O TESTAMENTO VITAL: manifestação da autonomia da vontade do paciente e sua inclusão no ordenamento jurídico brasileiro1

 

Jéssica Cristina P. B. Pinheiro e Jéssica Valéria S. Lima2

Anna Valéria de Miranda Araújo Cabral Marques3



RESUMO

Este paper visa considerar a possibilidade técnica-jurídica do reconhecimento do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista a recente alteração do Código de Ética, através da resolução nº 1995/12, que permite a manifestação da vontade do paciente que poderá decidir como será o fim da sua vida, caso esteja cometido de doença incurável ou em estado terminal. Para tanto, demonstra-se através de argumentos a viabilidade do novo tipo de testamento, fazendo uma analogia com as regras civis quanto a forma, características e requisitos, além de fundamentar a licitude do objeto ou conteúdo do testamento de acordo com preceitos constitucionais. Por fim, entende-se a necessária regulamentação do testamento vital, tendo em vista a aceitação deste instituto, seus benefícios, e segurança jurídica que proporciona em considerar efetivamente a vontade do paciente sobre seu destino.

Palavras – chave: Autonomia da vontade. Dignidade da pessoa humana. Testamento vital.



1 INTRODUÇÃO

Fruto da excessiva mecanização da medicina, advinda da revolução tecnológica, atualmente se observa que muitos pacientes nos hospitais ultrapassam os 80 anos, estando vivos, ainda, apenas por causa de aparelhos que prolongam o seu estado, são os chamados pacientes em estado terminal. Estes pacientes, embora, excessivamente debilitados, em alguns casos, ainda podem expressar a sua vontade, que, na maioria das vezes, é aquela última vontade.

O paciente, assim, pode expor uma série de vontades no que diz respeito ao modo como será tratado durante este curto espaço de tempo que lhe resta de vida, ou seja, o paciente goza de certa autonomia que dá origem a um instituto legal chamado testamento vital ou diretiva de vontade antecipada.

O testamento vital na prática já se tornou evidente no mundo e no Brasil, sendo assim, esta pesquisa tem por objetivos demonstrar a eficácia de mais uma modalidade testamentária na doutrina brasileira a despeito da legislação não abarcar esta hipótese. Logo, é objetivo especifico analisar o conceito, os requisitos intrínsecos à sua validade, as eventuais consequências legais tanto para os familiares quanto para os médicos que (in) aplicam tal vontade manifesta no testamento vital. Por fim, traçar-se-á argumentos que viabilizam a disposição normativa deste tipo de testamento no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista o passo inicial dado pelo Conselho Federal de Medicina ao identificar essa possibilidade.

2 RECONHECIMENTO DA AUTONOMIA DA VONTADE DO PACIENTE

A autonomia quer dizer independência. Independência de poder dar a si mesmo regras que se ajustam aos seus próprios interesses. Quando elas regulam os interesses das pessoas nas relações recíprocas estar-se diante da autonomia privada. Tais regras são fundamentais para o desenvolvimento da vida social e cooperação entre os seres humanos.

Frisa-se que este trabalho partirá da concepção da autonomia privada em sentido estrito – “referindo-se ao uso, gozo e disposição de poderes, faculdades e direitos subjetivos” (CIVITA apud SZTAJN, p.25, 2002) – e também da definição de autonomia privada em sentido amplo, referindo-se aquela que rege as relações jurídicas, que as cria, modifica e extingue, já que se estar a querer dar aceitação e regulamentação a uma relação jurídica válida e eficaz por meio de um documento (testamento vital).

O direito como regra social limita de certa forma a vontade individual em nome do interesse público, da moral e dos bons costumes. Vale ressaltar o posicionamento de Marcelo de Mello Vieira para quem “a intervenção do Estado nesse projeto passa a ser excepcional e só se legitima para a promoção e proteção dos direitos de todos os cidadãos e, mesmo assim, deverá ser realizada respeitando o máximo possível da vontade da pessoa” (p.5).

Então, acaba estabelecendo dois tipos de capacidades que esta intimamente ligada à noção de vontade. A vontade pode ser entendida como uma das manifestações da autônima e depende da capacidade da pessoa. Logo, as regras jurídicas estabelecem a capacidade jurídica e a capacidade de fato. Esta como capacidade de exercício de direitos, de fazer valer seus interesses perante a incidência das normas jurídicas em relação a si próprio, e aquela como capacidade para o gozo de direitos, ou seja, quando ao individuo é reconhecido conjunto de direitos, que, por exemplo, são indelegáveis e irrenunciáveis, aderidos à sua personalidade, pelo simples fato de ser sujeito de direitos.

O próprio ordenamento jurídico brasileiro prevê limitações para a capacidade de fato, como por exemplo, a idade mínima de 18 anos, (art. 5°, CC) que esta ligada a ideia de experiência e vivência, em que o individuo se revela apto para discernir entre as escolher o que seja melhor para os seus próprios interesses, logo terá a capacidade plena.

