O Direito a Acompanhante Especializado na Rede de Ensino Privado – Resistência à Prática e Desenvolvimento das Políticas Educacionais Inclusivas

 

Infelizmente  ainda não é garantido por Lei  a Assistência Especializada gratuita na rede de ensino privada aos Autistas.

 Trazia o texto do Art.2º , VI da Lei 12.764/12

“a inclusão dos estudantes com transtorno do espectro autista nas classes comuns de ensino regular e a garantia de atendimento educacional especializado gratuito a esses educandos quando apresentarem necessidades especiais e sempre que, em função de condições específicas, não for possível a sua inserção nas classes comuns de ensino regular, observado o disposto no Capítulo V (Da Educação Especial) do Título IV da Lei 9.394, de 20 de Dezembro de 1996(Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.”

Trata esse dispositivo, ora vetado, sobre uma exceção em relação às necessidades especiais e condições específicas do aluno Autista, o que lhe garantia atendimento especializado nas classes comuns da rede de ensino regular.

Ocorre que não prevê, muito embora remeta à impressão de que “rede de ensino regular” é uma expressão generalizada que se estende ao atendimento especializado em escolas da rede de ensino privado, ainda assim, restringe-se somente ao ensino regular em escolas públicas. Senão, vejamos:

Dispõe a Lei Federal que regulamenta os direitos das pessoas Portadoras de Deficiência, na qual está a Lei 12.764/12 (Lei do Autismo) amparada, que  a pessoa com deficiência tem direito à educação pública e gratuita assegurada por lei, preferencialmente na rede regular de ensino e, se for o caso, à educação adaptada às suas necessidades em escolas especiais, conforme estabelecido nos arts. 58 e seguintes da Lei Federal nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases), art. 24 do Decreto nº 3.298/99 (regulamenta a Le 7.853/89) e art. 2º da Lei nº 7.853/89: 

 Art. 2º Ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico.       

Parágrafo único. Para o fim estabelecido no caput deste artigo, os órgãos e entidades da administração direta e indireta devem dispensar, no âmbito de sua competência e finalidade, aos assuntos objetos esta Lei, tratamento prioritário e adequado, tendente a viabilizar, sem prejuízo de outras, as seguintes medidas:       

I - na área da educação:       

  c) a oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimento público de ensino;

Ora, quando dispõe o Parágrafo Único do Art. 2º da Lei 12.764/12 que o Poder Público poderá firmar contrato de direito público ou convênio com pessoas jurídicas de direito privado, submete-se esse parágrafo a uma iniciativa que deve partir do interesse das Escolas Privadas, mas o auxílio ao Autista, que é visto pela Lei como portador de deficiência, conforme  dispõe o Art. 1º, § 2º da Lei 12.764, em nenhum momento é cogitado como direito que lhe garanta o ensino nas escolas particulares. Obviamente, fugindo da órbita jurídica, não há interesse político algum que satisfaça esse benefício para as pessoas que possam estudar na rede de ensino privada, tendo em vista que, se assim fosse, a verba dispensada seria demasiadamente alta para o orçamento do Governo, que já dispensa esse tipo de verba para a inclusão no ensino público.

Para que tal benefício seja oferecido, os familiares de educandos Autistas ou Deficientes dependem de dois requisitos:

  • O primeiro que haja um Projeto Inclusivo na Escola em que o filho ou assistido estude para esse fim, ou seja, um contrato entre a Escola e o Governo para liberação de verba (o que não há, bem sabemos, interesse de nenhuma parte para tanto, ou quase nenhuma, posto que as escolas de ensino privado pouco têm demonstrado seu interesse na inclusão desses educandos), ou
  • A propositura de uma Ação  Judicial dos pais ou responsáveis requerendo o benefício.

Isso mesmo, em uma linguagem singular, “brigar” judicialmente para fazer valer o direito de seus educandos, num País onde a Constituição Federal diz que todos são iguais perante a Lei... Onde se estabelece a Igualdade neste caso, se até os próprios Tribunais que devem seguir  a constitucionalidade do direito do cidadão tem negado o benefício a inúmeras famílias?!

