CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA IZABELA HENDRIX

CURSO DE DIREITO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ELAINE BATISTA COSTA SOUZA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

HOMOFOBIA: LIBERDADE DE EXPRESSÃO VERSUS IGUALDADE DE DIREITOS

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Belo Horizonte – 2013

ELAINE BATISTA COSTA SOUZA

 

 

 

 

 

 

 

 

CURSO DE DIREITO

 

 

 

 

 

 

 

 

HOMOFOBIA: LIBERDADE DE EXPRESSÃO VERSUS IGUALDADE DE DIREITOS

 

 

 

 

 

 

 

Trabalho apresentado ao Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, como avaliação da Atividade Integradora.

Orientador: Professor Vinícius Marins

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Belo Horizonte – 2013

 

RESUMO

 

 

O presente trabalho tem como objetivo uma breve explanação ligando o tema Homofobia ao contraste existente entre a livre manifestação do pensamento e o respeito à diferença - um verdadeiro debate acirrado sobre a ponderação de princípios e direitos fundamentais, tendo como cenário o Neoconstitucionalismo bem como as transformações do Direito Constitucional Contemporâneo.

                                                    

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Palavras chave: preconceito – discriminação – criminalidade – igualdade – liberdade de expressão

 

SUMÁRIO

 

 

 

1 – INTRODUÇÃO.......................................................................................................5

 

2 – HOMOFOBIA – CONCEITUAÇÃO/ETIMOLOGIA................................................5

 

3 – LIBERDADE DE EXPRESSÃO E SUA PREVISÃO CONSTITUCIONAL............6

 

4 – IGUALDADE DE DIREITOS NUM ESTADO DEMOCRÁTICO...........................11

 

5 – CONCLUSÃO......................................................................................................14

 

6 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................15

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

HOMOFOBIA: LIBERDADE DE EXPRESSÃO VERSUS IGUALDADE DE DIREITOS

 

1       INTRODUÇÃO

A expressão homofobia e todo o seu significado tem sido alvo de muitos debates na atualidade, haja vista que uma simples aversão aos que assumem uma opção sexual tida como diferente tem dado lugar a constantes episódios de intolerância, trazendo à tona uma discussão sobre o limite entre a liberdade de expressão e a igualdade de direitos, a ser abordada neste trabalho.

Constitucionalmente, há a previsão de liberdade de expressão no art. 5º, IV, quando se estabelece que seja “livre a manifestação do pensamento,” bem como no inciso XIV do mesmo artigo em que “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”, e também no art. 220, quando dispõe que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.

Por outro lado, a discriminação também é proibida pela Carta Magna, conforme seu art. 3º, IV, onde se dispõe que, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, está a promoção do bem a todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

2       HOMOFOBIA – CONCEITUAÇÃO/ETIMOLOGIA

 

Homofobia pode ser compreendida como atitude de hostilidade contra homossexuais, portanto, homens e mulheres (BORRILLO, 2010, p. 13); designando o distúrbio psíquico revelado por aqueles que experimentam medo ou ódio irracional diante da homossexualidade (RIOS, 2001, p. 51).

O termo é um neologismo criado pelo psicólogo George Weinberg, em 1971, numa obra impressa, combinado a palavra grega phobos (“fobia”), com o prefixo homo-, como remissão à palavra “homossexual”. Phobos (grego) é medoem geral. Fobia seria assim um medo irracional (instintivo) de algo. Porém, “fobia” neste termo é empregada não só como medo geral (irracional ou não), mas também como aversão ou repulsa em geral, qualquer que seja o motivo.

Homofobia (homo, pseudo prefixo de homossexual, fobia do grego  φόβος “medo”, “aversão irreprimível” – Dicionário Aurélio, 2004) é uma série de atitudes e sentimentos negativos em relação a lésbicas, gays, bissexuais e, em alguns casos, contra transgêneros e pessoas intersexuais. As definições referem-se variavelmente a antipatia, desprezo, preconceito e aversão.

