FACULDADE PARAISO

CURSO DE DIREITO

TURMA: 2008.9

 

 

 

 

 

 

CÍCERO ANDERSON PALACIO DE CARVALHO

 

 

 

 

 

 

 

DITAMES DAS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS E SUA RELAÇÃO COM AS GRANDES OBRAS DA CONSTRUÇÃO CIVIL NO BRASIL

 

 

 

 

 

 

 

 

JUAZEIRO DO NORTE

20121     INTRODUÇÃO

Diante dos grandes eventos esportivos que brevemente acontecerão no país, a população volta sua atenção às grandes obras de construção e reforma dos estádios, aeroportos e metrôs que acontecem nas principais cidades do país, e além da magnitude dos projetos, evidenciei que grande parte desses estão sendo executados através das Parcerias Público-Privadas.

É a partir dessa premissa que estudarei os ditames das PPPs e sua importância para o desenvolvimento econômico do país; já que com o advento da lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que institui as PPPs, a concessão de serviços públicos ganhou uma nova modalidade de contrato, de forma que tanto o capital público quanto o privado podem participar como investidores em projetos de infraestrutura e atuar utilizando-se do capital do Estado para realizar os serviços que a sociedade demanda.

Por envolver o setor privado, as PPPs tem como finalidade secundária, depois de atender as necessidades sociais, permitir lucro ao ente privado que está executando uma atividade típica do Estado, no entanto, ainda há por parte dos parceiros privados um certo receio em assumir algum contrato com o governo, pela descontinuidade de obras entre gestões, por exemplo.

Há ainda muito espaço para um mecanismo tão poderoso crescer, no entanto, existem confusões sobre a relação existente entre as concessões normais e as PPPs, o que gera insegurança por parte do setor privado em assumir um contrato do tipo.

Portanto, no trabalho, identificarei os aspectos jurídicos das PPPs e a relação desta com os contratos de concessão comuns, de forma a nortear uma interpretação plausível com o proposto pela legislação.

A presente investigação científica primará pelo uso dos métodos bibliográficos e exegético-jurídico (trabalhados através da técnica de pesquisa documental), procurando explanar sobre o problema mediante a análise da literatura já publicada em livros, códigos, revistas eletrônicas e sites que envolvam o tema em comento.

A pesquisa, deverá acrescer conhecimento do pesquisador, determinando-lhe uma nova postura; a abordagem qualitativa não utilizará critério numérico; por fim quanto aos objetivos a pesquisa será exploratória, facultando o aprimoramento de ideias e ajudando na formulação de hipóteses em pesquisas posteriores.

Assim, primeiramente serão abordados temas para a compreensão do assunto, tais como a concessão dos serviços públicos no direito brasileiro, seu conceito e natureza jurídica, a parceira entre o poder público e o particular: descentralização dos serviços; a classificações das concessões de serviços públicos, as fontes normativas constitucional e infraconstitucional. Adiante, versar-se-á sobre as características dos contratos de concessão e o controle dos serviços concedidos, assuntos estes considerados pedras de toque no esclarecimento das modalidades de concessão de serviço público.

            No capítulo seguinte será analisado o instituto das parcerias público-privadas, tratando este tópico dos aspectos históricos, da introdução das parcerias público-privadas no ordenamento jurídico brasileiro, seu conceito e as regras legais aplicáveis.

            Finalmente, atinge-se o cerne principal desta monografia. Neste capítulo será estudado as PPPs e sua relação com os contratos de concessão, tratando-se da base legal, as espécies de concessão, o procedimento licitatório, a política tarifária, as características dos contratos de parceria entre o Poder Público e a iniciativa privada, suas cláusulas essenciais; por fim será estudado o instituto da extinção aplicável as concessões de serviços públicos.

            Vale salientar que toda atividade desenvolvida tende à confirmação do problema a ser solucionado nesta pesquisa: Quais os aspectos jurídicos das parcerias público-privadas? Identificados estes, como os contratos neste âmbito se relacionam com as concessões comuns?