Posto isso, entende-se que a “autonomia implica não só o respeito a alguém mas também a reciprocidade, isto é, ser respeitado” (SZTAJN, p.28). No que se refere aos princípios da bioética ninguém pode ser coagido (paciente) nem coagir (médico) no âmbito dos tratamentos terapêuticos. Por isso o medido deve previamente, explicar com clareza todas as possíveis ações que tomará com relação ao seu paciente, bem como quais as possíveis intervenções que aquele se submeterá, como procedimentos terapêuticos, terapias alternativas, devendo sempre se expressar em linguagem acessível, de forma que a vontade do paciente não seja viciada por pressão do médico ou familiares ou pela própria ausência de informações. Nesta situação o paciente tem o consentimento informado.

Se o paciente esta em pleno gozo das faculdades mentais, estando apto a avaliar as consequências da sua declaração no que tange as terapias recomendadas, seus efeitos colaterais, dentre outras intervenções médicas, claro esta que em situações de absoluta emergência também pode fazer com que sua vontade prevaleça escolhendo quais os tratamentos que quer ser submetido não abrindo margem para que a vontade de outros prevaleça, como por exemplo, familiares e médicos. Isto porque, “cabe, ao médico, portanto, em qualquer decisão séria, visando ao bom resultado do tratamento, assegurar-se de que o paciente tem aptidão para compreender o que lhe é explicado e refazer as explicações se não estiver convencido do que o entendimento foi correto” (SZTAJN, p.29).

Diante disso, se é dado a oportunidade de compreender e aceitar, concordar perante o médico sobre tais intervenções, também deve ser aceita a prerrogativa do paciente de elaborar um documento em que exprima de antemão as suas escolhas e compreensões acerca destes tratamentos médicos avaliando-as, ele mesmo, segundo as suas preferências e prioridades pessoas. Pois se, por exemplo, o paciente é uma pessoa que vive sob a regra da liberdade, viajando constantemente, se submetendo a experiências esportivas radicais, não é de convir que, em momento posterior, quando se encontre idoso ou em estado de doença terminal, ele aceitaria se submeter a um coma induzido podendo ficar internado em um hospital durante anos, ou mesmo se submeter a um longo tratamento que traga sofrimento a ele mesmo e aos seus familiares.

Entende-se que no referido documento o paciente já sopesou os efeitos da terapia, pois poderia de antemão procurar médicos e especialistas que lhe esclareçam sobre sua doença ou eventual doença que possa adquiri por ser predisposto geneticamente, como também sopesou seu estilo de vida, crença religiosa, família, amizades, amigos, valores sociais. Todos esses elementos podem levar o indivíduo a aceitar ou recusar um determinado tratamento, pois o paciente pode optar por suportar o sofrimento da moléstia e não ao sofrimento do tratamento, pode, ainda, preferir morrer a expor a família a presenciar longa agonia que cause dano emocional permanente.

Busca-se, com isso, o reconhecimento de tal documento no ordenamento jurídico pautado pelos princípios do Direito Civil e da Bioética. É um sistema de valores que não pode ser olvidado neste momento. Explica referidos princípios Maria Helena Diniz4:

Nas relações médico-paciente, a conduta médica deverá ajustar-se às normas éticas e jurídicas e aos princípios norteadores daquelas relações, que requerem uma tomada de decisão no que atina aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos a serem adotados. Tais princípios são da beneficência e não maleficência, o do respeito à autonomia e ao consentimento livre e esclarecido e o da justiça. Todos eles deverão ser seguidos pelo bom profissional da saúde, para que possa tratar seus pacientes com dignidade, respeitando seus valores, crenças e desejos ao fazer juízos terapêuticos, diagnósticos e prognósticos. Dentro dos princípios bioéticos, o médico deverá desempenhar, na relação com seus pacientes, o papel de consultor, conselheiro e amigo, aplicando os recursos que forem mais adequados (DINIZ, 2006, p.648-649 apud BOMTEMPO, p.26, 2012 – grifo nosso)

Para a maioria da doutrina este ato volitivo do paciente é chamado de diretiva antecipadas de vontade, que mais adiante se verá que já esta regulamentada pela resolução do Conselho Federal de Medicina.

O que importa aqui destacar é que a autonomia da vontade e a sua manifestação em um documento escrito é um direito e garantia fundamental do paciente, estando abarcada pelo principio da dignidade da pessoa humana e como decorrência deste os direitos à vida, os direitos à liberdade e de igualdade. A Constituição Federal de 1988 consagrou no art. 1º, III, a dignidade da pessoa humana, como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Em seguida, no art. 5º, III, preceitua que "ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante". Assim, o respeito a autonomia do paciente se desdobra no respeito enquanto pessoa humana, individuo que na posição de paciente como ser autônomo e como principal interessado na cura, agora se reconhece seu papel de protagonista no processo curativo.

Destaca-se que se deve entender que o os médicos não podem a qualquer custo salvar vidas, mas garantir a dignidade do doente, tratando-o como pessoa. Sendo assim, pode-se compreender que querendo uma pessoa elaborar o seu projeto de vida e querer decidir os seus momentos finais de vida, pode ela se valer de algum instrumento jurídico apto a manifestar, com força cogente, seus desejos caso estivesse em uma situação terminal? Esse documento é juridicamente válido?

