As alterações trazidas pela Lei 11.441/2007 como forma alternativa de acesso à justiça

RESUMO

 

O ordenamento jurídico há muito reclama por procedimentos que sejam céleres e contribuam para desafogar o judiciário. Este trabalho tem como escopo mostrar as alterações que a Lei 11.441 de 04 de Janeiro de 2007, introduziu no ordenamento jurídico, a qual é de grande relevância social, pois altera dispositivos do Código de Processo Civil, possibilitando a realização de inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual por via administrativa – desde que observadas as condições expressas na nova lei – procedimentos anteriormente determinados somente pelas vias judiciais. Nesse sentido, fez-se uma análise sobre a exigência desse tipo de legislação, que faculta a utilização da via extrajudicial – no caso em tela, especificamente no que tange a realização dos referidos atos junto ao tabelionato de notas, na realização de escrituras públicas – além de reavaliar a competência-chave do Judiciário. Procurou-se analisar se a medida atingiu os objetivos a que se propôs: agilizar, simplificar e reduzir custos no atendimento à população, além do descongestionar o Judiciário. Este humilde trabalho não tem a pretensão de esgotar o tema, mas busca expor um novo olhar sobre o assunto, esperando poder ajudar, de alguma forma, nesse perene mister.

 

Palavras-chave: separação e divórcio - via administrativa - tabelionato de notas - escritura

pública – celeridade – manutenção da segurança jurídica.

 

 

Com frequência, têm sido realizadas modificações na legislação processual, com o intuito de simplificar os trâmites processuais e baratear os custos de certos atos jurídicos. De fato, somente nos últimos três anos foram editadas quase dez leis para modificar o Código de Processo Civil, sendo que uma das últimas alterações foi realizada por meio da Lei n. 11.441, publicada em 05 de janeiro de 2007. O citado diploma normativo, que nem período de vacatio legis teve, modificou o Código Civil para possibilitar a realização do inventário, da separação e do divórcio consensuais pela via administrativa.

Por outras palavras: o inventário, a separação e o divórcio, que durante tantos anos demandaram para sua realização a manifestação de um magistrado, podem, agora, nos casos previstos em Lei, ser realizados por meio de escritura pública, a ser lavrada pelo tabelião. Afastou-se, portanto, a necessidade de – em tais casos – haver pronunciamento jurisdicional para que seja realizado o inventário ou mesmo a dissolução da sociedade conjugal ou do vínculo matrimonial.

O fundamento norteador da elaboração da Lei 11.441/07 – que já vem sendo chamada de “Nova Lei de Divórcio” apesar de abranger também o inventário por sucessão e a partilha de bens – está consignado no parágrafo inicial do “Pacto de Estado em Favor de um Judiciário mais Rápido e Republicano”, publicado no DOU em dezembro de 2004 elaborado em conjunto e assinado pelos Presidentes dos três Poderes da República. Tal Pacto, em seu parágrafo inicial, traz à tona que poucos problemas nacionais possuem tanto consenso no tocante aos diagnósticos quanto à questão judiciária. A morosidade dos processos judiciais e a baixa eficácia de suas decisões retardam o desenvolvimento nacional, desestimulam investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e solapam a crença dos cidadãos no regime democrático.

            Neste contexto, evidenciam-se as soluções alternativas para a solução dos conflitos – principalmente na seara da Mediação, Arbitragem, Conciliação e Procedimentos Administrativos ou Extrajudiciais – desmistificando-se a idéia do “acesso à justiça” apenas como “acesso ao Poder Judiciário”. Existe justiça fora dos tribunais. Ademais, fica claro que existe sim, a busca pelo aumento da qualidade dos serviços prestados aos usuários do sistema jurídico, bem como o equilíbrio entre tempo e o alcance do direito buscado. É imprescindível se alcançar uma atuação mais pronta e eficaz da justiça, eliminando certas mazelas características do Judiciário brasileiro, além de coibir a árdua demora na entrega da prestação jurisdicional que, juntamente com a injuriosa burocracia, são elementos perniciosos à pacificação social e ferem de forma fulminante o direito ao acesso à justiça.

Com efeito, há a necessidade de que a prestação da tutela jurisdicional atenda à realidade sócio-jurídica a que se destina, atuando como instrumento à efetiva realização de direitos, uma vez que não basta facilitar o ingresso à justiça a todos que acreditam ser detentores do direito material. Deve-se, acima de tudo, buscar, de forma efetiva e tempestiva, produzir soluções satisfatórias para os que dela necessitem. É imprescindível atender a todos e solucionar os conflitos de todos com qualidade, pacificando com agilidade.