            Os resultados obtidos com o encerramento da pesquisa deverão ratificar o entendimento firmado acerca do problema apresentado, qual seja: Quais os aspectos jurídicos intrínsecos às parcerias público-privadas e como estas se relacionam com os contratos de concessão firmados entre o Poder Público e o particular? Hipótese: Identificados os aspectos jurídicos das parcerias público-privadas é visível destacar os pontos que relacionam estas com os contratos de concessão firmados entre o Poder Público e o particular.

2     A CONCESSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS NO DIREITO BRASILEIRO

O Estado tem o dever de prestar os serviços essenciais a toda população por meio de seus órgãos, os quais utilizam de toda a infraestrutura física e humana necessária para prestação regular e eficiente dos serviços.

Muitas das vezes, o Estado, mesmo que conte com uma estrutura física, tecnológica e humana regular, nunca vai conseguir atingir seus objetivos e prestar todos os serviços de sua alçada com eficiência e eficácia suficientes para atender aos anseios de toda coletividade. Além do mais, os altos índices de endividamento interno e o desequilíbrio fiscal, levaram o Estado a rever suas formas de atuação e a adotar alternativas para o oferecimento dos serviços essenciais a toda a população, de forma contínua, regular e efetiva.

Alguns Estados, no intuito de minimizar o desequilíbrio fiscal e reduzir a dívida pública interna com mais rapidez, diminuindo custos com o “desfazimento” de alguns órgãos e aparelhos estatais, resolveram adotar as privatizações como política necessária para alcançar resultados mais consistentes, com vistas a garantir a prestação de serviços a população e aumentar a capacidade de investimento em obras estruturantes. 

No entanto, as privatizações nem sempre levaram o Estado a alcançar os resultados pretendidos, conquanto, nos casos em que diversas empresas estatais são negociadas por valores bem inferiores ao de mercado, gerando uma perda significativa de receita do Estado, pois, o setor privado é que passa a obter as vantagens do negócio de compra e venda, tendo retorno a médio e longo prazo com os lucros crescentes que tais empresas geram. Como exemplo o caso da Companhia Vale do Rio Doce, que hoje é uma empresa de 196 bilhões de dólares, sendo que o preço total que o Tesouro Nacional do Brasil recebeu pela venda do controle acionário da empresa, equivale hoje a uma fração lucro trimestral da companhia.

Existem pessoas que defendem as privatizações, por entenderem que não cabe ao Estado exercer atividades econômicas. Os favoráveis às privatizações citam frequentes casos de corrupção, de empreguismo e de ineficiência ocorrida em grande parte das empresas estatais. Já os contrários à privatização alegam que o Estado brasileiro vendeu para grupos multinacionais patrimônio público por um valor muito inferior ao real, dando a esses grupos econômicos privilegiados a oportunidade de realizar lucros extraordinários.

Em artigo intitulado “Privatizações versus Concessões”, publicado na Biblioteca Digital Jurídica do STJ[1], o ex-ministro Sr. José Augusto Delgado, proferiu com palavras que resumiram bem a situação de crise em que o Estado, no mundo todo, passava diante de seu tamanho, fazendo a seguinte observação:

Os excessos praticados pelo Estado e a ampliação das suas funções conduziram-no ao gigantismo e, consequentemente, pelo acúmulo de responsabilidades sociais assumidas, a se tornar vítima do seu próprio crescimento. Tendo se desenvolvido de forma desordenada, configurou-se a necessidade de se diminuir o tamanho do Estado e ser pedida a colaboração da iniciativa privada para exercer serviços destinados ao público.

Com relação ao instituto da privatização, continua o Ministro:

A filosofia intervencionista adotada pelo Estado no concernente às atividades públicas o levou a açambarcar a quase totalidade do fornecimento e da administração dos serviços necessários a atender aos reclamos da população, como os de saúde, energia, água, esgoto, telefonia, entre tantos outros. Essa atividade estatal agigantou-se de tal modo que, em decorrência da incapacidade de ser bem administrada tal expansão, começou a enfrentar dificuldades para continuar a ser exercida de modo que atingisse a finalidade de alcançar o bem comum. O Estado, no desempenho desses serviços públicos, vê-se envolvido por tantas falhas organizacionais que impedem o alcance de seus objetivos com eficiência.