 

3 O TESTAMENTO VITAL

 

Por testamento se entende que é ato pessoal, unilateral, espontâneo e revogável, que a pessoa determina o destino do seu patrimônio ou de parte dele para depois de sua morte, devendo o testamento atender as exigências formais para não ser posteriormente invalidado, só tem validade e pertinência depois do óbito do testador. (GONÇALVES, p.229, 2013).

Nas palavras de Rolf Madaleno:

O testamento abrange manifestações de cunho pessoal e familiar, cuidando o testador de reger o exato conteúdo de suas preocupações pessoais e econômicas, tratando de dispor no plano patrimonial o pessoal o endereçamento futuro de seus bens, para depois de seu falecimento, cercando-se com a partilha dirigida e se achar necessário, consignando aquilo que gostaria de ter dito em vida ou que mesmo tendo dito em vida, ainda assim gostaria de perpetuar na memória de seus herdeiros e legatários, cientes de que valores morais e a unidade familiar são heranças que transcendem a passagem do homem e o registro histórico de sua construção pessoal.

 

O testamento, como se vê pode abranger diretivas de vontade a respeito do patrimônio como perfeitamente da própria vida do testador. Porém o testamento vital é ainda uma diretiva enquanto o individuo estar com vida, ou seja, sua eficácia não se da com a morte. Sendo esta uma das principais dificuldades de se aceitar tal instrumento no ordenamento jurídico brasileiro.

Ocorre que, com o desenvolvimento tecnológicos dos tratamentos que prolongam o evento morte existe já à algumas décadas o desafio dos médicos, familiares e juristas em aceitar o direito do paciente em manifestar a sua vontade em relação a estes em situações de incapacidade, em que conste o interesse ou não do indivíduo em se submeter à terapias médicas, o qual tenha validade caso o paciente esteja incapaz de manifestar a sua vontade. Assim, não tem sua eficácia como evento morte, mas sim com o evento de doença que o torne incapaz de se expressar naquele momento pondo em duvida o médico e familiares acerca de sua vontade daquele momento em diante.

Surgiu nos Estados Unidos as chamadas diretivas de vontade (Advences Directives), previstas na PSDA – The Patient Self-Determination Act ou Ato de Auto-Determinação do Paciente, lei aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos que entrou em vigor a partir de 1º de dezembro de 1991 (BOMTEMPO, p.3).

A referida lei reconhece a autonomia do paciente em recusar tratamento médico. Esta recusa pode ser no momento em que o paciente entre nos centros-médicos ou nos hospitais em que serão registradas as objeções e opções de tratamento em caso de incapacidade superveniente do doente. Aqui pode haver críticas quanto ao consentimento informado, pois neste momento o paciente ainda não conhece os tratamentos terapêuticos aptos a serem aplicados ao seu caso, porém o paciente já pode ser acometido por doença crônica, por exemplo, em que esta levada ao centro médico pode não ser a primeira vez, sendo então valida a sua vontade neste primeiro momento.

De acordo com Luciana Penalva5 apud Marcelo de Mello Vieira1 (2009, p.528):

É uma lei que ordena às instituições médicas a dar informações aos indivíduos adultos, no momento de sua admissão na instituição, acerca de seus direitos baseados nas leis estaduais, incluindo o direito de participar diretamente das decisões sobre os cuidados a serem despendidos; o direito de aceitar ou recusar medicamentos e tratamentos cirúrgicos; o direito a preparar uma diretiva antecipada.

 

Tiago Vieira Bomtempo, explica que estas manifestações de vontade, diretivas antecipadas, são realizadas de três formas:

O living will (testamento em vida), documento o qual o paciente dispõe em vida os tratamentos ou a recusa destes quando estiver em estado de inconsciência; o durable power of attorney for health care (poder duradouro do representante para cuidados com a saúde), documento no qual, por meio de um mandato, se estabelece um representante para decidir e tomar providências em relação ao paciente; e o advanced core medical directive (diretiva do centro médico avançado), que consiste em um documento mais completo, direcionado ao paciente terminal, que reúne as disposições do testamento em vida e do mandato duradouro, ou seja, é a união dos outros dois documentos (2012, p. 3).

 

Percebe-se que se quer trazer para o direito pátrio a primeira forma de testar, o living will, que tem tradução literal para o português corresponde a “testamento vital”. O testamento vital, então, é um documento em que a pessoa determina, de forma escrita, que tipo de tratamento ou outro meio alternativo deseja se submeter para a ocasião em que se encontrar doente, em estado incurável ou terminal, e incapaz de manifestar a sua vontade. Nas palavras de Naves e Rezende apud Marcelo Vieria:

(...) é um documento breve, a ser utilizado em situação oportuna, no qual o paciente informa, de modo genérico, seu desejo de ser submetido ou não a tratamentos fúteis, nesse caso, entendidos como aqueles que apenas prolongam a vida artificialmente, contudo, não apresentam melhora no quadro clínico, suas opções quanto a métodos de reanimação cardiorrespiratória, manutenção de vida vegetativa por aparelhos e etc (p.105, 2007)

 

Pode-se observar que para estes autores o testamento vital só seria utilizado em casos terminais. A moléstia terminal é aquela que, de acordo com avaliação médica, levará o paciente a morte, ou por não existir medidas terapêuticas capazes de cura ou porque o paciente não aceita mais o tratamento. O paciente terminal é aquele que sofre a doença terminal ou que está em estagio final de doença não terminal (SZTAJN, p.107).

