A produção de provas ex officio por parte do juiz ainda é matéria de grande discussão junto ao ordenamento jurídico brasileiro. Parte da doutrina apresenta fortes argumentos para justificar a impossibilidade de produção de provas pelos magistrados, haja vista que, ao produzir prova de ofício, o Juiz estaria agindo como gestor da prova, confrontando assim com o sistema acusatório utilizado pelo nosso regramento jurídico.
Assevera-se por parte da doutrina que há o rompimento da imparcialidade do magistrado, tendo em vista que este age como inquisidor na fase probatória.
Contudo, com a reforma parcial do Código de Processo Penal ? Lei 11.690/2008, o legislador não só ratificou a possibilidade da produção de provas ex offício, como também permitiu sua produção antecipada, por iniciativa própria do magistrado, antes mesmo do ajuizamento da ação penal, ou seja, ainda na fase de investigação.
A nova redação do artigo 156, inciso I, dispõe que é facultado ao magistrado "ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida".
A intensão do legislador foi a de buscar a celeridade processual. Entretanto, alguns doutrinadores alegam que, ao autorizar o magistrado a produzir provas ex officio antes do início da ação penal, são violadas garantias processuais constitucionais, tais como o princípio da iniciativa das partes e o do contraditório e da ampla defesa. Além disso, alegam que o ônus da prova cabe à acusação, por força dos princípios da presunção de inocência e do in dubio pro reo, suscitando dúvidas sobre a constitucionalidade do dispositivo legal.
Dentre outros argumentos utilizados pelos doutrinadores inconformados com a produção de prova pelo juiz, citam-se também a perda da imparcialidade e o devido afastamento do juiz da persecução penal (devendo o magistrado não exercer outro papel na fase de produção de provas, a não ser o de garantir sua licitude).
Confirmando este entendimento, colaciona-se a decisão do Supremo Tribunal Federal - STF (Habeas Corpus 73338):

"(...) O PODER DE ACUSAR SUPÕE O DEVER ESTATAL DE PROVAR LICITAMENTE A IMPUTAÇÃO PENAL. - A exigência de comprovação plena dos elementos que dão suporte à acusação penal recai por inteiro, e com exclusividade, sobre o Ministério Público. Essa imposição do ônus processual concernente à demonstração da ocorrência do ilícito penal reflete, na realidade, e dentro de nosso sistema positivo, uma expressiva garantia jurídica que tutela e protege o próprio estado de liberdade que se reconhece às pessoas em geral. Somente a prova penal produzida em juízo pelo órgão da acusação penal, sob a égide da garantia constitucional do contraditório, pode revestir-se de eficácia jurídica bastante para legitimar a prolação de um decreto condenatório. Os subsídios ministrados pelas investigações policiais, que são sempre unilaterais e inquisitivas - embora suficientes ao oferecimento da denúncia pelo Ministério Público -, não bastam, enquanto isoladamente considerados, para justificar a prolação, pelo Poder Judiciário, de um ato de condenação penal. É nula a condenação penal decretada com apoio em prova não produzida em juízo e com inobservância da garantia constitucional do contraditório".

Corroborando o entendimento explicitado, fundamentam os doutrinadores que a faculdade do magistrado de produzir provas de ofício pode ser exercida, desde que de forma supletiva à iniciativa das partes e dentro da fase de instrução, sob o risco de violar ao princípio constitucional da presunção de inocência, conduzindo a um pré-julgamento, pois estas provas poderão servir às partes, numa fase em que ainda não há que falar em imputação, posto não haver ainda o processo.
Entretanto, todas essas teorias discutíveis na órbita jurídica, são rechaçadas pelos estudiosos da matéria.
Inicialmente, justifica-se pelo fato do Brasil não ter adotado o juizado de instrução de forma sistemática como modelo de instrumento investigatório para toda e qualquer infração penal cometida no país.
Inclusive, existem casos em que a legislação brasileira autoriza o Poder Judiciário a realizar sua própria investigação criminal.
Citam-se como exemplo, os casos em que:
1) Nas investigações criminais cometidas pelos próprios magistrados, estes somente podem ser investigados pelo Tribunal ao qual estão vinculados, ou seja, pelos próprios Juízes que compõem o órgão jurisdicional em questão;
2) No artigo 43 do Regimento Interno do próprio Supremo Tribunal Federal, ao atribuir a seu Presidente a competência para instaurar inquérito em razão de infrações penais que envolvam autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou mesmo pessoas não-detentoras dessa prerrogativa de função, mas desde que essas infrações ocorram nas dependências daquela Casa;
3) Das investigações presididas por um Ministro do Supremo Tribunal Federal, sempre que o sujeito passivo dessa investigação seja uma autoridade com prerrogativa de função;
4) A investigação judicial eleitoral, que ocorre nos casos de abuso de poder econômico, como representativa da presença do juizado de instrução em solo brasileiro;
5) O artigo 307 do Código de Processo Penal, que autoriza o magistrado brasileiro, ainda que excepcionalmente, a lavrar auto de prisão de prisão em flagrante.


Todas as situações acima são casos clássicos de juizados de instrução, exemplificando assim o embasamento de que o magistrado é possuidor do direito à produção de provas no nosso ordenamento jurídico.

Dos ensinamentos do professor Mauro Fonseca Andrade, podemos destacar:

Por tudo isso, voltamos a repetir: a Carta Maior de 1988 em momento algum optou pela adoção do sistema acusatório, pois todas as disposições constitucionais se ajustam, como vem sendo decidido, até mesmo ao sistema misto, onde sabidamente a acusação não é incumbência do juiz, e o acusado possui garantias próprias do sistema acusatório na segunda fase de sua persecução penal. E se assim o é, não há como pretender a inconstitucionalidade do inciso I do artigo 156 do Código de Processo Penal, e tampouco fazer depender sua constitucionalidade em razão da adequação das diretrizes constitucionais ao ? segundo Avena ? princípio da verdade real. Em suma, nossa flagrante indefinição sistêmica torna referido inciso plenamente constitucional, o que não implica dizer que possa ele ter incidência sobre toda e qualquer investigação criminal.

Por todo o exposto, verifica-se a total constitucionalidade do artigo 156, inciso I do Código de Processo Penal no tocante à produção de provas ex officio pelos juízes, haja vista o regramento processual penal brasileiro não possuir um sistema definido, qual seja inquisitório, acusatório ou misto.