Análise crítica da incidência do princípio da insignificância no crime de descaminho e ônus sofrido pela Instituição Fazendária frente às práticas cotidianas[1]

Fernando Pinto Morais

Jéssica Mendes Campos[2]

 

Introdução; 1 Considerações gerais sobre o descaminho; 2 O princípio da insignificância como excludente de tipicidade; 3 Análise critica da incidência do princípio da insignificância no crime de descaminho e ônus sofrido pela Instituição Fazendária frente às práticas cotidianas; Considerações finais

 

RESUMO

O presente estudo apresenta como objeto de estudo a incidência do princípio da insignificância no crime de descaminho. Desenvolvido por meio de pesquisa bibliográfica, buscou-se identificar nas praticas cotidianas do descaminho à ofensa direta ao interesse da Fazenda Pública Nacional e a incolumidade do regime de importação e exportação do país, além de compreensão da concorrência desleal. Aborda-se primeiramente as peculiaridades do descaminho, distinguindo-o do crime de contrabando e dos demais delitos de natureza tributária. No segundo capítulo disserta-se acerca do principio da insignificância e a utilização do mesmo como critério objetivo de excludente da tipicidade material em relação ao crime tratado. Na sequência ergue-se o cerne da questão, as consequência jurídicas do crime no contexto das obrigações tributárias. Por fim, mostra-se o principio da insignificância aplicado ao crime de descaminho e contrabando por meio das jurisprudências para analisar os critérios utilizados e a unicidade das decisões dos tribunais e se tal uso instiga a insegurança jurídica.

Palavras – chave: descaminho; principio da insignificância; crime fazendário

 

Introdução

O objetivo central do presente trabalho é analisar os reflexos da aplicação do Princípio da Insignificância na conduta delituosa do crime de Descaminho, tipificado no art. 334 do Código Penal. Partindo do ponto que o Descaminho é caracterizado pela entrada ou saída de mercadoria, para importação ou exportação, que são permitidas, mas que não foram submetidas à devida regulamentação, é notório a relevância do tema devido à relação direta com evasão fiscal e o ônus sofrido pelos cofres públicos, de modo tal que a existência dessa conduta atinge não só o interesse do fisco, como também o interesse público.

Parte-se, portanto, da análise do tipo penal, que fora considerado pelo legislador como semelhante a outro crime, qual seja, o crime de Contrabando. Ambas as condutas encontram-se tipificadas no mesmo artigo, o artigo 334, do Código Penal. Apesar disso, as condutas diferem-se intrinsecamente e é nesse sentido que o primeiro capítulo pretende delimitar as características gerais do crime de Descaminho, individualizando-o, tratando de suas peculiaridades e diferenciando do crime incidente no mesmo artigo no que couber.

Faz-se importante também a análise do Princípio da Insignificância, que por ser um conceito jurídico indeterminado, requer certo cuidado na delimitação do dano e do grau de lesão ao bem jurídico protegido. Dessa forma, no segundo capítulo busca-se entender como o princípio é aplicado de modo a ser justa a desconsideração da incidência do tipo penal, quais são as considerações feitas e se os critérios são suficientes para evitar a distorção do mesmo, o uso desenfreado e a utilização de critérios subjetivos do aplicador do direito.

Ademais, necessário se faz justificar a necessidade da interferência do direito penal em tais condutas. Nesse sentido, presta-se o terceiro capítulo para pormenorizar a peculiaridade à incidência do patamar fiscal adotado para o valor mínimo que a dívida ativa da União deve atingir para que se inicie o ajuizamento de execuções fiscais. Assim, toda conduta incidente no crime de Descaminho que não atinja o valor de R$ 10.000,00[3] é considerada penalmente atípica.

Pretende-se nesse último capítulo realizar a análise crítica de que trata o tema, consagrando a coerência da consolidação de um valor prefixado para que se aplique o art. 344 com base no princípio da insignificância a fim de que o referido artigo não se transforme em uma norma penal ineficaz. Trata ainda da aceitação social, da conseqüente concorrência desleal, bem como das medidas de conscientização e educação fiscal existente à disposição da sociedade.

  1.  Considerações gerais sobre o descaminho

O Descaminho, juntamente com o crime de Contrabando, é previsto no art. 334, que assim dispõe: “importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria”.

