MARANHÃO DO SUL

os interesses por trás da segregação do estado

 

 

Carolina Viegas Cavalcante1

Thiago Melo Ribeiro de Carvalho2

 

 

Sumário: Introdução; 1 Pastos Bons: A certidão de nascimento do Maranhão do Sul; 2 Separar pra governar ou integrar pra desenvolver? Conclusão; Referências.

 

 

RESUMO

Realiza-se um estudo sobre a possível criação do estado do Maranhão do Sul, destacando-se primariamente aspectos históricos para tal segregação estatal. Desenvolve-se uma análise através dos argumentos prós e contras, focando-se em aspectos econômicos, políticos e sociais. Destaca-se também, os empecilhos para a criação de um novo estado e as consequências que este trará para todo o estado do Maranhão.

 

 

PALAVRAS-CHAVE

Divisão territorial. Maranhão do Sul. Segregação estatal.

 

 

A realidade já mostra uma nova divisão territorial do Brasil, que, creio, vai exigir representatividade política, reclamar e participar do jogo das decisões que concernem à construção do futuro”.

Milton Santos

 

 

INTRODUÇÃO

 

A criação do Maranhão do Sul ao contrário do que se pensa, não é um pensamento recente. A questão reflete fatores históricos que remetem à época de povoamento do estado. O assunto é debatido por todo o país, pois além do projeto de divisão do atual Maranhão em dois estados, outros 17 projetos tramitam no Congresso Nacional. Os que se mostram a favor da autonomia socio-político-econômica da parte sul do Maranhão se baseiam na tremenda dependência da distante capital, São Luis. Aqueles que se posicionam contra, enfatizam a cortina de interesses polítcos de uma elite por detrás de um discurso libertador.

Segundo o autor do atual projeto, o senador Edson Lobão, uma proposta semelhante de segregação do Maranhão havia sido sugerida por ele em 1987, mas que não havia sido aprovada. No dia 14 de março de 2007, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou um projeto de decreto legislativo que institui um plebiscito para que a população maranhense decidisse pela criação do novo Estado. Amparado pela Constituição Federal, o projeto se baseia no artigo 18, inciso 3º:

 

 

Os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar. (Constituição Federal)

 

 

Portanto, este artigo visa propor a discussão acerca do objetivo da criação. Assim, a criação de um novo estado, resultado da desmembração do território que constitui o atual Maranhão, está ligada predominantemente à questões histórico-sociais ou políticas? Sabe-se que o Maranhão sempre figurou entre os estados com piores índices de desenvolvimento social, baseado-se nas posições supracitadas, em que isso afetaria a possível vida do novo estado?

 

 

1. PASTOS BONS: A CERTIDÃO DE NASCIMENTO DO MARANHÃO DO SUL

 

A história do Maranhão do Sul, começou muito antes do que se pensa, iniciou-se ainda com o processo de povoamento no estado. As diferenças no processo de povoamento destacou ainda mais as disparidades das regiões norte e sul. No norte do Maranhão, o processo de ocupação havia se consolidado ainda nos século XVI e XVII, devido à presença da capital São Luís.

Porém, até o início do século XVIII, pouca importância era dada ao sul da capitania do Maranhão, tanto que, quando os primeiros movimentos colonizadores em busca da terra dos “pastos bons” inciaram-se, nenhum governador da época se importou. O nome “Pastos Bons” se atribuía à natureza exuberante e uma vegetação pródiga:

 

 

Os seus campos nutridores o seu ar cômodo, preciosas águas, grande fertilidade seguida ao mais pequeno cultivo e a sua nunca interrompida verdura são circunstâncias que fazem com que este pais seja o mais abundante e delicioso por isso mesmo é que ele chama dos sertões das outras capitanias confinantes os negociantes de gados que dali transportam para manutenção dos seus infecundos campos a criação das vacas e novilhas.(RIBEIRO apud FRANKLIN 2005: 147)

 

 

A descrição é feita pelo intelectual português, major Francisco de Paula Ribeiro3, em uma publicação da Revista Trimestral do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil datada de 1849. Ainda nessa memória, Paula Ribeiro descreve o abandono da área pela capital litorânea, São Luis. Os problemas como a justiça, desenvolvimento econômico, educação e segurança eram totalmente ignorados, e já nessa época ele propôs providências de cunho político, entre elas encontrava-se o reforço do comando militar, processo de povoamento pela incrementação de fazendas e por fim a desanexação do território de Pastos Bons do termo da Vila de Caxias.