 

O programa de privatizações implementado no Estado Brasileiro pode ter sido necessário em momentos passados, mais precisamente no início da década de 90, mas terminado esse tempo apenas restou evidente que tal processo não era o ideal para o estágio de globalização que se constatou em meados da década passado, pois não pode o Estado apenas diminuir de tamanho e se tornar impotente frente à inoperância do setor privado em prestar serviços a toda sociedade, sem a devida qualidade e eficiência.

Após a constatação de que é imprescindível trazer inovações no campo da prestação de serviços púbicos, o Estado sentiu a necessidade de aperfeiçoar e expandir outro instituto do direito administrativo, qual seja o da parceria da Administração Púbica com o particular, sob a forma de concessão dos serviços públicos.

2.1 Conceito e natureza jurídica

O administrativista Hely Lopes Meirelles (1991, p. 234) apresenta um conceito genérico de concessão, abrangendo as três modalidades de concessão. Para ele, contrato de concessão

é o ajuste pelo qual a Administração delega ao particular a execução remunerada de serviço ou de obra pública, ou lhe cede o uso de um bem público, para que o explore, por sua conta e risco, pelo prazo e nas condições regulamentares e contratuais”. Esse conceito é bastante completo e traduz as características presentes nas modalidades de concessão que a legislação prevê.

Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 709) entende ser a concessão de serviço público:

[...] o instituto através do qual o Estado atribui a alguém o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob a garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço.

            Bandeira de Mello distingue rapidamente obra pública e serviço público, dizendo ser obra pública “a construção, reparação, edificação ou ampliação de um bem imóvel pertencente ou incorporado ao domínio público”; e segue: “a obra é, em si mesma, um produto estático; o serviço é uma atividade, algo dinâmico”.

Podem ser extraídas dos conceitos acima transcrito, várias características que compõem a natureza jurídica das concessões de serviços públicos, como a unilateralidade na alteração do contrato, pois o interesse público externado pelo Estado se sobrepõe ao particular; a remuneração, ou, contraprestação pelos serviços prestados pelo particular, paga pelos usuários; a garantia do equilíbrio econômico-financeiro; e a característica de contrato misto. Pois, segundo o professor O. A. Bandeira de Mello, citado por Fernando Antônio Dusi Rocha (2000, p. 110),

a natureza da concessão seria mista, sendo contratual e unilateral, assim é um ato complexo que congrega duas operações: o ato unilateral, regulamentando a organização e funcionamento da concessão, e o contrato, regendo o aspecto econômico do negócio.

Em sentido diverso, leciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro (1991, p. 215), que se coloca entre os que atribuem â concessão a natureza jurídica de contrato administrativo, sujeito ao regime jurídico de direito público. Nela, afirma a autora, estarem presentes todos os elementos que caracterizam o contrato: o acordo de vontades sobre determinado objeto; interesses contraditórios e, reciprocamente, condicionados; efeitos jurídicos para ambas as partes. No entanto, remata Di Pietro (1991, p. 216):

 

[...] isso não retira à concessão a natureza contratual, da mesma forma que não perdem a natureza os contratos de adesão em geral, pois a outorga do objeto do contrato (serviço público, obra pública, ou uso privativo) somente se efetuará mediante manifestação expressa de ambas as partes, implicando, o consentimento do concessionário, aceitação das condições previamente estabelecidas pelo Poder Público.

 

Já os adeptos da teoria unilateralista, a exemplo de Marques (2009, p. 143), “consideram as concessões como atos isolados – um ato da própria Administração e outro do concessionário – e autônomos”. De acordo com essa teoria, o objeto da concessão está fora do comércio e não pode ser delegado através de um contrato.

A discussão em torno das concepções contratualistas ou unilaterais perdeu sentido após a Constituição Federal de 1988, que em seu art. 175 dispôs de forma clara acerca dos serviços públicos e sua concessão aos particulares, deixando assente em seu parágrafo único, inciso I, a natureza contratual da concessão, que tem em seus ajustes um caráter especial, decorrente do regime jurídico de direito público, que assegura ao poder concedente prerrogativas e privilégios, expressos através das chamadas cláusulas regulamentares[2], as quais mesmo que impostas, não retiram a natureza contratual da concessão.

