AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS E A DIVISÃO DOS RISCOS: uma análise do contrato de concessão administrativa do “Complexo do Mineirão”

 

 

 

 

Anna Luiza Oliveira Guimarães[1]

 

 

 

 

Resumo

O presente artigo tem por finalidade abordar os aspectos gerais das parcerias público-privadas, diferenciando-as quanto às suas modalidades: patrocinada e administrativa. Posteriormente será discutida a inovação trazida pela Lei nº 11.079/04 referente ao compartilhamento dos riscos do contrato especial de concessão, analisando, sobretudo, o contrato de parceria público-privada na modalidade administrativa, pactuado pela Administração Pública para a realização de obras e serviços no “Complexo do Mineirão”, em Belo Horizonte, cidade sede da COPA DO MUNDO FIFA 2014. O contrato de concessão administrativa do “Complexo do Mineirão” prevê o compartilhamento dos riscos entre o setor privado e o Poder Concedente, a responsabilidade da concessionária pela contratação de seguros e as situações em que haverá a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

 

Palavras-chave: Parcerias público-privadas, Lei nº 11.079/04, inovação, divisão dos riscos, recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, “Complexo do Mineirão”, Copa do Mundo FIFA 2014.

1 INTRODUÇÃO

 

 

A instituição das parcerias público-privadas é uma forma de atender às necessidades da população, tendo em vista que a eficiência da gestão pública está diretamente relacionada com a rigidez do orçamento governamental, o que leva à inviabilização de programas de governo que invistam na infraestrutura do país. O dois pontos fundamentais que justificam a adoção do modelo são a falta de disponibilidade de recursos financeiros públicos e a eficiência da gestão do setor privado.

Neste artigo, far-se-á uma reflexão a respeito do conceito de parcerias público-privadas, a classificação quanto às modalidades administrativa e patrocinada, a divisão de riscos, bem como a sua importância para a infraestrutura do país em tempos em que há a convergência dos interesses públicos e privados para o desenvolvimento social e sustentável. Posteriormente, será feita uma análise do contrato de concessão administrativa do “Complexo do Mineirão”, no que diz respeito ao compartilhamento dos riscos decorrentes do empreendimento, bem como a solução de um eventual desequilíbrio econômico-financeiro.

Nesse contexto, as parcerias públicas privadas possuem o papel de combinar as qualidades da gerência pública e privada na busca de resultados de políticas públicas, viabilizando a efetividade de projetos a fim de diminuir o déficit em infraestrutura que o Brasil possui. É, portanto, mais uma tentativa para que o Poder Público consiga junto ao setor privado parcerias, recursos e formas de gestão para a execução de atividades estatais.

O contexto brasileiro que abriu portas para a surgimento da ideia das parcerias público-privadas pode ser assim resumido: o problema de infraestrutura que impedia o crescimento e a melhoria da situação fiscal do Estado; e a existência de várias atividades de importância para a coletividade, muitas delas referentes à infraestrutura deficitária, não auto-sustentáveis financeiramente e que o Estado, sozinho, não tinha condições de financiar.

Desta forma, a opção pelo modelo das parcerias público-privadas esta relacionada com a ausência de aportes suficientes para investimentos públicos e também a inviabilidade da transferência total dos riscos, ora para o parceiro público, ora para o privado, como ocorre nos contratos administrativos em geral regidos pela Lei nº 8.666/93, onde os riscos são exclusivos da Administração Pública, e nas concessões comuns disciplinadas pela Lei nº 8.987/95 em que os riscos são de responsabilidade do setor privado.

A Lei nº 11.079/04 inovou quanto aos riscos do empreendimento, estabelecendo em seus artigos 4º, VI e 5º III, o compartilhamento objetivo dos riscos que deverá ser especificado em por menores no próprio contrato administrativo.

Sendo assim, as parcerias público-privadas são uma importante forma de financiamento da infraestrutura do país, possibilitando o ingresso de recursos do setor privado na consecução de serviços públicos, mediante a divisão de riscos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS

 

 

2.1 Conceito

 

 

As parcerias público-privadas são modalidades de contrato especial de concessão, sendo instituída e regulada pela Lei 11.079/2004. Conforme estabelece o parágrafo único do art. 1º da referida lei, se aplica aos órgãos da administração pública direta, aos fundos especiais, às autarquias, às fundações públicas, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, estados, Distrito Federal, e municípios.

