favor do acusado, a presunção de não culpabilidade (art. 5º, LVII, da CF).

Disso decorre que, no processo penal, o ônus da prova recai inteiramente sobre o autor, no que se refere à demonstração “do crime na integridade de todos os seus elementos constitutivos”.

Não basta para o desfecho condenatório, pois, que a acusação comprove a existência material do fato, o nexo de causalidade e que a conduta foi praticada pelo réu, incumbindo-lhe, também, a demonstração do elemento subjetivo e da reprovabilidade da conduta.

Essa exigência, porém, não autoriza concluir que haja necessidade de a acusação provar fato negativo (por exemplo, que o acusado não agiu acobertado por causa excludente de ilicitude), já que é suficiente que o Ministério Público ou o querelante demonstre a ocorrência de fatos positivos cuja prática evidencie o dolo ou culpa do agente e que sejam incompatíveis com a licitude da conduta.

No mais das vezes, a demonstração da ilicitude e do dolo deriva da própria comprovação do comportamento, do qual são presumidamente indissociáveis.

Acaso o acusado alegue qualquer circunstância que tenha o condão de refutar a acusação, caberá à defesa sua demonstração. É o que ocorre quando invoca, em seu favor, por exemplo, excludente de ilicitude ou culpabilidade, álibi ou, ainda, circunstância excepcional que contrarie as regras da experiência comum.

Averbe-se, no entanto, que, em relação às circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena, o legislador optou, em atenção ao princípio in dubio pro reo, por aliviar o ônus do acusado, de modo a estabelecer que, se houver fundada dúvida sobre sua existência, o réu deve ser absolvido (art. 386, VI, do CPP).

Portanto, ainda que o acusado não produza prova incontestável da ocorrência de uma daquelas circunstâncias justificantes ou dirimentes (erro de tipo e de proibição, coação moral irresistível e obediência hierárquica, legítima defesa, estado de necessidade, exercício regular de direito e estrito cumprimento do dever legal, e inimputabilidade e embriaguez completa involuntária), o juiz deverá optar pela absolvição se houver prova capaz de gerar dúvida razoável em seu espírito. Não basta, entretanto, mera alegação da ocorrência de qualquer circunstância dessa natureza, no interrogatório ou pelo defensor, para que o réu possa ser absolvido, já que a dúvida, para ser fundada, deve advir de elementos de convicção idôneos.

DOS PRINCIPIOS:

Os princípios constitucionais são de suma importância no âmbito do direito processual penal, eles integram no aperfeiçoamento geral do pleito e é baseado neles que se forma a prática destes processos, são eles que garantem a conexão unitária do sistema jurídico na medida em que influenciam o legislador na criação de novas normas. Os princípios orientadores do Direito têm como função assegurar os direitos fundamentais de todos os cidadãos.

No que diz respeito ao princípio da imparcialidade são conferidas algumas garantias constitucionais ao magistrado, para tornar efetivo a aplicabilidade desse princípio tornando o juiz livre e independente, garantindo-lhe a vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos. Para Badaró, “tão importante quanto o juiz ser imparcial é o juiz pareça imparcial”[8], porém não é suficiente que ele apenas pareça que está sendo obediente as regras, ele precisa necessariamente estar, pois o que  a sociedade vê é de extrema importância.

Discutindo sobre o Princípio da Inércia ou ativismo na colheita de prova temos como um ponto para ser observado que se trata do assunto mais polêmico da PL nº8.045/2010 que tramita da Câmara dos Deputado, originado do PL n° 156/09 do Senado Federal, haja vista que se o juiz exercer a iniciativa acusatória, direta ou indiretamente está negando o sistema acusatório.

A atuação de todo juiz deve ser baseada em regras, fundamentos, que norteiam e limitam suas atuações, há de resguardar alguns princípios como o da inércia, que estabelece que o juiz atue apenas quando for provocado pelas partes do processo. Sendo assim a busca de provas, descrita nos artigos 156 e 209 do Código de Processo Penal, fere tal princípio, uma vez que não foi feito o pedido pelas partes e o juiz é informado de uma situação onde não existe o fato concreto em um processo, informações precisas em relação a tal objeto de investigação, o delito e o réu.

Nesse diapasão a Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul negou um provimento apelo referente às disposições do artigo 156 do Código de Processo Penal:

PROCESSUAL PENAL. SISTEMA ACUSATÓRIO. PROVA. GESTÃO. ARTIGO 156, DO CPP. AGRESSÃO AO ARTIGO 129, I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AO JUIZ É VEDADO PERSEGUIR PROVA. PALAVRA DA VÍTIMA. AUSÊNCIA DE VALOR PROBATÓRIO ABSOLUTO. - O texto do artigo 156, do CPP, proclamado pela acusação, fere expressamente a norma constitucional, quer genericamente diante da recepção do sistema processual acusatório, quer especificamente em seu artigo 129, I (onde resguarda o princípio da inércia da jurisdição): eis a regra básica do jogo no sistema processual democrático: um acusa (e prova), outro defende e outro julga - não se pode cogitar da inquisitorial relação incestuosa entre acusador e julgador. - A principiologia constitucional suplantou - desde muito - estratagemas como a crença mitológica de busca da ''verdade real''. Dela o que se alcança é o resultado das limitações históricas, culturais e ideológicas de cada um, exteriorizado na interpretação dos fenômenos mundanos. - Não prestar valor absoluto à palavra da vítima e não violar o princípio da inércia da jurisdição para buscar provas afasta a atividade jurisdicional dos dogmas processuais inquisitórios impregnados na legislação infraconstitucional e na atuação jurisdicional pátrias. - À unanimidade negaram provimento ao apelo. (Apelação Crime Nº 70006183826, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amilton Bueno de Carvalho, Julgado em 28/05/2003)[9]

Com base no conteúdo apresentado pode-se observar que esta iniciativa probatória gera consequências no resultado final do processo, tendo em vista que a jurisdição deve ser inerte, pois o princípio da inércia impede que ocorra parcialidade, porém a partir do momento que o magistrado busca provas, indiretamente se deixa influenciar.

