1 ANÁLISE SOB A ÓTICA PRINCIPIOLÓGICA E JURISPRUDENCIAL DA PESQUISA SOBRE A CONDUTA PESSOAL DO CANDIDATO

Para a aplicação do Direito é necessário antes de tudo interpretar a norma jurídica, devendo para isso, analisar e encontrar o verdadeiro significado desta, ou seja, a vontade da norma, saber o que o legislador quis dizer, o que realmente ele quer que aconteça. Neste contexto, o intérprete se utiliza de métodos e princípios para descobrir tal finalidade quando isto não for possível de ser entendido na simples leitura, e o estudo desses mecanismos é denominado de hermenêutica.

Mendes, Coelho e Gustavo (2010, p. 155) no seu livro Curso de Direito Constitucional abordam um conceito de interpretação jurídica relevante:

Como toda interpretação jurídica, de que é a espécie mais relevante, a interpretação constitucional é a atividade que consiste em fixar o sentido das normas da lei fundamental – sejam normas regras ou princípios -, tendo em vista resolver problemas práticos, se e quando a simples leitura dos textos não permitir, de plano, a compreensão do seu significado e do seu alcance. Noutras palavras, essa interpretação se impõe e tem início onde e quando a compreensão direta dos enunciados constitucionais já não está ao alcance da mão, provocando nos seus tradutores uma sensação de estranheza ou de mal-estar hermenêutico. Em poucas palavras, o trabalho de interpretação da Constituição tem início quando se frustra a comunicação direta com o seu texto e ele já não responde às perguntas dos seus leitores.

Logo, a hermenêutica tem por objeto o estudo da teoria de interpretação e os processos interpretativos, assim, no Direito ela determina o sentido e alcance das normas positivadas se utilizando de fatores históricos e sociais para isso.

Mota Filho e Barchet (2009, p. 49) diferencia a hermenêutica da interpretação para melhor entendimento:

Hermenêutica é a ciência que fornece a técnica e os princípios segundo os quais o operador do Direito poderá apreender o sentido social e jurídico da norma constitucional em exame, ao passo que interpretação consiste em, como já dissemos, desvendar o real significado da norma.

Há a possibilidade de uma norma jurídica admitir mais de uma interpretação, assim deve o intérprete descartar as interpretações que estejam em desconformidade com a Carta Magna e favorecer o sentido da norma que esteja ao seu acordo.

Seguindo nesta linha, Barros (2010, p. 177) expõe a existência de conflito entre regras e entre princípios, indica que a solução do primeiro conflito será a validade de uma regra em desfavor da outra, e no caso de princípios, estes devem se conciliarem, pois eles não são aplicados de forma absoluta, e é através do princípio da proporcionalidade que ocorre a conciliação deles.

Portanto, esses métodos de interpretação são utilizados no Direito, em todas as suas ramificações, seja para sedimentar entendimentos doutrinários ou para solucionar conflitos no Judiciário.

Partindo dessa abordagem, ter-se-á nos tópicos a seguir uma análise principiológica e jurisprudencial do processo de seleção em empresas que fazem pesquisas sobre a conduta social do candidato para fins de contratação.

1.1 Princípios constitucionais

Princípios constitucionais, também chamados por alguns juristas de princípios fundamentais, são considerados pela doutrina como alicerces do sistema constitucional, pois dão lógica a toda Constituição.

Barros (2010, p. 174) classifica os princípios constitucionais em fundamentais, gerais e setoriais ou especiais:

Há, entretanto, quem considere os princípios constitucionais como ‘síntese dos valores mais relevantes da ordem jurídica’ e os classifique em princípios fundamentais, vistos como os que contêm decisões políticas estruturais do Estado (ex.: princípio republicano, princípio federativo, princípio do Estado democrático de direito, princípio da separação de poderes, princípio presidencialista e princípio da livre iniciativa); princípios gerais, como desdobramento dos princípios fundamentais, incluindo-se entre eles o princípio da legalidade, da isonomia, do juiz natural; por fim, os princípios constitucionais setoriais ou especiais, vinculados a determinado assunto, como, por exemplo, princípio da legalidade tributária, princípio da legalidade penal, entre outros. (grifo original)

Assim, é nos princípios setoriais ou especiais que se podem identificar os princípios constitucionais de cada ramo do Direito, no caso do Direito do Trabalho temos o direito de greve (art. 9º); proteção da dispensa arbitrária ou sem justa causa (art. 7º, I); representação dos trabalhadores na empresa (art. 11); irredutibilidade de salários (art. 7º, VI); analisando de outra maneira temos que o trabalho escravo diverge do princípio da liberdade de trabalho; e o da liberdade de sindicalização não obriga ninguém a se associar, etc.

Em todas as relações jurídicas é presumida a boa-fé de seus participantes, salvo nos casos em que a lei expressamente presuma a má-fé de um indivíduo, quando este se comporta de determinada maneira, e assim também é no Direito do Trabalho.

O princípio da boa-fé não é peculiar do Direito do Trabalho, mas comum em todos os ramos do Direito, atuando nas diversas fases relação jurídica inclusive nas suas relações preliminares.