A união das duas condutas em um só tipo penal dá-se pelo tratamento feito pelo legislador, como se fossem a mesma conduta.Tal atuação legiferante fora objeto de crítica feita por BITENCOURT (2012, p. 254) que entende que ignorou-se a realidade de tais condutas quando do entendimento de serem iguais, e não só, ignorou-se também o desvalor de cada ação.

De acordo com a logística do Código Penal, tem-se que a conduta do Descaminho incide nos crimes praticados por particular contra a administração em geral, no sentido lato sensu. Não se olvida que se protege aqui a administração pública, diretamente atingida com a dispersão da renda resultante dessas atividades, mas deve-se considerar que abrange, além do aspecto patrimonial, o erário publico, a própria moralidade pública, o prestígio e o decoro da administração pública.

Não destoa desse entendimento o Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região no julgamento do HC nº 200803000042027:

O crime de descaminho não ofende somente o erário, atingindo também a soberania nacional, a autodeterminação do Estado, a segurança nacional e a eficácia das políticas governamentais de defesa do desenvolvimento da indústria pátria. Por isso, o descaminho é classificado como crime contra a Administração Pública e contra a ordem tributária[4]. (HC nº 200803000042027).

Trata-se fundamentalmente de um delito de natureza fiscal, considerado por BITENCOURT (2012, p.256) como uma espécie de “contrabando contra o fisco”. Aproxima-se assim, do crime de Sonegação Fiscal, visto que ambas resultam da conduta de subtração de impostos ao fisco, porém, afastam-se no sentido dos bens jurídicos tutelados por cada um, uma vez que no crime de descaminho, como já fora falado, o bem jurídico é amplo, e ainda, é perceptível pela análise da diferença das penas impostas a cada um[5].

Nesse mesmo sentido, necessário se faz levantar a distinção também do crime de Descaminho com o crime de Contrabando, visto que são as duas figuras típicas[6] previstas pelo artigo 334, CP, e que muito embora, tem conteúdo, bem jurídico tutelado, objeto material, e significado distintos. Acerca do crime de Descaminho o STJ pronunciou no REsp 100.681:

Descaminho – A conduta típica do crime de descaminho é iludir. Traduz idéia de enganar, mascarar a realidade, simular, dissimilar; o agente vale-se de expediente para dar impressão de não praticar conduta tributável. Há, pois, fraude, por ação, ou omissão. No primeiro caso, ilustrativamente, procura evidenciar a mercadoria ‘a’ como ‘b’; no segundo, se a pessoa indagada pelo agente fazendário porta objeto tributável, figurando não compreender, deixa de responder, ou não toma a iniciativa de evidenciar o fato[7].

De acordo com BITENCOURT (2012) a distinção fática entre os tipos penais pode ser observada no próprio conceito, na medida em que Contrabando consiste na importação ou exportação de mercadoria proibida (relativa ou absolutamente) e o Descaminho é a importação de mercadorias permitidas em que ocorre a omissão (evita ou burla, na alfândega, o recolhimento dos direitos impostos devidos).

Ainda nas palavras do autor, aduz que o crime de Contrabando não se enquadra na modalidade de delito de natureza tributária, como é inerente ao Descaminho, e que o Contrabando atenta contra a moral, saúde, higiene, segurança enquanto o Descaminho viola as obrigações aduaneiras.

De modo geral, trata-se de um crime comum, formal, de forma livre e instantâneo, unissubjetivo e plurissubsistente (exceto quando a mercadoria é apreendida na aduana), que tem apenas o dolo genérico como tipo subjetivo[8], qual seja, a vontade livre e consciente de iludir, total ou parcialmente o pagamento de direito ou tributo devido. Consuma-se com a liberação da mercadoria sem o pagamento do tributo, se for através da alfândega, se ocorrer em local distinto da aduana, se consuma com a entrada da mercadoria no país. Entendem nesse mesmo sentido CAPEZ (2012), BITENCOURT (2012) E MIRABETE (2004).