CONCLUSÃO:

O processo penal pátrio, de estrutura acusatória, prestigia a serenidade e a imparcialidade do juiz no tocante às pesquisas probatórias, de modo a desonerar-lhe da preocupação com a reunião de informações e vestígios relativos à infração.

A partir da publicação da Constituição Federal em 1988 passou ser proibida a iniciativa em processo condenatório pelo juiz, o que nos aclara que a atuação do magistrado de oficio, determinando a produção de provas, viola de maneira transparente o princípio da inercia jurisdicional, próprio do sistema acusatório, a busca por provas não pode ter como justificativa para valer-se da verdade real, tendo em vista que no sistema acusatório o juiz busca a garantia dos direitos fundamentais contra a possibilidade de arbítrio do poder de punir do Estado.

A produção de provas é uma continuação do poder de acusar do, MP, uma vez que a carga probatória é dele. O réu fica em um estado de inocência durante todo o processo, sendo assim ele não tem a necessidade de provar sua inocência, cabe a quem o acusou provar nas alegações que ele é culpado. Portanto, se a quem recai a obrigação de provar a culpa do réu não o fizer, o juiz deverá absolver o réu por falta de provas. Não cabe ao magistrado “garantir efetividade” à acusação, produzindo provas, uma vez que as provas server apenas para condenar. Se depois de todas as provas expostas ainda restar dúvida quando a culpa do réu o juiz deve ter como base o princípio constitucional in dubio pro reo, absolver o réu, se tiver dúvida. Se o juiz for produzir provas ele estará acumulando funções de acusar e julgar ao mesmo tempo. O afastamento do juiz da produção de prova é essencial para que seja garantida sua equidistância do caso penal e sua imparcialidade para julgar. A forma como se produz a “verdade” vai definir o modo de obtenção da decisão judicial, a necessidade de averiguar a “verdade”, por si, não justifica conferir a iniciativa do juiz.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto-Lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Diário Oficial de República Federativa do Brasil, Poder Legislativo, Brasília, DF, 13 OUT. 1941.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil.- Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2008.

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 19.ed. São Paulo : Saraiva, 2012.

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda.  . Introdução aos Princípios Gerais do direito processual penal brasileiro. Boletim IBCCrim, São Paulo, n. 188, p. 11-13, jul. 2008.

FERRAZ, Régis. Processo penal: comentários às recentes alterações. 1ªed. Leme/SP: Mundo Jurídico, 2008.

LOPES Jr., Aury. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. 5ª Ed. Rio de Janeiro: Ed. Lúmen Júris 2009.

Manual de metodologia científica / Instituto Luterano de Ensino Superior de Itumbiara; Auriluce Pereira Castilho, Nara Rúbia Martins Borges e Vânia Tanús Pereira. (orgs.) Itumbiara: ILES/ULBRA, 2011.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de processo penal interpretado. 13ª ed. São Paulo, editora atlas S.A 2011.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 10ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2011.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 10ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2013.

RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 18ª ed. ver., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de Processo Penal Comentado, volume 1. 13ª ed. ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2010.

O juiz pode produzir provas de ofício, conforme o novo texto do art. 156, I do CPP. Disponível em: <http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20012&query=156.>Acesso em 02 de setembro de 2013. 



[1] COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Introdução aos Princípios Gerais do direito processual penal brasileiro.

[2] Jurisprudência: Julgamento:  12/02/2004 Órgão Julgador:  Tribunal Pleno Publicação DJ 22-10-2004 PP-00004 EMENT VOL-02169-01 PP-00046RDDP n. 24, 2005, p. 137-146 RTJ VOL-00192-03 PP-00838 Parte(s):REQTE. : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

REQDO. : PRESIDENTE DA REPÚBLICA REQDO. : CONGRESSO NACIONAL

[3] RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16ª Ed. Editora Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2009.

[4] Jurisprudência: Apelação Crime Nº 70026105965, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amilton Bueno de Carvalho, Julgado em 17/09/2008

[5] Jurisprudência: Habeas Corpus Nº 70003938974, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amilton Bueno de Carvalho, Julgado em 24/04/2002

[6] O juiz pode produzir provas de ofício, conforme o novo texto do art. 156, I do CPP? Disponível em http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080703115617182&query=156. Acesso em 08 de setembro de 2013

[7] COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Introdução aos Princípios Gerais do direito processual penal brasileiro.

[8] Badaró, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Disponível em: <http://www.badaroadvogados.com.br/>. Acesso em: 07 setembro de 2013.

[9] Jurisprudência: Apelação Crime Nº 70006183826, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amilton Bueno de Carvalho, Julgado em 28/05/2003.