LIMITAÇÕES AO PODER DE TRIBUTAR: PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, ANTERIODADE, ISONOMIA E IRRETROATIVIDADE. [1]

Maysa Pinheiro dos Reis[2]

Roberto Fernandes da Silva[3]

 

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1 O PODER DE TRIBUTAR; 2 LIMITAÇÕES AO PODER DE TRIBUTAR; 3 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA; 4 PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA; 5 O PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA; 6 PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE TRIBUTÁRIA; CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS

 

RESUMO

O presente estudo inclina-se para o moderno Direito Tributário enquanto doutrina voltada para a realização dos valores constitucionalmente reputados como fundamentais. Necessitando-se aduzir que isto só será possível através da observância dos pilares do ordenamento jurídico-tributário, quais sejam os princípios, tais como o Princípio da Legalidade, Anterioridade, Isonomia e Irretroatividade, cujas considerações trazidas a lume, formam o cenário desta pesquisa no que tange às Limitações ao Poder de Tributar. A princípio, faz-se um breve histórico da cobrança dos tributos no Brasil, e posteriormente segue-se com a abordagem ilustrada por jurisprudências do Tribunal de Justiça do Maranhão.

 

PALAVRAS-CHAVE: Princípios, Tributários, Legalidade, Anterioridade, Isonomia e Irretroatividade.

 

INTRODUÇÃO

           

A história está repleta de registros de como o poder ilimitado de tributar é extremamente devastador. A ganância de governantes autoritários levou-os a impor à população a cobrança escorchante de tributos. Essas medidas levaram ao empobrecimento de toda a população.

            Esta situação fez eclodir em vários momentos da história da humanidade revoltas e revoluções que marcaram e mudaram a sociedade. No Brasil, o caso mais célebre ocorreu em Ouro Preto com “A Inconfidência Mineira”. Um dos mais importantes movimentos sociais da História do Brasil. Significou a luta do povo brasileiro pela liberdade, contra a opressão do governo português no período colonial. Ocorreu em Minas Gerais no ano de 1789, em Pleno Ciclo de Ouro. No final do século XVIII, o Brasil ainda era colônia de Portugal e sofria com os abusos políticos e com a cobrança de altas taxas e impostos. Vale lembrar também que, neste período, era grande a extração de ouro, principalmente na região de Minas Gerais. Os brasileiros que encontravam ouro deviam pagar o quinto, ou seja, vinte por cento de todo ouro encontrado acabava nos cofres portugueses em forma de impostos. Aqueles que eram pegos com o ouro “não quitado” (“sem ter pago o imposto”) sofriam duras penas, podendo até ser degredados (enviados a força para o território africano). Com a grande exploração, o ouro começou a diminuir nas minas. Mesmo assim as autoridades portuguesas não diminuíam as cobranças e impostos. Nesta época, Portugal criou a Derrama. Esta funcionava da seguinte forma: cada região de exploração de ouro deveria pagar 100 arrobas de ouro (1500 quilos) por ano para a metrópole. Quando a região não conseguia cumprir estas exigências, soldados da coroa entravam nas casas das famílias para retirarem os pertences até completar o valor devido.

E a mais inspiradora de todas as revoluções, a francesa, até hoje, provoca um intenso debate sobre a mobilização da população para impor a queda do poder monárquico. Ela apresenta um leque de razões para sua eclosão: liberdade, justiça e igualdade. O tributo estava lá. A igualdade tributária.

            Os diversos grupos sociais andavam insatisfeitos com a situação do país. O clero, a realeza e a nobreza feudal desfrutavam da isenção de tributos e se sustentavam por meio do controle das forças produtivas e do uso indiscriminado do dinheiro público.

            A luta não foi para destituir o estado de seu poder. Afinal, a sociedade não interessa um estado débil, frágil, sem forças para velar pelo cumprimento das regras que vão estabelecer a convivência, a paz social. O que se pretende foi pôr fim ao poder absoluto.

