Parecia ser só mais um dia de trabalho, um, como qualquer outro. mais tarde, recebi um telefonema de amigo, que me convidava para fazer um cooper e um lanche, apenas para conversarmos e nos distritos um pouco. eu tinha algumas coisas a fazer, mas podiam esperar, afinal eu também mereço um descanso.

Saí eu então e fui em direção a casa dele. estava ainda a tomar banho. "era mesmo uma moça", eu pensei. Tinha me ligado à meia hora e não tinha se preparado ainda? E mais, iríamos caminhar e suar um pouco. Então, se nos sujaríamos, por que se limitar previamente? O leitor vão me achar um porco, mas ainda assim mantenho minha teoria.

Enfim, a princesa terminou seu banho, vestiu-se e saímos.

Fazia tempo que não tirava um tempo assim pra mim mesmo, tanto trabalho, tanto tempo gasto produzindo, tantas coisas. Estava cheio. Nem percebi, mas precisava urgentemente de uma tarde assim. Conversamos sobre tudo e sobre todos. Já éramos velhos amigos, já havíamos passado muita coisa juntos.

Andamos, andamos, falamos e andamos. Mal percebemos o por do Sol e estávamos quase nos limites do mais remoto bairro da cidade. Dispomo-nos então a voltar. Ele falava da Sobrinha que lhe nascera, da esposa que engravidara e da greve da companhia. Morávamos perto um do outro, mas era longe que nossas mentes pairavam. E pensar que era amigo do Francisco desde que estávamos na pré-escola. Ele morava na minha rua, vivíamos na casa um do outro. A velha, inocente e bem vivida infância. Eu e Francisco planejávamos morar vizinhos durante toda a vida. Dizia ele que compraria um prédio, e que iríamos morar no mesmo andar. Bem, ele tornou-se empresário de sucesso, herdou uma pequena imobiliária do pai e tornou-a uma imensa construtora. Porém, o sistema capitalista não nos permitiu tornar realidade esse devaneio. Tinha saudades do tempo em que sabíamos nos iludir, pois éramos mais felizes. Talvez esteja faltando um pouco disso para diminuir esse ritmo frenético da vida que passa. Talvez a ilusão resolvesse grande parte de nossas desventuras, por que é irracional tentar buscar razão em tudo.

Enfim, voltamos pro centro da cidade, eu falando de descobertas de colegas (eu lecionava em uma universidade), falava de teorias sobre a ressurreição da sociedade e sobre a ilusão da qual um dia dispomos.

Terminou que no fim do dia éramos dois iludidos. Sentamos naquela mesa de pedra, na praça da igreja, fizemos de nossa tarde o coletivo recreio que há muito estava longe de nossa rotina. Esquecemos por uma tarde inteira todos os nossos afazeres, que não eram poucos. Foi inevitável, a ilusão se tornou assunto de nosso diálogo. Falamos sobre toda a nossa infância, e sobrou espaço para mencionarmos o Geninho, um velho amigo, o cabra mais abnegado que eu já vi, e mais risonho também. Sem dúvida, sabia aproveitar a vida e ajudar outros a aproveitá-la, apesar de seus pouco recursos. Essa fazia por merecer o título de iludido. Iludido e Feliz!

Começou a chover, corremos para o Coreto e ficamos alí vendo a chuva cair, dessa vez sem falar tanto. Assistindo e refletindo, vendo a chuva cair e nos iludindo. E por que não, sendo feliz, mesmo que por uns poucos instantes.