Esclarece Barros (2010, p. 188-189) o significado da boa-fé nas relações trabalhistas:

Esse princípio possui uma dimensão objetiva, que incide no direito obrigacional como regra de conduta a qual as partes deverão comportar-se com lealdade recíproca nas relações contratuais. Em sua dimensão subjetiva, a boa-fé assenta-se na crença que induz uma parte a agir equivocadamente, mas na absoluta convicção de que não está lesando interesses alheios juridicamente protegidos. A boa-fé subjetiva se encontra, em regra, no campo dos direitos reais, mas poderá ocorrer na órbita do Direito Previdenciário, quando o segurado recebe um benefício equivocadamente, sem noção de estar prejudicando o órgão previdenciário e a coletividade. (grifo original)

A boa-fé flexibiliza os institutos jurídicos, pois quando age, opõe os valores éticos, com o intuito de evitar os danos de uma interpretação literal da norma.

Barros (2010, p. 188-189) expõe que nas relações pré-contratuais as partes deverão obedecer ao princípio da boa-fé, não podendo o empregador abusar na seleção:

Desde a fase das negociações pré-contratuais, a boa-fé deverá presidir o comportamento das partes. Mesmo antes de o contrato ter sido concluído, as partes devem agir com retidão, conforme os valores éticos e sociais juridicamente protegidos e implícitos nas relações trabalhistas. A violação desse dever implica ressarcimento do dano emergente (gastos realizados) e do lucro cessante, que poderia ser obtido em outra contratação que não se realizou, dada a frustração da negociação anterior, sem prejuízo da compensação pelo dano moral acaso verificado. Dá-se, na hipótese, ‘abuso da liberdade de não contratar’, que constitui abuso de direito. (grifo original)

Todavia, a discussão em torno dessa temática é o fato de que, ao realizar essas consultas aos órgãos públicos, é saber se estas ferem ou não os princípios e direitos fundamentais da Constituição Federal, como o da privacidade, da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, da personalidade, dentre outros.

A dignidade da pessoa humana tida como princípio por Ruprecht (1995, p. 106) diz que “trata de elevar a consideração da pessoa que trabalha aos mesmos níveis das que utilizam seus serviços”, tem esse instituto utilizado como um escudo para não haver tratamentos discriminatórios em função da cor, sexo, idade, estado civil, orientação sexual e demais aspectos, além disso, o direito à intimidade uma das variáveis mais importantes da dignidade.

Assim, quando uma pessoa se candidata a uma vaga de emprego oferecida no mercado por uma empresa, deve-se presumir que ambas estão agindo de boa-fé, portanto, se o empregador se vale de consultas da conduta social dos candidatos, alegando isto ser necessário à contratação, como forma de justificar a não admissão de uma pessoa a vagas de emprego, tal atitude da empresa é tida como uma questão muito divergente no âmbito doutrinário.

O Professor de Direito e Processo do Trabalho da PUC-SP, Ricardo Pereira de Freitas Guimarães, discorda desse artifício na seleção, afirmando:

Muitos desempregados, por conta da falta de renda mensal, acabam utilizando os limites de crédito e, por vezes, não conseguem pagar suas dívidas. Ou seja, precisam do emprego para saldar o que devem. A pergunta é: vamos impedir essas pessoas de conseguir uma nova colocação profissional? Não me parece, com todo respeito, o melhor caminho (ESPECIALISTAS..., 2012, online).

Se faz necessário nesse momento a exploração do conceito de “privacidade”, pois este é o ponto onde se concentra toda a discussão desse tema. Szaniawski (1993, p. 367 apud BARROS, 2010, p. 147) descreve sobre proteção à vida privada como sendo,

[...] o poder determinante que todo indivíduo tem de assegurar a proteção de interesses extrapatrimoniais através de oposição a uma investigação na vida privada com a finalidade de assegurar a liberdade e a paz da vida pessoal e familiar.

De opinião contrária, Sônia Mascaro Nascimento, mestre e doutora em Direito do Trabalho, afirma que não existe discriminação e não fere o princípio da privacidade dos candidatos:

Se a reputação moral e a boa conduta fazem parte dos critérios de admissibilidade do empregado, as consultas aos órgãos públicos para esse fim, não ferem a privacidade, imagem ou a honra da pessoa. Também não é conduta discriminatória se tal consulta abrange todos os empregados ou candidatos aos cargos. Seria conduta discriminatória por parte do empregador e até mesmo caracterizaria perseguição no trabalho, se a consulta fosse dirigida a um indivíduo apenas ou um grupo de candidatos sem qualquer justificativa. No caso concreto, existe um motivo para tal procedimento pelo empregador: critério para a contratação de empregados. Não se trata de exigência aleatória (ESPECIALISTAS..., 2012, online).

Com esse pensamento, o candidato vê sua privacidade sendo invadida no momento em que há consultas/pesquisas da sua vida social, sem que estas tenham qualquer ligação à vaga de trabalho para a qual se candidatou, ficando impedido de exercer uma profissão pela simples conveniência e entendimento do empregador. Podendo concluir que as habilidades técnicas e o perfil profissional não são suficientes para conquistar o emprego.

Do outro lado, temos a empresa, que usa o seu poder diretivo para contratar os candidatos que melhor lhe convier, pois é ela quem assume os riscos da atividade econômica, e para obtenção de melhores resultados se utilizam de um processo de seleção que acha necessário para selecionar profissionais, de acordo com atribuições e competências de exigidas pelo cargo.

Finalmente, cumpre salientar que o equilíbrio entre os dois polos dessa relação devem ser norteados pelos princípios constitucionais, pois “tanto a proteção à intimidade como à vida privada devem ter como fundamento maior a proteção à dignidade da pessoa humana, da qual emana toda e qualquer proteção ao indivíduo” (QUEIROZ, online).