 

 

2.2 A parceira entre o poder público e o particular: descentralização dos serviços

 

 

No entendimento da professora Di Pietro (1999, p. 13) afirma que "fala-se em parceria entre poder público e iniciativa privada para designar fórmulas antigas, como a concessão e a permissão de serviços públicos".

A máquina administrativa é composta por órgãos ligados ao Estado direta ou indiretamente, além de conjugada com empresas estatais, sociedades de economia mista, fundações públicas e outros demais órgãos criados para prestar algum serviço ou desempenhar funções precípuas do Estado, sempre visando o desenvolvimento econômico, social, cultural e preservando a qualidade, eficiência e continuidade.

Os vários órgãos que prestam os serviços inerentes a atividade estatal, nas diversas áreas de atuação como saúde, educação, assistência social, energia, água e infraestrutura, há muito tempo não vem conseguindo atender a demanda, o que gera uma insatisfação, descrença e indiferença das pessoas que necessitam dos mais variados tipos de serviços que o Estado está obrigado a prestar.

Uma técnica utilizada para ampliar a capacidade do estado de prestar mais e melhor seus serviços foi adotar o sistema da descentralização dos serviços, forma pela qual o Estado delega algumas funções e serviços a outras pessoas, para que estas prestem os serviços sob a fiscalização e regulação daquele.

Quando os serviços são prestados por pessoas da própria administração, temos a chamada delegação legal, ou seja, lei autorizativa dispôs sobre essa delegação; já, quando os serviços são prestados por pessoas da iniciativa privada, temos caracterizada a delegação negocial, ou seja, um acordo de vontades que estabeleceu as formas de prestação de um determinado serviço de interesse público. Este tipo de delegação é característica das concessões no direito brasileiro, seja nas suas formas comum ou especial (modalidade surgida com o advento da Lei Federal nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004). Segundo Rocha (2000, p. 110):

 

A concessão foi a primeira forma encontrada pelo Poder Público para deferir a terceiros a execução de serviços públicos. Após a Revolução Francesa, predominou entre as nações civilizadas a idéia de que o Estado deveria abster-se de gerir, diretamente, os serviços da atividade social, delegando-os a terceiros, através do instituto da concessão.

 

E continua o mesmo autor, dizendo:

 

Vencida a fase do liberalismo econômico, o Estado foi sentindo a necessidade de aprimorar a gestão do serviço público e a atividade privada exercida pela Administração. Tornou-se, assim, cada vez mais frequente, delegar-se a execução de serviços públicos a empresas particulares, sobretudo diante da demonstrada incapacidade de o Estado de explorar os serviços públicos, por lhe faltarem as necessárias doses de iniciativa e de adaptação às circunstâncias.

 

A crise fiscal e as dificuldades financeiras induziram mudanças significativas no modelo de desenvolvimento brasileiro, simbolizando o começo de uma profunda reforma estrutural no papel do Estado durante os anos 80 (GRILO; MELHADO; SILVA; HARDCASTLE; JUNIOR). Segundo Grillo e Silva, “o processo foi acelerado após 1991, quando o programa de privatizações foi lançado, e mais uma vez em 1994, com a ampliação dos horizontes de planejamento propiciado pela estabilidade econômica.”

Para César da Silva (2004), o então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, disposto a atrair investimentos privados para projetos de infraestrutura, promulgou as Leis nº 8.987/95 (Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal) e nº 9.074/95 (Estabelece normas para outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos) que objetivaram preparar a Administração para uma nova fase de fluxos de capitais via parcerias por meio da concessão. A concessão, nessa fase, estava inserida numa política de privatização que, teoricamente, atenderia o atendimento dos interesses públicos e privados, recuperaria a infraestrutura, requalificaria os serviços públicos, atrairia os modos gerenciais privados, diminuiria o tamanho e a intervenção direta do Estado na atividade econômica produtiva.