A questão que se coloca neste momento é saber se existe no plano do direito normas que permitam aos médicos ministrar ou prescrever drogas letais a certos pacientes quando seja certo que nenhuma terapia poderá trazer de volta a saúde e garantir qualidade de vida. Sendo assim, o prolongamento da vida só tornaria o processo mais dolorido, pois receber comida, respirar mediante aparelhos não é uma qualidade de vida desejável por ninguém. Por isso é o respeito a autonomia e consequentemente a dignidade da pessoa no caso de pacientes terminais é mais relevante do que em qualquer outro caso.

Decidir sobre o prolongamento da vida é justamente um dos objetos do testamento vital. O indivíduo poderá declarar previamente sua vontade quanto à submissão ou não aos tratamentos médicos que vão somente prolongar a sua morte, ou seja, podendo causar-lhe mais dores e sofrimentos inúteis. Faculta-lhe, portanto, em optar por uma morte digna. Neste ponto, é necessário se fazer referência ao “direito de morrer dignamente”. Este para alguns doutrinadores é o desejo de se ter uma morte humana, sem o prolongamento da agonia por parte de um tratamento inútil. Isso não se confunde com o direito de morrer.

Por outro lado, o direito de morrer tem sido taxado como sinônimo de eutanásia ou de auxílio ao suicídio, que são intervenções que causam ou antecipam a morte. É o suicídio assistido, em que o médico fornece ao paciente meios para que este ponha término a sua existência. Este ato já esta tipificado no código Penal como induzimento ao suicídio, deixando, assim de ser terapia médica.

O certo é que este crime não pode se confundir com o direito de morrer dignamente, pois se frustraria por completo a aceitação do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro. Pois, este é aceitável somente nos casos de doenças irreversíveis ou incuráveis, em que já não seja mais possível expressar a vontade do doente. Este, em fase terminal ou em estado vegetativo autoriza, mediante documento, a suspensão de tratamentos que visam apenas a adiar a morte, em vez de manter a vida.

É importante ressaltar, ainda, que esse consentimento tem que ser prévio, antes do doente se tornar um paciente terminal. O testamento vital pode ser feito pela pessoa livre de qualquer enfermidade ou quando ela já esteja internada, por exemplo, mas sendo requisito de validade a sua capacidade de discernimento.

Apesar da possibilidade de ser realizado antes de ter alguma doença grave ou incurável, é provável que as pessoas não pensem em fazer o testamento vital nesta hipótese, pois as pessoas não se preparam para morrer, como descreve a reportagem da Revista Veja intitulada “O direito de escolher”. Segundo a matéria, a ideia de fazer o testamento vital naturalmente causa um desconforto, sendo por isso a porcentagem mínima de pessoas que decidem fazer o testamento antes de ser informada de uma notícia ruim. Nos Estados Unidos, por exemplo, onde já reconhecido legalmente o instituto, “somente 40% dos americanos optaram por deixar registrado como pretendem ser tratados no fim da vida” (VEJA, 2012, p. 104). Justifica-se essa repulsa pelas conquistas da medicina, todavia, julga-se necessário o testamento vital, para evitar o sofrimento desnecessário em detrimento da dignidade da pessoa humana e qualidade de vida.

4 O RECONHECIMENTO LEGAL DO TESTAMENTO VITAL

 

O Conselho Federal de Medicina determinou por meio da Resolução nº 1995/12, aprovada no dia 30 de agosto de 2012 a possibilidade de realizar o testamento vital. Assim, a postura dos médicos mudou diante os quadros clínicos dos pacientes em estado terminal e incurável. Antes, quando o paciente estava nessa situação, o médico recorria à opinião da família ou do representante legal, considerando que neste estado, a pessoa não poderia expressar sua vontade. Com a nova resolução, o médico deverá respeitar a vontade pré-determinada pelo paciente ou sua autonomia sobre o seu destino. Como é uma norma a ser cumprida por médicos de todo o país, quem não respeitar poderá ter sanção, ou perda do registro da profissão.

Por isso, a referida resolução tem força de lei, embora não seja uma lei ordinária que perpassa por processo legislativo. Cabe destacar que a CFM é uma autarquia especial federal que integra a Administração Pública indireta, cuja função compreende a expedição de atos normativos válidos e vinculantes a todos profissionais da área de medicina. E assim como todo ato administrativo, é passível ser controlado por via jurisdicional ou legislativa.

Embora ainda não regulamentada pelo poder legislativo, a possibilidade de realizar o testamento vital não deve ser descartada. Antes mesmo da resolução do CFM, “no Brasil, nos últimos anos, alguns acordos já vinham sendo firmados entre médicos e pacientes” (VEJA, 2012, p. 100), tendo em vista que as pessoas tem liberdade para fazer acordos, em respeito ao princípio da autonomia da vontade, como já explanado anteriormente, desde que não violem disposições expressas no ordenamento jurídico.

