APLICAÇÃO DA PENHORA ON-LINE FRENTE AO SIGILO BANCÁRIO E O PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE DO DEVEDOR[1]

 

                         Lucas Félix da Costa e Juliana Nunes Lamar[2]

 

SUMÁRIO: Introdução;1 Penhora on-line no processo de execução por quantia certa contra devedor solvente; 2 Princípios que envolvem o instituto; 2.1 Sigilo bancário; 2.2 Menor onerosidade do devedor; 3 Aplicabilidade do instrumento diante dos princípios elencados; Conclusão.

RESUMO

 

O presente paper trata-se da análise do instituto da Penhora on-line, instrumento esse de constrição de dinheiro em instituição financeira em nome do devedor. A penhora on-line é efetivada por meio do Sistema Virtual “Bacen Jud”, no qual, diante de ordem expressa do magistrado, é realizado o bloqueio de valores e a consulta de dados diretamente no Banco Central. Objetiva-se, com o presente estudo, demonstrar que a temática apresentada sofre críticas em relação a quebra do sigilo bancário e à afronta ao princípio da menor onerosidade do devedor. Entretanto, em razão dos benefícios trazidos, as críticas têm sido mitigadas tendo em vista a eficácia da prática demonstrada pelo instrumento, uma vez que reduz uma das principais mazelas da justiça brasileira: a morosidade.

PALAVRAS-CHAVE: Execução por quantia certa, penhora on-line, sigilo bancário, menor onerosidade do devedor.

INTRODUÇÃO

A morosidade processual ainda persiste como característica marcante da justiça brasileira. Entretanto, houve tempos em que a mazela se instaurava de modo muito mais grave, principalmente no que tange aos processos de execução.  No art. 655, do Código de Processo Civil, o legislador, ao colocar o dinheiro no topo preferencial da lista dos bens a serem executados, fez com a intenção de encurtar o itinerário executivo já que bastaria ao exequente pedir o levantamento da quantia depositada sendo desnecessária qualquer atividade expropriatória relatada no art. 647 do CPC. Visando assim, combater o mal da demora nas práticas forenses, fora incorporado o novo instituto da penhora on-line, em 6 de dezembro de 2006, pela Lei n º. 11.382, utilizado através do sistema “Bacen Jud”, este, desenvolvido pelo Banco Central do Brasil desde 2001, com o objetivo de automatizar o envio e o tratamento das solicitações e ordens judiciais ao Sistema Financeiro Nacional.

Nesse contexto, surgiram críticas em relação ao sigilo bancário e em relação ao princípio da menor onerosidade do devedor, as quais serão analisadas diante da inovação processual da penhora on-line como forma mais eficaz de satisfazer o crédito do exequente. Tem-se o sigilo bancário, ainda que não previsto de maneira expressa pela Constituição Federal, mas de certa maneira abarcado em seu art. 5°, incisos X e XXI, funciona assim como um direito e garantia fundamental que deve ser respeitado. E ainda, o princípio da menor onerosidade que se encontra disposto no art. 620 do CPC: “Quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor”.

 De modo mais específico e através de uma breve revisão bibliográfica, pretende-se analisar como a sistemática da penhora on-line, por meio do Bacen Jud, proporciona maior efetividade ao cumprimento da sentença e, consequentemente, à prestação jurisdicional. Dessa forma, provar-se-á, por meio de revisão bibliográfica, que não ocorre qualquer violação constitucional em relação aos princípios supramencionados. E, com o advento, maiores são os benefícios para as partes tendo em vista que a responsabilidade patrimonial é resolvida com a possibilidade da sujeição de um determinado bem ou de vários bens do executado para satisfação de um direito, sendo a penhora o meio que concretiza tal fato.

 

 

1 PENHORA ONLINE NO PROCESSO DE EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE

Com a penhora busca-se particularizar entre os bens que compõe o patrimônio do executado aquele sobre o qual irão recair os atos de expropriação, realizados com o intento de satisfazer o direito do exequente. Estabelecendo assim o Código de Processo Civil em seu artigo 664, que considera feita a penhora mediante a “apreensão e o depósito” do bem executado para que não corra o risco de eventualmente o bem especificado falte ou não seja possível obtê-lo (MEDINA, 2008, p.248).

