Retrovisão
Publicado em 28 de janeiro de 2015 por José Milton Correia Jr.
Ela desconfiava de tudo! do passo atras do seu, das marcas de dedo na vidraça, dos sorrisos falsos...de tudo.
Saltava dois pontos antes, para não ser seguida; disfarçava, subia ladeira, cruzava rua, não fazia contato visual, com ninguém.
E assim ia vivendo, como um coelho esperando para ser retirado da cartola. Quanto menos chamasse a atenção, melhor. Quase uma sombra, esgueirando-se para não ser vista. E assim ia caminhando, sempre do lado direito da rua, do lado certo da vida.
O que não podia se quer imaginar é que todo lado tem mais de uma lado, e às vezes um lado errado, um lado esquerdo.
A porta gitratória travou. E todos os medos e desconfianças vieram à tona;
-Isso é só comigo!
O carro enloquecido que patinara na poça dando-lhe um banho, fora de propósito.
O que não esperava, nem em sonhos desconfiava é que naquele fim de tarde um estranho não a assustaria. Os olhares se cruzariam, no relance do retrovisor embaçado. Uma vez, duas vezes....e esse ponto que não chega.
-Não é pra mim que está olhando!, ninguém olha pra mim (...); mas era sim; chega seu ponto, a vontade era de sair pela janela;
Aproxima-se da porta de saída, tropeça no degrau, quase cai. Olha para trás, ele sorrir iluminado pelos faróis do sentido contrário.
Desce, não olha pra trás, desacelera o passo, o ônibus passa, a porta aberta, ele acena e mais uma vez sorrir. Não responde, abaixa os olhos, aperta o livro conta o peito e caminha devagar, sem mudar o caminho.
A rua é uma mistura de sons, luzes, e passos apressados. Mas não tem pressa de voltar. Pode até voltar para casa, mas jamais para si mesma. Finalmente chegou a outro lugar. Um novo lugar, onde nunca havia estado antes.