Além disso, existem pesquisas que revelam a aceitação do testamento vital, considerando a possibilidade de futuramente desenvolver alguma doença incurável ou que possibilite a fase terminal. Entre grupos sociais, médicos, advogados e estudantes foi realizado uma pesquisa cujo resultado permite considerar ampla aceitação:

Não considerando a possibilidade de instituição do Testamento Vital, 87,6% dos entrevistados optariam pela ortotanásia diante de um paciente em fase terminal de vida. Considerando a sua institui­ção, a opção pela ortotanásia caiu para 35,9% e a opção pelo Testamento Vital foi apontada por 60,8% dos entrevistados, diferença estatisticamente significativa (p<0,01). A ampla aceitação do testamento vital por todos os grupos pesquisados permite supor que sua regulamentação poderá ser bem recebida e útil à sociedade brasileira como forma de garantir a autonomia do paciente que se encontre incapaz de manifestar sua vontade. (PICCINI, 2011, p. 388).

Por isso, pode-se inferir a necessária regulamentação do testamento vital para garantir o anseio social, o atendimento da autonomia privada do paciente. São casos comuns que acontecem nos hospitais, e que precisam de uma regulamentação a fim de evitar insegurança jurídica, e proporcionar a qualidade de vida das pessoas que se encontram em estado terminal ou com doença incurável. Não obstante, analisa-se a viabilidade técnica-jurídica de reconhecimento deste novo tipo de testamento no Brasil.

Como ato jurídico, a validade do testamento vital é indiscutível. Independentemente de forma oral ou escrita, a expressão da vontade produz efeitos que o agente pretende, apresentando elementos essenciais do negócio jurídico dispostos pelo Código Civil: declaração de vontade, consentimento, capacidade, forma e objeto lícito. Em relação a estes últimos, há de se fazer algumas considerações iniciais.

Quanto à forma, embora não estabelecida por lei, depreende-se a interpretação do art. 107 CC, pois segundo este artigo, a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, exceto quando a lei expressamente a exigir. Sendo assim, a forma poderá ser livre e ser considerado válido. E plano da validade, cita-se entendimento de Carlos Roberto Gonçalves, que “é um dos requisitos do negócio jurídico, porque estes são condição necessária para o alcance de certo fim” (GONÇALVES, 2011, p. 348).

Quanto ao objeto lícito, ou conteúdo do testamento vital, considera-se preliminarmente um embate entre direitos fundamentais, o direito a vida, e a dignidade da pessoa humana. Desta forma, analisa-se a possível legitimidade jurídica do testamento vital pelo ordenamento jurídico através de argumentos legais, sobretudo em relação à forma e o conteúdo, que são elementos indispensáveis para o reconhecimento da validade do ato.

 

2.1 Quanto a forma, características ou requisitos

 

É necessária a analogia com as regras civis, sobretudo em relação as características ou requisitos do testamento comum, uma vez que o testamento vital apresenta apenas um aspecto que lhe é peculiar. O testamento vital é um documento que expressa a vontade do paciente sobre o seu destino, portanto, difere do testamento comum, pois tem efeito antes da morte, sendo suas disposições relativas aos direitos da personalidade e autonomia do indivíduo, sendo a regra sucessória a produção de efeito após a morte, podendo ser de caráter patrimonial. Não obstante este aspecto, o testamento vital está sujeito às disposições do Código Civil, referentes ao título III, da sucessão testamentária.

Sobre a capacidade de testar, o art. 1.860 do CC determina que não poderão testar os que no ato de fazê-lo, não tiverem o pleno discernimento, além dos incapazes por idade, pois poderão testar os maiores de dezesseis anos. Há preocupação, portanto, também em relação ao testamento vital sobre o consentimento, que deve ser pleno, isento de coação, dolo ou erro, uma vez que o paciente ao buscar de auxílio do médico e obter viabilidade ou não dos meios terapêuticos não significa consentimento expresso ou implícito.

A autora Rachel Sztajn destaca que é preciso assegurar a boa comunicação entre o médico e o paciente, tendo em vista que o testamento vital poderá ser pactuado de forma oral. O paciente precisa ser devidamente informado de forma clara sobre sua situação para que possa decidir o seu destino, sob pena de violação da autonomia e erro de consentimento, coação, ou repercussão de outros fatores, como doutrinas morais e religiosas. Assim, salienta que a comunicação é importante:

Evidente que se a comunicação é importante, eticamente é preciso mais: o paciente deve entender o que lhe é dito para poder decidir. Faltando entendimento falta consentimento válido, falta autorização para a prática da terapêutica proposta. Ignorar as dificuldades para garantir a boa informação ao paciente leva a salientar que consentimento informado não depende só da liberdade de escolha visto que as pessoas agem influenciadas por muitos fatores. Mas, tal como no direito, em bioética também se deseja que a manifestação volitiva venha escoimada de vícios, que esteja suportada por escolha racional quanto ao que é melhor, desejável pela pessoa. (SZTAJN, Rachel, 2002, p. 31).

 

Ainda sobre a capacidade civil, assim como o testamento comum, deverá ser observada a capacidade no momento de realizado o testamento vital, pois a incapacidade superveniente não invalida a declaração de vontade. É uma importante determinação do art. 1.861 do CC, sobretudo em relação à situação em que o paciente se encontra quando recebe a notícia de seu estado terminal ou doença incurável. Eventual configuração de incapacidade, que poderá ocorrer devido ao estado emocional ou moral após a criação do documento não poderá ser impugnada por familiares. Por isso nesse caso, observa-se a importância do reconhecimento do testamento vital pelo ordenamento jurídico para que possa ser realizado por instrumento público, pois este meio revela maior segurança jurídica na averiguação da capacidade.