As inovações no âmbito social ocasionadas pela Lei 11.441/2007 – principalmente nos casos de separação e divórcio sem a intervenção do Estado-Juiz na vida dos cônjuges, quando presentes os requisitos de validade – de fato vieram a facilitar tal ato consensual, poupando as partes de maiores constrangimentos nessa decisão não litigiosa.

Utilizar-se a via administrativa ou extrajudicial, nos casos permitidos em lei, é imperiosa para se evitar os transtornos de espera de uma ação judicial, que sempre gera aos jurisdicionados uma demora, uma incerteza, acarretando prejuízos de difícil reparação quando se necessita desta prestação jurisdicional urgente. Optar-se pela solução extrajudicial viabiliza ao Poder Judiciário ganho de tempo para se dedicar às decisões de questões mais complexas.

Assim, a nova lei, apesar de algumas dificuldades que ainda a acompanham quando da sua aplicação, deu um grande avanço à negociação e à mediação familiar, permitindo ao casal já maduro na sua decisão de ruptura matrimonial, efetivar seu procedimento de separação e divórcio, com assistência do seu advogado, sem precisar se submeter a delongas do Judiciário Estadual, em questões menos complexas.

           Ainda, importante considerar a facilidade imposta pela lei que, ao eliminar a audiência de conciliação obrigatória nos processos judiciais de separação e divórcio, não possuiu o condão de vulgarizar o casamento, mas sim, tão somente desburocratizar a separação e o divórcio, o que sem dúvidas conseguiu, mantendo-se o acesso à justiça e a segurança jurídica.

           Sem nenhuma sombra de dúvidas a nova Lei trouxe um grande avanço para o Poder Judiciário, que poderá solucionar com maior rapidez processos que realmente envolvam conflitos, salientando que quando o fim do casamento ocorre de forma consensual, é totalmente dispensável que sua dissolução dependa da intervenção do Juiz.

Quanto à análise dos princípios constitucionais que norteiam o Direito Notarial, verifica-se sua eficácia imediata como garantidores da manutenção da segurança jurídica, principalmente em face da fé pública do tabelião e da presença indispensável do advogado aos atos realizados extrajudicialmente. Nesse sentido, evidente a importância de ter o procedimento notarial regras próprias e obedecer aos princípios e à operação específica da atividade notarial. Além da função de formalizar a vontade, os tabeliães têm a mesma atribuição que teria um juiz em um procedimento judicial desta natureza, uma vez que é um profissional do direito, capacitado a formalizar os atos consensuais das partes maiores e capazes, e idôneos para facilitar enormemente a vida privada. Assim, o valor do documento notarial repousa em sua executividade e eficácia preventiva, possibilitando a segurança jurídica.

De tudo isto, tem-se que a sociedade não quer apenas a desburocratização, mas exige também segurança em relação aos atos, razão por que é fundamental que se encontre o ponto de equilíbrio entre os dois pesos dessa balança. Este é o desafio que os cartórios aceitaram para enfrentar a burocracia estatal e oferecer mais celeridade, sem pôr em risco a segurança jurídica que os procedimentos buscam garantir.

Portanto, a nova lei não reduz a segurança jurídica dos atos por ela permitidos via escritura pública, ampliando o acesso à justiça. O motivo é simples: além de todos os princípios norteadores do Direito Notarial, não se excluíram – e nem poderia - da apreciação do judiciário os atos dos tabeliães. A separação, divórcio ou inventário por escritura pública estão sujeitos ao controle do Poder Judiciário, inclusive porque as respectivas serventias são fiscalizadas pela Corregedoria Geral de Justiça.  

É, pois, possível concluir que a Lei 11.441/2007 tem sido aprovada e reconhecida como um meio efetivo para acessar a justiça, alcançando seu objetivo de simplificação de procedimentos, racionalidade e celeridade para as ações, facilitar a vida do cidadão e desonerá-lo, desafogar o Poder Judiciário e concentrá-lo na jurisdição litigiosa. Outrossim, a inovação disponibiliza aos cidadãos um mecanismo extrajudicial rápido, seguro e eficiente para a regularização de situações em que não existe conflito entre as partes, preservando-se a segurança jurídica da relação estabelecida.

 

Tatiani Calderaro Dalcin

Tabeliã e Registradora Substituta da Serventia Notarial e Registral de Progresso/RS///Formanda em Direito pela UNIVATES, Lajeado/RS

 

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