Tratando-se de princípios básicos que deveriam reger a educação brasileira, a Constituição dispõe sobre a obrigatoriedade do atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208, III, CF), todavia, no Estado de São Paulo, quando, se refere ao ensino inclusivo, criou uma Emenda à Constituição do Estado permitindo ao Governo computar o mínimo de gastos obrigatórios com Educação do Estado às verbas repassadas às instituições privadas, ou seja, o que faz cumprir o Estado apenas uma ínfima parcela de interesse, retendo verba e procrastinando o direito de cidadãos portadores de deficiência, especificamente no caso em tela, dos portadores de Transtorno Invasivo do Desenvolvimento - TID.

Lamentavelmente há falta de interesse da rede de ensino regular privada que seja instaurado desenvolvimento de políticas educacionais inclusivas, tendo em vista que a prática dessas políticas requer investimento. Investimento em capacitação profissional, espaço adequado, mudança de metodologia de ensino, bem como a destituição da homogeneidade.

A diversidade é onerosa. O que pretendem a maioria das escolas privadas é um ensino homogêneo e exógeno, e o ato da aceitação, quando da efetuação da matrícula do aluno portador de Transtorno, não traduz a prática inclusiva. A inclusão se dá quando a Escola atribui e contribui com a socialização e a aprendizagem adequada. Receber o educando portador de transtorno nunca significou a inclusão do mesmo, em muitos casos o isolamento é conseqüência do despreparo e da resistência das gestões em desenvolver uma prática de ensino inclusiva que acolha o aluno e o desafie ao desenvolvimento comportamental e pedagógico.

Nesse mesmo patamar, a rede de ensino regular privado está suportada pela Constituição Federal, a qual em seus artigos de 205 a 208 menciona a gratuidade do “ensino público” a todos e a livre iniciativa do ensino privado desde que siga o cumprimento das normas gerais da educação nacional, bem como  autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público, conseqüentemente, as escolas privadas são livres para atribuir aos pais e familiares, a obrigação de contratar ou mesmo ter um acréscimo de valores nas mensalidades, para que seus filhos tenham um atendimento especializado.

Enfim, a Igualdade emanada da Constituição brasileira é contraditória e contraditada pela própria essência.

Paradoxalmente, Art. 3º, quando se refere à Educação, repete apenas o texto da Constituição, o que já é de conhecimento, que todos têm direito à Educação, todavia é generalizada. O benefício concedido ao aluno Autista em condições específicas, ou seja, portador de um grau mais elevado, e que não o permita freqüentar a rede regular de ensino, deve freqüentar escolas especializadas cujo benefício já é concedido pelo Governo, tais como APAE’s, Associações especializadas que recebem verbas do Governo.

Portanto, o Art. 3º, Parágrafo Único apenas refere-se aos casos que comprovada a necessidade, têm o direito garantido a um acompanhante especializado na rede de ensino, todavia, lembrando, trata-se de ensino público, já o direito ao acompanhante especializado no ensino regular privado é responsabilidade financeira dos pais e/ou assistentes e somente poderá ser concedido tal benefício, se houver contrato/convênio da Escola privada com o Governo ou através de Ação judicial.

Finalizando, as escolas privadas estão autorizadas a cobrar no ato da matrícula um “plus” dos pais do educando Autista para que haja um acompanhante em sala de aula, ou os próprios pais pagam o profissional. Caso os familiares não tenham condições financeiras, devem entrar com Ação Judicial para provável recebimento do benefício (procedência da Ação não garantida), ou procurar uma escola particular com convênio com o Governo, o que é bem pouco provável encontrar.

No tocante ao Veto referente ao Art. 2º, § IV trata da possibilidade de exclusão de educandos portadores Autismo da rede de regular de ensino, o que mão contraria o disposto no Art. 3º da Lei, tampouco o que reza o Art. 208 da CF, e o que se presume estarem em perfeita consonância entre um e outro, sendo o veto sim, inconstitucional em sua forma, e totalmente desnecessária que não seja sancionado.

 Portanto, há ainda uma grande caminhada a ser percorrida até que se conclua pela verdadeira Igualdade, e seja reconhecido o direito aos educandos portadores de Autismo à assistência especializada e à genuína inclusão nas escolas privadas da rede regular de ensino.

ANDRÉIA MARTINS S. DE GODOY

OAB.SP 179.729