           

1          O PODER DE TRIBUTAR

 

            Porque o Estado pode exigir dos indivíduos uma parcela do seu patrimônio? É que dentre as muitas atribuições deste ente político, uma em especial é o poder de tributar. Uma atividade que nasce da soberania.

O Estado é uma entidade soberana. No exercício de sua soberania o Estado exige que os indivíduos lhe forneçam os recursos de que necessita. Institui o tributo. O poder de tributar nada mais é que um aspecto da soberania estatal, ou uma parcela dela (MACHADO, Hugo de Brito. 2006, p. 53).

            Aqui exige uma breve reflexão sobre poder. Partindo da reflexão proposta por Bobbio, poder é uma relação entre dois sujeitos onde um impõe ao outro sua vontade e lhe determina, mesmo contra a vontade, o comportamento (SABBAG, 2012, p. 57).

            Partindo dessa conceituação, é possível afirmar que o poder político não se coaduna com a ideia de força, onde quem exerce o poder impõe a sua vontade a outrem, a quem cabe apenas comportar-se como ordenado. Nesse sentido, Sabbag fundamenta esta linha de discussão com o próprio Norberto Bobbio: “O fato de a possibilidade de recorrer à força ser o elemento que distingue o poder político das outras formas de poder não quer dizer que o poder político se resolva através do uso da força. O uso da força é uma condição necessária, mas não suficiente para a existência do poder político”.

            Desta forma podemos chegar à conclusão que o Poder de tributar é, na verdade, um poder de direito, calçado no consentimento dos cidadãos. Destinatários da invasão patrimonial. Diz Sabbag, no estudo da soberania estatal, que tendo o Estado surgido com a função precípua de prover necessidades coletivas, há de estar ele munido do poder de exigidos indivíduos, um dever de prestação (SABBAG, 2012, p. 58).

 

2          LIMITAÇÕES AO PODER DE TRIBUTAR

            Esse poder de tributar não é absoluto. Limitam-se regramentos que procuram frear o exercício desse poder, que deve ser operado de forma justa e equilibrada sem provocar danos à liberdade e à propriedade do cidadão.

            A constituição abriga vários princípios, que servem como verdadeiras garantias constitucionais do contribuinte contra a força tributária do Estado, agindo como fator limitador ao poder de tributar (SABBAG, 2012, p. 60).

            No Estado democrático de direito, a garantia individual é inafastável. E nesse sentido, o princípio da legalidade constitui o mais importante limite aos governantes à atividade de tributar. Ou seja, o tributo depende de lei para ser instituído e para ser majorado.

 

3          PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA         

 

            Este princípio está explícito no art. 5º, II, onde assumo por todo ordenamento um papel preponderante: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

            O consentimento emanará, em regra, de lei ordinária, por entidade titular da competência, portanto em caso de tributo federal, depende de lei federal aprovada pelo Congresso Nacional. Assim como o tributo federal, depende de lei federal aprovada pelo Congresso Nacional. Assim como o tributo estadual depende de lei ordinária aprovada pela Assembleia Legislativa e no município pela Câmara Municipal.

            Ressalve que há casos de tributos federais que exige uma aprovação mais rigorosa: a maioria dos representantes do poder legislativo, assim devendo ser aprovada por lei complementar:

A)    Imposto sobre grandes fortunas (art. 153, VII, CF);

B)    Empréstimo compulsório (art. 148, I e II, CF);

C)    Impostos residuais (art. 154, I, CF);

D)    Contribuições-sociais-previdenciárias residenciais (art. 195, §4º, CF c/c art. 154, I CF).

            Não basta que se disponha na lei que um dado tributo fica assim instituído. Pede-se que a lei tributária defina todos os aspectos da fisiologia do tributo. Identificando o quanto se pagará, por quê se pagará e a quem pagará. Ou seja, de forma clara a lei deve fixar a alíquota, a base de cálculo, o sujeito passivo do tributo, a multa e o fato gerador, como dispõe o art. 97 CTN. Veja que esta reserva legal é estrita e deve ser conjugada com o princípio da tipicidade, possibilitando ao contribuinte, segurança jurídica.

