PROCEDIMENTO DE EXONERAÇÃO, REVISÃO E MAJORAÇÃO DE ALIMENTOS APÓS A AQUISIÇÃO DA MAIORIDADE DOS FILHOS

INTRODUÇÃO:

No direito de família, a coisa julgada revela-se demasiadamente flexível e cada vez mais surgem novidades sobre o tema de maneira que a relativização da coisa julgada no direito de família não é só possível nas lides de alimentos, mas também nas ações de investigação de paternidade com pedido julgado improcedente por falta de provas (REsp n. 226.436-PR, DJ 04/02/2002 e RESP 330172/RJ, DJ DATA:22/04/2002, pg.:00213 RSTJ VOL.:00158, pg.:00409), diante das próprias peculiaridades destas.

DESENVOLVIMENTO:

O Colendo entende que STJ o simples fato da aquisição da maioridade nem sempre significa a imediata cessação da prestação alimentar.

Vejamos nesse sentido:

"EMENTA: AÇÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL. CONSIDERANDO NÃO PROVADOS OS FATOS ALEGADOS NA INICIAL, NÃO E POSSIVEL JULGAR-SE PROCEDENTE AÇÃO, LEVANDOEM CONTA O PROCEDIMENTODO PROPRIO AUTOR, QUE TERIA DESATENDIDO AOS DEVERES DO CASAMENTO. AUSENCIA DE RECONVENÇÃO DA MULHER QUE, AO CONTRARIO, OPÕE-SE A SEPARAÇÃO. ALIMENTOS - FILHOS. O FATO DA MAIORIDADE NEM SEMPRE SIGNIFICA NÃO SEJAM DEVIDOS ALIMENTOS. HIPOTESEEM QUE O ACORDOQUE ESTABELECEU A PENSÃO FOI CONCLUIDO QUANDO OS FILHOS JA ERAM MAIORES (RESP 4347/CE, 1990/0007451-7, DJ DATA:25/02/1991 PG:01467, Min. EDUARDO RIBEIRO)."

Dessa forma, essa questão encontra-se sem discernimento do que ao certo há de se fazer e agir processualmente.

O artigo 15 da Lei n. 5.478/68 disciplina que:

"A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado e pode a qualquer tempo ser revista, em face da modificação da situação financeira dos interessados".

Diante da determinação do art. 15 da Lei n. 5.478/68 duas posições imperam, veja-se:

I) - uma corrente que entende que os alimentos fixados por sentença, em favor dos filhos "menores" (tecnicamente crianças e adolescentes), se extinguem ipso jure e automaticamente com a maioridade civil dos favorecidos; e, assim, pode a prestação cessar de ofício por iniciativa do julgador ou mediante provocação por meio de simples petição protocolada pelo interessado, sem a garantia do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Nesse sentido:

"Alimentos – Obrigação alimentar – Filho – Maioridade atingida – Cessação automática do dever de pagá-los(...) (TJSP, 1º CC, Agravo por instrumento n o. 260.325-1-SP, Rel. Dês. Renan Lotufo, j. em 19.9.1995, in Boletim AASP no. 1.950, de a 14.05.1996, p. 36-e)."

Em que pese o respeito ao posicionamento adotado na decisão acima citada, verifica-se que esta posição fere o disposto no art. 5º, incisos LIV e LV da CF, in verbis:

"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;"

Assim passemos a discorrer acerca da posição mais consentânea com a ordem constitucional.

II) – a segunda corrente consentânea com a Constituição Federal entende que para a extinção da prestação alimentar, já fixada em sentença, é necessária a iniciativa do devedor em pedido dirigido ao juiz, nos próprios autos originários em que foi fixada a obrigação, com a oitiva da parte contrária e produção de provas; ou, em processo autônomo de revisão ou exoneração de alimentos; sendo certo que, em ambas as situações, deve ser garantido de maneira irrestrita o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal, com observância do art. 5º, incisos LIV e LV, da CF e possibilidade de manifestação do Ministério Público (não obrigatoriedade, salvo casos justificados, como por exemplo, requerido deficiente físico).

É praxe dos alimentantes, por economia processual, requerem, nos próprios autos da ação originária, o cancelamento da obrigação alimentar ou a proporcional redução da pensão, diante da maioridade de algum dos filhos; e, neste caso, os juízes geralmente aceitam esse procedimento e determinam a intimação dos interessados, com deferimento incontinente do pedido somente no caso de concordância do credor; e, por outro lado, se o alimentando alegar que ainda necessita da prestação, podem ser adotadas as seguintes alternativas:

a)- o devedor é encaminhado à ação de exoneração ou revisão de alimentos; ou,

b)-  é instaurado, nos mesmos autos, o contraditório e o magistrado decide pela procedência (total ou parcial) do pedido ou pela manutenção da prestação alimentar.

Creio que quaisquer das posições referidas devem ser aceitas, pois garantam o disposto no art. 5º, incisos LIV e LV da CF.