 1.2 Princípios do direito do trabalho

Os princípios peculiares do Direito do Trabalho são aqueles que inspiram o ordenamento jurídico-trabalhista, sendo estes bem específicos, pois tem características que não podem ser encontradas em outros ramos do Direito.

“Esses princípios têm como funções informar o legislador, orientar o Juiz na sua atividade interpretativa, e, por fim, integrar o direito, que é sua função normativa”, esclarece Barros (2010, p. 180). (grifo original)

Ao ser analisadas as situações, o juiz deve basear suas decisões não apenas nas normas trabalhistas positivadas pelo legislador, cumpre também, respeitar os princípios, conforme o ramo juslaboral se desenvolve, novos princípios vão surgir, deve-se isso as mudanças ocorridas na sociedade.

Os princípios trabalhistas enumerados pela maior parte da doutrina, e tidos como os mais importantes e especiais na classificação de Delgado (2010, p. 182): princípio da proteção, princípio da norma mais favorável, princípio da imperatividade das normas trabalhistas, princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, princípio da condição mais benéfica, princípio da inalterabilidade contratual lesiva, princípio da intangibilidade salarial, princípio da primazia da realidade; e princípio da continuidade da relação de emprego; esses 9 (nove) princípios formam o núcleo basilar dos princípios especiais do Direito do Trabalho.

É importante definir aqueles que são passíveis de ser aplicados no caso em estudo, ou seja, na seleção de funcionários, na fase que antecede a contratação. Sendo aqui analisado o princípio da proteção.

Grande parte da doutrina aponta o princípio da proteção como sendo a estrutura do Direito do Trabalho, pois influi em todas as suas atuações e características, leciona Delgado (2010, p. 183):

[...] este princípio que o Direito do Trabalho estrutura em seu interior, com suas regras, institutos, princípios e presunções próprias, uma teia de proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia – o obreiro -, visando retificar (ou atenuar), no plano jurídico, o desequilíbrio inerente ao plano fático do contrato de trabalho.

O princípio tutelar influi em todos os segmentos do Direito Individual do Trabalho, influindo na própria perspectiva desse ramo ao construir-se, desenvolver-se e atuar como direito. Efetivamente, há ampla predominância nesse ramo jurídico especializado de regras essencialmente protetivas, tutelares da vontade e interesses obreiros; seus princípios são fundamentalmente favoráveis ao trabalhador; suas presunções são elaboradas em vista do alcance da mesma vantagem jurídica retificadora da diferenciação social prática. Na verdade, pode-se afirmar que sem a ideia protetivo-retificadora, o Direito Individual do Trabalho não se justificaria histórica e cientificamente.

Seu propósito é tentar corrigir as desigualdades na relação trabalhista, pois o empregado é o hipossuficiente, cria-se aqui uma superioridade jurídica em relação ao trabalhador. E na hipótese da seleção de candidatos, não deve o empregador exigir atribuições e informações que não estejam relacionados à atividade laboral a ser exercida.

Outro princípio do Direito do Trabalho é mencionado e explorado por Barros (2010, p. 194) é o da adequação social, que está intimamente ligado ao contexto social e momento histórico que as relações são discutidas, demonstra:

À luz dessa disciplina, o princípio está compreendido no conceito segundo o qual ‘as normas trabalhistas deverão ser interpretadas e aplicadas de acordo com o sentir social dominante de cada realidade positiva, em cada momento histórico, e as condutas dos sujeitos terão de ser avaliadas em função de sua adequação às exigências sociais’. A jurisprudência tem que reconhecer a cada momento as inovações do direito legislado e as aspirações sociais, quando compatíveis com os textos legais.

Logo, é necessário usar o elemento sociológico, os fatores econômicos, políticos, morais que demonstrem a vontade e necessidade da comunidade no momento da aplicação da norma, o aplicador na norma utiliza esse princípio para suavizar a aplicação do direito no caso concreto.

Por fim, os princípios são grandes norteadores, essenciais para a aplicação e compreensão do Direito nas relações humanas. “Isso significa que sem a presença e observância cultural e normativa desse núcleo basilar de princípios especiais, [...] compromete-se a própria noção de Direito do Trabalho em certa sociedade histórica concreta” (DELGADO, 2010, p. 182-183).

1.3 Análise jurisprudencial

Uma vez analisado o tema no campo doutrinário, discutiremos agora como a jurisprudência pátria se posiciona nesse fértil e instável campo de estudo.

A jurisprudência é uma das fontes do direito, ela resulta das mudanças ocorridas na aplicação do direito em dissídios passados, se tornando uma nova forma de interpretar e aplicar a norma jurídica, e que passa a ser aplicada pelos tribunais nos casos concretos semelhantes.

A Professora Diniz (1993, p. 265) conceitua jurisprudência como sendo “o conjunto de decisões uniformes e constantes dos tribunais, resultantes da aplicação de normas a casos semelhantes, constituindo uma norma geral aplicável a todas as hipóteses similares ou idênticas”.

Com o advento da EC Nº45, se sabe que a atuação do Direito do Trabalho foi ampliada, sendo discutidos hoje nos tribunais os problemas ocasionados nas relações trabalhistas, incluindo-se aqui aqueles que antecedem a relação trabalhista, a fase pré-contratual.