Também deverá comportar a característica da revogabilidade, disposta no art. 1.858 do CC, pois o testamento é ato personalíssimo que poderá ser mudado, sobretudo em virtude o avanço da medicina, que em pouco espaço de tempo, descobrem-se alternativas que viabilizam a cura de determinadas doenças outrora identificadas como incuráveis. Nesse sentido a legislação de outros países sobre o testamento vital já consideram essa possibilidade, por exemplo, no Uruguai.

No mais, as características são as mesmas do testamento comum, é um ato jurídico, unilateral, personalíssimo, revogável, gratuito. É um ato jurídico unilateral porque representa a manifestação da vontade sobre o fim da vida, sendo que a eficácia independe de outra pessoa. É personalíssimo porque somente a pessoa poderá decidir o seu destino, sendo impossível a delegação de poder para dispor sobre esse direito. É revogável devido às considerações anteriores, e gratuito porque não comporta ônus, condições ou obrigação.

Os autores Maria Isabel Silva e Frederico Gomes, em artigo científico sobre a possibilidade de inclusão do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro, aponta outros aspectos formais a serem considerados no reconhecimento legal, como o efeito compulsivo, o formulário-tipo, a certificação perante um notário, criação no âmbito do sistema de saúde de um Registro Nacional de Diretivas Antecipadas de Vontade (RENDAV).

O efeito compulsivo diz respeito a consideração do testamento vital pelo médico, que deverá agir de acordo com as disposições e limites estabelecidos neste. Não deverá mais, portanto, de acordo com as alterações da resolução do CFM, recorrer a opinião os familiares, ainda que estes impugnem a declaração antecipada de vontade. Sendo assim, não estará sujeito a responsabilização, somente se violar a disposição testamentária, incide o art. 186 do CC, sobre a ilicitude do ato; o art. 948, no caso de homicídio tem o dever de reparar; o art. 949, no caso de lesão ou ofensa a saúde, além de sanção disciplinar pelo Código de Ética.

A criação de um formulário-tipo é importante para facilitar a criação do testamento vital, e para que a vontade expressa seja claramente identificável e entendida. Para garantir a eficácia, os referidos autores também mencionam a criação no âmbito do sistema de saúde de um Registro Nacional de Diretivas Antecipadas de Vontade (RENDAV). A finalidade é a mesma, porque é imprescindível que a vontade seja inequívoca, não poderá resultar em dúvidas. Há outra sugestão da certificação perante um notário, ou seja que seja realizado por meio de escritura pública ou apresentado o registro ao tabelião.

É importante a definição de uma estrutura para assegurar a eficácia e validade do testamento vital. Por isso, os países que já reconheceram através de normas legais o testamento vital, definiram a estrutura para a realização, os requisitos e procedimentos, visando essa finalidade, como assegura o autor, a exemplo dos Estados Unidos:

Apesar de não estar elencada dentre os requisitos estabelecidos pelo estudo da Associação Portuguesa de Bioética é necessário que a manifestação da vontade seja inequívoca. A intenção do paciente deve ser precisa e claramente manifestada. Não podendo haver dúvidas acerca das providências indicadas pelo indivíduo. No modelo utilizado nos Estados Unidos, tem-se como requisito a presença de pelo menos duas testemunhas no momento da assinatura, as quais devem de igual modo, assiná-lo. E a eficácia do documento se dará somente depois de decorridos 14 dias da assinatura, por motivos de segurança jurídica, sendo de suma importância que se estabeleça um período de espera para o testamento passar a ser válido. (GOMES, F. SILVA, M. 2012. Disponível em: <http://npa.newtonpaiva.br/direito/?p=577>. Acesso em: 19 mai. 2013).

 

Dessa forma, entende-se ser relevante a criação de um banco nacional ou como demonstrado anteriormente, um registro nacional, para possibilitar efetivamente a manifestação da vontade, que somente poderá ser de forma pública. Por isso, a autora Luciana Penalva entende que se houver norma a respeito, o cartório deverá encaminhar a declaração prévia de vontade do paciente terminal ao Registro Nacional para garantir a efetividade. E ainda sugere sobre a realização do procedimento no Brasil:

Esse procedimento poderá seguir as recomendações do Registro Central de Testamentos, do Colégio Notarial do Brasil, seção de São Paulo, dispostas no provimento CG 6/94, que objetiva implantar um registro único de testamentos em São Paulo – modelo que se tem estendido para outros estados, como Minas Gerais, onde o registro único ainda está em fase de implantação. (PENALVA, 2009, p. 532).

 

Tendo em vista o procedimento médico adotado no Brasil, a referida autora também recomenda que a declaração prévia de vontade do paciente em estado terminal seja anexada ao prontuário médico com a finalidade de informar os médicos. O prontuário é um documento em que cabe o médico preencher, devendo ser considerado no momento do preenchimento a vontade do paciente sobre o fim da vida. Portanto, urge reconhecimento legal para definir o processo e os procedimentos a serem adotados.