Em suma, é mister entender que a prática da conduta do Descaminho está ligada a ilusão à administração pública, posto que o sujeito ativo da ação deixará de cumprir o seu dever, legalmente imposto, e que terá como conseqüência a impossibilidade da cobrança dos impostos devidos pelas mercadorias.  Dessa forma, a análise crítica deve partir do relevante pressuposto de que o descaminho requer uma declaração fraudulenta ou omissiva quanto à declaração sobre rendas a fim de eximir-se do pagamento do tributo, ato este lesivo ao direito penal e à ordem jurídica.

  1. 2.       O Princípio da Insignificância como excludente de tipicidade

A tipicidade é a qualidade atribuída ao fato decorrente da conduta humana que está inserida como uma norma penal, o tipo. Ou seja, a tipicidade incidirá quando da pré-existência do tipo. Todavia, em certos casos, embora o sujeito tenha praticado um ato que vem determinado no tipo, será prescindível a aplicação da norma, e dessa forma não dar prosseguimento à ação penal quando da conduta do agente for possível incorrer o princípio da insignificância que têm como seus requisitos ofertar inexpressiva ofensividade, baixa lesividade e pequena reprovabilidade do comportamento.

O direito penal é fragmentário, tutelando apenas os bens jurídicos mais relevantes e indispensáveis, de uma cautela mais apurada do Estado. Decorre este princípio da faceta de subsidiariedade do direito penal, sendo ele usado como ultima ratio da aplicação de sanção, devendo haver o esgotamento das instâncias administrativas e civis, prezando assim, pela não banalização do direito penal. Neste sentido o HC 100316, de Relatoria do Min. Celso de Mello entendeu:

E M E N T A: PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IDENTIFICAÇÃO DOS VETORES CUJA PRESENÇA LEGITIMA O RECONHECIMENTO DESSE POSTULADO DE POLÍTICA CRIMINAL - CONSEQÜENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA TIPICIDADE PENAL EM SEU ASPECTO MATERIAL - DELITO DE DESCAMINHO (CP, ART. 334, "CAPUT", SEGUNDA PARTE) - TRIBUTOS ADUANEIROS SUPOSTAMENTE DEVIDOS NO VALOR DE R$ 8.135,12 - DOUTRINA - CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF - PEDIDO DEFERIDO. O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL. - O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público[9].

Desta forma, o crime de Descaminho revela-se como eminente caso da aplicação destes princípios, tomado em particular ao da Insignificância. A baixa reprovabilidade social, por possibilitar ao comércio a oportunidade de oferecer preços mais convidativos, coadunado com a elevada carga tributária, que em muito encarece os preços no Brasil (que traz descontentamento geral na sociedade) e até mesmo não para fins comerciais, mas em benefício próprio, corroboram para a desnaturação da tipicidade e maior possibilidade de aplicação do Princípio da Insignificância. Sobre este princípio, nas palavras de BITENCOURT (2012):

(...) É imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal. Amiúde, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material. (...) Assim, a irrelevância ou insignificância de determinada conduta deve ser aferida não apenas em relação à importância do bem juridicamente atingido, mas especialmente em relação ao grau de sua intensidade, isto é, pela extensão da lesão produzida.

O que é levado em consideração em preliminar análise do crime do artigo 344 do Código Penal é que sua atipicidade, ventilada a partir da Lei nº 10.522/02, cujo em seu art. 20 estipula um valor mínimo para o necessário cabimento de persistir em ação para restituição de crédito fiscal, que é de R$10.000,00. Logo, aqui a atipicidade é dada por conta do resultado, considera-se não a conduta como sem relevo, até porque é inegável, pois sonegar quantia superior à estipulada indubitavelmente incidirá o tipo, assim o referido artigo assevera:

Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00.

 Com nitidez macroscópica se percebe que a atipicidade, para fins do crime de Descaminho é que sua conduta deve necessariamente arrolar em um dano, este deve ser significativo, e sendo aquele disposto na letra de lei, decorre de uma atipicidade por resultado. Muito embora se tenha no caso concreto a possibilidade de ser feita a subsunção do que foi praticado pelo agente ao tipo, a pequena ofensividade e seu inexpressivo desvalor não se aplicará o disposto no artigo 334 do código penal.

