O presente estudo tem como objetivo apresentar de forma franciscana o evoluir da responsabilidade civil, analisando suas fases e suas principais características. Para tanto, necessária se faz a conceituação e a pontuação dos pressupostos da responsabilidade.

Conceito

O conceito de responsabilidade, para o Direito, possui diversos significados: não só o dever de assumir as consequências de ações e omissões, como também o cuidado que se deve ter com alguma coisa ou com alguém. O significado que importa para o presente estudo é o primeiro.

As regras são essenciais para o convívio em sociedade e para pacificação da mesma, visto que a relação entre pessoas muitas vezes é conflituosa. Toda e qualquer transgressão deve, consequentemente, gerar àquele que a infringiu o dever da devida reparação dos prejuízos causados.

A palavra responsabilidade, segundo Carlos Roberto Gonçalves, "origina-se do latim re-spondere, que encerra a idéia de segurança ou garantia da restituição ou recompensação do bem sacrificado. Teria, assim, o significado de recomposição, de obrigação de restituir ou ressarcir." (GONÇALVES, 2003. p. 18)

Segundo Dias (2006), a palavra origina-se do latim "spondeo", assumir, garantir.Continua José dos Santos Carvalho Filho:

(...) estes dois pontos, sejam eles o fato e a sua imputabilidade a alguém são requisitos essenciais para a definição de responsabilidade, pois a ocorrência do fato, seja ele de caráter comissivo ou omissivo, é indispensável, por ser ele o responsável pela situação jurídica e. no que diz respeito à atribuição do evento a outrem, é imperioso que o indivíduo a que se impute a responsabilidade tenha a aptidão jurídica de efetivamente responder perante o ordenamento jurídico pela ocorrência do fato. (CARVALHO FILHO, 2003, p. 429)

De acordo com os citados doutrinadores, pode-se inferir que a ocorrência de violação ao ordenamento, consequentemente, gera ao agente violador a responsabilidade de reparar eventuais danos.


Posto isso, afirma-se que a responsabilidade civil do Estado é obrigação, em caso de dano causado por seus agentes ou privados que atuem em seu nome, quando do exercício de suas funções, de reparar eventual dano causado. Define de forma mais clara o professor Alexandre Magno em seu artigo "Responsabilidade Civil do Estado", in verbis:

1. Conceito

Responsabilidade civil do Estado é a obrigação de reparar os danos causados por seus agentes, no exercício de suas funções. Divide-se em contratual e extracontratual. Responsabilidade contratual é aquela decorrente de contratos firmados entre a Administração Pública e particulares. Suas conseqüências estão previstas no próprio instrumento contratual. A responsabilidade extracontratual ou aquiliana é aquela decorrente de danos causados a pessoas com as quais o Estado não tem nenhuma relação especial.[1] (Grifo nosso)

De mesmo entendimento compartilha José Cretella Júnior ao dizer que "Responsabilidade civil é a decorrente de ação ou omissão, dolosa ou culposa, do funcionário, que causa danos a alguém". (CRETELLA JÚNIOR, 1995. p. 81)

A responsabilidade civil e seus pressupostos

São elementos necessários para a configuração da responsabilidade, a ação ou omissão do agente, a culpabilidade, o dano e o nexo de causalidade, conforme preconiza o artigo 186 do Código Civil de 2002: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".

Cabe enfatizar o que o autor César Fiúza ressalta em sua obra: "faltando qualquer destes elementos, não haverá ato ilícito na esfera civil, não cabendo qualquer reparação".(FIUZA, 2003, p. 606)

São excludentes da responsabilidade de indenizar a legítima defesa, o estado de necessidade, o exercício regular de direito, o estrito cumprimento do dever legal, o caso fortuito e a força maior não se enquadram como atos ilícitos e, portanto, excluem a responsabilidade do agente.

Retomando os requisitos enumerados anteriormente, tem-se que a ação ou omissão apontada pelo Código Civil é a conduta de própria vontade que venha a provocar prejuízo a alguém. A verificação deste comportamento se faz essencial para a definição de responsabilidade, visto que, para configurar o ilícito, é necessária a conduta contrária ao ordenamento jurídico e que esta gere um resultado danoso. Já a omissão é uma ação negativa, uma abstenção à realização de uma conduta, mas, da mesma forma que a ação positiva, ela causa prejuízo. Nestes casos, será responsabilizada, como se tivesse cometido o ilícito, a pessoa que tinha o dever de agir em determinada situação, mas não age.

A culpa e o dolo do agente também são elementos caracterizadores da responsabilidade, visto que a configuração destes elementos deve ser comprovada pelo prejudicado que pleiteia a reparação de determinado dano sofrido. O dolo e a culpa, apesar de serem institutos diferentes, produzem os mesmos efeitos para o ordenamento jurídico, sendo a diferença entre os dois apenas a configuração da voluntariedade, conforme ensina o autor Fiúza, em estudo ao preceito do artigo 186 do Código Civil: "dolo é a ação ou omissão voluntária, e a culpa é a ação ou omissão negligente, imprudente ou imperita". (FIUZA, 2003, p. 607)

Outro requisito é o dano, que é o prejuízo caracterizado, consumado, podendo ser moral ou material. O dano material é o prejuízo que atinge o patrimônio, ou seja, de caráter pecuniário. Já o dano moral não tem qualquer relação com o patrimônio do prejudicado. O prejuízo suportado será de caráter pessoal, fato que dificulta a estipulação do quantum indenizatório, tendo em vista a ausência de dimensão exata do dano sofrido.

