RESUMO

 Autor: Francisco Danilo Ramalho Furtado

Co-autor: Eugênbert Silva Matias / Anderson Lucas Basílio Tavares

Pretendemos com esse artigo discorrer sobre, o instituto da desconstituição da personalidade jurídica no Direito do Consumidor, prevista especificadamente, no artigo 28 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Demonstramos o momento em que foi pensado pela primeira vez nesse instituto, por volta de meados do século XX. E porque foi pensado, devido efervescência das relações de consumo. Trabalhamos todo elenco exemplificativo, do caput do artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista, seu parágrafo 5°, elastecer o sentido transcrito no caput. Para realização deste trabalho nos valemos de uma pesquisa bibliográfica, e através de uma abordagem analítica, qualitativa do CC-02 e do CDC, fizemos uso também, de alguns trabalhos retirados da internet. Ressaltamos que o termo desconsideração, deve ser entendido no significado de desprezo, pois o Magistrado não extingue a pessoa jurídica, ao aplicar a desconsideração da personalidade jurídica, em regra. Mostramos a aplicação da desconsideração, no atual Código Civil de 2002 com a finalidade de facilitar a compreensão do tema trabalhado. Concluindo que sem a existência do referido instituto, os consumidores lesionados na relação de consumo, no caso de insuficiência dos recursos da pessoa jurídica ficariam sem o pagamento da devida indenização.

Palavras Chaves: Direito do Consumidor; desconsideração da personalidade jurídica; Direito Civil;

INTRODUÇÃO.

 O presente trabalho tem por objetivo, discorrer sobre a desconsideração da personalidade jurídica no direito do consumidor. Para tanto faz se necessário antes, falar um pouco para melhor entendimento, sobre a base desse instituto, que inicialmente surgiu no direito civil mediante jurisprudência, para a posteriori, ser reconhecido através de normas escritas, no Código Civil de 2002 e no Direito do Consumidor, mais especificamente no Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 28, caput e parágrafo 5°.

Esse tema é de suma importância, tendo em vista o grande numero de relações jurídicas de consumo, que ocorrem na atualidade. Essas relações refletem, em vários tipos de problemas, que devem ser solucionados pelo poder público, nesse caso especifico danos causados ao consumidor pelos fornecedores em geral, não podendo estes se esquivar de sua responsabilidade pelos danos causados, e de ressarcir conseqüentemente, o consumidor.

Seguindo a linha de pensamento é lógico que o consumidor, não poderá ficar a mercê do fornecedor, e deverá ser indenizado, de qualquer maneira, respeitando os limites estabelecidos em lei. Surgindo assim mais um problema, qual seja, o fornecedor com intenção até mesmo sem ela, por estar acobertado por uma pessoa jurídica, que para o direito tem personalidade própria, diversa da pessoa dos seus sócios, ou administradores. Poderiam se valer disso para não indenizar o consumidor, na hipótese de a pessoa jurídica, não deter condições para fazê-lo. Então a lei permite quando necessário, a desconsideração da personalidade jurídica, atingindo o patrimônio dos sócios, para que seja satisfeito o consumidor pelos danos sofridos. 

Pretendo nesse artigo discorrer de forma resumida, sobre a origem do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, e em seguida demonstrar de maneira exemplificativa, e simples em que hipóteses o magistrado deve aplicar tal instituto, no Direito do Consumidor.

Para consecução desse trabalho fiz uso, de material bibliográfico, documental e alguns materiais encontrados na internet.

Por fim, subdividi a pesquisa em dois momentos. O primeiro tratando sobre a desconsideração da personalidade jurídica, no tocante direito civil. Quanto ao segundo, voltamos meu esforço à desconsideração da personalidade jurídica no direito do consumidor.

  1. 1.   A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO DIREITO CIVIL, CONCEITOS BÁSICOS.

Antes de tudo, vamos estabelecer em que consiste a personalidade jurídica. A maior parte da doutrina entende personalidade como, instituto jurídico intimamente ligado ao conceito de capacidade, tendo em vista que o próprio Código Civil em seu artigo 1° estabelecer tal ligação, por dispor da seguinte forma:

Art. 1° - Proclama que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

Sendo assim conceituamos personalidade, como a capacidade em seu sentido completo. Pois esta se subdivide em capacidade de direito (ou de gozo), aquela que todos possuem com nascimento com vida, e capacidade de exercício (ou de fato), onde a pessoa pode figurar, pessoalmente, sem necessidade de representação, assistência em uma relação jurídica.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves, ele conceitua personalidade jurídica como sendo “a aptidão genérica (que pessoas tem, e não animais), para adquirir direitos e contrair obrigações. (SINOPSES JURÍDICAS, Editora Saraiva, pag. 69).

Feitas essas considerações, personalidade jurídica (ou civil), consisti no reflexo da personalidade no mundo jurídico, gerando capacidade de ser sujeito de direitos e obrigações. Como diz o artigo 2° do CC.

Art. 2° - A personalidade civil da pessoa começa com o nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.  