            Situação bem pontuada na Apelação Cível n. 25140/2002, do Tribunal de Justiça do Maranhão:

“Desta forma, ao contrário do que sustentam as apelantes, não há que se falar em afronta aos princípios da tipicidade e legalidade, uma vez que a incidência do ISSQN sobre a atividade de rebocagem está compreendida na expressão serviços portuários, prevista na lista de serviços anexa ao Decreto Lei 406/68 e à Lei complementar 56/87. Em sendo assim, observo que o lançamento tributário pautou-se pelo princípio da tipicidade tributária pelo qual a administração tributária fica jungida a fixar, de forma precisa e especificada, a situação ou hipótese que constitua o fato gerador da obrigação tributária”.

 

            No sítio do Tribunal de Justiça do Maranhão, constam 7 (sete) ocorrências de decisões que incluíram em seu fundamento o princípio da legalidade tributária: a apelação Cível n. 25140/2002, Agravo Regimental n. 9637-2008, Mandado de Segurança n. 14341/2005, Apelação Cível n. 007681/2004, Agravo de Instrumento n. 027483/2009, Ação Recisória n. 020005-2007 e Apelação Civil n. 029211/2005.

            Uma breve observação faz necessário. Após intenso debate e tramitar por seis anos no Congresso Nacional, a PEC n. 472, resulto na emenda constitucional n. 32/2001. Esta, consoante o comando inserto no art. 62, §2º CF, permite a utilização de medida provisória em matéria tributária (SABBAG, 202, p. 79).

            O Supremo Tribunal Federal já produziu inúmeras decisões dando total proteção à permissão de criar tributos mediante Medidas provisórias, tendo em vista que a constituição não prevê quaisquer restrições a utilização dessa via para instituir imposto.

 

4          PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA

 

            O princípio da anterioridade tributária está expresso no art. 150, II, alíneas “b” e “c” da CF. Como já se posicionou STF, este princípio é garantia individual do contribuinte, implicando sua violação de vício inconstitucional, como leciona Sabbag (2012, p. 95).

            Percebe-se que a Constituição exige que a lei que crie ou aumente o tributo seja anterior ao exercício financeiro em que o tributo seja anterior ao exercício financeiro em que o tributo será cobrado e, ademais, que se observe a antecedência mínima de noventa dias entre a data de publicação da lei que o instituiu ou aumentou e a data em que se passa a aplicar-se (SABBAG, 2012, p. 94).

            Desta forma o princípio da anterioridade possibilita ao contribuinte a segurança jurídica, a certeza, coibindo como afirma Sabbag, a tributação de surpresa, pegando desprevenido o sujeito passivo da obrigação, como acentua bem a Desª Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz em seu voto na apreciação do Agravo de Instrumento n. 0002466-31.2011.8.10.000.

            “Como bem ressaltei, ao Município cabe instituir, por meio de lei, às alíquotas dos impostos de sua competência, configurando Instrumento da autonomia do ente municipal, assegurados nos artigos 18 e 30 da Constituição Federal, devendo apenas obedecer aos princípios da anterioridade e retroatividade tributária, a fim de assegurar que o contribuinte não seja surpreendido pelas alterações legislativas sem que possa preparar-se para as mesmas”.

            Ainda no sítio do Tribunal de Justiça do Maranhão, havia 5 (cinco) jurisprudências sobre o princípio da anterioridade: Medida cautelar em ADIN nº 6738/2004, Apelação Cível nº 011512-2009, agravo de Instrumento nº 0002466-21.2011.8.10.000. Apelação Civil nº 06031-2009 e por fim apelação Cível nº 006037/2009.

            Deste modo, alude-se à Sabbag para afirmar que o princípio da anterioridade não impede a criação nem a majoração de tributo. Apenas preocupa-se em regular os efeitos de tal ato no tempo. Trata-se de uma distância temporal mínima entre a publicação e a força vinculante da lei. As alíneas “b” e “c” do art. 150 da CF, faz duas exigências temporais com dupla espera a ser cumprida: a anual e a nonagesimal.