Por meio de um trabalho publicado pela Editora PUC Minas, em 2009, Chamado ‘História da Criminalização da Homossexualidade no Brasil: da Sodomia ao Homossexualismo’, a atuação do Estado e da Igreja teriam sido fundamentais na criação e perpetuação de discursos e práticas homofóbicas. Segundo o orientador da pesquisa, Túlio Viana, “a relação sexual entre pessoas era um pecado-delito”. Após um longo período, a figura criminosa teria dado lugar a um diagnóstico de desvio biológico, enquanto a ciência se encarregou de criar o termo homossexualismo.

3       LIBERDADE DE EXPRESSÃO E SUA PREVISÃO CONSTITUCIONAL

 

A Constituição de 1988, chamada não por acaso de cidadã, fundou as bases do nosso Estado Democrático de Direito, erigindo um rol de direitos e garantias fundamentais com o escopo da proteção da dignidade da pessoa humana. Dessa forma, nossa Carta Magna primou pela própria preservação da liberdade e igualdade, essenciais à formação do indivíduo e à sua realização, em meio à coletividade.

A liberdade de expressão desponta como direito fundamental inerente tanto ao ser humano quanto a uma Democracia. É necessária ao indivíduo, uma vez que é intrínseco e fundamental à sua formação o contato com seus semelhantes e com o mundo. Ao Estado Democrático, confere uma dinamicidade especial que se renova com a comunicação das demandas e escolhas dos cidadãos.

A ampla previsão de liberdade de expressão se dá de modo direto no art. 5º, IV, da CF, quando estabelece que seja “livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” bem como no inciso XIV do mesmo artigo em que “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”, e também no art. 220, quando dispõe que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.

Acrescenta nos parágrafos 1º e 2º do mesmo artigo que “nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o dispositivo no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV”, e que “é vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”.

Vê-se, pois, que sob o amparo constitucional, discussões, comentários ou opiniões integrariam o indivíduo com a sociedade, para uma formação plena de personalidade, assumindo posturas críticas necessárias à tomada de relevantes decisões.

Diante do pleno exercício de tal garantia, qual o papel se pode esperar do Poder Público? De total afastamento, sem qualquer sinal de censura ou restrição?

Os debates a respeito das proteções e restrições à liberdade de expressão surgem justamente neste momento. Em meio a tantas relações sociais, os variados tipos de exercício de expressão podem causar o desrespeito a valores constitucionais igualmente essenciais.

Qual o limite entre o controle estatal e a intervenção legítima, a demandada pela própria ordem constitucional? Segundo os autores Gustavo Binenbojim e Caio Mário da Silva Pereira Neto, “a fina ironia do papel do Estado em relação às liberdades de expressão e de imprensa: o Estado é, ao mesmo tempo, um inimigo mortal e um amigo imprescindível dessas liberdades”. Assim, a liberdade de expressão possui tanto uma dimensão defensiva, implicando um afastamento do Estado, como um aspecto de proteção, que exige uma intervenção estatal. Em ambos os casos, o propósito seria de assegurar o exercício da liberdade de expressão de maneira livre e igualitária.

Analisar a ação estatal para com as liberdades individuais é definir qual tipo de Estado queremos. Tal escolha remete-nos à diferenciação que o jurista americano Owen M. Fiss (em sua obra, A ironia da Liberdade de Expressão, 2005) estabeleceu sobre a concepção de liberdade de expressão. O autor teria dividido em dois tipos de óticas paradigmáticas por meio das quais poderíamos visualizá-la.

Uma primeira pela “Teoria Libertária”, caracterizada pela preponderância maior ao autor mensagem, por meio de uma proteção da autonomia discursiva dos indivíduos. Há a exigência de uma total abstenção por parte do Estado, sem qualquer atuação na esfera do indivíduo. Aqui, o Estado deveria se limitar à proteção dos direitos do emissor, uma vez que qualquer interferência no conteúdo poderia parecer violação à liberdade de expressão.

De um modo mais evoluído, tem-se a “Teoria Democrática”, centralizando-se na figura do destinatário da mensagem, e considerando a liberdade de expressão como um instrumento de promoção da diversidade na esfera pública. Ocorre, visivelmente, a necessidade de uma atuação positiva estatal que estimule o debate público. Sob esta ótica, o Estado é considerado o promotor da liberdade de expressão, em busca da livre informação, por parte de todos, sobre assuntos de interesse geral, a fim de possibilitar a livre formação da convicção individual e coletiva. Assim, o controle seria visto como uma condição necessária à função da liberdade de expressão e à participação de todos, o que garantiria uma cidadania informada e capacitada para o exercício de um autogoverno.