Conforme Moreira (2010), devido a problemas cambiais, tarifários e regulatórios associados à ascensão do Presidente da República Luis Inácio Lula da Silva ao poder, as privatizações foram interrompidas, por uma total incompatibilidade de objetivo de governo defendido pelo novo presidente. Na visão do governo Lula, a PPP é um contrato em que a Administração Pública e as empresas privadas compartilham riscos e assumem a realização de serviços ou empreendimentos públicos. Os contratos de parceria devem ficar de acordo e obedecer a Lei de Licitações e Leis de Concessão de Serviços, com poucas alterações de adaptação que lhes dê mais flexibilidade, por exemplo, com a instituição da arbitragem, prazo de concessão e garantias.

Podemos compreender, do contexto acima exposto, que passados vários anos desde o inicio do processo de redemocratização do país, várias formas de prestação de serviços à coletividade foram sendo implantadas, no entanto, a aplicação prática da legislação esbarra na indiferença do setor privado. É importante que as parcerias entre Administração Pública e particulares sejam tratadas como meio indispensável para o crescimento sócio econômico da nação e como ferramenta inafastável em nova conjuntura mundial marcada pela globalização e aproximação da máquina estatal da coletividade, seja através da prestação efetiva dos serviços públicos, seja pela intensa participação popular nos processos de planejamento e tomada de decisões pelo Poder Público, ou até, pela real necessidade de reconhecimento que a Administração Pública sozinha jamais atingirá seus fins.

 

 

2.3 Classificação das concessões de serviços públicos

 

 

As concessões de serviços públicos são classificadas de acordo com o diploma legal a qual se estabelecem, sendo comuns, quando regidas pela Lei Federal nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e especiais, quando regidas pela Lei Federal nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública.

O professor José dos Santos Carvalho Filho (2007, p. 325/326), faz uma divisão por demais didática a respeito da classificação básica das concessões, subdividindo a concessão de serviços públicos comum em concessões simples e concessões de serviços públicos precedidas da execução de obra pública – sendo que sua característica reside no fato de que o poder concedente não oferece qualquer contrapartida pecuniária ao concessionário, pois todos os seus recursos provêm das tarifas pagas pelos usuários; as concessões especiais se subdividem em concessões patrocinadas e concessões administrativas – sendo caracterizadas pela circunstância de que o concessionário recebe determinada contraprestação pecuniária do concedente. Incide sobre estas o regime jurídico denominado de “parcerias público-privadas”.

Sendo o objeto deste estudo as formas de parcerias público-privadas, pretende-se analisar os seus elementos básicos e as definições, buscando um entendimento prático sobre o instituto e as suas relações com as concessões comuns.

A concessão patrocinada, tal como definida na lei, constitui modalidade da concessão de serviço público disciplinada pela Lei nº 8.987/95; esta se aplica subsidiariamente em tudo o que não contrariar a Lei nº 11.079/04. Evidencia-se, das normas citadas, que a diferença está na forma de remuneração: na concessão comum ou tradicional, a forma básica de remuneração é a tarifa, podendo constituir-se de receitas alternativas, complementares ou acessórias ou decorrentes de projetos associados; na concessão patrocinada, soma-se à tarifa paga pelo usuário uma contraprestação do parceiro público.

Tendo por objeto a execução de serviço público, a escolha da modalidade patrocinada de concessão no âmbito da PPP não é discricionária porque terá que ser feita em função da possibilidade ou não de executar-se o contrato com a tarifa cobrada do usuário e as outras fontes de receita indicadas na Lei nº 8.987/95 (PEREIRA, 2006). E complementa Di Pietro (2005): “se essa forma de remuneração for suficiente, não poderá o poder público optar pela concessão patrocinada, que dependerá, em grande parte, de contribuição do poder público e de pesadas garantias que vão onerar o patrimônio público.”