            O princípio da anterioridade determina que os entes tributantes não podem cobrar tributos no mesmo exercício financeiro em que tenha sido publicada a lei que aumentou ou instituiu o tributo (SABBAG, 2012, p. 102).

            O princípio da anterioridade nonagesimal, revigorado pela EC. 42 de 19 de dezembro de 2003, pela qual se passou a vedar cobrança de tributos antes decorridos 90 (noventa) dias desde a data em que se tenha sido publicada a lei que haja instituído ou majorado o tributo.

           

5          O PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA

 

            A princípio, conforme ensina Bernardo de Moraes, insta salientar que o princípio da igualdade nasceu para abolir a estrutura social do século XVIII, onde existiam privilégios de nascimento, regalias de toda ordem e diferenciações sociais. Propugnava-se, então, uma completa igualdade entre os homens, isto é, pela absoluta abolição de vez, dos privilégios e regalias então reinantes (MORAES apud NASCIMENTO, 1999, p. 61).

            Cumpre aduzir que tal noção de igualdade surge primordialmente com o descrédito do modelo estatal vigente à época das monarquias absolutistas, sendo fundamental ressaltar o entendimento de Cármen Lúcia Antunes, neste sentido:

“[...], sociedade estatal ressente-se das desigualdades como espinhosa matéria a ser regulamentada para circunscrever-se a limites que arrimassem as pretensões dos burgueses, novos autores das normas, e forjasse um espaço de segurança contra as investidas dos privilegiados em títulos de nobreza e correlatas regalias no Poder. Não se cogita, entretanto, de uma igualação genericamente assentada, mas da ruptura de uma situação em que prerrogativas pessoais decorrentes de artifícios sociais impõem formas despóticas e acintosamente injustas de desigualação (ROCHA, 1990, p. 35).”

 

            Estabelece-se, então, um Direito que se afirma fundado no reconhecimento da igualdade dos homens, igualdade em sua dignidade, em sua condição essencial de ser humano. Positiva-se o princípio da igualdade. A lei, diz-se então, ser aplicada igualmente a quem sobre ela se encontre submetido. Preceitua-se o princípio da igualdade perante a lei (ROCHA, 1990).

            Desta forma, não basta tão somente que a lei declare que todos são iguais, mas sim que a mesma declare e propicie os mecanismos eficazes para o cumprimento de tal igualdade, assumindo o Estado, com isso, um papel fundamental para garantir aos membros da sociedade uma efetivação da isonomia (ROCHA, 1990).

            O que, no estágio atual de interpretação do Princípio da Igualdade, é buscado de forma que “a igualdade perante a lei signifique igualdade por meio da lei, vale dizer, que seja a lei o instrumento criador das igualdades possíveis e necessárias ao florescimento das relações justas e equilibradas entre as pessoas” (ROCHA, 1994. Pg 118).

            Neste propósito, a Constituição Federal de 1988 também contemplou o Princípio da Igualdade, sendo correto aduzir que tal princípio foi amplamente consagrado, eis que além da igualdade genérica (arts. 3º e 5º), também previu a isonomia tributária (art. 150, II).

            Na Carta Política de 1988, encontram-se claramente os conceitos de igualdade formal e material, ao dizer que todos são iguais perante a lei, na cabeça de seu artigo 5º, a Magna Carta consagra a ideia de igualdade meramente formal, ou seja, aquela em que a lei deve ser indistintamente aplicada a todas as pessoas. Nesse sentido, entende-se que a desigualdade na lei se produz no momento em que a norma diferencia de modo não razoável ou arbitrário um tratamento específico a pessoas diversas, como afirma Alexandre de Moraes:

“Para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não discriminatórias, torna-se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável, de acordo com critérios e juízos valorativos genericamente aceitos, cuja exigência deve aplicar-se em relação à finalidade e efeitos da medida considerada, devendo estar presente por isso uma razoável relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade perseguida, sempre em conformidade com os direitos e garantias constitucionalmente protegidos”. (MORAES, 2004, p. 67).