O nexo causal, ou nexo de causalidade, é a vinculação entre a conduta do agente e fato gerador do dano, o liame entre a conduta e o dano. Assim ensina o professor Cezar Fiúza: "O nexo causal é a relação de causa e efeito entre a conduta do agente e o dano por ele provocado. O dano deve ser fruto da conduta reprovável do agente". (FIUZA, 2006, p. 375) Ainda conforme ensina Carlos Roberto Gonçalves: "Se houve o dano, mas sua causa não está relacionada com o comportamento do agente, inexiste a relação de causalidade e também a obrigação de indenizar", (GONÇALVES, 2003, p. 33), ou seja, a responsabilidade de indenizar só surgirá, quando o dano for causado por ação praticada pelo agente.

Evolução da Responsabilidade

A evolução da responsabilidade, melhor dizendo, a mutação do conceito de responsabilidade decorre, diretamente, da evolução da sociedade, visto a alteração das relações sociais com o decorrer dos anos. Iniciou-se com a teoria da irresponsabilidade até chegar aos dias de hoje, com a aplicação da responsabilidade objetiva - teoria do risco administrativo.

Quando da formação da sociedade, não havia instituto que disciplinasse as condutas por meio da imposição de regras previamente previstas, o que levava as pessoas a resolver seus problemas com o emprego da força, atitude esperada de qualquer pessoa que se vê injustiçada e não tem outra maneira ao alcance para resolver seus problemas.

A teoria da responsabilidade teve seu despontar com o Direito Francês, quando a responsabilidade passou a ser ligada à comprovação do elemento culpa. Com maior propriedade, o ilustre professor Júlio César dos Santos Esteves ensina que "a rigor, a consagração do princípio da responsabilidade fundada na culpa que, a partir do Código Civil francês, funcionará como inspiração da legislação de quase todo o mundo civilizado". (ESTEVES, 2003, p. 14)

Com a evolução contínua da sociedade, ficava claramente perceptível a necessidade da criação de ferramentas que fornecessem segurança à sociedade, visto que o desenvolvimento das relações fazia com que os conflitos e danos consequentemente gerados crescessem rapidamente. Em virtude disto, nasce a teoria do risco.

Com maior propriedade ensina o autor Alexandre Ávalo Santana, in verbis:

Numa primeira fase a irresponsabilidade prevalece, afinal admitir responsabilidade pecuniária da Administração é considerado um obstáculo inconveniente para a execução de seus serviços na ordem patrimonial, época em que vigorava o princípio de que o rei não erra (The King can do not wrong). Essa teoria também é conhecida como feudal. Numa segunda fase, a questão se põe parcialmente no plano civilístico, fazendo-se apelo às teorias do Código Civil, relativas aos atos dos prepostos e mandatários. Numa terceira fase, a questão se desenvolve no âmbito do direito público. Forma-se progressivamente no quadro jurídico da faute e do risco administrativo.

No Brasil, Diógenes Gasparini faz uma divisão bastante didática para tratar da evolução da Responsabilidade do Estado, segundo a qual: no período colonial percebeu-se a presença da irresponsabilidade estatal (doutrina importante entende jamais ter sido aceita a irresponsabilidade estatal); no período imperial, com o surgimento de legislação esparsa admitiu-se a responsabilidade patrimonial do Estado, sendo este período considerado como um marco; no denominado período republicano, tem-se o surgimento da Constituição de 1891, bem como emergiu o artigo 15, do Código Civil Brasileiro de 1917, os quais tratavam da responsabilidade subjetiva do Estado.

Pois bem, somente com a Constituição de 1946 é que se passou a reconhecer a responsabilidade objetiva do Estado, que foi adotada pelas constituições seguintes até se chegar à atual, que a prevê em seu artigo 37, § 6º da CF, mantendo a teoria objetiva no âmbito do direito público, dando, inclusive, mais amplitude à responsabilidade estatal, quando passou a utilizar em seu texto o termo agente, incluiu-se assim, para fins de imputação de responsabilidade estatal, todos aqueles entes públicos ou privados que exerçam atividades públicas, como na concessão e permissão de serviços públicos.[2]

Posto isso, conclui-se que a evolução da responsabilidade se deu de maneira gradativa, em que na primeira fase vigorava a irresponsabilidade estatal, posteriormente, em um segundo enfoque, se permitia responsabilização do Estado por atos praticados por seus prepostos e mandatários, desde que comprovada à culpa, fase denominada responsabilidade civilística e, finalmente, a terceira fase fundada na teoria do risco, denominada responsabilidade publicística

Bibliografia

[1] MAGNO, Alexandre. Disponível em: http://www.alexandremagno.com/novo/responsabilidade-civil-do-estado-0. Acessado em: 03/04/2009.

2 SANTANA, Alexandre Ávalo. Aspectos polêmicos sobre a responsabilidade civil na prestação do serviço público:implicações decorrentes da delegação. Disponível em: http://www.tex.pro.br/wwwroot/ 00/00_asp_polemicos.php). Acessado em 03/04/09.

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