A principal atração do setor privado para investir na celebração das parcerias é o retorno sobre o capital investido. Ou seja, ao setor privado é proporcionada uma contraprestação paga pela Administração Pública o que torna as parcerias mais interessantes do ponto de vista econômico/comercial.

As parcerias público-privadas são, portanto, como uma forma da Administração Pública e do parceiro privado dividirem os custos com o desenvolvimento do país através da construção de infraestruturas, uma vez que separadamente, parceiro público e privado, não poderiam arcar com tamanhos investimentos. A Administração Pública não teria orçamento suficiente e o parceiro privado não obteria sustentabilidade com o negócio.

A fim de visualizar entendimento do acima descrito, lecionada ARAGÃO (2005):

 

Dessa forma, o Estado lança mão também de uma criativa – e não muito explícita nova forma de financiamento do custo para o caso de infraestruras que não possam ser amortizadas apenas com tarifas. Ao invés de realizar uma operação de empréstimo diretamente com uma instituição financeira para obter esses recursos, o Estado contrata uma empresa privada que, via de regra, vai por sua conta realizar uma similar operação de crédito para efetuar as obras e prestar os serviços contratados. Mas como a tarifa não é suficiente (concessões patrocinadas) ou é até mesmo inexistente (concessões administrativas), o Estado irá aos poucos – ao longo do prazo de vigência do contrato e apenas depois de disponibilizado o serviço – pagando pelo montante despendido previamente pela empresa privada.

 

Carvalho Filho (2006) define o contrato de concessão especial sob regime de parceria público-privada como:

 

O acordo firmado entre a Administração Pública e pessoa do setor privado com o objetivo de implantação ou gestão de serviços públicos, com eventual execução de obras ou fornecimento de bens, mediante financiamento do contratado, contraprestação pecuniária do Poder Público e compartilhamento dos riscos e dos ganhos entre os pactuantes. (CARVALHO FILHO, 2009, p. 353)

 

Para melhor entender o conceito, pode-se consignar que o mesmo abrange as diretrizes básicas do instituto. Caracteriza-se como acordo por resultar da manifestação de vontade da Administração Pública e do parceiro privado. Os contratos de parcerias público-privadas possuem valor mínimo de 20 milhões de Reais e em decorrência disso, implicam na prestação de serviço de implantação e gestão de empreendimentos de grande vulto. O objeto principal do contrato é a prestação de serviço de interesse público, podendo ser necessária a realização de obras e fornecimento de bens. O financiamento total ou parcial, bem como a prestação do serviço, incumbe ao concessionário privado, cabendo ao parceiro público a contraprestação no curso do contrato. Diferenciando-a das demais concessões, na concessão especial os riscos e ganhos são compartilhados, ou seja, há responsabilidade solidária entre as partes.

Segundo entendimento de José dos Santos Carvalho Filho (2006) a expressão “contrato de parceria” é tecnicamente imprópria, uma vez que, onde há contrato não haveria parceria em seu sentido verdadeiro. Além do mais o parceiro privado é uma pessoa comum do setor privado, que exercendo atividade econômica aufere lucros e vantagens na execução do contrato. O que caracterizaria uma verdadeira parceria seriam a cooperação mútua, técnica e financeira, sem fins lucrativos, onde as partes envolvidas possuíssem interesses comuns e não contrapostos como ocorre nos contratos em geral.

Para alguns críticos as parcerias público-privadas são uma forma de “capitalismo sem riscos”, onde o parceiro privado sempre obtém lucros que advém ora do retorno direito do empreendimento, ora da remuneração a ele paga pelo poder público. Afirmam, ainda, que o modelo gera despesas a longo prazo, não podendo serem calculadas, o que representa risco ao intuito de obter o equilíbrio fiscal que tem sido há muito buscado pelos brasileiros.

