1. Apresentação

 

A temática contrato está presente no quotidiano das pessoas, embora alguns autores já preveem o fim do contrato em sua melhor exposição, a celebração de negócios entre os entes é comum e reflete um aspecto próprio do hodierno consumista em que vivemos.

Neste contexto os serviços de saúde, ou melhor, os serviços médicos se apresentam cada vez mais como uma relação negocial, do que em uma relação humanitária, onde pelo conhecimento específico, uma pessoa auxilia no tratamento de outra, embora persistam os casos em que vários profissionais atuam de maneira hercúlea para salvar pessoas.

O que se pretende, em rápidas palavras é abordar a seara consumeirista com as relações médicas, ou os “contratos médicos” que nos apresenta como um verdadeiro contrato de prestação de serviços, tendo sua subsunção ao descrito na legislação consumeirista.

 

1. Conceitos e Relação de Consumo.

 

As relações de consumo nascem das relações negociais entre as pessoas, que desde o período pré-histórico trocam bens e outros produtos entre si até chegarmos à complexidade do tecido negocial existente em um mundo globalizando.

 

É em ramo do direito que possui sua origem estritamente ligada às transações de natureza comercial e ao comércio propriamente dito, surgindo naturalmente à luz deste.

 

Tido como um microssistema jurídico que nasce das relações: fornecedor – consumidor, ou seja, de relações negociais, as relações de consumo experimentaram naturalmente ao longo dos tempos, um processo de aprimoramento e de desenvolvimento "pari passu" com o desenvolvimento das práticas comerciais, ganhando posteriormente importância, até atingir a forma contemporânea conhecida por nós, sendo devidamente regulamentada com o advento da Lei nº 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor), que passou a tutelar essa relação, revestindo-a de caráter público, a fim de resguardar os interesses da coletividade.

O Código de Defesa do Consumidor Brasileiro, Lei 8.078/90 criou um sistema de normas protetoras dos consumidores em matéria de prestação de serviços quando dispôs que consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza serviços como destinatário final, e ao definir serviço, como sendo:

 

"qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista".

 

Acresce em seu artigo 14 que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

 

Portanto, considera-se defeituoso um serviço quando não oferece a segurança que o consumidor espera ou quando o prestador do serviço não fornece ao consumidor informação suficiente, clara e adequada.

 

Outros direitos arbitrados pela lei em favor do consumidor são de natureza processual, e estão encaminhados a facilitar a defesa de seus direitos, inclusive com a possibilidade de propor a ação de responsabilidade no domicílio do autor: “Inversão a seu favor do ônus da prova no processo civil, se a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando o consumidor for hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”.

 

 

Neste sentido, muitos autores e Tribunais que vem admitindo a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à prestação de serviços médicos, no entendimento que na relação paciente, há o receptor do serviço prestado pelo profissional da medicina, mais propriamente, um consumidor.

Há de se observar que há autores que não defendem essa possibilidade, limitando sua sustentação na obrigação meio que se refere à atividade do médico.

 

2. Relação médico-paciente

 

A relação médico-paciente não se limita ao puro tratamento em si, além do cerne da obrigação meio propriamente dita, e que por muitas vezes não são realizados e se enquadram, subsumem, possuem identidade, uniformidade e tipicidade com o descrito na legislação consumeirista.

 

Para o senso comum, a relação médico paciente inicia-se com base num motivo de saúde, onde este procura aquele, visando o fim para a angústia que sofre (Irany Novah Moraes, in Erro médico e Justiça), ou seja, busca a prestação de um serviço específico que é a proteção da vida e da integridade física.

 

A definição de fornecimento de serviço do Código de Defesa do Consumidor é "qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração", Colaboram para isso os dispositivos contidos no art. 14, § 4º do próprio texto legal, que preceitua que a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais, entre os que se coloca o médico, será apurada mediante a verificação de culpa.

 

É clara a questão da vulnerabilidade do paciente na relação fornecedor-consumidor, com base no artigo 4º do CDC, no que tange “(...) respeito à sua dignidade, saúde” (...), também corrobora para a polarização da questão no âmbito do curso, depois deste “brainstorm”, vejamos o tema.

 

Então, nasce o debate da natureza da relação médico-paciente já fora objeto de diversos debates doutrinários, no direito estrangeiro e no pátrio.

 

No direito brasileiro, a controvérsia decorre da regulação da responsabilidade médica em dispositivo localizado na parte referente à responsabilidade aquiliana, art. 1.545 do Código Civil de 1916, pelo que se indagava se a relação médico-paciente era contratual ou extracontratual.

 

Todavia, a natureza jurídica de uma relação não pode ter como base a mera figura legal da matéria, mas sim a substância do ato, pelo que não basta estar no capítulo atinente à responsabilidade extracontratual para afastar o caráter contratual da relação.

 

O Código Civil de 2002, diferentemente do Código Civil de 1916, não tratou da responsabilidade do médico no mesmo capítulo, deixando de imputar relevância a tal classificação e a prevê no artigo 951.

 

É da essência da relação médico-paciente o caráter contratual, mas em algumas circunstâncias o dever de assistência médica pode não decorrer de vínculo contratual, é o que ensina Paula Moura F.de Lemos Pereira, em seu artigo “A relação médico-paciente e a responsabilidade pelo dever de informar”.

 

Neste sentido descreve o assunto com precisão a Profa. Dra. Hildegard Taggesell Giostri, Advogada especialista em Direito Médico, autora da obra “Erro Médico à luz da jurisprudência comentada”, que resume de forma ímpar a questão do vínculo, trazendo à tona variantes não controláveis em mera declaração de vontade, tais como: alguns serviços prestados são de forma espontânea, sem intervenção da vontade do paciente, pois o médico atende alguém em situação de emergência, neste caso, não há de se falar em relação contratual; atendimento médico a incapaz de fato, sem poder comunicar-se com representante legal a fim de obter a devida autorização, é dever do médico, portanto, divorcia das situações clássicas da relação menor-pais/representante-autorização; atividade desenvolvida contra a vontade do paciente, em situações de emergência, entre outros descritos pela eminente professora.

 

Após as situações que podem excetuar uma relação contratual convencional podemos verificar que o contrato médico pode ser escrito, verbal ou tácito (atendimento em pronto-socorro), e se caracteriza por ser bilateral, intuitu personae, contínuo, comutativo, oneroso ou gratuito, aleatório.

 

 

 

 

 

3. Conclusões

 

 

 O Código de Defesa do Consumidor Brasileiro, Lei 8.078/90 criou um sistema de normas protetoras dos consumidores em matéria de prestação de serviços quando dispôs que consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza serviços como destinatário final, e ao definir serviço, como sendo que qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, decorrendo daí dentre outros ilações que a relação medico-paciente é uma relação contratual, e aplicável todo o sistema protetiva próprio do microssistema consumeirista.

Corrobora com a argumentação, o que muitos autores e Tribunais que vem admitindo  aplicável o CDC na prestação de serviços médicos, no entendimento que na relação paciente, há o receptor do serviço prestado pelo profissional da medicina, mais propriamente, um consumidor.

 

Autor: Célio Egidio é Mestre e Doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Professor na Universidade São Francisco, na Universidade Gama Filho e nas Faculdades Atibaia.