A concessão administrativa, de mais difícil conceituação devido à redação ambígua do art. 2º, § 2º, da Lei 11.079/04, tem por objeto “a prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens”. Afirma Di Pietro (2005), com bastante propriedade, que:

 

Embora o dispositivo fale em prestação de serviços (aproximando-se do contrato de empreitada), na realidade o contrato pode também ter por objeto a execução de serviços públicos que não admitam a cobrança de tarifa. A essa conclusão chega-se, em primeiro lugar, pelos próprios objetivos declarados na justificativa do Governo ao encaminhar o projeto de lei ao Congresso Nacional; em segundo lugar, pela redação do artigo 4º, inciso III, da Lei, que só proíbe a delegação das funções de regulação, jurisdicional, poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado; em conseqüência, como a concessão patrocinada depende, parcialmente, de remuneração do usuário, os serviços públicos que não comportam essa remuneração, terão que ser objeto de concessão administrativa, que é inteiramente remunerada pelo parceiro público. Além disso, vários dispositivos da Lei 8.987/93 são estendidos, expressamente, à concessão administrativa, como os que tratam da responsabilidade da concessionária, transferência da concessão, encargos do poder concedente, encargos da concessionária, intervenção, formas de extinção (advento do termo, encampação, caducidade, rescisão etc).

 

Com base nas lições do autor acima, pode-se inferir que a concessão administrativa constitui-se em um misto de empreitada (porque a remuneração é paga pelo parceiro público) e de concessão de serviço público (porque o serviço prestado pode ter a natureza de serviço público e está sujeito a algumas normas da Lei nº 8.987/95).

 

 

2.4 Fontes normativas

 

 

            Nas lições de Gasparini (2001, 24), “fonte é o lugar de onde brota, através da terra, a água”, ou seja, é de onde de extrai o objeto do Direito. A principal fonte normativa é a Constituição Federal, seguida das leis infraconstitucionais.

 

 

2.4.1 Fonte constitucional

 

 

A Constituição da República dispôs em seu art. 175 sobre as formas de exercício do serviço público, diretamente ou mediante delegação sob o regime de concessão ou permissão, exceto os serviços de radiodifusão sonora e de imagens. O citado dispositivo constitucional ressalta vários princípios que, na legislação infraconstitucional reguladora, devem reger as concessões, com destaque para o da política tarifária, o da obrigação de manter serviço adequado, o que trata dos direitos dos usuários, o das especificidades desses negócios jurídicos e o da obrigatoriedade de licitação.

Essa norma é de caráter genérico, devendo cada ente observar sua competência, conforme os artigos 21, XI e XII (União); 25, § 2º (Estados); e 30, V (Municípios), da Constituição Federal.

Utilizando os conceitos de Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 679) obtêm-se as noções de serviço público, concessão de serviço público e permissão de serviço público.

 

Serviço Público: É toda a atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais –, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo.

 

O serviço público possui um elemento material: o oferecimento de uma utilidade ou comodidade à coletividade; e um elemento formal: a atividade material oferecida ou prestada é regida pelo regime jurídico de direito público, o qual visa garantir a prestação de um serviço adequado à população. A Lei nº 8.987/95 no seu artigo 6º parágrafo 1º arrola oito princípios específicos que se aplicam ao serviço público (regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas) os quais possibilitam determinar o que é um serviço público adequado. Na mesma definição, preleciona o professor Bandeira de Mello (2010, p. 709):

 

Concessão de Serviço Público: É o instituto através do qual o Estado atribui a alguém o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob a garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço.

 

Para o concessionário a prestação do serviço é um meio através do qual obtém o fim que almeja: o lucro. Para o Estado, o lucro que propicia ao concessionário é o meio por cuja via busca sua finalidade, que é a boa prestação do serviço, desempenhado quando, como e enquanto conveniente ao interesse público.

A Lei nº 8.987/95 que regula a concessão e a permissão, disciplina também a concessão de obra pública, hoje reconhecida como modalidade autônoma que tem como objeto a execução de uma obra, sendo secundária a prestação ou não de um serviço público. A remuneração do concessionário pela construção da obra ou dos serviços dela decorrentes será efetuada pelos usuários por meio de contribuição de melhoria ou tarifas conforme o fixado em contrato. A concessão só pode ser dada à pessoa jurídica ou consórcio de empresas, mediante concorrência, admitindo-se a sub-concessão, desde que autorizada. No mesmo desiderato, conceitua a permissão nos seguintes termos (2000, p. 671):

 

Permissão de Serviço Público: É o ato unilateral e precário, intuitu personae, através do qual o Poder Público transfere a alguém o desempenho de um serviço de sua alçada, proporcionando, à moda do que faz na concessão, a possibilidade de cobrança de tarifas dos usuários. Dita outorga se faz por licitação (art. 175 da Constituição Federal) e pode ser gratuita ou onerosa, isto é, exigindo-se do permissionários pagamento(s) como contraprestação.