De qualquer forma, parece-nos essencial o papel da liberdade de expressão na adequação às exigências de um Estado Democrático. Sob este prisma, não há como pensar um total afastamento do Estado, principalmente ao considerarmos a

“função social da liberdade de informação de colocar a pessoa sintonizada com o mundo que rodeia (...), para que possa desenvolver toda a potencialidade da sua personalidade e, assim, possa tomar as decisões que a comunidade exige de cada integrante” (BRANCO, 2007, p. 371).

Mas até que ponto a própria organização de Estado e a convivência em sociedade exigiram limites para expressão da liberdade quanto ao tema da homofobia? A opinião de quem discorda de relações homossexuais poderia ser cerceada penalmente? E a criação de uma lei em benefício de um grupo não seria privilegiar uns em detrimento de outros?

Indagações como essas nos fazem observar o mundo e a ideia central é de que não há uma verdadeira e objetiva liberdade de expressão. O pensamento e a opinião de cada indivíduo são pré-determinados, enraizados em modelos familiares, educacionais, culturais e ideológicos, sem falar da educação escolar e da religião, grupo e meios sociais, assim como das formações úteis ou não dos meios de comunicação. Não há direito absoluto, uma vez que estão limitados por outros direitos ou por valores coletivos da sociedade.

Para qualquer sociedade, a liberdade de se expressar é extremamente benéfica, porque será por meio dela que os cidadãos poderão participar sugerir ou criticar. O objetivo da liberdade de expressão é tornar o cidadão um ser “pensante”, sendo um passo construtivo à sociedade, desde que haja respeito à dignidade e à liberdade das pessoas. Não se pode confundir a liberdade de expressão com a degradação, banalização e inversão de valores.

“A liberdade de expressão se manifesta através de três microestruturas jurídicas fundamentais: a liberdade de pensamento, genericamente considerada; a liberdade de expressão religiosa e a liberdade de expressão e também a vedação de censura prévia a atividades artísticas, científicas, intelectuais e de comunicação” (BENJAMIN, 2009, p. 78).  

Mas a mesma Carta Política que consagra a liberdade de expressão também lhe aponta limites, submetendo-lhe aos seguintes princípios e dispositivos constitucionais:

1)    Princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) – Não pode a liberdade de expressão ser invocada com o intuito de subtrair de um indivíduo ou de um grupo social a sua dignidade;

2)    Princípio da cidadania (art. 1º, III) – Se a liberdade de expressão, em qualquer de suas formas for utilizada como sustentáculo da negativa do reconhecimento de qualquer indivíduo como cidadão, deixa automaticamente de ser um direito.

3)    Princípio da vedação ao preconceito (art. 3º, IV) – Se a manifestação de pensamento (religioso, artístico, científico, literário) tem por escopo a disseminação de concepções passa a caracterizar um exercício irregular de direito.

4)    Princípio da igualdade (isonomia formal e material – art. 5º, “caput”, primeira parte) – Todos são iguais perante a lei (igualdade formal), o que, por si só, já elimina a possibilidade de grupos sociais, ainda que majoritários, ditarem a forma pela qual as minorias deverão se comportar ou deverão exercer os seus direitos. No tocante à igualdade examinada em sua perspectiva material (igualdade na lei), quando um determinado indivíduo ou grupo social encontra-se em desvantagem (econômica, política, social) em face dos outros setores da sociedade, a lei deve criar uma “desigualdade jurídica” para, na seara do Direito, equilibrar tais desníveis.

5)    Princípio da liberdade (genericamente considerada – art. 5º “caput”) – Embora a liberdade de expressão seja uma das bases mais importantes do Estado Democrático de Direito, não se pode tentar suprimir, por exemplo, a liberdade de manifestação da orientação sexual, porque, embora não esteja explicitamente consagrada pelo Texto Maior, encontra amparo em outros princípios constitucionais, como os já analisados princípios da cidadania, da dignidade da pessoa humana e o da igualdade.