Com a finalidade de evitar o prolongamento das despesas e o conseqüente desequilíbrio fiscal, a Lei nº 11.079 em seu art. 22 estabelece um limite para as despesas com parcerias público-privadas, consignando que a União ficará impedida de celebrar futuras parcerias quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas por ela tiver excedido, no ano anterior, a um por cento da receita corrente liquida do exercício. Também com o intuito de evitar desequilíbrios fiscais decorrentes dos gastos públicos com as parcerias público-privadas, o caput do art. 28 da Lei nº 11.079 dita:

Art.28. AUnião não poderá conceder garantia e realizar transferência voluntária aos Estados, Distrito Federal e Municípios se a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas por esses entes tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita corrente liquida do exercício ou se as despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 (dez) anos subseqüentes excederem a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios.

 

Além disso, foi inserido no art.10, aexigência de observar os limites e condições estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2000).

A bem da verdade, em decorrência do prolongamento dos contratos de parceria público-privadas, que podem durar de5 a35 anos, se torna muito difícil, se não impossível, o cumprimento efetivo da Lei de Responsabilidade Fiscal e evitar que os gastos com as parcerias, contratadas em larga escala, provoquem desequilíbrios fiscal a longo prazo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

3 MODALIDADES DE PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS

 

 

3.1 Concessão Patrocinada

 

 

A própria Lei nº 11.079 estabelece o seu conceito no art. 2º, § 1º ao determinar que “Concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.”

José dos Santos Carvalho Filho bem define a concessão patrocinada como:

 

A concessão patrocinada se caracteriza pelo fato de o concessionário perceber recursos de duas fontes, uma decorrente do pagamento das respectivas tarifas pelos usuários, e outra, de caráter adicional, oriunda de contraprestação pecuniária devida pelo poder concedente ao particular. (CARVALHO FILHO, 2006, p. 353).

 

Desta forma, a concessão patrocinada é o contrato administrativo pelo qual o parceiro público delega ao concessionário a execução de um serviço, precedida ou não de obra pública, para que o execute, em seu próprio nome, mediante tarifa paga pelo usuário, acrescida de contraprestação pecuniária paga pelo parceiro público ao parceiro privado.

Conforme o art. 7º da Lei nº11.079 acontraprestação do parceiro público só ocorrerá quando o objeto do contrato se tornar parcialmente ou totalmente disponível. Assim, nos casos em que a prestação do serviço dependa de execução de obra pública e do fornecimento e instalação de bens, o concessionário arcará com tais tarefas, uma vez que a tarifa paga pelo usuário somente é cobrada mediante a prestação do serviço.

Aplica-se às concessões patrocinadas a Lei nº 11.079 e subsidiariamente a Lei nº 8.987/95 (lei geral das concessões), e também outras leis que sejam correlatas ao referido diploma.

 

 

3.2 Concessão Administrativa

 

 

As concessões administrativas são regidas por contratos nos quais a cobrança de tarifas seriam inviáveis econômica ou socialmente. Esta impossibilidade de cobrança pode ser politicamente definida de forma discricionária pelo Estado, ou pelo Poder Judiciário, como a cobrança pela saúde ou educação públicas (arts. 196 e 206, IV, CF/88), ou também quando o único usuário é a própria Administração Pública. Nesta modalidade não se fala em pagamento de tarifas pelo usuário para complementar a remuneração do Estado ao parceiro privado, mas da inexistência tout court de tarifas.

Está previsto no art. 2º, § 2º, da Lei nº 11.079 que “A concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direita ou indireta, ainda que envolva a execução de obra ou fornecimento e instalação de bens.”

Em relação à concessão administrativa a Lei nº 11.079 especificou a aplicação suplementar de alguns dispositivos da Lei nº 8.987/95 e 9.074/95. Enquanto que aos contratos de concessão comum não se aplica a Lei nº 11.079, sendo regidos pela Lei nº 8.987/95 (lei geral das concessões e permissões) e pela legislação correlata.