 

            Quanto ao Princípio da Isonomia Tributária em si, cabe aduzir que, consoante o artigo 150, inciso II, da Magna Carta, que é o que traz a baila o aludido princípio, é vedado que seja instituído “tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos” (BRASIL, 2005).

            Ademais, o Princípio da Isonomia, ou seja, a Proibição de Desigualdade prevista no artigo 150, inciso II, da Constituição Federal, de acordo com Ricardo Lobo Torres, pode ser expressado sob dois aspectos principais: a) proibição de privilégios odiosos; b) proibição de discriminação fiscal. O privilégio nada mais é que a permissão para fazer ou deixar de fazer alguma coisa que se contraponha aos direitos impostos a todos. No que toca ao privilégio odioso, cabe aduzir que o mesmo consiste em pagar tributo menor que o previsto para os demais contribuintes ou não pagá-lo, isso em razão de características pessoais. Vale salientar que nossa Constituição Federal de 1988, em seu artigo 150, inciso II, proibiu genericamente os privilégios odiosos e permitiu os não-odiosos. Já as discriminações odiosas são desigualdades infundadas que prejudicam a liberdade do contribuinte, ou seja, “qualquer discrime desarrazoado, que signifique excluir alguém da regra tributária geral ou de um privilégio não-odioso” (TORRES, 2004, p. 80).

            Esse princípio em comento veda o tratamento jurídico diferenciado entre as pessoas sob o mesmo pressuposto fático, bem como o tratamento isonômico às pessoas que se encontram sob pressupostos de fatos diferentes. É um princípio voltado ao legislador ordinário, proibindo discriminações tributárias, privilegiando ou favorecendo determinadas pessoas físicas ou jurídicas.

            Desse principio da igualdade é possível inferir o princípio da generalidade da tributação, da mesma forma que do princípio nullum tributum sine lege pode-se inferir o princípio da legalidade da isenção, isto é, não há, nem pode haver isenção sem lei.

            Segundo o princípio da generalidade dos tributos, todo aquele que praticou o ato tipificado ou foi o responsável pela sua ocorrência é obrigado a pagar tributos. Esse princípio não se choca com o princípio da capacidade contributiva, porque a igualdade se refere aos indivíduos que apresentam situação física igual, isto é, tratamento igual para os iguais, e não para todos indistintatemente. O princípio da generalidade pode ser excepcionado por meio da isenção, que respeite o princípio da isonomia. Neste raciocínio, leciona o agravo de instrumento nº 0002256-81.2011.6.11.000, levado ao Tribunal de Justiça do Maranhão.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. REGIME DO SIMPLES. EMPRESA COM ATIVIDADE NA ÁREA EDUCACIONAL. LEI 10.034/2000, ART. 2º. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA. – Embora todos os contribuintes inscritos no SIMPLES recolham os valores pertinentes nos termos do art. 5ª da Lei 9317/96, com as alterações introduzidas pela Lei 9.7321/98, somente as creches, pré-escolas e escolas de ensino fundamental estão obrigadas ao recolhimento com acréscimo de 50% nos termos do art. 2º da Lei 10.034/00, a configurar-se violação ao princípio da isonomia tributária. – A imposição do referido acréscimo de 50% atenta contra o princípio da razoabilidade, uma vez que o que se pretende com possibilidade de opção pelo SIMPLES é justamente eximir as creches, pré-escolas e instituições de ensino fundamental do regime tributário comum, mais complexo e, principalmente, mais oneroso, deixando-o para aquelas empresas que contam com infraestrutura capaz de suportá-lo, e não inviabilizá-lo através da exigência de recolhimentos a maior.

 

            Essa isenção específica, que não se confunde com a isenção especial, fere o princípio da razoabilidade, que se apresenta como um limite à própria atividade legislativa. Daí a minudência com que o princípio da isonomia tributária foi prescrito na Constituição de 1988 atendendo ao clamor do povo no sentido de proibir as isenções subjetivas para manter privilégios de poucos à custa da maior imposição tributária sobre os demais membros da sociedade. A redação analítica do inciso II, do art. 150 da CF visa restabelecer a justiça fiscal, que está ínsita no princípio da isonomia. Pela atual redação do texto constitucional os integrantes da magistratura, das forças armadas e os parlamentares sujeitam-se ao pagamento do imposto de renda incidindo sobre a remuneração respectiva (CASTILHO, 2002).

