O convívio em sociedade implica, necessariamente, a existência de relações entre seus componentes. Algumas dessas relações são alvo de regulamentação por parte do Estado, que cria regras de conduta, sendo que sua obediência é observância obrigatória para todas as pessoas, daí se extrai aquela velha máxima ubi societas ibi jus, ou seja, onde há sociedade há direito.

Pergunta-se prefacialmente, qual o liame existente entre direito e sociedade. A resposta reside na função que o direito exerce na sociedade, que é a função de ordenar os interesses que se contrapõem na vida social, tendo em vista a cooperação entre pessoas e a composição dos conflitos que se fizerem presentes entre seus membros.

Nos primórdios da vida em sociedade, não havia um poder estatal que fosse capaz de conter os atritos dos homens e que impusesse o direito acima da vontade dos particulares. Assim, quem pretendesse alguma coisa que outrem o impedisse de conseguir, por conta própria, teria de satisfazer sua pretensão.

Essa prática, denominada autotutela ou autodefesa, era precária e aleatória, pois não realizava a justiça, e sim, a vitória do mais forte sobre o mais fraco. José Albuquerque Rocha (2009) ensina que a autotutela repousa no poder de coação de uma das partes, sendo que o critério da justiça intrínseca da decisão é sacrificado, tendo por traços fundamentais a inexistência de juiz distinto das partes e a imposição da decisão por uma das partes à outra.

Dessa maneira, o poder e o direito transformam-se em elementos indissociáveis da convivência humana em sociedade, de tal forma que não há de se falar em sociedade sem um sistema político e jurídico que determine as regras de conduta, uma vez que o surgimento de conflitos entre os homens é algo inevitável e a resolução das contendas por parte dos particulares é vedada pelo Estado.

O professor Wilson Alves de Souza (2011), obtempera que o sistema político, reconhecido e institucionalizado sob a forma de Estado, por meio do poder legislativo, é que delimita quais são os bens da vida que serão objeto de proteção pelo direito material. Com efeito, é proibida a autotutela do direito material, e para isso o Estado deve garantir a realização do direito quando violado ou sujeito à violação.

A função do sistema jurídico, como bem assinala Ada Pellegrini Grinover, Antonio Carlos de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco (2004), é apaziguar as relações sociais intersubjetivas, com a finalidade precípua de maximizar a efetivação dos valores humanos, reduzindo ou minimizando o sacrifício e o desgaste, tendo portanto, o escopo de coordenar os interesses que se externam no meio social, de modo a compor os conflitos que eventualmente se verifiquem entre os componentes do referido meio social.

Concluem os autores que a jurisdição possui duas finalidades primordiais: uma finalidade social, que seria a pacificação dos conflitos entre os membros de determinada sociedade. Euma finalidade jurídica, que seria garantir a efetivação do direito material por meio do processo.

Ada Pellegrini Grinover, Antônio Carlos de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco (2004), discorrendo sobre a jurisdição ensinam que esta é uma das manifestações do poder estatal, caracterizada pela capacidade, que o Estado tem, de decidir imperativamente e impondo suas decisões.Os mesmos autores ao conceituarem a atividade jurisdicional a definem como sendo (2004, 131):

“uma das funções do Estado, mediante a qual este substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça. Essa pacificação é feita mediante a atuação da vontade do direito objetivo que rege o caso apresentado em concreto para ser solucionado; e o Estado desempenha essa função sempre mediante o processo, seja expressando imperativamente o preceito (através de uma sentença de mérito), seja realizando no mundo das coisas o que o preceito estabelece (através da execução forçada).”

A jurisdição, nessa linha de raciocínio, segundo os eminentes processualistas, pode ser entendida sob três aspectos, podendo ser poder, função e atividade. Como poder, esta seria uma exteriorização do poder do Estado, em regraquando provocado, caracterizado pela capacidade de decidir maneira imperativa e impondo assim, sua decisão.

Como função, seria o encargo que os órgãos estatais têm de realizar a pacificação dos conflitos, que se dá por meio da realização do direito através de um processo.

Já como atividade, ela é o conjunto de atos do juiz no processo, exercendo o poder e cumprindo a função que lhe foi atribuída pela lei. O poder, a função e a atividade somente se manifestam validamente por meio de um processo devidamente estruturado, ou seja, por meio do devido processo legal.