6)    Direito de resposta (art. 5º, IV) – Caso alguém exorbite do seu direito em manifestar opinião, crença ou dotes artístico-literários, a própria Constituição confere ao ofendido o direito de resposta, proporcional ao agravo.

7)    Princípio da laicidade do Estado (art. 19, I) – O Estado Democrático de Direito, isto, é Estado Democrático e Laico de Direito, lança suas bases na concepção de norma moral relativa, ou seja, norma moral livremente pactuada entre governantes e governadores (estes últimos, representados por seus legisladores ou diretamente, nas hipóteses constitucionalmente consagradas).

A norma moral relativa se contrapõe à norma moral absoluta que, invariavelmente, parte de dogmas religiosos não pactuados livremente. Trata-se de norma de “inspiração divina”, que não contou com a participação da discussão científica, sociológica, filosófica e biológica para a sua formação.

E não serve como justificativa a tese de que a menção a Deus, expressa no preâmbulo da Constituição, determina o caráter cristão do Estado brasileiro. Afinal, como bem assevera o grande constitucionalista Alexandre de Moraes: “A crença na existência de um criador, de um ser supremo, expressa em um preâmbulo não significa que um Estado tenha adotado como oficial alguma religião, na medida em que todas as religiões expressam e se apóiam na existência de Deus. Ademais, a liberdade de crença também pressupõe, em seu bojo, a liberdade em não professar qualquer fé e em até mesmo ser ateu ou agnóstico”. Tampouco pode ser tomada como relevante a máxima segundo a qual “O Estado é Laico, mas o povo não é”.

Os conceitos de “Estado” e de “povo” não coincidem, sendo este um elemento daquele. Ademais, se não nos é possível estabelecer, de uma forma genérica, qual a religião da totalidade do povo, não podemos afirmar que a íntegra dos indivíduos que vivem no Brasil tenha uma única religião, o que já inviabiliza a utilização de dogmas religiosos pelos poderes estatais. Não há, portanto, que se falar em liberdade de expressão (em qualquer de suas facetas) como um direito absoluto ou irrestrito.

Nenhum direito individual é absoluto, na medida em que, não raro, consubstanciam-se em normas de alto teor de abstração, seus limites são traçados, portanto, em face do caso concreto, na medida em que afrontem outros princípios hierarquicamente equivalentes, ou superiores (como o da dignidade da pessoa humana), que é classificado, inclusive por doutrina estrangeira, como supraprincípio de Ordenamentos Jurídicos que se encontrem sob a égide do Estado Democrático de Direito. O legislador constituinte fixou o princípio da dignidade da pessoa humana como fundamento da Constituição da República (art. 1º, III).

Quanto ao argumento de quem entende estar amparado pela Constituição em suas manifestações contrárias ao homossexualismo, deixa-se claro que a opinião deve ser protegida pelo manto constitucional da liberdade de expressão é aquela baseada na livre escolha político-ideológica do indivíduo ou na sua liberdade de se ajustar a um dogma religioso ou a uma corrente filosófica.

Não se encontra na descrição acima a liberdade de, a seu bel-prazer ou em nome de diretrizes puramente eclesiásticas, subverter-se às descobertas científicas e tentar criar uma verdade absoluta contrária a todas as evidências e fatos comprovados pela metodologia científica.

Desse modo, o indivíduo não gozaria de liberdade para atacar a homossexualidade. Inicialmente, porque não se pode atacar uma orientação sexual sem atacar aquele que a apresenta. Quando falamos em sexualidade, discorremos acerca do ativo jurídico intangível do indivíduo, ou seja, o “ativo de personalidade”. Assim, não podemos falar em prática homossexual, mas de essência homossexual.

E a Carta da República não garantiu a nenhum indivíduo a liberdade de atacar a essência humana, em nenhum de seus aspectos, sob pena de se estar violando o superior princípio da dignidade da pessoa humana.