A personalidade atribui à pessoa uma série de direitos que se encontram regulados no Código Civil, entre os artigos 11 a 21.

No entendimento de Maria Helena Diniz, ela vai conceituar “os direitos da personalidade como: direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a sua integridade física( vida, alimentos, próprio corpo vivo ou morto, corpo alheio vivo ou morto, partes separadas do corpo vivo ou morto); a sua intelectualidade (liberdade de pensamento, autoria cientifica, artística e literária); e a sua integridade moral honra, recato, segredo profissional e domestico, identidade pessoal, família, e social. (Curso de Direito Civil, parte geral, Editora Saraiva, 2008).

Vale ressaltar que a lei atribui personalidade jurídica (ou civil), as pessoas jurídicas, capacitando as a serem sujeitos de direitos e obrigações. A sua principal característica é que elas participam da vida jurídica com personalidade própria, e diversa dos indivíduos que a compõe.

 Definem pessoa jurídica como: “grupo humano criado na forma da lei, e dotado de personalidade jurídica própria para realização de fins comuns. Não se enquadrando nesse conceito, as fundações”. (Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, no Curso de Direito Civil, parte geral, Editora Saraiva, 2009).

Feitas essas considerações necessárias, voltaremos nossa atenção em fim, a desconsideração da personalidade jurídica.

 Com o estabelecimento legal, reconhecendo as pessoas jurídicas personalidade própria, surgiam indivíduos valendo-se disso para se beneficiar, e conseqüentemente lesionar terceiros. O legislador muito esperto, percebendo tais praticas, criou o instituto da desconsideração da personalidade jurídica. Que nada mais é que um instrumento, que permite o juiz, em casos de fraude, e de má-fé, desconsiderar o principio de que as pessoas jurídicas têm existência distinta, da de seus membros e autorize a penhora de bens particulares dos sócios.

Como ensina o artigo 50 do CC e 28 do CDC.

“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. 

Esse instituto foi criado para caso como o de Aarom Salomon muito conhecido, citado por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, no Curso de Direito Civil, parte geral, Editora Saraiva, pagina n° 268. Que dizia:

Aaron salomon, objetivando constituir uma sociedade, reuniu seis membros da sua própria família, cedendo para cada um apenas uma ação representativa, ao passo que, para se reservou vinte mil.

  Pela desproporção na distribuição do controle acionário já se verificava, a dificuldade em reconhecer a separação dos patrimônios de Salomon, e de sua própria companhia.

Em determinado momento talvez  a quebra da empresa, Salomon cuidou de emitir títulos privilegiados (obrigações garantidas) no valor de dez mil libras esterlinas, que ele mesmo cuidou de adquirir.

Ora, relevando-se insolvável a sociedade o próprio Salomon, que passou a ser credor privilegiado da sociedade, preferiu a todos os demais credores quirografários (sem garantia), liquidando o patrimônio liquido da empresa.

Apesar de Salomon haver utilizado a companhia como escudo para lesar os demais credores, a Câmara dos Lordes, reformando as decisões de instancia inferiores, acatou a sua defesa, no sentido de que tendo sido validamente constituída, e não se identificando responsabilidade civil da sociedade com a do próprio Salomon, este não poderia, pessoalmente, responder pela dividas sociais.

Finalizamos este capitulo, com uma pequena distinção terminológica, entre desconstituição, que diz respeito à própria extinção da personalidade jurídica, e o termo desconsideração que significa um desuso momentâneo, como conseqüência de fraude, abuso ou desvio de finalidade.

  1. 2.   DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO DIREITO DO CONSUMIDOR.

Nesse momento, iremos trabalhar com o artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor, onde a matéria a ser demonstrada encontra-se regrada.

Art. 28, do CDC. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

§ 1°. (Vetado);

§ 2°. As sociedades integrantes dos grupos sociais e as sociedades controladas são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste Código;

§ 3°. As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste Código.

§ 4°. As sociedades coligadas só responderão por culpa;

§ 5°. Também poderão ser desconsideradas as pessoas jurídicas sempre que sua personalidade for de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

Assim como no Código Civil, o Código de Defesa do Consumidor, prever em seu texto, a possibilidade da desconsideração da pessoa jurídica. A doutrina acredita, que somente por meados do século XX, que surgiu a idéia de desconsideração da personalidade jurídica, um instrumento que possibilita atingir a pessoa dos sócios praticantes de fraude.

Tal reflexão só veio a surgir, como o advento do mercado empresarial e sua efervescência, facilitando a insurgência de pessoas jurídicas, notadamente empresas, com o custo de permissibilidade, valendo-se seus sócios das empresas para todo tipo de dolo. Fez como que criassem o artigo 28 do CDC, responsabilizando expressamente os sócios, e não se limitando apenas a fraude, mas de uma forma ampla, como nos mostra o § 5° do respectivo artigo.