A antecedência de Paula Ribeiro, de demarcar o território da capitania em dois foi tão precisa, que o lusitano produziu um mapa do estado em que há a delimitação de duas áreas (ponto A e ponto B). A semelhança com a previsão do que seria o Maranhão do Norte e o Maranhão do Sul se faz tão presente, que Paula Ribeiro nomeou apropriadamente de 'parte sul' a região além da “latitude meridional de pouco mais de cinco graus.”

Os primeiros registros disponíveis sobre a tentativa separatista no sul do Maranhão é datada no ano de 1827. Nesse ano, a capital São Luís foi informada de que na vila de Pastos Bons, no alto sertão, corriam “impressos em que se concitava o povo a levantar-se contra a monarquia e a tornar-se independente do resto do Império, proclamando a república de Pastos Bons”. (MEIRELES, 1990).

Como bem registra a professora e pesquisadora Carlota Carvalho em seu livro “O Sertão” o apoio de intelectuais foi importante nesse processo de proclamação da República dos Pastos Bons. Pontos revolucionários surgiram por todo o país, os intelectuais que chegaram à região de Pastos Bons, vindos da mal sucedida luta revolucionária em Pernambuco, pretenderam continuar a luta, e assim criar a República de Pastos Bons.

Percebe-se que, acima de tudo, a tentativa separatista já estava ligada à questões políticas naquela época. Os manifestantes recém chegados em nosso estado, se mantinham contrários à autoridade do imperador D. Pedro I, e estavam dispostos a proclamar uma república libertada do jugo colonial português.

É ainda Carlota Carvalho que continuará a traçar um estudo sobre a República de Pastos Bons. Conta ela que a região chegou inclusive a ter carta constitucional e bandeira. Apesar da tentativa mal sucedida de criação de uma república, a história de Pastos Bons foi essencial para o registro de um grito de esperança em meio ao abandono.

 

 

2. SEPARAR PRA GOVERNAR OU INTEGRAR PRA DESENVOLVER?

 

Dentre os vários argumentos proferidos em defesa da criação do novo estado, o Maranhão do Sul, o principal é aquele que sustenta que a divisão seria uma ferramenta para o desenvolvimento de uma das áreas mais pobres do país, carente de educação, saúde e saneamento básico.

O argumento “dividir pra melhor governar” é consequência de outro argumento bastante repetido: a grande distância entre a capital São Luís e o sul do estado, impediu que este último fosse influenciado pela primeira, ou seja, a ausência do governo nessas áreas foi responsável por seu atraso.

 

 

A região sul do Maranhão tem fortes relações comerciais, culturais e sociais com outras regiões do País, o que torna o seu vínculo com a capital do Estado bem menos importante do ponto de vista econômico e vivencial, o que prenuncia o processo de emancipação político econômico regional, cuja evolução guarda paralelo, como a que antecedeu às bem sucedidas criações dos estados do Mato Grosso do Sul e do Tocantins. (Projeto de decreto de Lei nº 300/2005)

 

 

Ora, é certo que o Brasil é um país com uma grande extensão territorial, e que seria praticamente impossível todos os 5.563 municípios se beneficiarem com a “mão federal”, mas para isso já há a segregação do país em estados e municípios, estes seriam uma ferramente intermediária de comunicação entre as partes, atuando justamente em áreas desprovidas de investimentos.

Aconsultora legislativa da câmara, Ana Tereza Sotero Duarte argumenta que em países de situação territorial semelhante ao Brasil, como a Austrália, a divisão estatal não foi uma solução aderida. Naquele país, a distribuição populacional também é irregular, e a maior parte da população se concentra nas cidades litorâneas. “Nem por isso, no entanto, a Austrália deixa de ser um dos países mais ricos e socialmente justos do mundo, bem como um dos campeões na preservação e valorização de paisagens e recursos naturais.”