O art. 655 em seu inciso I, CPC, reserva o dinheiro como sendo o primeiro lugar na ordem de preferência da penhora, seja ele em espécie, em depósito ou aplicação em instituição financeira. Quando o dinheiro encontrar-se depositado ou em alguma aplicação financeira, deve ser realizada assim a penhora on-line (REDONDO; LOJO, 2007, p.175).

 A Lei 11382/2006, que entrou em vigor em 22 de janeiro de 2007 acrescentou o art. 655-A ao CPC que prevê expressamente a utilização e o procedimento do mecanismo da penhora on-line ou eletrônica, sendo que já era existente o direito de penhorar dinheiro em contas bancárias do devedor, mas que antes não havia instrumentos que localizassem essas contas e que possibilitassem a penhora. Conforme afirma Luiz Guilherme Marinoni (2008 p.46-47):

Se o exequente, para penhorar dinheiro, necessita saber se o executado possui – e em que local – dinheiro depositado em instituição financeira, deve ter ao seu dispor uma forma que lhe garante essa verificação. Para viabilizar o acesso a tais informações, o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior do Trabalho e o Conselho de Justiça Federal firmaram convênio com o Banco Central – há bastante tempo -, por meio do qual os juízes com senhas cadastradas têm acesso, através da internet, a um sistema de consultas – desenvolvido pelo Banco Central do Brasil, denominado “Bacen Jud”. Acesso a esse sistema confere ao juiz a possibilidade de obter informações sobre depósitos bancários – em conta corrente ou aplicação financeira do País. Com isso, o magistrado também fica com o poder de determinar o bloqueio do valor do crédito executado, concretizando o direito do exeqüente à penhora de dinheiro.

Sendo assim, o art. 655-A, CPC, estabelece que para que seja possível a penhora em depósito ou aplicação financeira, a pedido do exequente, o juiz irá requisitar à autoridade supervisora do sistema bancário informações a respeito dos ativos em nome do executado, de preferência por meio eletrônico, podendo inclusive determinar o ato de indisponibilidade até o limite do bem indicado na execução.

O meio eletrônico empregado para que seja viável esse tipo de penhora é o Bacen Jud, como já mencionado, é o meio preferencial mas não exclusivo, de forma que a requisição de informações e a determinação de indisponibilidade dos bens pode ser feita pelo modo tradicional de expedição de ofício (STJ- 4ª T. Resp 1.017.506, Min. João Otávio, j.22.3.11, DJ 1.4.11). Através do Bacen Jud, possibilita-se a condução, por via eletrônica (internet) das ordens judiciais dos bloqueios e transferências de valores em contas correntes ou diversos ativos financeiros tendo como intermediador dessa relação o Banco Central. É imprescindível assim que o Tribunal correspondente tenha convênio com o Banco Central e que o juiz correspondente ao processo em ativa tenha um cadastro (com senha de acesso) ao sistema (MEDINA, 2008, p. 262).

Há aqui a necessidade da cautela em relação à penhora de dinheiro assim como em qualquer outro tipo de penhora, não aprender verbas correspondentes a salários, soldos, subsídios, nos termos do art.649, IV do CPC, salvo se destinada a pagamento de prestação alimentícia conforme art.649,§2º, CPC. Não devendo também extrapolar a quantia além daquela prevista no título sem apreender dinheiro que pertença a terceiro assim como dinheiro em conta-corrente do cônjuge que não está sendo executado (ABELHA, 2007, p. 351).

Segundo o disposto no art. 655-A §2, CPC, a penhora on-line uma vez que efetivada, fica com certa disposição à espera do devedor para que o mesmo possa comprovar eventuais quantias depositadas em conta corrente quando as mesmas se referirem ao art. 649 do CPC que faz menção aos bens absolutamente impenhoráveis, é imposto assim ao executado o ônus de alegar provas que inviabilizem a penhora realizada.