Adentremos inicialmente, na analise do § 5°, porque neste encontramos de forma geral, quando poderá ser aplicada a desconsideração da personalidade jurídica, sendo hipóteses elencadas no caput do artigo 28, meramente exemplificativos, mas por serem aquelas que ocorrem com mais freqüência, não deixaram de ser normatizadas pelo legislador.

O § 5°, no ensina que para desconstituir a personalidade jurídica, de uma pessoa jurídica, é necessário que esta apenas se torne, um impasse para satisfação dos danos sofridos pelo consumidor, reforçando o que foi dito anteriormente. Que nas hipóteses de abuso de direito, excesso de poder, infração de lei ou existência de fato ou pratica de ato ilícito, violação dos estatutos ou contrato social, falência, estado insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica, provocado por má administração. São meramente exemplificativas, mas de suma importância.

Passando se agora a analise, do rol exemplificativo, previsto no caput do artigo 28 do CDC. Encontramos nos texto algumas terminologias a serem explicadas. Quando no inicio do texto o legislador escreveu a palavra poder, não estava falando em discricionariedade, por parte de magistrado, mas sim, que o mesmo tem o dever de aplicar a desconsideração da personalidade jurídica, sempre que verifique as hipóteses para tanto.

No tocante ao sentido da palavra desconsideração. Ela deve ser interpretada no sentido de desprezo, e não como extinção, até porque se esta tiver condições de continuar existindo, permanecerá mesmo depois da deconsideração.

Mais a frente o texto fala “em detrimento do consumidor”. Devemos entender isto como evento, em que o consumidor sofreu algum tipo de perda por vicio ou defeito de produto ou do serviço por quebra contratual, descumprimento ou nulidade de clausula, etc.

Listando agora as hipóteses do caput do artigo 28: começando pelo abuso do direito. No texto encontramos abuso de direito quando na verdade, consiste na pratica do direito, tendo em vista a conseqüência pratica de um direito, excessivamente capaz de causar dano a outrem.

Na infração da lei e violação, existência ou pratica de ato ilícito, a hermenêutica deve ser feita sobre a perspectiva de que a pessoa jurídica praticou algum ato contra leis, impeditivo do consumidor satisfazer seus direitos. A violação do estatuto ou do contrato social faz-se necessário analise deste para averiguar se caberá aplicação da desconsideração.          

A má administração deve ser entendida, na vontade do legislador, de responsabilizar os sócios de uma empresa objetivamente (sem averiguar culpa), através da desconsideração da pessoa jurídica. Pois entendeu que mesmo que a empresa feixe sem intuito de seus sócios, se houver consumidor a ser satisfeito, os sócios responderam, no limite de seu patrimônio.

Finalizando este capitulo, informando que os parágrafos § 2°,3°, 4° do artigo 28, são meramente explicativos do caput de referido artigo, sendo assim, nos limitamos a transcrevê-los.

CONCLUSÃO.

Diante do exposto, podemos dizer que como nosso ordenamento prima pelo justo, não poderia permitir que um de seus preceitos como o de emprestar personalidade as pessoas jurídicas, ou seja, empresas que possuem personalidades distintas de seus sócios fossem utilizadas para fins injustos. Nesse caso especifico pessoas naturais, dotadas as vezes de má-fé, outras vezes não, poderiam lesionar terceiros e estes em nada seriam responsabilizados.  

O legislador atento, corrigiu seu erro permitindo a quebra do principio de que as pessoas jurídicas, tem personalidade diversa da de seus sócios, ocorrendo tanto no direito civil como, no direito do consumidor  sendo neste de forma mais ampla.

Para que haja a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, no direito do consumidor, como nos ensina o artigo 28, § 5°, basta que o consumidor tenha sofrido um dano, e não tenha sido indenizado, devido à empresa (pessoa jurídica), não deter condições para tanto, atingindo patrimonialmente a pessoa de seus sócios, por determinação judicial.

Sento assim, o rol de hipóteses do artigo 28 caput, meramente exemplificativas, mas por serem os motivos de maior incidência, foram elencados pelo legislador. Quais sejam: caso do abuso do direito ou excesso de poder; infração da lei ou existência de fato ou pratica de ato ilícito; violação do estatuto ou do contrato social; falência ou estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica, provocados por má administração.

Em fim, lembramos que o termo desconsideração deve ser interpretada no sentido de desprezo, tendo em vista que o juiz não irá extinguir a sociedade, apenas agirá como se o pessoa jurídica não representasse obstáculo.  

REFERÊNCIAS

Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, no Curso de Direito Civil, parte geral, Editora Saraiva, 2009.

Carlos Roberto Gonçalves, SINOPES JURÍDICAS - Direito Civil parte geral, Editora Saraiva, 2011.

Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil, parte geral, Editora Saraiva, 2008.

Rizzatto Nunes, Curso de Direito do Consumidor, 7° edição, Editora Saraiva,2012.

Rizzato Nunes. Bê-a-bá do Consumidor. Editora Método. São Paulo-SP.

Http://jus.com.br/revista/texto/596/desonsideração/-da-pessoa-jurídica-no-código-de-desfesa-do-consumidor.