 

2.2 Quanto ao conteúdo

 

O ato jurídico, ou negócio jurídico depende de um objeto lícito para não ser passível de nulidade no ordenamento jurídico, conforme disposição dos art. 104, II e 166, II do CC. Sendo assim, o conteúdo ou o que se pretende realizar por meio do testamento vital não pode ser contrário as disposições normativas já existentes.

Com o instituto, pretende-se conhecer a vontade do paciente, que se os tratamentos forem considerados paliativos, poderá optar pela antecipação da morte, visando a qualidade de vida, a dignidade da pessoa humana. Há, necessariamente, um conflito entre do direito à vida (art. 5º caput da CF) e a dignidade da pessoa humana (art. 1º da CF), pois o direito a vida é irrenunciável, inviolável, as pessoas não podem dispor sobre esse direito. Por outro lado, considerando a autonomia da vontade e a dignidade da pessoa humana, é possível a antecipação da morte para evitar o sofrimento através do testamento vital.

O direito à vida tende a prevalecer quando está em confronto com outros direitos fundamentais, pois segundo Maria Helena Diniz, “a vida tem prioridade sobre todas as coisas, uma vez que a dinâmica do mundo nela se contém e sem ela nada terá sentido.” (DINIZ, apud GOMES, F. SILVA, 2012, p. 28). Todavia, esse direito pode ser mitigado, pois não existem direitos absolutos. O próprio ordenamento jurídico prevê expressamente essa limitação no caso de legítima defesa, ou aborto legal. Sendo assim, nada obsta também essa restrição ao considerar o dignidade da pessoa humana como prevalecente.

Deverá ser considerado, portanto, válido o testamento vital considerando o principio norteador da Carta Magna, o princípio dignidade da pessoa humana (art. 1º,III CF), da autonomia da vontade (implícito no art. 5º CF), a proibição de tratamento desumano (art. 5º, III CF), bem como o art. 15 do CC que ninguém poderá ser constrangido a submeter a tratamento médico ou intervenção cirúrgica. Sendo o testamento vital o instrumento que garante que isso não aconteça, pois há manifestação de vontade do paciente, garantindo a sua dignidade, sobretudo.

Há de se considerar também que o testamento vital não possibilita a prática da eutanásia ou distanásia. A eutanásia ou auxílio ao suicídio é considerada ilícita pelo ordenamento jurídico e pelo Código de Ética, pois são intervenções que tem por objetivo provocar a morte do paciente. O testamento vital “visa resguardar o direito de morrer dignamente, não se trata de defender qualquer procedimento que cause a morte do paciente, mas sim de reconhecer sua liberdade e sua autodeterminação” “(GOMES, F. SILVA, 2012, p. 29). E também não é caso de distanásia cuja prática possibilita o prolongamento artificial da vida, pois o Código de Ética já considerou afastada isso. O que este considera válido é a prática da ortotanásia, no art. 41 do referido Código, sobre a interrupção de tratamento.

Por fim, considerando o arcabouço desses argumentos, o testamento vital não constitui objeto ilícito, pelo contrário, representa uma possibilidade do exercício do direito da autonomia, e da dignidade da pessoa humana. Sendo estes princípios amparados constitucionalmente, e os requisitos, e forma válida argumentada anteriormente, não há porque impedir a regulamentação deste ato jurídico. Tanto não é que já existe um projeto de Lei sobre a prática da ortotanásia considerando o testamento vital mesmo que indiretamente, como se observa no tópico seguinte.

 

2.3 Projeto de Lei

O projeto de lei nº 524/2009, determinado pelo senador Gerson Camata, tem por objetivo regulamentar direitos dos pacientes quando configurada a fase terminal de uma enfermidade. Sendo assim, propõe-se legitimar a ortotanásia, considerando a manifestação da vontade do paciente, portanto, há necessariamente o reconhecimento do testamento vital, como se observa o art. 6º do referido projeto de lei:

Art. 6º Se houver manifestação favorável da pessoa em fase terminal de doença ou, na impossibilidade de que ela se manifeste em razão das condições a que se refere o § 1º do art. 5º, da sua família ou do seu representante legal, é permitida, respeitado o disposto no § 2º, a limitação ou a suspensão, pelo médico assistente, de procedimentos desproporcionais ou extraordinários destinados a prolongar artificialmente a vida.§ 1º Na hipótese de impossibilidade superveniente de manifestação de vontade do paciente e caso este tenha, anteriormente, enquanto lúcido, se pronunciado contrariamente à limitação e suspensão de procedimentos de que trata o caput, deverá ser respeitada tal manifestação. § 2º. A limitação ou a suspensão a que se refere o caput dever ser fundamentada e registrada no prontuário do paciente e será submetida a análise médica revisora, definida em regulamento.(CAMATTA, 2009).

 

Quanto aos requisitos do testamento vital, o projeto de lei preocupa-se com a verificação do consentimento, que deverá ser válido, do paciente. No art. 5º, menciona constitui direito da pessoa em fase terminal de doença ou acometida de grave e irreversível dano à saúde de ser informada sobre as possibilidades terapêuticas, paliativas ou mitigadoras de sofrimento. Este é o pressuposto para que o paciente venha manifestar antecipadamente sua vontade, considerando a informação prestada pelo médico sobre seu quadro, que deverá decidir mediante as possibilidades medicinais ou não, e sua qualidade de vida, a elaboração do testamento vital.