            Vale explanar ainda que não existe uniformidade quanto ao entendimento acerca da capacidade contributiva (“capacidade econômica do contribuinte”). Os impostos deverão ser graduados segundo a medida da possibilidade econômica dos contribuintes de pagar tributos.

 

6          PRINCÍPIOS DA IRRETROATIVIDADE TRIBUTÁRIA

 

            No que tange ao princípio da irretroatividade, prescreve o art. 150, III a da CF que é vedado cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado.

            Esse princípio é o da prévia definição legal do fato gerador da obrigação tributária. Em uma interpretação literal, esse princípio seria de todo dispensável, pois é elementarmente sabido não há como falar em ocorrência do fato gerador sem que a norma instituidora do tributo estivesse em vigor (LACOMBE, 2000).

            O princípio da legalidade tributária, por si só, já impede a cobrança de tributo, sem que antes estivesse em vigor a lei criadora ou majoradora do tributo. Mas, o legislador constituinte de 1988 tinha motivos para instituir esse princípio. É que o art. 34 do ADCT determinou que o Sistema Tributário Nacional só entrasse em vigor em 1º de março de 1989, com as exceções previstas no seu §1º, no qual não estão incluídos todos os impostos novos, como por exemplo, o adicional do imposto de renda outorgado aos estados membros (VALADÃO, 2000).

            Esse adicional de 5% só poderia viger a partir de 1º de março de 1989, por força daquela art. 34 do ADCT. Mas, para poder cobrar a partir desta data, o estado teria que instituir o imposto adicional no exercício anterior em razão do princípio da anterioridade. Por isso, o Estado de São Paulo, por exemplo, instituiu esse imposto adicional, publicando a Lei nº 6.352, em 29 de dezembro de 1988, prescrevendo em seu art. 11 que entrará em vigor na data de sua publicação produzindo os efeitos a partir de 1º de Março de 1989 (VALADÃO, 2000).

            A lei instituidora do fato gerador estava em vigor no ano de 1988 em respeito ao princípio da anterioridade, porém, seus efeitos ficaram suspensos até 28 de fevereiro de 1989, passando a atuar a partir de 1º de março de 1989. Com isso, respeitou-se o princípio da irretroatividade à medida que o adicional só poderia ser exigido a partir da data em que a norma jurídica de tributação tivesse aptidão para incidir sobre os fatos concretos (VALADÃO, 2000).

            Esse princípio que, na verdade, é um princípio geral de direito, ou seja, da anterioridade da lei aos fatos, merece exame mais detalhado para efeitos práticos, pois o aspecto temporal do fato gerador, ou seja, o momento de sua ocorrência no mundo fenomênico, define a legislação tributária aplicável ao caso.

            O art. 105 do CTN prescreve a aplicação imediata da legislação tributária aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim considerados aqueles cuja ocorrência tenha tido início, mas não esteja completa nos termos o art. 116. O art. 116, por sua vez, define o momento em que se considera ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos distinguindo as hipóteses de situação de fato e de situação jurídica.

            O art. 106 prescreve hipóteses de aplicação retroativa da lei em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade às infrações dos dispositivos (LC nº 118/05, art. 3º confere efeito interpretativo ao inciso I do art. 168 do CTN, declarando que a extinção do crédito tributário ocorre no momento da antecipação do pagamento).

            Quando tratando-se de caso não definitivamente julgado quando deixe de defini-lo como infração; quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulenta ou não tenha implicado em falta de pagamento de tributo; quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da prática.

            Ademais, o inciso I cuida de hipótese de lei interpretativa, modalidade de interpretação conhecida como interpretação autêntica. Na verdade, interpretação não é tarefa dos legisladores, mas da doutrina e da jurisprudência.