O tema aqui abordado não é discutido com grande frequência nos tribunais, são poucos os julgados que versam sobre o assunto, um deles, o qual fez surgir toda essa discussão, trata-se de uma Ação Civil Pública contra a G. Barbosa Comercial Ltda., rede de lojas de Aracaju, movida pelo Ministério Público do Trabalho – MPT da 20ª Região (SE), com o intuito de impedir a empresa de realizar pesquisa no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), na Centralização dos Serviços dos Bancos (Serasa) e em órgãos policiais e do Poder Judiciário com a finalidade de subsidiar processo de seleção para contratação de empregados.

O Tribunal Superior do Trabalho no seu site apresenta todo teor envolvendo o caso, aqui apresentar-se-á a introdução:

Utilizar no processo de contratação de empregados a consulta a serviços de proteção ao crédito e a órgãos policiais e do Poder Judiciário não é fator de discriminação, e sim critério de seleção de pessoal que leva em conta a conduta individual. Com esse argumento, a G. Barbosa Comercial Ltda., rede de lojas de Aracaju (SE), conseguiu evitar, na Justiça do Trabalho, condenação por prática discriminatória e dano moral coletivo.

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou apelo do Ministério Público do Trabalho da 20ª Região (SE), ao não conhecer do seu recurso de revista. Por meio de ação civil pública, o MPT pretendia impedir a empresa de realizar pesquisa no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), na Centralização dos Serviços dos Bancos (Serasa) e em órgãos policiais e do Poder Judiciário com a finalidade de subsidiar processo de seleção para contratação de empregados. No recurso ao TST, o MPT alegou que a decisão regional violou os artigos 1º, inciso III, 3º, inciso IV, 5º, inciso X, da Constituição da República, e 1º da Lei 9.029/1995, sustentando que a conduta da empresa é discriminatória. (TAVARES, 2012, online)

E finalizando a análise do caso, tem-se:

Ao examinar o caso, o relator do recurso de revista, ministro Renato de Lacerda Paiva, frisou que os cadastros de pesquisas analisados pela G. Barbosa são públicos, de acesso irrestrito, e não há como admitir que a conduta tenha violado a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Destacou também que, se não há proibição legal à existência de serviços de proteção ao crédito, de registros policiais e judiciais, menos ainda à possibilidade de algum interessado pesquisar esses dados.

Nesse sentido, o ministro salientou que, "se a Administração Pública, em praticamente todos os processos seletivos que realiza, exige dos candidatos, além do conhecimento técnico de cada área, inúmeros comprovantes de boa conduta e reputação, não há como vedar ao empregador o acesso a cadastros públicos como mais um mecanismo de melhor selecionar candidatos às suas vagas de emprego".

Preocupado com a questão de que, quanto à análise de pendências judiciais pela G. Barbosa, houvesse alguma restrição quanto à contratação de candidatos que tivessem proposto ações na Justiça do Trabalho, o ministro José Roberto Freire Pimenta levantou o problema, mas verificou que não havia nada nesse sentido contra a empresa. O empregador, segundo o ministro, tem todo o direito de, no momento de contratar, apurar a conduta do candidato, porque depois, questionou, "como é que faz para rescindir"? Em decisão unânime, a Segunda Turma não conheceu do recurso. (TAVARES, 2012, online)

Assim, o TRT de Sergipe entendeu que a empresa poderia consultar bancos de dados públicos para eliminar os candidatos do processo seletivo.

O MPT, visando alterar tal decisão, apresentou o Recurso de Revista, perante o TST, mas este não foi aceito. Isso significa que os Ministros do TST não analisaram o mérito da discussão.

O não reconhecimento do recurso pelo TST teve a seguinte redação:

2 - PROCESSO DE SELEÇÃO - PESQUISA SOBRE A CONDUTA PESSOAL DO CANDIDATO

CONHECIMENTO

O recorrente alegou que o acórdão recorrido violou os artigos 1º, III, 3º, IV, 5º, X, da CF/88, 1º, da Lei nº 9.029/1995, sustentando, em síntese, que a conduta da reclamada é discriminatória e fere os dispositivos legais em destaque.

O artigo 1º, III, da CF/88, insere-se como um dos ‘fundamentos’ da República Federativa do Brasil, relacionado à ‘dignidade da pessoa humana’, matéria esta totalmente estranha à controvérsia dos autos, que aborda pedido de obrigação de não fazer, abstenção de prática supostamente discriminatória, cumulado com indenização por dano moral coletivo.

Além disso, referido preceito tem caráter eminentemente genérico, inaplicável à hipótese vertente.

No mesmo sentido, não se reconhece a alegada violação direta e literal ao artigo 3º, IV, da CF/88, que também de forma genérica estabelece os ‘objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil’, dentre os quais ‘promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.’.

O artigo 5º, X, da CF/88 dispõe que ‘são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;’.

Se os cadastros de pesquisas analisados pela reclamada são públicos, de acesso irrestrito à toda a coletividade, não há como admitir que a conduta da empresa tenha violado a ‘intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas’.

O artigo 1º da Lei nº 9029/95 dispõe, in verbis:

‘Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal’.

Referido dispositivo, contudo, trata especificamente de práticas discriminatórias relacionadas a ‘motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade’, não tendo qualquer pertinência com a prática da reclamada em realizar prévia consulta sobre a conduta dos candidatos às vagas de trabalho disponibilizadas pela empresa.