No que diz respeito ao objeto da concessão administrativa, este será a prestação de serviços, onde a Administração Pública será a usuária direta ou indireta; esta prestação de serviço ocorrerá mesmo que seja necessária a execução de obras ou fornecimento e a instalação de bens (art. 2º, § 2º) como, por exemplo, a concessão administrativa para a construção e administração do “Complexo do Mineirão”. Neste sentido CARLOS ARI SUNDFELD apud ARAGÃO (2009) define as concessões administrativas como sendo os contratos de prestação de serviços de que a Administração é usuária, mediata ou imediata, em que:

a) há investimento do concessionário na criação de infraestrutura relevante; b) o preço é pago periódica e diferidamente pelo Concedente em um longo prazo, permitindo a amortização dos investimentos e o custeio; e c) o objeto não se restringe à execução de obra ou ao fornecimento de mão-de-obra e bens (estes, se existirem, deverão estar vinculados à prestação de serviços). Em outras palavras tem que haver a gestão do bem – prestação de serviços através dele -, o que ao mesmo tempo diferencia as concessões administrativas da simples prestação terceirizada de serviços (em que não há a disponibilização de infraestrutura pelo contratado) à Administração Pública e da empreitada de obras públicas (em que há a disponibilização da infraestrutura pelo contratado, mas não a prestação de serviços através dela). (SUNDFELD apud ARAGÃO, 2005, p. 21).

 

A concessão administrativa, entendida como delegação de gestão de infraestrutura, deve possibilitar ao concessionário, autonomia empresarial para desenvolver a atividade, tomando decisões que entender necessárias para alcançar os objetivos pactuados no contrato. A possibilidade de autonomia de gestão atribuída ao concessionário decorre do art. 2º, § 4º, III da Lei nº 11.079, que veda as parcerias público-privadas se dirigirem unicamente ao fornecimento de mão-de-obra, ao fornecimento e instalação de equipamentos ou à execução de obra pública.

Conclui-se, portanto, que as parcerias público-privadas no Direito brasileiro são contratos para a delegação de construção, reforma, ampliação ou manutenção de infraestruturas e da gestão das atividades administrativas prestadas por seu intermédio. A remuneração a ser auferida será fixada em virtude da qualidade ou quantidade do serviço prestado pelo parceiro privado, sendo a mesma de longo prazo e arcada total ou parcialmente pela Administração Pública.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

4 DIVISÃO DOS RISCOS NAS PARCERIAS PÚBLICOS PRIVADAS

 

 

A repartição dos riscos entre o parceiro público e o privado é um dos pontos específicos mais importante e que deve ser minucioso e objetivamente disciplinado nos contratos de parceria público-privada. Sendo assim, em cada contrato de parceria haverá o arbitramento de riscos amoldado às peculiaridades da parceria.

O compartilhamento dos riscos é a solidariedade que o parceiro público tem como o parceiro privado em casos de eventuais prejuízos ou qualquer outra forma de déficit, mesmo que este prejuízo advenha de fatos imprevisíveis, como o caso fortuito, a força maior, o fato do príncipe e a álea econômica extraordinária.

A repartição objetiva dos riscos, estabelecida no art. 4º, VI da Lei nº 11.079 é um dos aspectos que caracteriza as parcerias público-privadas. A referida inovação trazida pela Lei nº 11.079 é uma forma de atrair eventuais parceiros privados, uma vez que poderá haver igualdade no que toca aos riscos e aos possíveis prejuízos, não cabendo somente ao concessionário privado arcar com os mesmos, o que dependerá do estabelecido no contrato.

Nos contratos administrativos regidos pela Lei nº 8.666/93, o risco é de responsabilidade da Administração Pública, que contrata a execução de obra pública ou prestação de serviço, não importando se a obra ou o serviço foram efetivamente utilizados, sendo sempre devido ao contratante privado o valor fixado na licitação.

Nas concessões comuns, regidas pela Lei nº 8.987/95, os riscos são prioritariamente do concessionário privado. Apenas os riscos por fatos imprevisíveis ou aquele inerentes ao próprio Estado (aumento de tributos, alteração unilateral do contrato) serão assumidos pelo Poder Público por força do direito do concessionário ao reequilíbrio da equação econômico-financeira do contrato.