Sobre o tema ensina o Min. RUY ROSADO DE AGUIAR no RESP 347010/ SP:

"Verifico que, realmente, o fato da maioridade é causa extintiva ipso jure do dever que decorre do pátrio poder, por isso não é razoável se imponha ao alimentante a iniciativa de uma ação de exoneração, com todos os inconvenientes que disso decorrem. De outro lado, é também muito comum que o filho, ao atingir a maioridade, ainda necessite da contribuição paterna, pelas muitas razões que a experiência do foro revela, dadas suas condições sociais, físicas, educacionais e financeiras, especialmente entre os da classe média, que frequentam curso superior. "O fato da maioridade", disse o Min. Eduardo Ribeiro, "nem sempre significa não sejam devidos alimentos" (REsp 4347/CE). Tal seja o caso, não seria razoável o automático cancelamento da prestação, a exigir do filho ingressar com ação de alimentos para manter a prestação alimentar, uma vez que se trata de simples continuidade da situação existente. Por isso, chego à conclusão de que acertados estão os juízos de família que adotam a praxe de extinguir a obrigação mediante solicitação do obrigado, nos autos do processo em que consignada a obrigação, ouvidos os interessados e o Ministério Público. Se concordes, e isso também é comum e vezes tantas o pedido já vem acompanhado da anuência do beneficiário, o juiz decide pela extinção. Com a discordância, cabível a produção sumária de prova, com sentença decidindo pelo cancelamento ou, ao reverso, assegurando a continuidade da prestação. Quando não for possível decidir a questão nos próprios autos da ação originária em que o alimentante atravessou o seu pedido, então seria de encaminhar as partes para a ação de alimentos (a ser instaurada pelo filho) ou para a ação de exoneração ou de modificação (de autoria do pai)."

Vejamos também:

"EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL. PENSÃO ALIMENTÍCIA PAGA A FILHO ENTÃO MENOR POR FORÇA DE ACORDOEM SEPARAÇÃO CONSENSUAL. MAIORIDADE.PEDIDODE CANCELAMENTO DA PENSÃO FEITO NOS PRÓPRIOS AUTOS. PROCESSAMENTO COM CONTRADITÓRIO. EXAME DO MÉRITO. MANUTENÇÃO DOS ALIMENTOS.RECURSO ESPECIAL. PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL. MATÉRIA DE FATO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7-STJ. I. Se ao pedido de cancelamento da pensão, formulado pelo pai alimentante no bojo dos autos do processo de separação consensual, em face da maioridadedo filho, foi dado processamento litigioso, com observância de contraditório e colheita de provas, não há efeito prático, senão propósito procrastinatório, em perquerir, a tal altura, depois de apreciada profundamente a controvérsia, qual a ação cabível e a quem pertencia a sua iniciativa, se ao filho maior em ajuizá-la para postular a manutenção, ou ao genitor alimentante em pedir a exoneração. II. Decidido pelo Tribunal estadual, soberano na interpretação da prova, sobre a necessidade do filho maior estudante, a ser provida com pensão alimentícia pelo pai (arts. 396 e 397 do CC), o reexame da questão encontra, em sede especial, o óbice da Súmula nº 7 do STJ. III. Recurso especial não conhecido (RESP 306791 / SP ; RECURSOESPECIAL,2001/0023817-3, DJ DATA:26/08/2002 PG:00228, Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR)."

"EMENTA: ALIMENTOS. Filhos. Maioridade. Extinção. - Atingida a maioridade do filho, o alimentante pode requerer, nos autos da ação em que foram estipulados os alimentos,o cancelamento da prestação, com instrução sumária, quando então será apurada a eventual necessidade de o filho continuar recebendo a contribuição.

Á despeito do argumento acima ter uma lógica clara, com a devida licença, revela-se "contra legem".

Se há norma que diz que não corre o prazo prescricional em detrimento de incapaz, que não tem condições de exercer, por sua vontade, o direito de ação, então é essa a norma a aplicável, independente deste ter sobrevivido no tempo não retirando-lhe  o direito de perceber os alimentos, do contrário estaríamos diante do enriquecimento ilícito do obrigado aos alimentos não cumpridos.

Os julgados abaixo transcritos, encontram-se sob a égide do Código Civil anterior, todavia, se aplicam ao debate:

"A PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL NÃO CORRE CONTRA INCAPAZES, NEM CONTRA ASCENDENTE E DESCENDENTES, DURANTE O PÁTRIO PODER. ADEMAIS, A CITAÇÃO COMO TERMO INICIAL DA PRESTAÇÃO ALIMENTÍCIA É ENTENDIMENTO UNIFORMIZADO NO STJ. (TJBA - AP. CÍV. 11.853-9/02 - 1ª C.Cív. - Relª. Desª. Ruth Pondé - J. 27.11.2002)".

"ALIMENTOS - EXECUÇÃO - PRESCRIÇÃO ALEGADA. Curso admitido, diante de credor, apenas desde quando completou dezesseis anos de idade (arts. 169, I, do Código Civil) - Período de exigência, na espécie, que torna claro não estar atingida nenhuma das parcelas atrasadas, pela alegada causa extintiva. Agravo não provido. (TJSP - AI 116.039-4 - 10ª C.D.Priv - Rel. Des. Quaglia Barbosa - J. 10.08.1999)".

"ALIMENTOS - PRESCRIÇÃO. Inteligência do artigo 23 da Lei 5.478, de 1968, conjugado com os artigos 168, II e 169, I, do Código Civil - Prescrição qüinqüenal que embora atinja as prestações vencidas e não satisfeitas, não afeta direito de credor absolutamente incapaz. Recurso provido. (TJSP - AC 97.922-4 - 6ª C.D.Priv - Rel. Des. Antonio Carlos Marcato - J. 11.02.1999)".

CONCLUSÃO:

O artigo 206, parágrafo 2º do Código Civil, de fato, dispõe que as dívidas alimentares prescrevem em dois anos, todavia, essa norma deve ser interpretada conjuntamente com o artigo 197 do mesmo Código que expõe os casos em que não ocorre a prescrição, valendo destacar o inciso II que retira o curso da prescrição entre ascendentes e descendentes durante o poder familiar. E com o artigo 198 que dispõe não correr a prescrição (I) contra os incapazes de que trata o art. 3º (menores de dezesseis anos, deficientes sem discernimento para a prática de atos da vida civil e os que, mesmo por causa transitória não puderes exprimir sua vontade.