  1. 3.       Análise critica da incidência do princípio da insignificância no crime de descaminho e ônus sofrido pela Instituição Fazendária frente às práticas cotidianas

O princípio da insignificância retira a tipicidade da conduta, com observância aos critérios e requisitos já acima citados. No entanto, deve-se fazer aferição do dano provocado pelo agente e para isso o parâmetro utilizado é a identificação do bem jurídico em questão. O artigo 334 do código penal está contido no capítulo II, Dos Crimes Contra a Administração Pública, que abrange os Crimes Praticados Por Particular Contra a Administração em Geral.

É cediço que o bem jurídico que se resguarda aqui, é a própria Administração Pública, em especial a probidade administrativa, moralidade, normalidade do funcionamento da Administração (uma vez que ela precisa fazer o recolhimento dos impostos), sua respeitabilidade e também arrecadação fiscal, como já citado anteriormente. Ainda que se perquirisse acolher unicamente sua faceta tributária, estaria o Estado abrindo mão de efetivo cumprimento de um dever dos cidadãos ao se estabelecer a quantia de R$10.000,00 como o menor valor executável judicialmente, dando baixa no processo, embora sem arquivamento, nos valores inferiores a esse.

Não há como conceber possibilidade de atribuir um valor que é maior que 14 vezes o salário mínimo vigente, R$ 678,00 (seiscentos e setenta e oito reais) como insignificante, esta omissão de cumprimento, nesta via, vem se demonstrando então uma patente afronta ao erário nacional, isso se levando apenas sob a ótica pecuniária. Como supra mencionado, são vários os bens jurídicos inerentes ao Descaminho, e nesse sentido, surgem algumas questões, por exemplo, como auferir a respeitabilidade ou a moralidade à Administração Pública apenas mediante critérios financeiro? Seria mais desrespeitoso ou imoral quando o agente não paga o imposto, quando ele for a partir de R$10.000,00?

Não, e o que alicerça tal resposta está contido nos princípios que regem a aplicação do artigo 344 CP, em especial aos da ofensividade, que para as palavras de BITENCOURT (2012):

Para que se tipifique algum crime, em sentido material, é indispensável que haja, pelo menos, um perigo concreto, real e efetivo de dano a um bem jurídico penalmente protegido. Somente se justifica a intervenção estatal em termos de repressão penal se for efetivo e concreto ataque a um interesse socialmente relevante, que represente, no mínimo, perigo concreto ao bem jurídico tutelado. ( p.52).

      Coaduna-se ainda entendimento com o princípio da intervenção mínima, devendo o Estado insurgir repressão em esfera penal apenas quando as demais esferas, tanto administrativas, ou mesmo no direito civilista, forem insuficientes para assegurar aquele bem jurídico. Deste modo, não devendo o Direito Penal punir toda ação que vá de encontro ao bem jurídico, que deve ser os bens jurídicos mais relevantes, mas tão somente as que verdadeiramente forem mais graves.

Segundo o artigo 3º do Código Tributário Nacional, o “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (grifo nosso). Diante do mencionado artigo do código tributário, já existe uma forma descrita em lei de arrecadação disposta em legislação específica, então o discurso o qual afirma que R$ 10.000,00 é insignificante para com a Administração Pública encontra-se falseado.

Neste sentido, apenas o modo de sua persecução se dará de maneira administrativa, quando o montante do tributo for menor que o estabelecido no artigo 20 da lei 10.522/02, por sua vez, se irrelevante fosse, sequer, ainda que administrativamente, estaria por pleitear restituição do imposto sonegado. Será então “insignificante” apenas para fins de processo jurídico, todavia, não obsta os procedimentos administrativos de cobrança e coerção fiscal.

Pelas concepções argumentativas já expostas, se fariam, per si suficientes à desmitificarem o suposto “ônus sofrido pela Instituição Fazendária”. Como dito, não que o Estado, por intermédio de sua Instituição Fazendária, deixará de arrecadar seus tributos referentes à importação, mas apenas fará de maneira não jurídica, nota-se que as esferas administrativas, jurídica civil e jurídica penal são independentes, uma vez não sendo possível apuração por uma via, em nada prejudica os trabalhos na outra esfera, salvo em casos específicos. 