A orientação sexual faz parte da personalidade do indivíduo, não sendo possível separar prática da essência. Ao se colocar a homossexualidade como algo abominável, diz-se, claramente, que os homossexuais também seriam abomináveis, o que se consubstancia em uma ofensa inadmissível aos já citados Princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Vedação ao Preconceito.

4       IGUALDADE DE DIREITOS NUM ESTADO DEMOCRÁTICO

 

Originalmente, o princípio da igualdade ou da isonomia teria sido aplicado em Atenas, na Grécia antiga, cerca de 510 A. C. por Clístenes, o pai da Democracia Ateniense.

Sua concepção mais próxima de nossos tempos datar-se-ia de 1.199 D. C., época em que o então Rei João sem Terra assinou a Magna Carta Britânica, considerando o início da Monarquia Constitucional, de onde se originaria o princípio da legalidade para resguardar os direitos dos burgos.

Pela Constituição de 1988, a igualdade consiste num princípio jurídico disposto no seu art. 5º, no Título “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...”

Outra importante referência constitucional a ser citada e que possui pertinência para adentramos ao tema da Homofobia é a definição de um dos objetivos fundamentais da República (art. 3º, IV): “o de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, ou quaisquer outras formas de discriminação”. A expressão “quaisquer outras formas” refere-se a todas as formas de discriminação não mencionadas explicitamente no artigo, tais como orientação sexual, entre outras.

Convém lembrar que, de acordo com a primeira geração dos direitos humanos, as liberdades clássicas individuais (incluindo as de expressão coletiva, como liberdade de reunião e de associação, por exemplo) e os direitos fundamentais têm por objetivo máximo alcançar a igualdade formal entre os indivíduos. Assim, aqueles que venham a se sentir tolhidos ou discriminados na manifestação de uma identidade pessoal, caracterizada pela atração ao sexo oposto, podem invocar o princípio fundamental da isonomia bem como seu corolário, que é a proibição de discriminações injustas.

A Constituição Federal de 88, na esteira do Constitucionalismo contemporâneo, como ferramenta instituidora do Estado democrático de Direito, enuncia os direitos e liberdades fundamentais, consagrando, sobretudo, a liberdade e a igualdade como sustentáculos da então dignidade da pessoa humana, princípio fundamental veiculado no art.1º, inc. III.

Tais enunciados detêm, sem dúvida, uma eficácia jurídica. Trata-se dos direitos fundamentais, por força do termo do § 1º do próprio art. 5º; os princípios fundamentais, a seu turno, pela posição privilegiada no texto constitucional e por já compreendem (...) a bipartição, característica da proposição de Direito em previsão e conseqüência jurídica (CANNARIS, 1989, p. 86).

O combate à homofobia encontra bases legais no princípio da igualdade, com especial proteção mediante a proibição de qualquer discriminação sexual infundada, por meio do inciso I do art. 5º (assegurando a igualdade de direitos e deveres entre homens e mulheres) e o inciso XXX do art. 7º (proibindo a diferença de salários, exercício de funções e critério de admissão por motivo de sexo).

Com efeito, a discriminação de um ser humano em virtude de sua orientação sexual constitui, precisamente, uma hipótese (constitucionalmente vedada) de discriminação sexual. A proteção constitucional, quanto à homofobia, visa o resguardo da escolha de um homem ou de uma mulher, ou seja, sua orientação sexual.

Podemos citar, nesse sentido, o caso da Suprema Corte do Havaí que decidiu que a discriminação por orientação sexual configura verdadeira discriminação sexual (Baehr v. Lewin, 1993). No mesmo ano, a Corte de Apelações da Califórnia decidiu (Engel v. Worthington) que a recusa de um editor quanto à inclusão da foto de um casal homossexual em livro de recordações constituía discriminação.

“O nosso ordenamento jurídico veda quaisquer tratamentos discriminatórios fundados na orientação sexual do indivíduo, por força, inclusive, do princípio da igualdade geral. Como ocorre com todos os demais padrões (idades, raça, etnia, religião, orientação filosófica, convicção política), somente em casos excepcionais, onde fique concretamente demonstrado e racionalmente provado, de modo totalmente livre de preconceitos, que o status do indivíduo é razão suficiente para o tratamento diferenciado, poderá ocorrer qualquer restrição de direito (situação repise-se, absolutamente excepcional em um Estado democrático de Direito)” (BARROSO, 1986, p. 68).

Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello, (...) as discriminações são recebidas como compatíveis com a cláusula igualitária apenas e tão somente quando existe um vínculo de correlação lógica entre a peculiaridade diferencial acolhida por residente no objetivo e a desigualdade de tratamento em função dela conferida, desde que tal correlação não seja incompatível com interesses prestigiados na Constituição (Mello, 1993, p. 17).

Como avanço na legislação brasileira atual contra a homofobia, tem-se o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 122/2006, atualmente em tramitação no Congresso, propondo a criminalização dos preconceitos motivados pela orientação sexual e pela identidade de gênero, equiparando-os aos demais preconceitos já objeto da Lei 7716/89. Esse projeto foi iniciado na Câmara dos Deputados, de autoria da então deputada Lara Bernardi e que ali tramitou com o número 5003/2001. Sua redação já aprovada propunha, além da penalização criminal, também punições adicionais de natureza civil para o preconceito homofóbico, como a perda do cargo de servidor público, a inabilitação para contratos com a administração pública, a proibição de acesso a crédito de bancos oficiais e a vedação de benefícios tributários.

Independentemente da orientação sexual de um ser humano, é crucial invocar o respeito devido à sua individualidade, em virtude da citada cláusula constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º inc. III). Tal valor é elemento central na sociabilidade que caracteriza o conceito de Estado democrático de Direito, que visa garantir aos indivíduos muito mais que abstenção de invasões ilegítimas de suas esferas pessoais.

5       CONCLUSÂO

 

 

O assunto homofobia constitui uma fonte inesgotável de discussões e, enquanto a intolerância se fizer presente no convívio de nossa sociedade, por meio de condutas criminosas, os dois aspectos precisam ser exaustivamente questionados: liberdade de expressão e igualdade de direitos.

As dificuldades de ordem dogmática e cultural devem ser deixadas de lado. As principais coordenadas devem surgir de um constitucionalismo que possua um caráter mais efetivo na expectativa de concretização dos direitos fundamentais, reconhecendo as diferenças em diversas esferas, com espaço inclusive para que aqueles que queiram aceitar saibam que é preciso respeitar para se viver em sociedade.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

6       REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

ALMEIDA, Luiz Mello de. Da diferença à igualdade: os direitos humanos de gays, lésbicas e travestis. In: LIMA, Ricardo Barbosa de. Coordenador geral (et. al). Direitos humanos no cotidiano. Goiânia: Bandeirantes, 2001.

AURÉLIO, Novo Dicionário, 2001. Rio de janeiro. Editora. 2004.

BAHIA, Alexandre Gustavo Melo Franco. A não discriminação como direito fundamental e as redes municipais de proteção a minorias sexuais – LGBT. Revista de Informação Legislativa, Belo horizonte, MG 2010.

BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e a constitucionalização de Direito, Revista Eletrônica de Direito Constitucional, Salvador, 2005.

BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo, Editora: Saraiva 2007.

BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. 7ª Ed. Trad. Sérgio Paulo Rouanet, 2009.

BORRILO, Daniel. Homofobia: história e crítica de um preconceito. Belo Horizonte. Editora: Autêntica, 2010.

Owen M. Fiss. A Ironia da Liberdade de Expressão. Editora Renovar. 2005

RIOS, Roger Raupp. A Homossexualidade no Direito. 19ª edição. Porto Alegre. Editora: Livraria do Advogado, 2001.

MATOS, Maria João. Sobre a formação de homofóbico e homofobia, São Paulo, 2004. Acesso em: 1º maio 2012.

Projeto de Lei PLC-122/2006 - Texto do projeto. Disponível em: www.senado.gov.br. Acesso em: 04 de maio de 2012.

Acompanhamento da tramitação do projeto PLC-122/2006. Disponível em:  www.senado.gov.br.Acesso em: 04 de maio de 2012.

Projeto de Lei 5003-B/2001 Acompanhamento oficial da tramitação. Disponível em: www.senado.gov.br. Acesso em: 04 de maio de 2012.