Graças a Deus!

Ivan Sampaio/Jornal Cidade Nova-PA

 

Era um domingo chato. Triste e sem muitas opções. Na cidade não havia cinema, Shopping e ir à praça, seria um risco que preferi evitar. Decidi. A noite fui ao culto de uma grande igreja protestante.

Em seu culto, o pastor lembrou Personagens como Moises, Abraão e Jose foram citados como mestres na fuga e no conhecimento de suas regiões e principalmente poder de liderança para resolver conflitos e punir cretinos mentirosos e enganadores da fé. Sua palavra firme, era reforçada com gestos com a bíblia sendo balançada sobre sua cabeça. Condenava os maus feitores, a desumanidade, os pobres de espíritos e ia esgotando com suas palavras todas as resistências contrárias que ali houvesse. Mas sentado logo na terceira fila, eu ficava refletindo sobre a ponderação dos filósofos materialistas que colocaram em duvida a existência de Deus, que sem ele, o homem livre do cabresto espiritual, poderia movido apenas pela intelectualidade e sem os limites morais, trilhar o sucesso com mais alegria. Ouvindo meus pensamentos, o pastor condenou-os a todos descrentes e sem que ele percebesse, estava ali criando teses morais e filosóficas. Lembrou Judas, Tomé que dava pouco credito aquilo que não pudesse ser provado, Cristo e por fim as legiões guerreiras de Satanás! Eu sem que quizesse, olhava as paredes da Igreja, queria escutar tudo aquilo mas ficar olhando a imagem de um santo, de preferência a da virgem Maria, mas as paredes estavam vazias, e vazio fiquei.

-Aleluia! Aleluia! Respondiam os irmãos.

As emoções mais complexas da psicológia, todas sem exceção foram lembradas. Culpa, medo, incertezas e duvidas... Todas foram trabalhadas para os irmãos tornarem-se, ainda, mais fieis. O Pastor prosseguiu convidando os maiores contribuintes ao púlpito orou por eles e agradeceu as contribuições.

-Graças a deus! Dizia ele.

-agora irmãos, faço um convite aos visitantes que desejam nesse momento começar uma nova vida que subam aqui , para num pacto com deus, sejam ungidos e libertados do pecado.

O pastor esperou um segundo correu os olhos e parou-os sobre mim.

-Irmãos, não tenham vergonha, aceite o convite, deus clama por essa reconciliação. Aqueles que quiserem as bênçãos divinas subam aqui.

Novamente o pasto passeou o olhar e fixou-os nos meus.

E depois do terceiro convite pediu para os que visitantes da igreja levantassem o braço. Uma velhinha de 80 anos, caduca e eu levantamos. Ele desceu com o microfone, passou pela velhinha e veio em minha direção. O que é que esse cara quer comigo, pensei..

-Irmão, como se chama?

-Ivan

-O senhor é evangélico? Perguntou e me olhou profundamente, ele sabia que a historia era outra, pois eu estava ali de jeans, camiseta, tênis, mas o bom relógio de pulso e cordões que usava cabia melhor analises sobre minha condição. Eu era descasado, pois não usava aliança e nem sinais dela no dedo. Estava ali com boa aparência, apesar de bem diferente dos outros irmãos da igreja

-sim

-de que igreja?

-Quadrangular de Manaus.

-sei... Disse ele. Acho que não acreditou em uma palavra minha. Que alias, penso que os pastores são as piores pessoas para serem enganados, eles conhecem a alma humana, escutam problemas alheios todos os dias intermediando conflitos e resgatando ovelhas desgarradas. E eu estava ali sendo colocada a prova, olhos nos olhos.

-Aleluia irmãos! Temos aqui mais uma ovelha de deus!

-Aleluia! Diziam os irmãos!

Pegou-me pela mão. Conduziu-me ao palco e pediu a todos a ajuda-lo a orar por mim. Com sua mão firme sobre a cabeça, me ajoelhou e fez sua oração. Nesse momento, muito desconfiado que por sugestão da oração  pudesse entrar em transe e revelar coisas secretas, resisti. Fiquei pensando no cão que insistentemente latia lá fora. Segurei-me, não cedi quando ele suplicou para que os demônios surgissem para deixar o irmão livre em sua existência. Não queria ficar ali amarrado, sendo xingado, usado para, na ultima parte, ser o show de domingo. E finalmente o pastor na boa conversa quis me converter a sua igreja. O culto terminou e continuei com o corpo fechado. O cão, cansado, estava dormindo sob a marquise da igreja.

Não consegui dormir. O barulho dos corredores do hotel de Porto Velho insistia a negar um sono tranquilo. Pior também que não lembrava se havia cedido ao convite e me convertido àquela igreja. Com raiva de tudo, guardei na mala o livro “Anticristo” do filosofo Nietzsche.