Se não há qualquer vedação legal à própria existência de serviços de proteção ao crédito (SPC e SERASA), de registros policiais e judiciais, menos ainda poderia ocorrer quanto à possibilidade de algum interessado pesquisar tais dados, a fim de melhor avaliar os riscos a serem enfrentados caso decida realizar o negócio jurídico que tem em mente, e, mais especificamente, à contratação de empregados.

Como bem salientado pelo acórdão recorrido, ‘não se pode retirar do empresário o direito de separar e escolher para o seu serviço, dentre os candidatos que se apresentam, aqueles que são portadores das qualificações técnicas necessárias e cuja conduta pessoal não se desvia da normalidade’.

Se a Administração Pública, em praticamente todos os processos seletivos que realiza, exige dos candidatos, além do conhecimento técnico de cada área, inúmeros comprovantes de boa conduta e reputação, não há como vedar ao particular, no caso o empregador, o acesso a cadastros públicos como mais mecanismo de melhor selecionar candidatos às suas vagas de emprego, mesmo porque todos estes cadastros detém natureza pública, de acesso irrestrito a qualquer interessado, salvo as exceções legais.

Não conheço.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista.

Brasília, 08 de fevereiro de 2012 (PROCESSO Nº TST-RR-38100-27.2003.5.20.0005).

Quanto a este caso da empresa G. Barbosa em Sergipe, o advogado da área trabalhista, Carlos Eduardo Dantas Costa, explica a decisão da turma do TST, e como esta decisão pode representar uma mudança no entendimento jurisprudencial, não devendo ser aplicada na generalidade dos casos, expõe:

É preciso interpretar esta nova decisão com cautela, até porque foi adotada na análise de um caso concreto, por uma das oito turmas existentes no TST. Ou seja, a decisão não legitima esse tipo de procedimento. Vale ressaltar que para que a empresa não proceda de forma discriminatória, deve verificar se o candidato possui os requisitos técnicos para prestar o serviço a que se propõe. Dependendo do cargo (como gerente financeiro, caixa de banco, transportador de valores etc.) a ser exercido e do tipo de empresa, outras consultas podem ser justificáveis, o que exige análise caso a caso. Outras investigações, como consultas aos órgãos de crédito, órgãos policiais e ao Poder Judiciário poderão ser entendidas (e, na maioria das vezes, de fato o são) como discriminatórias (ESPECIALISTAS..., 2012, online).

Nosso Professor Eduardo Pragmácio Filho, também comenta sobre o assunto:

O tema é bastante delicado e gera opiniões diversas. A situação gira em torno do poder diretivo do empregador, para saber se o exercício desse direito é abusivo ao se consultar o cadastro de inadimplentes de um candidato. Ao meu ver não há abuso. O TST agiu acertadamente. É bom lembrar que o contrato de trabalho é fiduciário e se baseia na confiança mútua (DIANA, 2012, online).

Antes dessa ação, o TST e outros tribunais decidiam que as condutas de pesquisar os dados dos candidatos eram tidas como discriminatória e invasiva. Cumpre, assim, transcrever a ementa de um acórdão proferido pelo TST, em 2008, com o entendimento de que é tida como discriminatória a consulta ao SPC e ao SERASA para fins de processo seletivo de trabalhadores:

I) RECURSO DE REVISTA DA EMPRESA-RÉ - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - OBRIGAÇÃO DE NÃO-FAZER - OBTENÇÃO DE INFORMAÇÕES CREDITÍCIAS NO SERASA - REQUISITO PARA A REALIZAÇÃO DE CONTRATAÇÕES. 1. Conforme dispõe o art. 5º, XXXIII, da CF, todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. 2. No caso, o Regional manteve a sentença na parte em que condenou a Empresa-Ré a abster-se de utilizar banco de dados, tomar ou prestar informações creditícias relativas a empregados ou a candidatos a emprego. Salientou que o SERASA não se destina ao fim pretendido pela Ré, que somente poderia consultá-lo para verificar a idoneidade de seus clientes (futuros devedores) e não de seus empregados ou candidatos a emprego, que são, ou passariam a ser, credores dos salários. 3. O acórdão recorrido não viola o dispositivo constitucional mencionado, pois não restou demonstrado qual o interesse da Empresa em obter tais informações sobre seus empregados e os candidatos a emprego. Na verdade, o Regional entendeu que o empenho da Ré em granjear essas informações tinha o único objetivo de discriminar. Ademais, não aproveita à Recorrente a tese de afronta ao art. 5º, ‘caput’, da CF, que contém norma genérica e somente poderia ser violado de forma reflexa, o que não se coaduna com o art. 896, ‘c’, da CLT. Recurso de revista da Empresa-Ré não conhecido. II) RECURSO DE REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COLETIVOS - CERTIDÕES DE ANTECEDENTES CRIMINAIS E DE AÇÕES TRABALHISTAS AJUIZADAS. 1. Segundo a diretriz da Súmula 126 do TST, é incabível o recurso de revista para reexame de fatos e provas. 2. No caso, o Regional deixou claro que o fato de a Empresa-Ré exigir que os candidatos a empregos apresentassem certidões de antecedentes criminais, por si só, não é suficiente para ensejar o pagamento da indenização por danos morais, nem caracteriza ato discriminatório a ser vedado. Salientou que o intuito da Ré era conhecer o perfil exato das pessoas recrutadas e colocá-las em função compatível, impossibilitando, por exemplo, que uma pessoa com antecedentes de furto ocupasse a função de caixa. Além disso, frisou que cabia ao Autor o ônus de provar a conduta discriminatória, principalmente a alegada compra de informações acerca do ajuizamento de ações por parte dos candidatos a empregos, a lesão à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, ônus do qual não se desincumbiu a contento. 3. Sendo assim, não há como divisar violação dos arts. 1º da Lei 9.029/95, 186 e 927 do CC e 5º, X, da CF, dados os pressupostos fáticos nos quais se lastreou o Regional, não mais discutíveis nesta Instância, de natureza extraordinária. Recurso de revista do Ministério Público do Trabalho não conhecido. (grifou-se ED-RR - 9892100-27.2004.5.09.0014, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 21/05/2008, 7ª Turma, Data de Publicação: 30/05/2008).