Já nas concessões especiais (parcerias público-privadas) estabelece o inciso III do art. 5º da Lei nº 11.079 que serão repartidos os riscos entre as partes, inclusive os decorrentes de caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária. ARAGÃO (2005) define o compartilhamento dos riscos da seguinte forma:

 

As PPPs se situam exatamente entre esses dois modelos, permitindo uma divisão de riscos entre o Poder Público e o concessionário maior do que a meramente direcionada a fatos imprevisíveis ou de jus imperii. Admite, portanto, uma manutenção da equação econômico-financeira diferente da tradicionalmente aplicável aos contratos administrativos em geral, dita estática e referenciada apenas ao momento inicial do contrato. Em uma manutenção da equação econômico-financeira dinâmica e permanentemente atualizada poderão ser incluídos elementos como previsão de demanda e de variação dos custos ordinários com insumos e pessoal, que não poderiam ser considerados como fatos imprevisíveis para efeito de reequilíbrio de uma equação econômico-financeira estática. (ARAGÃO, 2005, p.40).

 

A pormenorização do compartilhamento dos riscos nos contratos de parcerias público-privadas, não é especificada pela Lei nº 11.079, cabendo esta especificação ao contrato, onde haverá cláusula prevendo a repartição objetiva dos riscos entre as partes (arts. 4º. VI, e 5º, III, Lei nº 11.079/2004). Dessa forma, a referida Lei delega ao contrato a determinação dos riscos que serão compartilhados entre o Estado e o parceiro privado, não havendo modelagem contratual da divisão de riscos vedada ou fixada pela Lei, havendo, portanto, discricionariedade administrativa para a fixação.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

5 CONTRATO DE CONCESSÃO ADMINISTRATIVA DO “COMPLEXO DO MINEIRÃO”

 

 

5.1 Contextualização do Projeto

 

 

Considerando a escolha por parte da Federation Internacional de Football Association – FIFA, da cidade de Belo Horizonte como uma das sedes da Copa do Mundo FIFA 2014, com a indicação do Estádio Governador Magalhães Pinto – MINEIRÃO para a realização dos jogos; o estado de Minas Gerais por meio da Secretaria de Estado de Planejamento celebrou contrato de parceria público-privada na modalidade de Concessão Administrativa com a empresa Minas Arena – Gestão de Instalações Esportivas S/A, pelo prazo de 27 (vinte e sete) anos.

A exploração, operação e manutenção, precedidas de obras de reforma, renovação e adequação do “Complexo do Mineirão”, serão realizadas pelo valor de R$ 677.353.021,85 (seiscentos e setenta e sete milhões, trezentos e cinqüenta e três mil, vinte e um reais e oitenta e cinco centavos) em conformidade com o disposto no EDITAL DE CONCORRÊNCIA Nº 02/2010 – SEPLAG, na Lei Federal nº 11.079/2004 (Lei Federal de Parcerias Público-Privadas), na Lei Estadual nº 14.868/2003 (Lei Estadual de Parcerias Público-Privadas), e, subsidiariamente, na Lei Federal nº 8.666/1993 (Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos) e demais normas que regem a matéria.

 

 

5.2 Dos riscos e do equilíbrio econômico financeiro

 

 

O Capítulo IX do referido contrato de parceria público-privada pactua a respeito dos riscos, ganhos e do equilíbrio econômico financeiro.

Em sua cláusula 25ª estabelece o conceito de caso fortuito e força maior sendo eles:

 

25.1. Consideram-se caso fortuito e força maior, com as consequências estabelecidas

neste CONTRATO, os eventos imprevisíveis e inevitáveis, alheios às PARTES, e que tenham um impacto direto sobre o desenvolvimento das obras, serviços e atividades da CONCESSÃO ADMINISTRATIVA.

25.1.1. Caso fortuito é toda situação decorrente de fato alheio à vontade das PARTES, porém proveniente de atos humanos. Constituem nomeadamente caso fortuito: atos de guerra, hostilidades, atos de vandalismo, invasão ou terrorismo e inexecução do CONTRATO por alteração na estrutura político-administrativa do PODER CONCEDENTE que, diretamente, afetem as obras, serviços e atividades compreendidos neste CONTRATO.