Logo, a penhora por via eletrônica dos ativos financeiros é apenas uma forma para que se permita também a responsabilidade patrimonial, que deve ser feita respeitando os seus limites, e por isso, nada há que fira regras constitucionais já que ninguém é privado dos seus bens sem haver o devido processo legal (ABELHA, 2007, p. 355).

 

2 PRINCÍPIOS QUE ENVOLVEM O INSTITUTO

 

2.1 SIGILO BANCÁRIO

Inicialmente, é salutar compreender que sigilo bancário corresponde a “dever jurídico que têm as instituições de crédito e as organizações auxiliares e seus empregados de

não revelar, salvo justa causa, as informações que venham a obter em virtude da atividade bancária a que se dedicam” (SILVA apud MOREIRA, 2007, p. 188).

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, incisos X e XII, se preocupou em tornar inviolável as informações pessoais de cada indivíduo, incluindo o acesso a dados e informações capazes de atingir a vida privada de cada um. A tal fato, é possível se inserir de forma extensiva o sigilo bancário, de modo a resguardar as características da personalidade humana, in verbis:

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade o direito a vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes:

[...]

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

[...]

XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;

[...].

 

Nesse sentido, a Lei Complementar nº. 105/2001 tratou em disciplinar o sigilo das operações financeiras, contendo o art. 3º como um dispositivo autorizador do acesso às informações bancárias, na medida em que este dispõe:

Serão prestadas pelo Banco Central do Brasil, pela Comissão de Valores Mobiliários e pelas instituições financeiras as informações ordenadas pelo Poder Judiciário, preservado o seu caráter sigiloso mediante acesso restrito às partes, que delas não poderão servir-se para fins estranhos à lide.

E assim, para que não ocorra o abuso diante a utilização do sigilo bancário, cabe esclarecer que o direito que o exequente possui é apenas aquele de saber se existe ou não dinheiro para saldar o que é devido, sendo inteiramente vedado conhecer informações sobre o que há na conta de cada um, o quantum existente ou quais foram as últimas transações financeiras realizadas (REDONDO; LOJO, 2007, p.179).

Por outro lado, a norma é taxativa ao determinar quais casos não constituem violação ao dever de sigilo (LC 105/2001, art. 1º, §3º). De todo modo, é possível extrair que a preocupação do legislador em assegurar o sigilo às informações pessoais não se trata de uma mera proteção, uma vez que as informações bancárias acabam por revelar um íntimo de sacrifício diário do indivíduo que podem colocar em risco sua segurança. É possível revelar traços da vida íntima, despesas rotineiras e dados pessoais que, se utilizados de forma indevida, acabam por atingir a dignidade da pessoa humana (MOREIRA, 2007, p. 194).

O sigilo bancário vigora assim contra intervenções arbitrárias, mas não pode prevalecer sobre a justiça, ordem pública e na constrição de bens penhoráveis, não se afirma que tal interesse não exista e sim que não se pode tratá-lo a ponto de que autoridades públicas não possam tem acesso a informações desejadas (PUCHTA, 2009, p. 84).

2.2 O PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE DO EXECUTADO

Diante os interesses conflitantes e existentes na execução, que de um lado é o direito do exequente de ter satisfeito o seu crédito e de outro a sujeição do executado para que isso se realize importa na necessidade do princípio da menor onerosidade, ou como também é chamado de menor sacrifício possível, durante a execução (ABELHA, 2007, p. 55-56).

Este princípio está previsto no artigo 620 do Código de Processo Civil (CPC) e tem como finalidade a realização de uma execução que onere menos o devedor, ou seja, o juiz deve observar se há mais de uma forma de satisfazer o que é devido e assim sendo, ele determinará que toda a execução seja cumprida pela forma menos gravosa e menos prejudicial ao sujeito que fora inadimplente.

Deve ser observado esse princípio também, quando por exemplo na atividade executiva que se pretende fazer, sobre a parcela do patrimônio do executado, a penhora incida sobre um bem que seja capaz de garantir a satisfação do crédito mas que em contrapartida, o devedor tem outro que também seja capaz de garantir a satisfação mas que no momento da sua apreensão causasse menor gravame e assim a penhora deverá incidir sobre ele e não sobre o primeiro bem (CÂMARA, 2011, p.154).