Isso nos leva a indagar se o verdadeiro motivo da criação do novo estado seria por motivos territoriais ou políticos. Junto com a criação do Maranhão do Sul, em termos de representação política, seriam criados, cargos de deputados estaduais, federais e senadores, sem mencionar desembargadores, procuradores, juizes, etc. Não haveria um remanejamento dos cargos já criados que representam o estado em sua totalidade. Sotero Duarte continua na sua análise sobre as propostas: “O que se observa nas entrelinhas de algumas proposições em tramitação é a ausência de fundamentos convincentes, o que leva ao entendimento de que algumas iniciativas podem embutir, na sua origem, discordâncias de grupos políticos e, mesmo, econômicos.” (grifo nosso)

Por consequência teríamos um acréscimo nas contas públicas, já bastantes defasadas. Não é tarefa fácil estimar os futuros gastos com a criação de um Estado, mas estes não seriam pequenos a ponto de se desprezar. Outro fator atenuante no mesmo campo monetário, corresponde à economia do Estado após sua criação. Como a criação de estados se concentra em áreas pobres, estes, já nasceriam endividados e sem recursos.

Uma estimativa feita por Sotero Duarte, revelou que, caso seja criado, o estado Maranhão do Sul estaria entre os 3 priores estados do Brasil em renda per capita, com aproximadamente R$85,48.

Porém, é mister destacar que todos esses argumentos signifiquem, necessariamente que um novo estado não deva ser criado. Há de se analisar caso a caso. Se por um lado os gastos públicos se tornariam onerosos demais para a União, é preciso ver o gasto como um investimento, que por certo poderá ser recuperado em anos futuros com o aumento do PIB local e

da arrecadação tributária.

Ainda, se considerarmos divergências culturais entre áreas de um mesmo estado, a segregação agiria como fortalecimento de uma identidade própria como ocorreu em alguns exemplos de segregação estatal no Brasil. Porém cada proposta deve ser analisada como única, é preciso que esteja embasada em fundamentos técnicos sólidos, para que fundamentem a criação daquele estado específico e que não dê vazão para a criação de estados em geral.

É preciso que os projetos aprovados estejam de acordo com interesses mútuos, da União e da população, e que o discurso protetor mal disfarçado, que busca apenas voto e manutenção de poder, seja vetado.

 

CONCLUSÃO

Tendo em vista tudo o que já foi explanado acima, percebe-se que há vários argumentos expostos para a segregação ou não do Estado do Maranhão, e que cada argumento, representa um interesse por trás, seja ele político, busca de integração ou desenvolvimento social. Através desta pesquisa foi possível o esclarecimento sobre o Maranhão do Sul; sua história se fez antes mesmo de seu projeto de criação, o que demonstra que os interesses eleitorais, apesar de existirem, não são os únicos nesse processo.

É certo que, a criação de um estado novo trás problemas, entre tantos, financeiros, mas há de se considerar, que o retorno destes gastos poderia ser revertido em investimento social, para tanto, o projeto deve visar o desenvolvimento de uma área castigada e esquecida por anos.

A partir disso, conclui-se que, a criação do Maranhão do Sul acima de tudo é decisão da população maranhense, somente esta poderá decidir sobre seu futuro. O plebiscito aprovado ainda não tem data para acontecer, mas até agora foi o passo mais largo em busca do sonho de Francisco Paula de Ribeiro.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Juarez de Oliveira. 25º. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2005.

 

CARVALHO, Carlota, O Sertão: subsídios para a história e a geografia do Brasil. 2º ed. Imperatriz: Ética Editora, 2008.

 

DUARTE, Ana Teresa Sotero. Divisão territórial do Estado do Amazonas. Câmara dos Deputados: 2005.

 

FERREIRA, Wilton Alves. Maranhão do Sul: o estado da integração regional. 2ª ed. Imperatriz: Ética Editora, 2008.

 

FRANKLIN, Adalberto; CARVALHO, João Rênor. Francisco de Paula Ribeiro: desbravador dos sertões de Pastos Bons. 1 ed. Imperatriz: Ética Editora, 2005.

 

GOMES, Gustavo Maia. Dividir para governar.Insight Inteligência (Rio de Janeiro), v. 1, 2005.

 

MEIRELLES, Mário Martins. O Maranhão e a República. São Luís: SIOGE, 1990.

 

MARTINS, Hebert Toledo. A Fragmentação do Território Brasileiro: a criação de novos estados no Brasil. Cadernos do CRH (UFBA), v. 35, 2001.

 

Projeto de decreto de Lei nº 300/2005 de 10 de Junho. Diário do Senado Federal. Nº 18921. Senador Antonio Leite

 

1 Acadêmica do 2º período do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco (carolviegascav@hotmail.com)

2 Acadêmico do 2º período do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco ([email protected])

3Alferes que durante vinte anos percorreu a região do sul do Maranhão, registrando aspectos geográficos, étnicos e culturais, além da fauna e da flora dos chamados “sertões de Pastos Bons”.