25.1.2. Força maior consiste no fato resultante de situações independentes da vontade humana. Constituem nomeadamente força maior: epidemias globais, radiações atômicas, graves inundações, ciclones, tremores de terra e outros cataclismos naturais, que, diretamente, afetem as obras, serviços e atividades compreendidos neste CONTRATO.

 

A parte que tiver o cumprimento de suas obrigações afetado por caso fortuito ou força maior tem o dever de comunicar à outra parte, por escrito, no prazo máximo de 72 horas, contadas da ocorrência do evento. Nos casos em que não sejam cobertos por seguro, ocorrendo caso fortuito ou força maior, as partes entraram em acordo se haverá a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato ou a extinção da concessão administrativa, observado o disposto no capítulo da solução de conflitos.

As partes ainda se comprometeram a empregar todas as medidas e ações necessárias a fim de minimizar os efeitos decorrentes dos eventos de força maior ou caso fortuito.

Importante também salientar o compartilhamento dos ganhos econômicos que advierem da execução do contrato, estabelecidos na cláusula 26ª,  havendo assim, a redução do valor correspondente à remuneração:

 

26.1. A CONCESSIONÁRIA deverá compartilhar com o PODER CONCEDENTE os ganhos econômicos que obtiver pela execução do CONTRATO, sejam os decorrentes da eficiência empresarial da CONCESSIONÁRIA na exploração do COMPLEXO DO MINEIRÃO, sejam os decorrentes de novos empreendimentos comerciais desenvolvidos sob sua responsabilidade na área inserida no LEVANTAMENTO TOPOGRÁFICO, ANEXO XI, desde que devidamente autorizados pelo PODER CONCEDENTE.

26.1.1. O compartilhamento será feito por meio da redução correspondente do valor da REMUNERAÇÃO imediatamente vincenda, ou, por meio de pagamento a ser feito ao PODER CONCEDENTE, na hipótese de não ser devido qualquer valor a título de REMUNERAÇÃO.

26.2. A receita da CONCESSIONÁRIA proveniente da exploração da infraestrutura construída ou reformada com base nos PROJETOS ARQUITETÔNICOS E DE ENGENHARIA, do ANEXO XII, será compartilhada com o PODER CONCEDENTE, por meio de redução do valor da REMUNERAÇÃO, por meio da fórmula no ANEXO V - REMUNERAÇÃO E MECANISMO DE PAGAMENTO.

 

Sendo assim, haverá o compartilhamento dos ganhos, sejam eles decorrentes da eficiência empresarial da concessionária na exploração do Complexo do Mineirão ou decorrente de novos empreendimentos em sua área inserida no levantamento topográfico. O compartilhamento se dará mediante a redução do valor da remuneração, ou seja, haverá um desconto entre o valor compartilhado e o valor a ser pago pelo Poder Concedente.

Posteriormente, a cláusula 27ª dita a respeito do equilíbrio econômico-financeiro, estabelecendo na cláusula 27.1 que a Concessionária assumirá integral responsabilidade por todos os riscos inerentes ao contrato, excetuados unicamente aqueles que do contrário resulte expressamente do contrato.

Como fora dito anteriormente, a Lei de parcerias público-privadas inovou quanto ao compartilhamento dos riscos, ocorre que não estabeleceu o modelo que deveria ser seguido, cabendo ao contrato o ajuste quanto aos riscos compartilhados. Sendo assim, como se observa na cláusula 27.1, a concessionária assumirá a responsabilidade integral por todos os riscos, excetuados os que do contrato decorrer o compartilhamento ou que estiverem incluídos nas apólices dos seguros contratados pela concessionária.

A recomposição de equilíbrio econômico-financeiro é uma forma de compartilhamento dos riscos e será feita de comum acordo entre as partes e poderá ocorrer por meio da prorrogação ou redução do prazo da concessão administrativa; da adequação dos índices que compõem o sistema de mensuração de desempenho; da revisão do valor referente à remuneração; ou da combinação dos meios citados.