Conforme o conceito do princípio que expõe José Miguel Garcia Medina (2004, p.76):  

Não se dúvida de que o executado é merecedor de tutela, na medida em que se deve buscar, na execução, satisfazer o crédito executado do modo menos gravoso ao devedor. Desse modo, haverá o executado de suportar a execução, mas poderá empenhar-se no sentido de que lhe seja tirado apenas aquilo que é efetivamente devido.  

 O princípio da menor onerosidade, é voltado assim para a proteção do executado e nada obstante, pode o sujeito mencionado, em seu campo de incidência invocar a análise do magistrado sempre que a execução civil estiver sendo realizada pelo modo mais gravoso, ou seja, por um meio que ultrapasse os limites daquilo que é indispensável (ABELHA, 2007, p. 56).

Trata-se então de proteger a boa-fé ao impedir o abuso do direito do credor, que sem auferir algum tipo de vantagem, se valesse do meio mais danoso ao executado. Esse princípio protege a ética processual, a lealdade, impedindo comportamentos abusivos do exequente do credor que pretende valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idôneo que satisfaça o conflito (DIDDIER, 2013, p.56-58).

Sendo assim, esse princípio deve nortear a realização da tutela executiva de maneira justa já que não é tampouco legítimo submeter o executado bem como o seu patrimônio a uma situação que não seja necessária para a satisfação do direito exequente. O que por outro lado não importa que o executado seja um “coitado” e possa valer-se do princípio estudado para trazer átona algumas alegações supérfluas como, por exemplo, alegar que o credor não precisa do dinheiro, ou que a execução é absurda etc. As mazelas da vida não devem ser suportadas de forma alguma pelo exequente (ABELHA, 2007, p. 56).

3 APLICABILIDADE DO INSTRUMENTO DIANTE DOS PRINCÍPIOS ELENCADOS

Diante das disposições gerais normativas explanadas em relação ao sigilo bancário, cabe discorrer sobre as posições doutrinárias em relação à suposta quebra do sigilo. Alguns doutrinadores sustentam que a penhora on-line revela verdadeira quebra ao sigilo, uma vez que, bastando ter autorização do magistrado, as partes têm acesso às informações pessoais do indivíduo. No entanto, este argumento é refutado sob o prisma de que o magistrado, ao solicitar o bloqueio ou as informações necessárias não invade a intimidade no que vai além do quantum determinado pela execução (PUCHTA, 2009, p. 88).

 O sigilo bancário do executado não é violado pelo simples bloqueio dos bens efetuados eletronicamente. Só se faz o bloqueio da quantia que fora determinada para a satisfação do crédito do credor, e, mesmo que se fosse quebrado o sigilo bancário, seria importante ponderar que tal sigilo não é um direito absoluto, devendo sim ceder perante a necessidade da informação estatal e do interesse social para que se tenha a busca efetiva da justiça, ou pelo menos que se tente. A autoridade judiciária com acesso à conta bancária não retira o núcleo do sigilo, ocorre como uma transferência do mesmo entre a instituição financeira e autoridade judiciária. (PUCHTA, 2009, p. 84-86).

Nesse mesmo sentido corrobora Luíz Guilherme Marinoni (2007, p. 274):

Antes de tudo, é preciso deixar claro que o exequente tem o direito de saber se o executado possui dinheiro depositado em instituição financeira pela mesma razão que possui o direito de saber se o executado é proprietário de bem móvel ou imóvel. Ou seja, tal direito é conseqüência do direito à penhora, que é corolário do direito de crédito e do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva (art. 5º, XXXV, da CF). De modo que a requisição de informações ao Banco Central objetiva apenas permitir a penhora, que é inquestionável direito daquele que tem direito de crédito reconhecido em título executivo, particularmente em sentença condenatória não adimplida, nada tendo a ver com alguma intenção de violar o direito à intimidade.