Segue, aqui, ementas dos acórdãos de diferentes tribunais, com o mesmo entendimento perseguido pelo TST na jurisprudência anterior:

TRT-PR-08-07-2011 CONSULTA JUNTO AO SPC E AO SERASA PARA FINS DE CONTRATAÇÃO DE EMPREGADO. DANO MORAL CONFIGURADO. A consulta a órgãos que prestam serviços de proteção ao crédito apenas se mostra aceitável na hipótese de concessão de empréstimo ou na possibilidade de se firmar contrato oneroso em que o trabalhador figurasse como devedor. Se o obreiro possui dívidas, tal não pode configurar fato impeditivo para que obtenha o emprego ou nele permaneça, e a consulta a pendências financeiras constitui flagrante ofensa à intimidade, o que enseja o pagamento de compensação por dano moral, nos termos dos arts. 5º, X, da CRFB, 186 e 927, do CC. (TRT-PR-30471-2009-084-09-00-3-ACO-27089-2011 - 2A. TURMA; Relator: ROSALIE MICHAELE BACILA BATISTA; Publicado no DEJT em 08-07-2011)

 

TRT-PR-20-01-2009 PROCESSO SELETIVO PARA CONTRATAÇÃO DE ESTAGIÁRIO - CONSULTA AO SERASA - EXCLUSÃO / NÃO ADMISSÃO DO CANDIDATO - CONDUTA DISCRIMINATÓRIA - DANO MORAL - PRECEDENTE DO C. TST

A não admissão ou exclusão do processo seletivo para estágio na PETROBRÁS, pela circunstância de ter ser nome inscrito no SERASA, gera abalo moral, o qual não necessita de comprovação, visto que a conduta da ré, por si só, já é geradora de dor psíquica e sentimento de invasão de privacidade e de exposição da vida pessoal do autor perante a família e a sociedade. O dano moral não exige prova cabal, eis que se trata de abalo interno, psíquico, que não necessita de demonstração robusta, bastando a análise dos fatos em que estava inserida a vítima.

Os males acarretados pela conduta da ré violaram diretamente a honra subjetiva do autor, elemento integrante da honra em sentido lato, ligada intimamente à auto estima do trabalhador, o que trouxe transtornos morais à sua pessoa, ferindo em última análise a própria dignidade do homem enquanto homo faber.

Para fins legais, a atitude da ré possui a mesma consequência do ato ilícito, ou seja, dela se origina o dever de indenizar o sujeito de direito lesado (Novo Código Civil, art. 187. Ademais, a pretensão inicial também e contra amparo nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho e da não discriminação (grifou-se, TRT-PR-05811-2007-594-09-00-4-ACO-00278-2009 - 2A. TURMA; Relator: ANA CAROLINA ZAINA; Publicado no DJPR em 20-01-2009).

Mas, nesse ano, 2014, o TST não reconheceu o recurso de revista de uma empresa que foi condenada a pagar uma indenização a uma candidata a emprego, a trabalhadora teve sua contratação frustrada depois de participar de todo processo seletivo, onde foi submetida a exame admissional, fez a entrega de toda a documentação, inclusive abrir conta correte em um banco para recebimento de salário.

Após todo o processo, a empresa a comunicou que não seria mais possível sua contratação, pois ela não havia preenchido os requisitos desejados, mas para a candidata a sua contratação foi cancelada pelo fato de ter chegado ao conhecimento dos administradores que ela estaria em uma união estável com um ex-funcionário que estaria movendo reclamação trabalhista contra a empresa.

A 19ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, entendeu que a candidata ser submetida a todas as etapas do processo seletivo e no final não ser contratada, apesar de ter sido aprovada, viola a integridade moral da trabalhadora. Julgando procedente a ação, condenando a empresa em R$ 2.000,00 (Dois mil reais) por danos morais.

A empresa, Precon, recorreu no TRT da 3ª Região, Minas Gerais, que negou provimento ao recurso.

Novamente, a empresa recorreu, mas a 6ª Turma do TST negou o agravo, segue acórdão deste colendo tribunal:

A C Ó R D Ã O

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CONTRATAÇÃO FRUSTRADA. DANO PRÉ- CONTRATUAL. CONFIGURAÇÃO. NÃO PROVIMENTO. Nega-se provimento a agravo de instrumento pelo qual o recorrente não consegue infirmar os fundamentos do despacho denegatório do recurso de revista.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-1446-55.2012.5.03.0019, em que é Agravante PRECON INDUSTRIAL S.A. e Agravada VERÔNICA RODRIGUES DA SILVA.

O juízo primeiro de admissibilidade, a fls. 171/172, negou seguimento ao recurso de revista, por não ter constatado violação de lei, tampouco divergência jurisprudencial.