Como exemplo dessa independência, no artigo 306, caput do Código de Trânsito Nacional dispõe acerca da Lei Seca, será penalizado, segundo ela, ao se “conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência (grifos nossos)”. Por conta do princípio processual penal do Nemo Tenetur se Detegere, escusa-se a parte suspeita de produzir provas contra si próprio, logo, a comprovação da incapacidade psicomotora, a influência do álcool assim como a concentração etílica no sangue de 0,3g por litro deverão ser feitos por exames, no direito penal é plenamente cabível a negativa em se submeter aos exames, todavia, a essa mera recusa, no âmbito administrativo já dar azo às suas sanções inerentes, como a multa.

Conquanto valores abaixo de R$ 10.000,00 seja insuficiente para o Estado levar em frente ação penal referente ao crime de Descaminho por inviabilidade processual de uma decisão de vontade da própria administração. O CADIN[10] regula os créditos não quitados do setor público, será um dos meios de busca de satisfação do crédito tributário pelo administrador público.

A jurisprudência é uníssona no sentido de acolhimento o princípio da insignificância em:

Resumo: Princípio da Insignificância - Identificação dos Vetores Cuja Presença Legitima o Reconhecimento. Desse Postulado de Política Criminal - Conseqüente Descaracterização da Tipicidade Penal em Seu Aspecto Material - Delito de Descaminho (cp, Art. null334,"caput", Segunda Parte)- Tribu... Relator(a): CELSO DE MELLO Julgamento: 07/10/2008 Órgão Julgador: Segunda Turma Publicação: DJe-043 DIVULG 05-03-2009 PUBLIC 06-03-2009 EMENT VOL-02351-03 PP-00549 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IDENTIFICAÇÃO DOS VETORES CUJA PRESENÇA LEGITIMA O RECONHECIMENTO DESSE POSTULADO DE POLÍTICA CRIMINAL - CONSEQÜENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA TIPICIDADE PENAL EM SEU ASPECTO MATERIAL - DELITO DE DESCAMINHO (CP, ART. 334,"CAPUT", SEGUNDA PARTE)- TRIBUTOS ADUANEIROS SUPOSTAMENTE DEVIDOS NO VALOR DE R$ 180,58 - DOUTRINA - CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF - PEDIDO DEFERIDO. O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL[11]

E segue o entendimento também, agora sob a relatoria do juiz Theotônio Costa em:

Resumo: Penal. Contrabando. Pequena Quantidade de Mercadorias. Inexpressivo Valor. Aplicação do Principio da Insignificancia. Inexistencia de Reprovabilidade Social. Fato Atipico. Infração Fiscal. Desproporcionalidade da Aplicação de Pena a Infima Afetação ao Bem Jurídico Tutelado. Le... Relator(a): JUIZ THEOTONIO COSTA Julgamento: 24/09/1996 Publicação: DJ DATA:05/11/1996 PÁGINA: 84242 PENAL. CONTRABANDO. PEQUENA QUANTIDADE DE MERCADORIAS. INEXPRESSIVO VALOR. APLICAÇÃO DO PRINCIPIO DA INSIGNIFICANCIA. INEXISTENCIA DE REPROVABILIDADE SOCIAL. FATO ATIPICO. INFRAÇÃO FISCAL. DESPROPORCIONALIDADE DA APLICAÇÃO DE PENA A INFIMA AFETAÇÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO. LESÃO TRIBUTÁRIA IRRISORIA. 1 - A OBJETIVIDADE JURIDICA DO ARTIGO 334 DO CÓDIGO PENAL E A SALVAGUARDA DOS INTERESSES DO ERARIO PÚBLICO E A PROTEÇÃO A INDUSTRIA NACIONAL. ASSIM, NÃO E SEU OBJETIVO DIRIGIR SEUS RIGORES A QUEM, COMO A APELANTE, EMPREENDE UMA VIAGEM DE TURISMO AO PARAGUAI, LA ADQUIRINDO ALGUMAS MERCADORIAS DE ORIGEM ESTRANGEIRA, SEM INTENÇÃO DE COMERCIALIZA-LAS, E QUE EM POUCO ULTRAPASSARAM A COTA LEGAL. 2 - A PEQUENA QUANTIDADE E O INEXPRESSIVO VALOR DAS MERCADORIAS ESTRANGEIRAS APREENDIDAS SEM A DOCUMENTAÇÃO FISCAL DESCARACTERIZA O DELITO DE DESCAMINHO, TORNANDO-O FATO ATIPICO, CONSTITUINDO-SE QUANDO MUITO INFRAÇÃO FISCAL. 3 - APLICAÇÃO DO PRINCIPIO DA INSIGNIFICANCIA. A AÇÃO DELITUOSA FOI DE INFIMA AFETAÇÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO, NÃO SE JUSTIFICANDO A APENAÇÃO, AINDA QUE MINIMA, POR SER DESPROPORCIONAL A SIGNIFICAÇÃO SOCIAL DO FATO. 4 - APELAÇÃO A QUE SE DA PROVIMENTO, PARA ABSOLVER A APELANTE DA PRATICA DO DELITO PREVISTO NO ARTIGO 334 DO C.P., COM FULCRO NO ARTIGO 386, III DO C.P.P.[12]