            Não cabe ao legislador, sob o manto da interpretação autêntica proceder a alteração ou inovação do texto legal interpretado, como aconteceu com o art. 3º da Lei Complementar nº 118/03 que, a pretexto de interpretar o disposto no inciso I do art. 168 do CTN, promoveu a redução do prazo prescricional para propositura de ação de repetição de indébito tributário, retirando daquele preceito exatamente o sentido tido como correto pela reiterada jurisprudência do STJ, intérprete máximo em termos de legislação federal (VALADÃO, 2000).

           

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

            Princípio é a regra básica implícita ou explícita que, por sua grande generalidade, ocupa posição de destaque no ordenamento jurídico e, por isso, vincula o entendimento e a boa aplicação, seja dos simples atos normativos, seja dos próprios mandamentos constitucionais. Demonstra regra superior, mesmo que não positivada, à qual devem se amoldurar as disposições legais, visto que os princípios indicam “direção” que deve ser tomada pelo exegeta ou pelo legislador.

            Em consequência do cenário exposto, a problemática desenvolvida foi sintetizada na seguinte questão: qual o papel os princípios constitucionais tributários e qual é a sua interferência na tributação? Procurou-se discutir os posicionamentos contraditórios existentes na jurisprudência quanto aos princípios constitucionais tributários, as suas características e finalidades, apontando a sua aplicabilidade no nosso ordenamento, em especial nas decisões do Tribunal de Justiça do Maranhão, e verificando seus fundamentos e implicações na tributação.

            Pode-se concluir que os princípios constitucionais tributários são limitações ao poder de tributar e devem ser observados sob dois aspectos: o primeiro diz respeito aos princípios, os quais regulam, norteiam a competência dos entes políticos; o segundo, às imunidades, regras que proíbem a tributação sobre certos bens, pessoas ou fatos a fim de proteger determinados conteúdos axiológicos na Constituição.

            Princípios de uma ciência são as proposições básicas, fundamentais, típicas que condicionem todas as estruturas subsequentes. Princípios são os alicerces da disciplina estudada.

            Os princípios tributários estão relatados pela Constituição Federal brasileira de 1988, no Título VI, da Tributação e do Orçamento, Capítulo I, do Sistema Tributário Nacional, Seção II, das limitações ao poder de tributar.

            Princípios jurídicos são as ideias centrais do sistema, que norteiam toda a interpretação jurídica, conferindo a ele um sentido lógico e harmonioso. Os princípios estabelecem o alcance e sentido das regras existentes no ordenamento jurídico.

            Estudar os princípios constitucionais tributários é descobrir que o Estado sofre limitações no seu poder dever de instituir e cobrar tributos. Não fossem essas limitações, a vida social tornar-se-ia insuportável. Com todos esses bloqueios, a sanha fiscal estatal é voraz, imagine se elas não existissem.

 

REFERÊNCIAS

 

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 9. ED. SÃO PAULO: SARAIVA, 2003.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: HTTP://www.planalto.gov.br/. Acesso em 31 out. 2005.

CASTILHO, Paulo Cesar Baria de. Confisco Tributário. São Paulo: RT, 2002.

LACOMBE, Américo Lourenço Masset. Princípios Constitucionais Tributários. 2. Ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso De Direito Tributário. 27 ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2006.

MORAES, Alexandre. Constituição Do Brasil Interpretada. São Paulo: Atlas, 2002, p.181.

MORAES, Alexandre apud NASCIMENTO, Carlos Valder do. Curso de direito tributário. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 61.

ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais Da Administração Pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994.

__________. O Princípio Constitucional Da Igualdade. Belo Horizonte: Lê, 1990.

SABBAG, Eduardo. Manual De Direito Tributário. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

VALADÃO, Marco Aurélio P. Limitações constitucionais ao poder de tributar. Minas Gerais: Del Rey, 2000.

           

 



[1] Paper apresentado para obtenção de nota parcial referente à disciplina Direito Tributário, ministrada pelo Prof.º Msc. Fabiano Lopes, no 7º período do curso noturno de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

[2] Graduando no curso de Direito da Universidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB).

[3] Graduando no curso de Direito da Universidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB).