JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA: Uma Análise dos artigos 3º e 4º da Lei 12.153 diante do Direito a Ampla Defesa e ao Contraditório Dandara Ribeiro* Giuliana Belém* SUMÁRIO: Introdução; 1. O Instituto dos Juizados Especiais; 2. Competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública; 3. Do Recurso nos Juizados Especiais da Fazenda Pública; 4. O Direito à Ampla Defesa e ao Contraditório diante da limitação de admissibilidade de recursos nos Juizados especiais da Fazenda Pública; Considerações Finais. PALAVRAS-CHAVE Juizados especiais. Recurso. Celeridade. Ampla Defesa e Contraditório. RESUMO Existem muitas polêmicas acerca do Sistema de Juizados Especiais. Este trabalho pretende tratar de um fato incontroverso em especial. Busca-se analisar as possibilidades de interpor recurso nos Juizados Especiais da Fazenda Pública, discriminadas nos artigos 3º e 4º da Lei 12.153. Partindo-se desta análise, far-se-á uma digressão acerca dessas possibilidades limitadas de interposição do recurso diante do Direito à Ampla Defesa e ao Contraditório. Sem, para isso, se olvidar da importância do Direito de acesso ao judiciário da Celeridade Processual, estendida à Duração Razoável do Processo. INTRODUÇÃO Muito se fala da ineficiência da prestação jurisdicional no Estado brasileiro, resultante de fatores como o engessamento da legislação que não consegue acompanhar as mudanças cada vez mais rápidas do mundo contemporâneo. A fim de melhorar esta prestação surgiu o Sistema de Juizados Especiais, tendo como precursor os Juizados de Pequenas Causas. Tal Sistema, que engloba os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, implantados pela lei 9.099/95, os Juizados Federais, implantados pela lei 10.259/01 e os Juizados Especiais da Fazenda Pública, implantados pela lei 12.153/09, está envolto em uma série de polêmicas, em especial acerca do trâmite, que por ser enxuto acaba ceifando alguns momentos processuais necessários para o bom andamento do processo. Pretende-se fazer uma breve análise do histórico do Sistema de Juizados Especiais, para depois delimitar o estudo ao campo dos Juizados Especiais da Fazenda Pública. Inicialmente se elucidará algumas peculiaridades do tramite processual destes Juizados, bem como sua competência, disposta no art. 2ª da lei 12.153, não se omitindo de eventuais comparações com a lei 9.099. Após esta análise geral, parte-se para o cerne deste trabalho: A disciplina dos recursos nos Juizados Especiais da Fazenda Pública ante a ampla defesa e o contraditório. Dispostos nos art. 3º e 4º da lei 12.153, a possibilidade de interpor o recurso se limita a alguns casos específicos, sendo um rol bem menor que o aplicado á justiça comum. Diante disso, cabe explicar como se dá o recurso neste sistema, para fazer uma análise sobre a finalidade dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, qual seja a celeridade processual, duração razoável do processo, bem como a promoção do acesso á justiça e o “desafogamento” do judiciário, diante do direito de Contraditório e da Ampla Defesa. Cumpri observar se a abreviação do trâmite processual restringiu de alguma forma este direito. 1 O INSTITUTO DOS JUIZADOS ESPECIAIS Não é recente o debate acerca da crise do Judiciário brasileiro, desde o mais remoto tempo, quando foi inserido na sociedade brasileira, este instituto sofre críticas, que na maioria das vezes encontra respaldo na disparidade entre a real necessidade social e atos normativos ineficazes. A morosidade do judiciário e as leis que mais burocratizam do que primam pela celeridade do processo, somadas à crescente demanda dos cidadãos às vias judiciais, colocam em xeque a efetividade de princípios/direitos como a celeridade, duração razoável do processo e o próprio direito de acesso a justiça. Com o crescimento econômico, aumento populacional e surgimento de diversas relações paralelas em variados setores da sociedade, o judiciário brasileiro tornou-se “uma estrutura pesada, sem agilidade, incapaz de fornecer soluções em tempo razoável, previsíveis e a custos acessíveis para todos” (DADEK, 2004). A fim de evitar uma bancarrota, o judiciário brasileiro precisou se modernizar para acompanhar os novos tempos e ainda que estejamos longe de alcançar a excelência, algumas medidas tomadas serviram se não para melhorar, para, pelo menos, não deixar que a situação se agrave. Em 1984 foi aprovada a lei que estabelecia os Juizados Especiais de Pequenas Causas no ordenamento jurídico brasileiro. Tal lei abria as portas para um novo sistema que se diferenciava e contrastava com o sistema vigente, uma vez que quebrava com o formalismo e burocracia exacerbados que assolam nosso sistema jurídico. Nas palavras de Paulo Fadigas (2011, p. 3), “A alteração foi muito grande, com um sistema novo, todos os operadores do Direito tiveram de se adaptar, isto é, tiveram de se afastar do paradigma do CPC”. A finalidade destes juizados não era inicialmente promover uma celeridade processual ou desafogar o judiciário, tais juizados tinham competência de julgar casos que não eram submetidos ao Poder Judiciário (FADIGAS, 2012), logo, foi um avanço significativo na promoção do Acesso à Justiça. Nesse Diapasão, os Juizados Especiais de Pequenas Causas deram ensejo à criação dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais, Federais e da Fazenda Pública, objeto deste artigo. Em 1995 foi instituído pela lei 9.099 os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que, embora tenha a base dos Juizados de Pequenas Causas, abrangem um numero maior de pessoas e de causas, agora sim, promovendo não só o acesso à justiça, mas também a celeridade e uma duração razoável do processo. Em 2001, com a lei 10.259, surgiram os Juizados Especiais Federais e em 2009, com a lei 12.153, implantaram-se os Juizados Especiais da Fazenda Pública, formando o sistema de Juizados Especiais. Consoante o art. 98, inciso 1º da Constituição Federa, tal sistema tem competência de julgar e executar causas de menor complexidade. Primando pela conciliação e mediante procedimentos oral e sumaríssimo. Trata-se de um tramite menos formal e muito mais simples que a Justiça Comum, de modo que o caminho entre a Petição Inicial e a sentença é mais curto. Outra característica deste sistema é a possibilidade de se ir a juízo sem a assistência do advogado quando a causa não alcança um determinado valor, estabelecido pela legislação específica de cada juizado, bem como a apresentação das testemunhas se dar em audiência (FADIGAS, 2012). Em suma, os Juizados Especiais foram uma forma de enxugar o tramite processual diante de situações mais simples, assim abrindo o judiciário a uma parcela antes esquecida da sociedade. 2 COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA Com a implantação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, abriu-se caminho para se tratar de forma mais simples casos entre particulares e a União. Ainda que tenha os mesmo fundamentos dos Juizados Cíveis, como oralidade, rito simples e célere, os Juizados Especiais se diferenciam daqueles em alguns aspectos, quais serão explanados nos próximos parágrafos. Contudo, naquilo em que a lei 12.153 é omissa, aplica-se a regras da lei 9.099 e subsidiariamente o CPC. A competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública está prevista no caput do art. 2º da Lei 12.153: Art. 2º - É de competência dos Juizados Especiais da Fazenda pública processar, conciliar e julgar causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 (sessenta) salários mínimos. Diferentemente dos Juizados Especiais Cíveis que julgam causas de até 40 salários mínimos, sendo dispensável a presença do advogado em causas que não excedam 20 salários mínimos, os Juizados Especiais da Fazenda Pública têm competência de julgar causas de até 60 salários mínimos, sendo dispensável o advogado independente do valor da causa, desde que não ultrapasse o teto previsto (CARDOSO, 2010). Entretanto é preciso pontuar que nos casos em que ocorre recurso é necessária a presença do advogado, consoante o art. 41 da lei 9.099 (CUNHA, 2010). Outra característica dos Juizados Especiais da Fazenda Pública é sua competência absoluta, expressa no §4º do art. 2º da lei 12.153, ou seja, Enquanto nos Juizados Especiais Estaduais existe limitação a causas de menor complexidade (art. 3º, caput, da Lei nº 9.099/95) e o autor pode optar pelo seu rito ou pelas vias ordinárias, nos Juizados da Fazenda Pública a competência é absoluta nas causas com valor de até 60 salários mínimos (art. 2º da Lei nº 12.153/2009), independentemente de seu objeto ou dificuldade (CARDOSO, 2010). Isto ocorre porque no próprio art. 2º, mais precisamente no § 1º, da lei dos Juizados especiais da Fazenda Pública estão expressos os casos que fogem à competência dos mesmos. São eles: a) mandados de segurança; b) ações de desapropriação; c) ação de divisão e demarcação; d) ação popular; e) ação de improbidade administrativa; f) execuções fiscais; g) sobre direitos ou interesses difusos e coletivos; h) causas sobre bens imóveis dos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, autarquias e fundações públicas a eles vinculadas; i) e ações que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou de sanções disciplinares aplicadas a militares (CUNHA, 2010). Outra peculiaridade dos Juizados Especiais da Fazenda Pública diz respeito às partes da demanda, disposta no art. 5ª da lei 12.153. Consoante este dispositivo somente figuram como autores, pessoas físicas, microempresas e empresas de pequeno porte. Enquanto que o polo passivo só pode ser preenchido pelos Estados, Distrito Federal, Territórios, Municípios, Autarquias, Fundações e empresas públicas a eles vinculadas. Convém ressaltar que não se admite nos sistemas de Juizados qualquer forma de intervenção de terceiro. Contudo admite-se o litisconsórcio, desde que observado o valor de 60 salários mínimos como somatória total (FADIGAS, 2012). Diante desta breve explanação acerca da competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, pode-se perceber nitidamente o objetivo de retirar da Justiça Comum causas mais simples, mas que contribuem para o abarrotamento do judiciário, bem como promover um processo mais célere. 3 DO RECURSO NOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA O microssistema dos Juizados Especiais não contemplou uma teoria geral em matéria recursal, aplicam-se, pois, as regras gerais sobre recursos previstas no Código de Processo Civil, ressalvadas as peculiaridades próprias do sistema os Juizados Especiais (FADIGAS, 2012). Salvo no caso de medidas cautelares e antecipatórias, não cabe recurso contra decisões interlocutórias, no sistema processual da Lei nº 12.153/2009 em um único artigo (art. 4º). Quando recorrível, a decisão interlocutória desafiará agravo de instrumento, observado o procedimento previsto no Código de Processo Civil para essa modalidade recursal, ou seja, o recorrente se dirigirá diretamente à Turma Recursal, instruindo sua petição com as peças extraídas por cópia dos autos. Como a nova lei que instituiu o Juizado Especial da Fazenda Pública nos Estados procurou englobar todos os Juizados num único sistema (Lei n° 12.153/2009), acabou sendo omissa quanto ao prazo de interposição do recurso, cabimento, efeitos, além de outros aspectos importantes. Todavia, por estar inserida no microssistema dos Juizados Especiais Estaduais, aplicam-se as regras da Lei n° 9.099/1995 e, no que esta for omissa, a Lei n° 10.259/2001 e o Código de Processo Civil. (CUNHA, 2010) No sistema dos Juizados Especiais da fazenda Pública o recurso inominado é cabível também contra as sentenças que extinguem o processo sem resolução de mérito. Assim, v.g, se o juiz indeferir petição inicial, por inépcia, ou extinguir o processo, sem resolução de mérito, por faltar algum pressuposto processual ou condição de ação, caberá recurso inominado a ser julgado pela Turma Recursal a que se refere o art. 17 da Lei n° 12.153/2009. (FADIGAS, 2012) Desse modo, as sentenças nos Juizados Especiais da Fazenda Pública são recorríveis (Lei nº 10.259/2001, art. 4º), mas não ensejam apelação para o Tribunal de Justiça. Tampouco se há de cogitar de recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça, quando a causa for submetida ao segundo grau interno dos Juizados. Pode caber, no entanto, recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal do que restar decidido, não pelo juiz singular, mas pelas turmas recursais internas do juizado (art. 21). São irrecorríveis as sentenças do Juizado Especial que homologarem a conciliação ou o laudo arbitral (Lei nº 9.099, art. 41). O recurso, no caso em que seja manejável contra a sentença, é endereçado à Turma Recursal integrante do Sistema dos Juizados Especiais, a qual se compõe de juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, na forma prevista na legislação local, com mandato de dois anos (FADIGAS, 2012). O recrutamento, de preferência, será feito entre os juízes integrados ao sistema dos Juizados Especiais. A Lei n° 12.153/2009 é omissa quanto a prazo para interposição do recurso inominado. Aplica-se, pois, por analogia, o prazo previsto na Lei nº 9.099/95, art. 42, que é de dez dias. Efetuado o preparo, o recorrido terá, também, dez dias para contrarrazões (Lei nº 9.099, art. 42, § 2º). Admitem-se embargos de declaração no sistema dos Juizados especiais da Fazenda Publica, tanto contra as decisões interlocutórias, quanto contra sentenças e acórdãos. Tem aplicação analógica aqui o disposto nos art. 48, 49 e 50 da Lei n° 9.099/1995. O pressuposto para a admissibilidade dos embargos declaratórios é que na decisão exista obscuridade, contradição ou omissão. (KOZIKOSKI, 2004, p.95) Existe permissão expressa, também, para o cabimento dos embargos de declaração, tanto em face das sentenças dos juízes de primeiro grau, como dos acórdãos das Turmas Recursais (Lei nº 9.099, art. 48). É do acórdão da Turma Recursal, e não diretamente da sentença, que se poderá cogitar do recurso extraordinário para o STF, em caso de ofensa à Constituição, desde que configurada a “repercussão geral” (CF, art. 102, inc. III e § 3º). Em qualquer caso, não se permite recorrer, nos Juizados Especiais, sem a representação por advogado, ainda que o processo tenha se desenvolvido até a sentença sem o patrocínio técnico (Lei nº 9.099, art. 41, § 2º). O recurso, nos Juizados Especiais, se a parte não estiver amparada pela assistência judiciária gratuita, estará sujeito a preparo. (CUNHA, 2010) No caso específico do recurso inominado, entretanto, não é prévio como no CPC, tem aplicação disposto na Lei nº 9.099, art. 42, § 1º, o qual estabelece que o preparo deva ser feito nas 48 horas seguintes à interposição, independentemente de intimação e sob pena de deserção. Não há efeito suspensivo para o recurso, em regra, mas o juiz pode conferi-lo, para evitar dano irreparável para a parte (Lei nº 9.099, art. 43). 4 O DIREITO À AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO DIANTE DA LIMITAÇÃO DE ADMISSIBILIDADE DE RECURSO NOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA Nossa Constituição garante os destacados princípios consagrados em seu inciso LV, artigo 5º: "Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com meios e recursos a ela inerentes". Como se observa tais princípios se destina ao processo civil, deste modo, a exigência de defesa técnica é uma revelação da igualdade processual. O devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade quanto no âmbito formal, ao assegurar-lhe paridade total de condições com o Estado e plenitude de defesa, sendo assim: os direitos à defesa técnica, à publicidade do processo, à citação, de produção ampla de provas, de ser processado e julgado pelo juiz competente, aos recursos, à decisão imutável e à revisão criminal. Por sua vez, a ampla defesa e o contraditório são as bases do devido processo legal (DIDIER, 2011). O princípio contraditório é reflexo do princípio democrático na estrutura do processo, logo essa democracia no processo opera-se pela efetivação da garantia do contraditório. Diante disso, o principio contraditório pode ser decomposto em duas garantias, a primeira é participação feita por meio de audiência, comunicação e ciência, a segunda seria a possibilidade de influencia na decisão (DIDIER, 2011). Nesse principio, o processo exige que seus sujeitos tomem conhecimento de todos os fatos que venham a ocorrer durante seu curso, podendo ainda se manifestar sobre tais acontecimentos. O contraditório e a ampla defesa formam um pelo par. Não por acaso, estão previstos no mesmo dispositivo constitucional. A ampla defesa é o direito fundamental de ambas as partes, consistindo no conjunto de meios adequados para o exercício do adequado contraditório. Estabelece assim que o Juiz deva conferir ampla oportunidade às partes para que possam fazer valer, em juízo, as suas pretensões. Tais princípios supracitados se fundiram, formando uma amálgama de um direito único fundamental. Consoante Didier (2011), a ampla defesa corresponde ao aspecto substancial do princípio contraditório. A ampla defesa consiste em assegurar que o réu tenha condições de trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade. Já o contraditório é a própria exteriorização da ampla defesa. A todo ato produzido pela acusação caberá igual direito de oposição por parte do réu, bem como de trazer a versão que melhor lhe apresente ou fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor, não respeitar estes princípios seria violar as normas constitucionais. Incontestavelmente, uma das principais inovações da Lei 12.153/2009 está prevista no art. 3º, que se pede vênia para citar textualmente: “O juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir quaisquer providências cautelares e antecipatórias no curso do processo, para evitar dano de difícil ou de incerta reparação”. Trata-se de importante inovação legislativa na medida em que prevê, expressamente, a possibilidade de o juiz, ex offício, conceder a antecipação dos efeitos da tutela pretendida (BUENO, 2009). O art. 273 do CPC, que previu originalmente os principais fundamentos para concessão da tutela antecipada, não foi tão abrangente quanto o art. 3.º, da Lei 12.153/2009, haja vista que naquele se exige o requerimento da parte para que o juízo analise o pedido, enquanto que nos Juizados Especiais da Fazenda Pública tal medida poderá ser deferida de ofício pelo juiz (SOARES, 2012). Igualmente, na visão como microssistema, revoga tacitamente a previsão do art. 4.º, caput, da Lei dos Juizados Especiais Federais, que autorizava somente o deferimento de medidas cautelares no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação (THEODORO, 2012). O novo Código de Processo Civil superará de vez a dicotomia entre medidas cautelares e antecipatórias, englobadas na disciplina uniforme da tutela geral de urgência. Diante do supracitado no art. 3º c/c art. 4º da Lei nº 12.153/2009, eis que se trata de recurso contra providência cautelar antecipatória no curso do processo, capaz de produzir dano de difícil ou de reparação incerta, proferida por juiz cível. É imprescindível, quanto à concretização do acesso à justiça, a necessidade de o ordenamento jurídico estabelecer normas de fomento ao ingresso em juízo (DIDIER, 2011). O reconhecimento da força normativa da Constituição reforça a obrigação de o poder público não retirar da sua pauta política a melhoria o acesso à justiça. Em razão disso, conduz-se à percepção de que o direito fundamental de acesso à justiça consagra-se como verdadeiro princípio, identificando-se neste um mandado de otimização (CARDOSO, 2012). A Lei 9.0995/95, ao definir os critérios orientadores dos Juizados Especiais Estaduais, adotou a celeridade. A Lei 10.259/2001 e a Lei 12.153/2009, ao determinarem a aplicação subsidiária das regras previstas na Lei 9.099/95, também prestigiaram referido critério, adotando medidas para a sua efetivação (TOSTA, 2012). Posteriormente, a Emenda Constitucional 45/2004 determinou, em nosso sistema jurídico, o princípio constitucional da razoável duração do processo, ao acrescentar o inciso LXXVIII ao art. 5º da Constituição Federal, que determina a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Desta forma, a Emenda Constitucional, não deixa mais dúvidas sobre a legitimidade de toda e qualquer conduta adotada pelo juiz com a finalidade em otimizar o procedimento e precipitar o julgamento da lide (SOARES, 2012). Neste contexto, um dos maiores desafios dos Juizados Especiais é trazer a celeridade no julgamento das demandas, cumprindo a sua finalidade. Assim, pode-se afirmar que um dos propósitos da criação dos Juizados foi combater o clima de impunidade e descrédito do Poder Judiciário, mediante um sistema ágil e simplificado de distribuição da Justiça pelo Estado (THEODORO, 2012). No entanto, não bastaram as Leis dos Juizados Especiais definirem a celeridade como critério orientador, mas precisaram criar mecanismos (dispositivos) para que isto aconteça. Além das medidas analisadas na Lei 9.099/95 que tornam o procedimento mais célere, a Lei dos Juizados Especiais Federais também adotou outras providências para a agilização, tais como: Inexistência de prazo diferenciado para a prática de qualquer ato processual pelas pessoas jurídicas de direito público, bem como para contestarem ou interporem recursos (art. 9º); irrecorribilidade das decisões interlocutórias, salvo aquelas que apreciarem pedido de antecipação dos efeitos da tutela (art. 5º); inexistência de reexame necessário, ainda que a União, suas autarquias e fundações, sejam vencidas (art. 13); a flexibilização do princípio da indisponibilidade do interesse público, com a possibilidade de transação judicial (art. 10); o aumento do número de atos processuais possíveis de serem realizados por servidores, independentemente de despacho (CUNHA, 2010). Todas as medidas acima citadas têm a finalidade de redução temporal do processo, mas no âmbito do Juizado Especial Federal, a maior novidade é o processo eletrônico, que permite que os atos sejam realizados de forma muito ágil e eficaz (TOSTA, 2012). É certo que a lei que trouxe à existência os Juizados Especiais da Fazenda Pública representou um significativo avanço e uma abertura do Judiciário aos cidadãos em geral, o que facilitou o acesso à justiça, mas também a isonomia processual. Sendo assim, a Lei 12.153/2009 é de suma importância, pois, além de permitir o acesso à justiça de forma bastante simples, célere e objetiva, traz importantes inovações no tocante à atuação da fazenda pública e na atuação nos processos de seus representantes judiciais, quais sejam, em regra os procuradores dos estados e municípios, rompendo com um paradigma tradicional já bastante defasado, haja vista o emperramento da máquina judiciária, agravado pelo número exacerbado de demandas fazendárias (SOARES, 2012). Desta forma, a Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos estados e dos municípios dá um passo importantíssimo para o aprimoramento do Poder Judiciário no tocante ao combate dos efeitos danosos para a efetividade processual do enorme número de demandas fazendárias em tramitação (CUNHA, 2010). É, portanto, uma realidade que os Tribunais de Justiça dos estados devem implementar, estabelecendo um diálogo democrático com as procuradorias dos estados e municípios para o seu êxito, já que o artigo 22 do citado diploma legal estabelece o prazo de dois anos, contados de sua vigência, para que os Tribunais de Justiça dos Estados instalem tais juízos (DIDIER, 2011). CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante de todo o exposto, enxerga-se a importância da Lei 12.153/2009, na medida em que consolida, pelo menos do ponto de vista legislativo, a nova opção teórico-valorativa do processo iniciada pela Lei 10.259/2001, isto é, a inserção ampla da Fazenda Pública no âmbito dos Juizados Especiais, fato que contribui para a relativização do dogma da indisponibilidade do interesse público diante da permissão genérica para a propositura de acordos pelos entes públicos por intermédio da Advocacia Pública. Destaque-se que, os Juizados Especiais Fazendários são uma importante ferramenta na busca de um acesso à Justiça mais efetivo e célere. Entretanto, para que haja um aproveitamento de todo o potencial dos Juizados é preciso que a Fazenda Pública reveja o paradigma da indisponibilidade do interesse público, possibilitando, assim, a realização da conciliação. Para a consecução de acordos é necessária uma Advocacia Pública independente que possam representar em Juízo uma Fazenda Pública pautada nos princípios constitucionais da legalidade e da moralidade. Dessa forma, verifica-se que para o bom funcionamento do microssistema dos Juizados Especiais faz-se mister a mudança cultural daqueles que representam a Fazenda Pública em juízo, ou seja, da Advocacia Pública, no sentido de se priorizar a justiça coexistencial em detrimento do culto à indisponibilidade do interesse público como subterfúgio do Estado na qualidade de litigante contumaz e burocrático. Por fim, não basta que sejam criados novos procedimentos ou fóruns para que seja implementado um real acesso à Justiça, sendo necessário que o Executivo, através de serviços e políticas públicas eficientes, implemente os direitos previstos constitucionalmente, cumprindo com seu papel de prevenir conflitos de forma geral, não passando para o Judiciário a atribuição inadequada de solucionar conflitos individuais que deveriam ser resolvidos de forma coletiva pelo Executivo. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1998. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições técnicas, 2007. BRASIL. Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 set. 1995. BRASIL. Lei 10.259, de 12 de julho de 2001. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. 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