Ou seja, contra a alegação de inconstitucionalidade no que se refere ao sigilo bancário, a penhora online não importa violação alguma, uma vez que recai sobre “valor predeterminado, não havendo, em nenhum momento, divulgação de saldo, lançamentos ou depósitos referentes ao titular da conta e, também, qualquer mácula à intimidade ou privacidade do titular da conta” (JANTALIA, 2007, p. 91).

Para que seja possível a aplicação do instituto é necessário “considerar, de um lado, o reconhecimento da proteção ao sigilo bancário e, de outro, os interesses coletivos envolvidos (como justiça, segurança etc.), ponderando-os. Ou seja, deve observar o princípio da proporcionalidade” (MOREIRA, 2007, p. 192), tendo em vista que todo direito tem uma limitação, quando se exagera no exercício de um direito tem-se como consequência a violação de demais outros, o que de fato constitui uma ilicitude, devendo assim sempre ponderá-los. Como acontece, por exemplo, em Portugal, que os interesses da justiça na execução prevalecem sobre o sigilo bancário:

Qualquer instituição bancária tem a obrigação de cumprir despacho de penhora de depósito de dinheiro do executado, devendo informar ao tribunal se o valor de depósito for inferior ao valor mandado cativar; sem que isso possa se prejudicado pelas regras acerca do segredo bancário e em vigor, nem tem legitimidade para impugnar o despacho de penhora proferido em processo que não sejam partes. (ACORDÃO DE RELAÇÃO DE LISBOA DE 22.06.1995).

Com a reforma de 2006, o direito à penhora on-line fora consagrado como direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva uma vez que é a principal modalidade executiva destinada à execução pecuniária. A sua não realização viola direito fundamental daquele que é o exequente, caracterizando também o descumprimento por parte do Estado do dever que o mesmo possui de prestar a justiça de modo adequado e efetivo (REDONDO; LOJO, 2007, p. 176). Necessária então a presença do princípio da menor onerosidade para que tais parâmetros sejam obedecidos de maneira que a execução não onere demasiadamente e de maneira desnecessária o executado, mas que em contrapartida concretize a obrigação que inadimpliu anteriormente.

Entretanto, como mostra a seguinte jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), no acórdão de Agravo de Instrumento nº 1.0702.02.012692-7/001 que fora proferido:

No entanto, embora admita a agilidade do referido sistema para a satisfação do crédito exequendo, tenho que tal situação afeta garantias como o sigilo bancário e dados fiscais, não sendo recomendável que uma ordem judicial possa trafegar em rede aberta, sujeita à ação de hackers, o que compromete a integridade da mesma. Além disso, tenho que o deferimento, ou não, do pedido de penhora on-line, por ser uma medida excepcional, pressupõe que todos os meios postos à disposição do credor, para a localização de bens penhoráveis, tenham sido esgotados, em observância ao princípio da menor onerosidade da execução.

Escolhido assim não utilizar a penhora on-line sob o argumento de que ela é unicamente cabível quando há a comprovação de esgotamento de todos os outros meios de se realizar a penhora.

De maneira diferente, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro editou em outubro de 2006 a súmula n° 117 que afirma que a penhora on-line não ofende o princípio que estabelece que a execução se dê por meios menos gravosos ao executado. Isso ocorre com base no que foi visto que o dinheiro é o primeiro bem na ordem de preferência legal, quando requerida ao juiz as medidas de informações ao Banco Central, a mesma deve ser deferida de imediato, quando demandada pelo exequente, visto que não há como comprovar o esgotamento de outro meios de que dispunha a execução já que esse é o primeiro (REDONDO; LOJO, 2007, p.175-176).

E ainda, conforme o disposto no art. 688, caput do CPC, cabe ao executado no prazo de dez dias, após a intimação da penhora, requerer a substituição do bem penhorado desde que o mesmo comprove que a substituição será menos onerosa para ele e que de mesmo modo irá satisfazer o exequente sem lhe causar prejuízo algum. Constatou-se assim que não compete ao magistrado declarar a violação do princípio da menor onerosidade uma vez que é ainda oferecido ao executado um momento apropriado para o mesmo alegar a penhora, devendo o magistrado assim somente indeferir o pedido da penhora on-line ante a exposição de outros meios que sejam passíveis de atender a execução.

