O homem é um ser social e não nasceu para viver sozinho. Desde os primórdios, sempre buscou a convivência de seus semelhantes para suprir suas próprias necessidades, como proteção, segurança, subsistência e reprodução. Homens e mulheres passaram a viver em grandes agrupamentos, onde cada um exercia suas funções; os homens cuidavam da caça e pesca e da segurança; os mais idosos eram tidos por sábios, cabendo a eles as decisões mais difíceis, além das funções de juízes e de conciliadores; as mulheres desenvolviam o trabalho doméstico e eram responsáveis pela educação das crianças.

Com o passar do tempo, os indivíduos passavam a se aproximar e a conviver não só por questões de necessidades físicas ou mesmo biológicas, mas também em virtude de afinidades que iam surgindo ao longo da convivência dentro de um determinado grupo social. Desse complexo número de relações que se desenvolviam entre os homens, nascia o que nós conhecemos hoje por família.

            A família, em uma definição bem simples, pode ser conceituada como um conjunto de pessoas que passam a conviver juntas, ligadas por laços de afetividade, de afinidade e de parentesco, gozando de ampla proteção estatal, já que é entendida como a base da sociedade. Ela é o primeiro grupo do qual fazemos parte, desde o momento do nascimento; é através da família que adquirimos os valores culturais, religiosos, morais e éticos que nos acompanharão ao longo da vida.

            Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, renomados autores, afirmam em sua obra (2011, p. 43) que “família é o núcleo existencial integrado por pessoas unidas por vínculo sócio afetivo, teleologicamente vocacionada a permitir a realização plena dos seus integrantes”. Para ele, uma família se forma porque duas pessoas, afetivamente ligadas, se unem, a fim de promover a realização pessoal de cada um de seus membros, de acordo com os valores eleitos por cada um.

            Porém, o conceito de família mudou muito, pois acompanhou a evolução do homem e as mudanças das relações sócio afetivas. Como é sabido, a sociedade ocidental é fortemente influenciada pelas tradições romanas. Entretanto, a noção que se tinha durante o Império Romano sobre a família é completamente diferente da que hoje conhecemos.

Em Roma, a família era um agrupamento social hierarquizado, donde todos os poderes emanavam de um pater, ou seja, do pai, escolhido dentre os mais velhos. Ele possuía autoridade suprema, podendo decidir o futuro de qualquer pessoa que se encontrasse dentro de sua família. As mulheres não eram chefes de família e se encontravam subordinadas ao poder do pater.

O casamento não era um instituto valorizado nesse período. Na verdade, a reunião dessas pessoas dentro de um mesmo grupo não se dava devido a laços de afeto e de amizade, e sim por questões de sobrevivência, já que no período em que as civilizações antigas tiveram o seu auge, as guerras eram constantes. Rodrigo da Cunha Pereira, em sua obra “Direito de Família – Uma abordagem Psicanalítica” (2003, p. 25), nos ensina: "Embora possa-se pensar que o casamento para o Direito romano tinha mais sentido religioso, sua concepção era mais de relação jurídica que propriamente uma celebração. Na verdade, foi o cristianismo que elevou o casamento à dignidade de sacramento: “Homem e mulher selam a sua união sob as bênçãos do céu, transformando-se numa só entidade física e espiritual, de maneira indissolúvel."

Com a queda do Império Romano e com o crescimento da religião cristã, os padrões familiares começaram a mudar. Valores como amor e fraternidade passaram a ser disseminados dentro dos grupos sociais, fazendo com que homens e mulheres passassem a se unir levando em conta os ditames cristãos, ou seja, formar uma família a partir do casamento abençoado por Deus. Em meados do século XXIX, os padrões cristãos outrora difundidos, continuavam vigorando.

A família era aquela oriunda do casamento entre um homem e uma mulher, não se concebendo a ideia de família formada por apenas um dos genitores, por pessoas do mesmo sexo ou até mesmo por pessoas que não haviam se casado perante as leis estatais e canônicas. Situações como essas eram consideradas aberrações.

Acreditava-se que só era legítima a família construída a partir do matrimônio, considerado um sacramento pela Igreja. No século passado, a interferência do Estado e da Igreja nas relações familiares era muito forte, capaz de determinar os padrões de comportamento de homens e de mulheres.

A sociedade do século XXIX era patriarcal, cabendo aos homens o exercício do pátrio poder: eles deveriam trabalhar, prover o sustento de seus dependentes, zelar pelo patrimônio familiar e decidir todas as questões pertinentes a organização de sua família. Nesse período, as mulheres eram tidas como relativamente incapazes, devendo obedecer a seus maridos, cuidar dos afazeres domésticos e educar os filhos.

            Porém, a sociedade passou por muitas mudanças. Com a Revolução Industrial, ocorreu um rápido crescimento das cidades, com um crescente número de migrações do meio rural para o meio urbano. As fábricas precisam de um número muito grande de mão de obra para dar vazão a produção de suas mercadorias. Foi nesse período que as mulheres passaram a ingressar no mercado de trabalho ao lado dos homens, porém, em condições degradantes e desiguais.

 Como a exploração do trabalho feminino era notória, as mulheres passaram a lutar por seus direitos e começaram a ganhar seu espaço. Muitas delas tornaram-se chefes de família, papel anteriormente exercido, de forma exclusiva, pelos homens. A partir de então, a noção que se tinha de família se transformou e sua forma de constituição também.

Hoje, todas as formas de se constituir uma família, seja ela oriunda do casamento ou de uma união estável, seja aquelas que são formadas apenas por um genitor (conhecida como entidade ou núcleo monoparental) são legítimas e gozam de ampla proteção do Estado, conforme observamos pela leitura do artigo 226, §3º e 4º da Constituição Federal de 1988:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§4º. Entende-se também como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

                        Portanto, atualmente, há 3 formas de se constituir uma família: através do casamento, da união estável ou mesmo a formação da entidade monoparental. Podemos visualizar até mesmo um outro tipo de família, a recombinada, ou seja, aquela em que outras famílias que já haviam sido formadas se juntam, formando uma nova.

             Segundo Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 43), "é forçoso convir que nenhuma definição nessa seara pode ser considerada absoluta ou infalível, uma vez que a família, enquanto núcleo de organização social, é, sem dúvida, a mais personalizada forma de agregação intersubjetiva, não podendo, por conseguinte, ser aprioristicamente encerrada em um único standard doutrinário".

            Portanto, pode-se concluir que definir o que é a família não é tarefa fácil. Tampouco há um conceito único e absoluto, pois varia de acordo com a época, com o lugar de origem, com os valores culturais, com a religião de cada um. Até mesmo a própria legislação de cada Estado pode estabelecer distinções entre o que pode ser considerado uma família ou não. As mudanças ocorridas ao longo dos séculos, desde a pré-história até os dias atuais, só mostram como os padrões de constituição da família mudaram muito.

            O que hoje se concebe por família, como por exemplo, uma que seja formada por um casal do mesmo sexo e uma criança que foi adotada por ambos, não era vista dessa forma há 30 anos. Com cada uma das mudanças trazidas pela sociedade, uma nova definição de família pode ser criada.