     Na outra margem, posicionamento antagônico pode ser obtido se elementos subjetivos do sujeito for temerária ou mesmo questionável, não havendo assim a aplicação do princípio da insignificância unicamente mediante análise dos requisitos meramente formais.

RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA; PACTE.(S): FÁBIO NUNES DO AMARANTE; IMPTE.(S):DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO; PROC.(A/S)(ES): DEFENSOR PÚBLICO-GERAL FEDERAL; COATOR(A/S)(ES): RELATOR DO RESP Nº 1301250 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA; EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. CONSTITUCIONAL. INFRAÇÃO DO ART. 344, § 1º, ALÍNEA D, DO CÓDIGO PENAL. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: INVIABILIDADE. PRÁTICA REITERADA DE DESCAMINHO. PRECEDENTES. (...) 3. Existência de outros processos administrativos fiscais instaurados contra o Paciente em razão de práticas de descaminho. Elevado grau de reprovabilidade da conduta imputada evidenciado pela reiteração delitiva, o que afasta a aplicação do princípio da insignificância no caso. 4. O criminoso contumaz, mesmo que pratique crimes de pequena monta, não pode ser tratado pelo sistema penal como se tivesse praticado condutas irrelevantes, pois crimes considerados ínfimos, quando analisados isoladamente, mas relevantes quando em conjunto, seriam transformados pelo infrator em verdadeiro meio de vida. 5. O princípio da insignificância não pode ser acolhido para resguardar e legitimar constantes condutas desvirtuadas, mas para impedir que desvios de conduta ínfimos, isolados, sejam sancionados pelo direito penal, fazendo-se justiça no caso concreto. Comportamentos contrários à lei penal, mesmo que insignificantes, quando constantes, devido à sua reprovabilidade, perdem a característica da bagatela e devem se submeter ao direito penal. 6. Ordem denegada. Decisão: A Turma, por maioria, denegou a ordem, nos termos do voto da Relatora, vencido o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e Joaquim Barbosa. 2ª Turma, 18.09.2012. (HC 112597/PR , Rel. Ministra Cármem Lúcia, QUINTA TURMA, julgado em 10/12/2012, grifo nosso).

Nesse sentido, percebe-se que não será absoluta a incidência do princípio da insignificância, como visto no caso supra citado, a teoria subjetiva também poderá ser levada em consideração. A análise de vida pregressa, o comportamento do réu, bem como a reincidência delitiva consubstanciam inexoravelmente na impugnação do benefício cedido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verificar a pertinência entre o artigo 334, do Código Penal, Do Crime de Contrabando e Descaminho, pondo especial foco neste último, e, por fim, o Princípio da Insignificância, tão propalado na doutrina e amplamente aceito em sede jurisprudencial foi o cerne desse trabalho, o qual, primeiramente, ocupou-se em esclarecer o que viria a ser o crime de Contrabando e Descaminho, distinguindo-os, pormenorizando e colacionando seu amparo com diversos institutos do Direito brasileiro, demonstrando seus diversos entendimentos, então, se chegar à análise de sua aplicabilidade sob a égide de sua efetiva possibilidade.

Em um segundo momento, foram postos os conteúdos atinentes tanto ao do art. 334 da Carta Penal, tanto diversos princípios que ensejam quando da sua subsunção, desse modo, arrolando na conformidade do ordenamento jurídico nesse aspecto.