 

Esta precariedade que permite que a Administração promova alterações sem necessidade de indenizar o permissionário, a possibilidade de qualquer modalidade de licitação (não apenas a concorrência) e a formalização por contrato de adesão com pessoas físicas ou jurídicas são as principais diferenças entre permissão e concessão de serviço público.

 

 

2.4.2 Fonte infraconstitucional

 

 

Depois de muita espera, foi promulgada a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que regulamentou o regime das concessões comuns e das permissões de serviços públicos, tal como previsto no art. 175 da CF.

A lei citada acima disciplinou o serviço adequado, os direitos e obrigações dos usuários, a política tarifária, a licitação, os contratos, os encargos do poder concedente e da concessionária e as formas e extinção. Brevemente disciplinou as permissões, que no presente trabalho não é objeto de estudo.

Logo depois foi promulgada a Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, a qual foi resultado da conversão da Medida Provisória nº 1.107, de 1995,  estabelecendo normas para outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos - alterando e complementando algumas normas da Lei nº 8.987/95 – sujeitando as obras e serviços de competência da União como: vias federais, precedidas ou não da execução de obra pública; exploração de obras ou serviços federais de barragens, contenções, eclusas, diques e irrigações, precedidas ou não da execução de obras públicas; estações aduaneiras e outros terminais alfandegados de uso público, não instalados em área de porto ou aeroporto, precedidos ou não de obras públicas, sendo ainda acrescentado os serviços postais. Esta lei ainda disciplinou especificamente os serviços de energia elétrica e da reestruturação dos serviços públicos concedidos.

Posteriormente, foi promulgada a Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, a qual instituiu normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública, disciplinando assim uma nova modalidade de concessão de serviços públicos, a qual se denominou de regime de parcerias público-privadas.

 

 

2.5 Características dos contratos de concessão

 

 

Os contratos de concessão firmados entre a Administração Pública e o particular são caracterizados pela bilateralidade, isto porque as partes contratantes têm obrigações ajustadas entre si; comutatividade, as obrigações são estipuladas entre as partes e devidamente identificadas e equivalentes; intuitu personae, pois ao concessionário é vedado ceder suas obrigações, e, sobretudo, o serviço que lhe foi delegado, a terceiros, sem prévio assentimento do concedente (a Lei nº 8.987/95 admitiu a sub-concessão, mas a condicionou ao fato de estar prevista no contrato e à autorização do concedente); e formalismo, sendo necessária a formalização das vontades através de instrumento contratual com cláusulas bem delineadas e com obrigações bastante detalhadas, permitindo a efetiva execução do objeto do contrato (FILHO, 2007, p. 333/334). Afirma Rocha (2000, p. 115/116), que:

 

[...] o contrato de concessão de serviços públicos – sobre o qual se construiu a doutrina brasileira da teoria da imprevisão e do equilíbrio econômico-financeiro – caracteriza-se pela plena disponibilidade do serviço público pelo poder concedente, atribuindo-lhe os poderes de inspeção e fiscalização, além do poder de alterar, unilateralmente, as cláusulas regulamentares, relativas às condições de funcionamento do serviço, e o poder de extinguir a concessão antes de findo o prazo contratual. Por fim, o Estado dispõe de plena liberdade para regulamentar o serviço, de acordo com o que for mais conveniente para o interesse público, mantido e sempre respeitado o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

 

Outros elementos são indispensáveis para caracterizar os contratos envolvendo o Poder Público e os particulares, como podem ser citados: a supremacia do Estado/concedente, o qual detém várias prerrogativas nos contratos administrativos, podendo conferir ao instrumento contratual de concessão as chamadas cláusulas exorbitantes[3], ex vi legis, artigos 23, V e 37 da Lei nº 8.987/95; a natureza jurídica do concessionário e do concedente, sendo este somente as pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e aqueles somente poderão ser pessoas jurídicas de direito privado ou consórcio de empresas, devidamente constituídos e regulares.