De todo modo, importante ressaltar que mais vale a flexibilização do sigilo bancário e da menor onerosidade do devedor, depois de demonstrado que tais medidas não são inconstitucionais, visto que não são violadoras dos princípios, do que a frustração da execução, uma vez que esta não se trata unicamente de interesse restrito às partes, mas sim da demonstração de um “sistema jurídico falho, incapaz de entregar ao vencedor o que realmente lhe é devido” (JANTALIA, 2007, p. 83).

CONCLUSÃO

A penhora on-line é um instrumento utilizado para proporcionar maior celeridade aos processos de execução. Entretanto, os debates acerca do tema deixam inúmeras especulações acerca da manutenção do sigilo bancário, bem como com relação afronta ao princípio da menor onerosidade do devedor. 

O sigilo bancário é questionado pelo fato de que o magistrado, diante da inércia do executado para o pagamento do crédito devido, autoriza o bloqueio do valor da execução nas contas deste ou solicita informações que deverão ser passadas pelas instituições financeiras, pelo Banco Central ou pela Comissão de Valores Mobiliários. Nessa perspectiva, alguns doutrinadores consideram que estaria violado o sigilo previsto pela Carta Magna. Entretanto, é sabido que tanto o bloqueio quanto às informações prestadas se limitam ao valor predeterminado pela execução, não tendo o magistrado qualquer acesso a informações alheias ao que for necessário à execução. Além disso, no momento em que o executado opta por não realizar o pagamento voluntariamente ou não busca nenhum outro meio de adimplir a prestação, está ciente de que suas contas bancárias serão alcançadas para satisfazer o crédito devido ao exequente.

Embora inúmeras discussões sejam levantadas, também em relação ao princípio da menor onerosidade, previsto no art. 620 do CPC, sob a alegação de trazer um ônus desnecessário ao executado, tendo em vista que o bloqueio poderia atingir contas destinadas ao sustento do devedor. Entretanto, conforme já foi assegurado inclusive na jurisprudência do STF – REsp 390.116/SP, REsp 703.033 / MA e AgRg no Ag 633.357/RS - tal princípio não se sobrepõe a outros aplicáveis à execução, como o de sua maior utilidade para o credor o bloqueio poderia atingir contas destinadas ao sustento do devedor  (MOREIRA, 2007, p. 91).

Em suma, a penhora on-line no processo de execução por quantia certa contra devedor solvente se apresenta como verdadeiro remédio à morosidade da justiça brasileira por se desmembrar em nome da celeridade processual e da razoável duração do processo. Além disso, tais benefícios são trazidos sem acarretar danos ao executado que superem os já sofridos pelo exequente, uma vez que ainda lhe é assegurado às hipóteses de impenhorabilidade de bens com o fim de garantir que restem condições de se manter economicamente.

O mais importante, no entanto, é realizar a penhora on-line mas de maneira que  a mesma não se desgaste trazendo assim eventuais prejuízos ou transtornos para ambas as partes. Deve-se utilizar de maneira adequada a tecnologia que é disponibilizada, através do Bacen Jud para indisponibilizar apenas o montante, obedecendo o limite que venha a ser penhorado sem haver dessa maneira qualquer invasão às contas do devedor e sem violar qualquer direito que seja fundamental.

REFERÊNCIAS


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MOREIRA, Henrique Balduino Machado. O Dever Legal do Banco Central de Informar a Ocorrência de Crimes e o Poder Requisitório do Ministério Público. Revista da Procuradoria Geral do Banco Central. Vol. 1, nº. 1, Dezembro,2007.

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TJMG, AI 1.0702.02.012692-7/001, Rel. Des. Audebert Delage, Data de Publicação: 23.11.2007.

 



[1] 2° check de paper da disciplina de Processo de Execução Civil, lecionada pelo professor Christian Barros, do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

[2] Alunos do 7° período do curso de direito da UNDB.