Nas situações abaixo listadas caberá a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro para ambas as partes:

 

a) criação, extinção, isenção ou alteração de tributos ou encargos legais, que tenham repercussão direta nas receitas ou despesas da CONCESSIONÁRIA, para mais ou para menos, relacionados ao objeto deste CONTRATO;

b) modificação unilateral, imposta pelo PODER CONCEDENTE, nos projetos e estudos anexos ao EDITAL, desde que, como resultado direto da modificação, verifique-se para a CONCESSIONÁRIA alteração substancial dos custos ou da receita, para mais ou para menos;

c) ocorrência de eventos de força maior ou caso fortuito, salvo quando a sua cobertura seja aceita por instituições seguradoras bem conceituadas no mercado brasileiro, dentro de condições comerciais razoáveis;

d) as revisões, promovidas pelo PODER CONCEDENTE, nos parâmetros e medidores referentes aos índices que compõem o SISTEMA DE MENSURAÇÃO DE DESEMPENHO, ANEXO VI, e que acarretem, comprovadamente, encargos adicionais para a CONCESSIONÁRIA;

e) atrasos na execução das medidas necessárias à realização dos procedimentos de desapropriação e instituição de servidão administrativa, quando couber, que resultem em custos adicionais para a realização do objeto da CONCESSÃO ADMINISTRATIVA, desde que imputáveis ao PODER CONCEDENTE; e

f) em outras hipóteses expressamente previstas no CONTRATO.

 

Desta forma, haverá a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro para ambas as partes nas situações em que ocorrer eventos de força maior ou caso fortuito, a menos que sua cobertura conste do seguro realizado pela concessionária, também nos casos em que houver atrasos na execução das diligências necessárias aos procedimentos de desapropriação e servidão que propiciem custos extras ao projeto; dentre outras situações em que haverá o compartilhamento das responsabilidades.    

Estabelece ainda o contrato as situações em que não haverá a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro para nenhuma das partes:

 

a) variações de custos nas obrigações imputáveis à CONCESSIONÁRIA, inclusive o valor ou o volume dos investimentos de sua responsabilidade;

b) prejuízos decorrentes de negligência, inépcia ou omissão na exploração adequada da CONCESSÃO ADMINISTRATIVA;

c) prejuízos decorrentes de riscos normais à atividade empresarial;

d) prejuízos decorrentes de gestão ineficiente dos seus negócios, inclusive aquela caracterizada pelo pagamento de custos operacionais e administrativos incompatíveis com os parâmetros verificados no mercado; e

e) aumento do custo de empréstimos e financiamentos assumidos pela CONCESSIONÁRIA para realização de investimentos ou custeio das operações objeto deste CONTRATO.

 

            Nas situações acima descritas a concessionária deverá arcar com os prejuízos, não havendo o que se falar em responsabilidade solidária pelos mesmos e nem mesmo em manutenção do equilíbrio econômico-financeiro.

            Além da possibilidade de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro o contrato de concessão administrativa admite a contratação de companhia seguradora para garantir a efetiva e abrangente cobertura de riscos inerentes ao desenvolvimento de todas as obras, serviços e atividades contempladas no referido contrato, devendo as apólices prever a indenização direta ao poder concedente nos casos em que caiba a ele a responsabilização pelo sinistro.

            O contrato de concessão administrativa em sua cláusula 32ª fixa que a concessionária deverá contratar e manter em vigor seguros, que deverão cobrir, pelo menos os riscos, da obra, operacionais, incêndio raio e explosão de qualquer natureza, equipamentos eletrônicos, roubo e furto, vendaval, tumultos, atos dolosos e danos elétricos, sendo eles:

 

a) seguro do tipo “todos os riscos” para danos materiais cobrindo a perda, destruição ou dano em todos ou em qualquer bem integrante da CONCESSÃO ADMINISTRATIVA, devendo tal seguro contemplar todas as coberturas compreendidas de acordo com os padrões internacionais;

b) seguro de responsabilidade civil, que compreenda todos e quaisquer acidentes de prepostos ou empregados da CONCESSIONÁRIA e de terceiros, cobrindo qualquer prejuízo que venha a ser causado ou esteja relacionado com a execução da CONCESSÃO ADMINISTRATIVA, inclusive, mas não se limitando, a danos involutários pessoais, mortes e danos materiais causados a terceiros e seus veículos;

c) conforme o caso, observado o disposto na cláusula 29ª, relativamente à garantia de execução do contrato pela CONCESSIONÁRIA, seguro-garantia do cumprimento das obrigações relativas à CONCESSÃO ADMINISTRATIVA.