A parte interpôs agravo de instrumento, a fls. 185/186, com base no art. 897, b, da CLT.

Contraminuta e contrarrazões apresentadas a fls. 190/193 e 195/198.

O Ministério Público do Trabalho não se manifestou nos autos.

É o relatório.

V O T O

1. CONHECIMENTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento.

2. MÉRITO

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CONTRATAÇÃO FRUSTRADA. DANO PRÉ-CONTRATUAL. CONFIGURAÇÃO

O Tribunal Regional, juízo primeiro de admissibilidade do recurso de revista (art. 682, IX, da CLT), denegou-lhe seguimento, adotando os seguintes fundamentos:

PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS

Responsabilidade Civil do Empregador/Empregado / Indenização por Dano Moral.

Analisados os fundamentos do v. acórdão, verifico que o recurso, em seu tema e desdobramentos, não logrou demonstrar divergência jurisprudencial válida e específica, tampouco violação literal e direta de qualquer dispositivo de lei federal (arts. 113, 187, 422 e 427 do CC) e/ou da Constituição da República, como exige o artigo 896, alíneas ‘a’ e ‘c’, da Consolidação das Leis do Trabalho.

Com efeito, a análise das alegações suscitadas pela parte demandaria reexame de fatos e provas, o que encontra óbice na Súmula 126/TST.

Além do mais, o posicionamento adotado pela d. Turma traduz, no seu entender, a melhor aplicação que se pode dar aos dispositivos legais pertinentes, o que torna inviável o processamento da revista, além de impedir o seu seguimento por supostas lesões à legislação ordinária.

Por fim, verifico que são inespecíficos os arestos colacionados, porque não abordam todos os fundamentos da r. decisão recorrida, como a aprovação da reclamante, bem como a abertura de conta bancária para recebimento do salário e ainda a apresentação dos documentos relacionados em lista indicada como ‘documentos necessários para admissão’. (Súmula 23/TST).

CONCLUSÃO

DENEGO seguimento ao recurso de revista.

Nas razões do agravo de instrumento, o agravante não conseguiu infirmar os fundamentos que embasaram o não seguimento do recurso de revista, os quais, pelo seu acerto, adoto como razões de decidir.

Acrescente-se, por oportuno, que o Tribunal Regional, com base no conjunto fático-probatório dos autos, insuscetível de reexame nesta fase extraordinária, ao teor da Súmula nº 126 do TST, concluiu que foi praticado ato ilícito pela reclamada, pois a reclamante participou de todo o processo seletivo, foi submetida a exame admissional e entregou documentos para a contratação, e, depois, injustificadamente, a reclamada não a contratou, o que configurou ofensa ao princípio da boa-fé, aplicável ao contrato de trabalho, inclusive, na fase pré-contratual. Sob o enfoque probatório, não há como se chegar a conclusão contrária nesta esfera recursal, pois, nos termos da Súmula nº 126 do TST, é vedado o reexame do conteúdo das provas produzidas e a sua valoração.

Pelo exposto, mantenho o despacho agravado e nego provimento ao agravo de instrumento.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento.

Brasília, 26 de Fevereiro de 2014.

Pode ser concluído desta jurisprudência que, uma conduta social da candidata gerou a sua não contratação, sendo suficiente para não contratá-la pelo fato de estar em uma relação amorosa com um ex-funcionário, ficando nítida a má-fé da empresa.

Contudo, com a não aceitação do recurso de revista pelo TST no caso G. Barbosa, e com a negativa de provimento do agravo de instrumento contra a candidata neste último caso apresentado, demonstra a lacuna existente, causando em diversos casos concretos transtornos às partes, pois com a falta de uma norma ou entendimento consolidado, sempre haverá uma forma de ambas as partes motivarem o judiciário em defesa do que acham ser seu direito.

1.4 Indicadores para solucionar a problemática

A solução dos problemas envolvendo os direitos fundamentais do candidato e do empregador deve ser apreciado de acordo com as circunstâncias que envolvem o caso concreto, devendo ser aplicada a solução adequada, usando a razoabilidade na proporção dos meios e fins.

Ruprecht (1995, p. 96) diz que deve-se utilizar o princípio da racionalidade, da colaboração, da não discriminação, da justiça social, da equidade, da gratuidade nos procedimentos judiciais e administrativos e da integralidade do salário.

O fato de encontrar-se com o nome inscrito nos cadastros públicos não guarda relação com a capacidade de ocupação no mercado de trabalho. Deve haver uma investigação do motivo que levou seu nome a ser inserido nesses cadastros, para depois, avaliar se a situação é incompatível com o trabalho, o Professor de Direito do Consumidor Guglinski (2012, online) salienta:

E um detalhe importante chama a atenção para que se compreenda claramente a questão: ainda que se force uma situação para que se reconheça a legitimidade de se considerar o devedor inadimplente como inapto a ser digno de uma vaga de emprego na iniciativa privada ou na esfera pública, dever-se-ia investigar se sua inadimplência é voluntária, habitual, isto é, se o indivíduo descumpre suas obrigações de forma acintosa, o que, ainda assim, no nosso entender nenhuma relação guarda com a negativa de ocupação de vaga no mercado de trabalho.

Cumpre destacar que a empresa não deve agir sem limites e sem respeitar as normas gerais do Direito, argumenta Pantaleão (2014, online):

A grande preocupação do legislador foi de, dentro deste direito atribuído à empresa, assegurar que os candidatos pudessem ter uma participação imparcial e que os princípios atribuídos pela Constituição Federal do direito ao trabalho, à igualdade, à dignidade da pessoa humana, bem como o combate a qualquer ato discriminatório, pudessem ser assegurados nos processos de seleção.