Assim, caso o paciente venha a se manifestar pela recusa dos tratamentos oferecidos, sendo para prolongar o estado do paciente, sem perspectiva nenhuma de cura da enfermidade, o projeto destaca que tal pronunciamento deve ser considerado como válido. Justifica-se pelos princípios da autonomia da vontade e principalmente pela dignidade da pessoa humana, que são fundamentais para que exista esse reconhecimento legal no ordenamento jurídico brasileiro.

 

CONCLUSÃO

 

No Brasil ainda não existe o reconhecimento do testamento vital no ordenamento jurídico. Não obstante, houve pronunciamento do Conselho Federal de Medicina determinando que os médicos reconhecessem a manifestação de vontade antecipada do paciente sobre o fim da sua vida. Por isso, urge o reconhecimento deste novo tipo de testamento para que haja identificado o direito de manifestação da vontade dos pacientes, tendo em vista a dignidade da pessoa humana, pois essa escolha poderá evitar o sofrimento e proporcionará qualidade de vida mesmo nos últimos dias de existência.

A prática de utilizar esse tipo de testamento não é considerada ilícita, pois a ortotanásia não se confunde com eutanásia, distanásia ou auxílio ao suicídio. A ortotanásia consiste na interrupção ou suspensão do tratamento de acordo com a vontade do paciente ou dos familiares, sendo esta ultima legitimidade desconsiderada pela alteração do Código de Ética. Agora, prevalece à vontade do paciente, que poderá fazer o testamento durante a internação no hospital desde que tenha plena capacidade de discernimento, ou mesmo antes de saber que possui a enfermidade.

Houve uma restrição ao direito à vida em considerar prevalecente a aplicação do direito a dignidade da pessoa humana, como princípio norteador da Carta Magna. Além de considerar como essenciais o atendimento da norma constitucional que revela a proibição de tratamento desumano, a autonomia privada, bem como o art. 15 do CC que ninguém poderá ser constrangido a submeter a tratamento médico ou intervenção cirúrgica. Sendo assim, essas normas constitucionais e civis corroboram para a viabilidade do reconhecimento do testamento vital.

Este tipo de testamento é definido por um documento que expressa a vontade do paciente, consistindo em ato jurídico unilateral, pessoal, revogável, ou seja, possuindo as mesmas características do testamento comum, exceto pelo fato de produzir efeitos ainda em vida. Mesmo não sendo reconhecido, sua validade é indiscutível, pois representa um ato jurídico, que não viola disposições normativas já existentes. O que é necessário, todavia, é a sua regulamentação por meio do reconhecimento legal, para determinar requisitos, e procedimentos específicos tendo em vista a eficácia da vontade manifestada pelo paciente. Há indícios do possível reconhecimento legal com a elaboração do projeto de Lei nº 524/2009 sobre direitos dos pacientes quando configurada a fase terminal de uma doença.

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

 

BOMTEMPO, Thiago Vieira. Diretivas antecipadas: instrumento que assegura a vontade de morrer dignamente. Revista de Bioética e Direito, nº 26, setembro de 2012. Disponível em: http://www.ub.edu/fildt/revista/pdf/rbyd26_art-vieira.pdf>. Acesso em: 10 mai 2013.

 

 

CAMATTA, 2009. Projeto de lei do Senado nº 524, ano 2009: dispõe sobre os direitos da pessoa em fase terminal de doença. Disponível em: < http://www.medicinaintensiva.com.br/

PLS-524-2009.htm>. Acesso em: 19 mai 2013.

 

 

Eu decido o meu fim. Revista Veja. Edição 2286, ano 45, nº 37. São Paulo, p. 98 a 106. 12 de setembro de 2012.

 

 

GOMES, F. SILVA, M. 2012. Possibilidade de inclusão do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em: <http://npa.newtonpaiva.br/direito

/?p=577>. Acesso em: 19 mai. 2013

 

 

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro: parte geral. vol. 1. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

 

 

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro: direito das sucessões. vol. 7. 7º ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

 

 

PENALVA, Luciana. Declaração prévia de vontade do paciente terminal. Revista de Bioética ano 2009. Disponível em: < ttp://www.revistabioetica.cfm.org.br/index.php

/revista_bioetica/article/viewFile/515/516>. Acesso em: 10 mai 2013.

 

 

SZTAJN, Rachel. Autonomia privada e direito de morrer: eutanásia e suicídio assistido. São Paulo: Cultural Paulista: Universidade de São Paulo, 2002.

 

1 Paper apresentado à disciplina de Direito de Família e Sucessões, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

2 Alunas do 6º período do Curso de Direito, da UNDB.

3 Professora orientadora.

4 DINIZ, Maria Helena Diniz. O estado atual do Biodireito. 3ª Edição, São Paulo: Ed. Saraiva, 2006.

5 In: Declaração prévia de vontade do paciente terminal. Dissertação (Mestrado em Direito Privado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte. 2009.