 

            A responsabilidade pela abrangência ou omissões decorrentes do contrato de seguro é da concessionária, bem como o pagamento integral da franquia em caso de utilização de qualquer seguro previsto no contrato.

            Pelo exposto, o que se conclui é que a através da realização de contratos de parcerias público-privadas, a Administração Pública possui discricionariedade para a fixação dos riscos que serão compartilhados com o parceiro privado. O que se observa, após a análise do contrato de Concessão Administrativa do “Complexo do Mineirão” é que o Poder Concedente optou por determinar que a Concessionária transferisse quase a totalidade dos riscos inerentes à atividade às seguradoras, por meio de contratos de seguros, restando ainda, alguns riscos que serão compartilhados, havendo assim, a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro em alguns casos para ambas as partes e deixando outros riscos de inteira responsabilidade do parceiro privado.

           

 

 

 

6 CONCLUSÃO

 

 

            Diante do exposto, o que se pode inferir é que as parcerias público-privadas são importantes formas de otimizar as qualidades do setor privado e da gestão pública. Neste sentido, o setor privado irá projetar, financiar e executar obras e serviços, com o objetivo de melhor atender às demandas sociais, recebendo como forma de contraprestação, remuneração paga pelo setor público e/ou tarifas pagas pelo usuário a depender da modalidade de parceria contratada, podendo ser administrativa ou patrocinada.

            Na modalidade administrativa a Administração Pública é usuária direta ou indireta do serviço, precedido ou não de obra pública, fornecimento e instalação de bens, havendo a contraprestação em forma de remuneração. Já na modalidade patrocinada foi visto que o serviço é prestado de forma direta à população, que para tanto paga tarifa do serviço, sendo a remuneração recebida pelo concessionário complementada por contraprestação pecuniária do poder concedente.

            Quanto aos riscos do contrato de parcerias público-privadas é estabelecido pela Lei nº 11.079/04 o seu compartilhamento, não prevendo forma rígida para o mesmo. O que possibilita a existência de discricionariedade por parte da Administração Pública para a elaboração, fixação da forma de compartilhamento dos riscos e do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

            Através da análise do contrato de concessão administrativa do “Complexo do Mineirão” pode-se constatar a existência de contratos de seguro utilizados para salvaguardar alguns riscos inerentes à atividade, e ainda, o compartilhamento dos riscos que não são abrangidos pelos referidos contratos, bem como as situações em que caberá a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro para ambas as partes e as situações em que a mesma não será possível, devendo o setor privado arcar com suas responsabilidades.

 

 

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

 

ARAGÃO, Alexandre Santos de. As parcerias público-privadas – PPPs no direito positivo Brasileiro. Revista dos Tribunais, v. 94, nº 839, p. 11-46.

BANDEIRA DE MELO, Celso Antônio. CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO.  21ª Ed., Malheiros, São Paulo: 2006, 1040p.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. MANUAL DE DIREITO ADMINISTRATIVO. 16ª Ed., Rio de Janeiro: 2006, 1026p. Lumen Juris

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21. Ed. – São Paulo: Atlas, 2008, 823p.

Domínio público disponível em: http://www.ppp.mg.gov.br/projetos-ppp/projetos-celebrados/estadio-governador-magalhaes-pinto-mineirao/arquivos-para-download/Contrato%20PPP%20Mineirao.pdf  Acesso em 16/05/2012.

LEI Nº 11.079, DE 30 DE DEZEMBRO DE 2004.

MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas concessões, permissões e parcerias. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. 658p.



[1] Bacharelanda do 10º período do curso de Direito da PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS, aprovada no V Exame da Ordem dos Advogados do Brasil, realizado pela FGV. E-mail: [email protected].