O velho sábio.

 

Sentado à porta do tempo, o velho sábio estava. Seus olhos negros fitavam alguma coisa invisível pra mim. Seus gestos lentos deixavam-me pensativo. As mechas de cabelos longos e grisalhos misturavam-se com a barba também grisalha. Sua idade era imprevisível, aparentava umas oito décadas de existência, porém, alguma coisa nele denunciava uma existência muito acima da média normal de vida de um ser humano.

Não era nem um pouco encurvado como a maioria dos anciãos que conheci, a impressão era que se tratava de um antigo e formidável atleta e que ainda trazia no corpo traços físicos desse tempo da sua vida. Suas mãos eram firmes, não tremiam, como julguei, antes de reparar melhor. Seus pés pisavam firmes quando andava, parecia que o destino, o lugar da chegada, dava-lhe forças para que fosse assim.

Pensei que não tivesse percebido minha chegada, mas depois de algum tempo, desviou o olhar daquilo que via e eu não, e fixou em mim aqueles dois olhos negros e profundos como o mar.

Senti-me como que violado nos meus mais profundos segredos. Adicionou-se em meu cérebro mais uma compreensão, o que na verdade última significava a palavra força.

Uma força silenciosa, sem violências. Uma paz tão nova e estranha para mim, que tudo o mais deixou de existir, como se o tempo tivesse parado. Não existia mais nada a não ser aquele estranho ancião e eu, embalados pelo silêncio de tudo.

Então ouvi sua voz. Pensei que fosse me perguntar quem era, ou, o que estava fazendo ali, de onde vinha, mas não. Suas palavras foram tão inesperadas como calma e pacífica era sua voz.

Quando falou, movia a boca lentamente, como se estivesse saboreando cada sílaba de cada palavra que dizia. Não havia pressa em nada. E sem pressa falou e disse:

“ – Não é difícil encontrar o que procura, se na procura levar muito amor, vontade e resignação. O coração é o instrumento que indica a rota e o cérebro é o que tira do caminho os obstáculos. Quem procura com o coração encontra o amor. Quem encontra o amor, dá ao cérebro a explicação e as respostas de tudo. E Tudo, é uma resposta só”.

  Falou tantas coisas que pensei estivesse delirando. Mas, delirando devia estar eu. Pois me demorava no entendimento. Só quando consegui compreender a extensão do que me explicava, ele continuou:

“ – Uma coisa é importante. Quem procura saber, desta forma, sabe. Mas não deve jamais esquecer a humildade necessária para conseguir o que conseguiu. Saber não é difícil. Difícil é esconder que sabe.

 Difícil, é ouvir verdadeiros insultos à Verdade e ter de ficar calado, ter que aceitar a confusão das pessoas até que elas entendam, cada uma por si, o que é a Verdade. Difícil, não é saber o segredo da vida, mais do que difícil, até quase impossível, é colocar dentro de cada um essa visão do TUDO, porque cada um terá que descobrir por si. Cada um terá de procurar, até merecer encontrar. Nunca se esqueça que o segredo é um segredo, não porque é proibido, mas apenas porque o ser humano, talvez sem o querer, faz com que seja assim”.

Sua paz me inundava de compreensão. Sentia-me como se fosse algo assim como uma pluma, leve, sem peso físico ou psicológico. Não sentia meu corpo, eu não tinha corpo. Sentia-me como uma pequena “bola de luz” que flutuava.

Suas lições mataram meus medos sem dilatar excessivamente a coragem. Mediu meus sentimentos e equilibrou meus atos e pensamentos. Mostrou-me que ser justo era uma questão de vital importância e jamais deveria ser influenciado exteriormente, pois dentro de cada um existem as medidas exatas que coordenam os atos que o tempo se encarrega de endossar.

“ – Olhe para o mundo, mas não julgue o mundo, pois dentro de você existe outro igualzinho ao que está fora. Se o primeiro parecer errado, conserte o segundo e verá que modificou também o outro. Agora, quando houver erro no exterior, proclame o acerto, lute e morra por ele”.

Apesar das profundas analogias, minha mente captava com perfeito entendimento de significados.

“– Olhar dentro das pessoas através dos olhos não é um crime, pois só consegue isso quem estiver puro de sentimentos, como uma criança normal. Se sua mão estiver sempre “limpa”, você poderá sempre tocar o coração do seu próximo. Siga seu caminho no tempo, sem medo de olhar em qualquer direção. Estaremos sempre juntos, embora fisicamente separados. Seremos UM só, como um só seremos todos um dia”.

Suas palavras andavam pelos meus pensamentos, trazidas pelos meus ouvidos, pelos meus olhos, pelo meu tato, olfato, enfim por tudo em mim que pudesse estar alerta para viver aquele momento.

O eco de suas palavras ainda visita meus ouvidos, mesmo depois de ter acordado, levantado e retornado às atribulações do cotidiano.