De forma clara, viu-se que o crime Descaminho, comporta sim o uso do Princípio da Insignificância. Todavia, ficara macroscópico, na medida em que as leituras foram feitas e aprofundadas, que a propriedade apresenta facetas não tão somente natureza fiscal, o erário público, mas também acautela o decoro da administração pública, respeitabilidade, moralidade pública etc. Inerente ao aspecto pecuniário encontra seu aporte em disposição do artigo 20 da Lei nº 10.522/02, que por meio dela, mitiga-se a possibilidade do Estado de perquirir judicialmente o crédito sonegado em valores inferiores a R$ 10.000,00.

Em outro diapasão, a faceta mais abstrata, que tange a respeitabilidade à Administração e afins é observada ao ordenamento o cumprimento de determinados requisitos, como acima foram elencados, desta forma o aspecto subjetivo deverá ser levado em consideração, caso exista fator questionável de sua idoneidade ou mesmo de sua conduta, poderá ensejar óbice à incidência do Princípio da Insignificância, devendo o sujeito responder pelo art. 334, segunda parte, mesmo seu débito para com o fisco seja menor que o valor estipulado em lei.

      Por fim, devido à análise trazida encorpada por argumentos doutrinários, centraliza-se o objeto deste paper, que vai além simploriamente apresentar meros conceitos acerca do Crime de Descaminho e do Princípio da Insignificância, mas perceber a conformidade de dispositivos a eles inerente e os meios para assegurar sua aplicação.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERENCIAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 5: parte especial: dos crimes contra a administração pública e dos crimes praticados por prefeitos – 6.ed. rev. e apli. –São Paulo: Saraiva, 2012

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 3, parte especial: dos crimes contra a adignidade sexual e dos crimes contra a administração publica (arts. 213 a 359-H) – 10. ed. – São Paulo: Saraiva, 2012

CHEQUER, Monique. A distorção do princípio da insignificância nos crimes de contrabando e descaminho. Escola superior do ministério publico da união. Boletim Científico n. 28 e n. 29 - Julho/Dezembro de 2008. Disponível em:  <http://boletimcientifico.esmpu.gov.br/boletins/bc-28-e-29/a-distorcao-do-principio-da-insignificancia-nos-crimes-de-contrabando-e-descaminho>. Acesso em 28 abr 2013

MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de direito penal – 19. ed. – São Paulo: Altas, 2004

MONTEIRO, Samuel. Dos crimes fazendários: compendio teórico e pratico. São Paulo: Iglu, 2000.

SALUSTIANO, Marcus Peterson. O principio da insignificância aplicado nos crimes de contrabando e descaminho. Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul. Nivirai, 2010. Disponivel em: <http://www.uems.br/portal/biblioteca/repositorio/2012-06-27_18-22-57.pdf> acesso em: 20 abr 2013


[1] Artigo científico apresentado à disciplina de Direito Penal III do 6° período noturno do curso de Direito

[2] Alunos do 6° Período do curso de Direito -  Noturno

[3] Vide Lei 11.033/04

[4] BRASIL. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Segunda Turma, Habeas Corpus n.º 200803000042027, Relator Nelton dos Santos, 25/08/2009

[5] Sonegação Fiscal, detenção de seis meses a dois anos, acrescida de multa, cujo valor será de duas a cinco vezes o do tributo sonegado (art. 1º da Lei n.º 4.729, de 14 de julho de 1965), a pena para quem comete o descaminho é de reclusão, de um a quatro anos (art. 334 do Código Penal)

[6] São elas: “importar ou exportar mercadoria proibida” e “iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo da mercadoria”.

[7] STJ, 6ª Turma, REsp 100.681 – MG, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, 30-6-1997.

[8] Ressalta-se que as condutas equiparadas no parágrafo primeiro em suas alíneas “c” e “d” exigem o fim especial de agir, quais sejam, “em proveito próprio ou alheio” e o conhecimento de quem pratica a ação de introdução clandestina ou da falsidade dos documentos.

[9] STF, 2ª Turma, HC 100316, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, julgado em 15/12/2009, DJe-027  publicado 12-02-2010

[10] Cadastro Informativo de créditos não quitados do setor público federal

[11] STF, 2ª Turma, Habeas Corpus 93482 PR, Julgamento: 07/10/2008

[12] TRF3 - APELAÇÃO CRIMINAL: ACR 26076 SP 95.03.026076-0.