Com relação a figura do concedente, merece destaque a excepcionalidade de representação das autarquias, especialmente algumas agências reguladoras, na condição de concedente na celebração dos contratos de concessão, posição esta delegada em face da função fiscalizadora ou de controle que estes entes estatais passaram a exercer no ordenamento jurídico pátrio, resultado da descentralização da atuação político-administrativa do Estado (FILHO, 2007, p. 334).

 

 

2.6 Controle dos serviços concedidos

 

 

O Estado tem a prerrogativa de delegar aos particulares a prestação de serviços públicos à sociedade, devendo exercer fielmente a controle e a fiscalização sobre o parceiro privado ao qual foi delegada a função de executar um determinado serviço. O que não pode é o Estado delegar suas funções de regulamentação, controle e fiscalização, porquanto são atividades inerentes indelegáveis.

Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2007, p. 468) deixam assentado em sua obra que em qualquer forma de prestação de serviços públicos, seja direta ou indiretamente, o Estado tem sempre como atribuição a regulamentação e o controle.

Ainda arrematam os autores: “No caso dos serviços públicos, o dever de controle por parte da Administração é ainda mais premente, uma vez que os serviços públicos são regidos por princípios como o da adequação, da eficiência e da continuidade”.

Quando os serviços públicos ou atividades econômicas eram prestados por empresas estatais, ao próprio Estado incumbia o controle; no entanto, com o processo de desestatização (ou privatização como preferem alguns) o Estado delega a terceiros a execução de serviços públicos e atividades econômicas antes realizadas por si ou por suas entidades, criadas para fins específicos. Diante desse fato, sentiu-se a necessidade de se criar uma estrutura de controle mais rígido da execução dos serviços púbicos concedidos, pois, o Estado mesmo não sendo mais responsável pela execução dos serviços, ele continua como titular destes, devendo zelar pela sua eficiência, regularidade, modicidade das suas tarifas, direitos dos usuários, capacidade de atender a demanda, concorrência leal, dentre outros fins.

            Com isso, surgiu no nosso ordenamento jurídico a figura das agências reguladoras, criadas sob a forma de autarquias de regime especial, cuja atribuição prioritária consiste no exercício do controle estatal sobre os diversos serviços já atualmente prestados sob o regime das concessões. No âmbito federal podemos citar a ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica, a ANATEL – Agência Nacional de Telecomunicações, a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar e ANP – Agência Nacional do Petróleo. Os Estados e Municípios também têm competência para criarem as suas agências reguladoras para fins de controle dos serviços executados sob o regime das concessões.

            A Constituição Federal de 1988 prevê, ainda, a participação do usuário na relação de concessão, assim como nos serviços públicos em geral. O parágrafo 3º do artigo 37 da Carta Magna, com redação da Emenda Constitucional nº 19/98, inclui o usuário como partícipe atuante da Administração Pública direta e indireta, garantindo-lhe a possibilidade de apresentar reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral e de realizar o controle dos serviços prestados.



[1] Aula magna ministrada na abertura do 1° Seminário de Direito Municipal Brasileiro e 3º Seminário Nacional de Direito Administrativo, realizados em Belo Horizonte - MG, nos dias 9 a 14.6.96, promovidos pela Editora NDJ Ltda.

[2] As cláusulas regulamentares ou de serviço dispõem sobre o objeto do contrato e o modo de sua execução. São as cláusulas alteráveis unilateralmente pela Administração, segundo as exigências do interesse público que o contrato visa a atender.

[3] As cláusulas exorbitantes são cláusulas comuns em contratos administrativos, mas que seriam consideradas ilícitas em contratos entre particulares, pois dão privilégios unilaterais à Administração, colocando-a em posição superior à outra parte, ou seja, as cláusulas exorbitantes são benefícios que a Administração possui sobre o particular.