As exigências não são preconceituosas e se justificam pela dignidade e magnitude dos cargos a serem ocupados, nos casos de se tratar de profissões que lidam diretamente com dinheiro, como bancos e caixas de supermercado, porém, não deixam de ser discriminatórias, mas na medida em que é essencial para o exercício profissional.

Pelo fato das decisões proferidas no TST serem divergentes, causa a situação que foi discutida em todo o trabalho, pois quando reconhecem que estar inadimplente e negativado em arquivos de consumo revelam a inidoneidade moral de quem se candidata a vagas de emprego, afirmam a ideia de que pode utilizar as informações desses arquivos como meio hábil a obstar o exercício do direito fundamental ao exercício profissional.

Guglinski (2012, online) lembra:

[...] ainda, que vivemos na era da solidariedade, iluminada pelos direitos de terceira geração, os quais extraem seus fundamentos do princípio da solidariedade, sendo certo que promover a inserção do trabalhador no mercado de trabalho é também um dever do empregador/empresário, baseado na função social do contrato, podendo-se afirmar que a função social de um contrato de trabalho, por certo, não encontra fundamento na mão-de-obra como fator de produção, em sua feição empresarial, mas exatamente no princípio da dignidade humana.

[...]

Indispensável consignar que a maior parcela da nossa população enfrenta dificuldades financeiras de toda a ordem, até mesmo em razão do abuso de poder econômico desses mesmos empresários que vedam o ingresso ou reinserção de trabalhadores no mercado de trabalho, adotando práticas hediondas como esta de bisbilhotar a vida privada de eventuais empregados, sendo fato notório que o próprio Estado assegura proteção a esses poderosos conglomerados econômicos, como de fato o fez o TST na decisão alhures mencionada, em detrimento dos direitos e garantias individuais elencados na Constituição Federal. Não se pode, ainda, ignorar que nessa era digital, de alto fluxo de informações no ambiente da internet, em que empresários não se asseguram de que quem contrata é realmente o titular das informações que lhes são passadas no ambiente virtual, por telefone etc., inúmeras fraudes são praticadas por estelionatários, valendo-se de dados de terceiros, obtidos clandestinamente. Isso faz com que o nome de muitos consumidores sejam inseridos em bancos de dados e cadastros de inadimplentes, sem que sejam os verdadeiros devedores, o que torna esse critério de admissão em vaga de emprego ainda mais danoso.

Uma tentativa para resolver essas contradições seria a criação de uma norma que tratasse da matéria, um projeto já existe, Projeto de Lei nº 465/09, de autoria do Senador Paulo Paim (PT-RS), que objetiva proibir a discriminação de trabalhadores que buscam um emprego com base em informações negativas em cadastros de inadimplentes.

Paulo Paim justifica seu projeto: "se um candidato, inserido no cadastro de proteção ao crédito e assim penalizado por deixar de honrar com suas obrigações financeiras em razão do desemprego, é desclassificado à vaga de emprego em razão do não-cumprimento destas obrigações, acabará sofrendo uma dupla penalidade”. (PAIM..., 2010, online)

Esse projeto foi aprovado em agosto de 2010 pela Comissão de Assuntos Sociais em caráter terminativo, mas ainda está em tramitação para votação na Câmara dos Deputados.             Outra forma de resolver tal situação é se valer da aplicação do direito estrangeiro, conforme dispõe o art. 8º da Consolidação das Leis Trabalho “in verbis”:

Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

Parágrafo único - O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

Utilizando o direito comparado conforme expõe o artigo acima demonstrado, pode ser aplicado no âmbito do Direito do Trabalho por meio da analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, o art. 17 do Código do Trabalho Português, que aborda de maneira objetiva e clara sobre a proteção dos dados pessoais de trabalhadores, “in literis”:

Artigo 17.º

Protecção de dados pessoais

1 – O empregador não pode exigir a candidato a emprego ou a trabalhador que preste informações relativas:

a) À sua vida privada, salvo quando estas sejam estritamente necessárias e relevantes para avaliar da respectiva aptidão no que respeita à execução do contrato de trabalho e seja fornecida por escrito a respectiva fundamentação;

b) À sua saúde ou estado de gravidez, salvo quando particulares exigências inerentes à natureza da actividade profissional o justifiquem e seja fornecida por escrito a respectiva fundamentação.

2 – As informações previstas na alínea b) do número anterior são prestadas a médico, que só pode comunicar ao empregador se o trabalhador está ou não apto a desempenhar a actividade.

3 – O candidato a emprego ou o trabalhador que haja fornecido informações de índole pessoal goza do direito ao controlo dos respectivos dados pessoais, podendo tomar conhecimento do seu teor e dos fins a que se destinam, bem como exigir a sua rectificação e actualização.

4 – Os ficheiros e acessos informáticos utilizados pelo empregador para tratamento de dados pessoais do candidato a emprego ou trabalhador ficam sujeitos à legislação em vigor relativa à protecção de dados pessoais.

5 – Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto nos n.os 1 ou 2.

Até que seja dada uma solução pelo legislador, deverão as partes dessa relação pré-contratual conduzirem a negociação de acordos com os princípios gerias do Direito e os que são essenciais ao Direito do Trabalho.