A PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA COMO PENA RESTRITIVA DE DIREITOS NO SISTEMA CAPITALISTA BRASILEIRO:

uma alternativa para todos, uma verdade para poucos

 

Alessandra de Jesus Diniz Lemos[1]

 

RESUMO

 

Sob a luz da Criminologia Crítica, este estudo lança um olhar sobre a questão social implícita na aplicação da prestação pecuniária como pena restritiva de direitos, trazendo, para composição deste cenário, abordagens pautadas na relação entre Dogmática Penal e Capitalismo, no problema da seletividade do sistema penal, na falência do sistema prisional e na ineficácia no uso de penas privativas de liberdade no Brasil.

PALAVRAS-CHAVE

Capitalismo. Dogmática Penal. Criminologia Crítica. Seletividade. Prestação Pecuniária.

 

 

1 INTRODUÇÃO

As Penas Alternativas apresentam-se no Sistema Penal brasileiro hodierno como um importante instrumento de solução para a problemática em torno da visível falência das Penas Privativas de Liberdade, especialmente no que concerne ao constante aumento da população carcerária e de um modelo penitenciário indiscutivelmente esgotado. Tais penas surgiram, sobretudo, da necessidade de se encontrar novas fórmulas que fizessem com que o sistema penal, deveras fracassado, pudesse, de alguma forma, cumprir seu papel dentro da sociedade.

Dentro deste contexto das Penas Alternativas, descritas no artigo 43 do Código Penal, encontram-se arroladas as Penas Restritivas de Direito, aplicadas em substituição às penas privativas de liberdade de curta duração. No rol dessas penas restritivas apresenta-se a pena de prestação pecuniária (inserida no Código Penal por intermédio da Lei nº 9.714/98), tema abordado por este trabalho.

Contudo, ao falar das prestações pecuniárias não se pretende aqui meramente apresentar conceitos técnicos, nem mesmo suscitar debates sobre sua relação com as penas de multa, mas deseja-se, sobretudo, abordar aspectos sociais implícitos na aplicação dessas penas, levando em consideração o cenário no qual estas se encontram inseridas, qual seja, o de um país cujo sistema penal reflete em muito as conseqüências geradas pela adoção de um sistema capitalista gerador de segregação e exclusão.

Neste ínterim, o desenvolvimento do assunto sob um viés crítico faz-se necessário, motivo pelo qual a Criminologia Crítica é trabalhada como pano de fundo para a apresentação do tema.

Diante deste panorama, surgem indagações como: Levando-se em consideração o princípio da igualdade defendido pelo Direito e, consequentemente, pelo Direito Penal, seria a prestação pecuniária uma pena alternativa de fato aplicável a todos? Seria esta pena uma alternativa passível de ser utilizada contra indivíduos pobres (maioria no sistema penal/capitalista), que sequer possuem condições de sobreviver com a dignidade assegurada a eles pela Constituição?

Visando encontrar respostas para essas questões, o artigo trabalha inicialmente com conceitos relacionados à dogmática penal e ao capitalismo. Em um segundo momento, apresenta aspectos relacionados à Criminologia Crítica, bem como o problema da seletividade no sistema penal. Logo em seguida, uma abordagem sobre a falência do sistema prisional e a ineficácia das penas privativas de liberdade serve de trampolim para a apresentação das penas restritivas de direito. Na parte final desse estudo, tomando-se por base tudo o que foi discutido anteriormente, enfoca-se a prestação pecuniária e, em especial, aspectos de cunho social relacionadas à sua aplicação como pena alternativa no Brasil.

 

2  CAPITALISMO E DOGMÁTICA PENAL: CONCEITOS DISTINTOS, MAS INCONTESTAVELMENTE RELACIONADOS

 

Capitalismo e Dogmática Penal são dois conceitos distintos, mas que definem duas realidades visivelmente interligadas: a classe menos favorecida produzida naturalmente pela aplicação do primeiro é a classe segregada e criminalizada, em grande parte, durante a utilização do segundo.

O capitalismo, segundo a Teoria Marxista[2], é um sistema econômico que se desenvolve por meio da acumulação de capital, exigindo uma busca permanente de mais-valia e lucro, o que acaba por favorecer a relação de exploração, servindo como mola propulsora da crescente desigualdade e exclusão. Neste cenário, o aumento constante de riquezas tem sido concentrado num número cada vez menor de pessoas, enquanto a pobreza se expande pela maior parte da população mundial. (SANTOS, 2001, p. 178)

A Dogmática Penal compreende todo o acervo teórico, principiológico, conceitual e normativo que serve de base e direção para o Sistema Penal que, por sua vez, ao cumprir uma função social, tem por meta a segurança jurídica cujo objetivo poderia se resumir na proteção da sociedade e, por conseguinte, de seus bens jurídicos (direitos), como uma maneira de assegurar a coexistência, ou seja, a existência humana em sociedade. (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2008, p. 85-6)

Postos esses conceitos, não é difícil notarmos o quão interligado está direito penal e capitalismo. O último, ao gerar uma desigualdade social e a incessante busca das classes menos favorecidas por condições de vida melhores, necessariamente fará com que o uso do primeiro, o direito, se faça presente neste meio, impondo limites e garantindo que coexistência neste tipo de sociedade se faça possível. Baratta corrobora com esse pensamento quando afirma que

as relações sociais e de poder da subcultura carcerária têm uma série de características que a distinguem da sociedade externa, e que dependem da particular função do universo carcerário, mas na sua estrutura mais elementar elas não são mais do que a ampliação, em forma menos mistificada e mais ‘pura’, das características típicas da sociedade capitalista. (BARATTA, 2002, p. 186)

Ainda sobre esta relação, é possível perceber que a existência de características constantes, predominantes em relação às diferenças encontradas na sociedade e comuns à comunidade carcerária das sociedades capitalistas, tem possibilitado a construção de um modelo próprio, capaz de produzir efeitos contrários à reeducação e à reinserção do condenado, ao mesmo tempo em que se mostra favorável à sua estável inserção na população criminosa. E é justamente neste momento de identificação deste modelo próprio que, fazendo uso da Criminologia Crítica, acabamos percebendo o problema da seletividade, característico do nosso sistema penal.

3  A CRIMINOLOGIA CRÍTICA E O PROBLEMA DA SELETIVIDADE DO SISTEMA PENAL

A criminologia crítica, alicerçada sobre o paradigma da reação social, tem o propósito de construir uma teoria materialista (econômico-política) do desvio, dos comportamentos socialmente negativos e da criminalização, bem como o de conceber uma política criminal alternativa pautada em uma análise radical dos mecanismos e das funções reais do sistema penal, na sociedade tardo-capitalista, e nos interesses das classes atualmente subalternas – aquelas selecionadas negativamente pelos mecanismos de criminalização. (BARATTA, 2002, p. 197)

Contrária às outras criminologias, a crítica não mais foca o estudo nas causas da criminalidade, mas, principalmente, nas condições da criminalização, ou seja, como o sistema penal constrói a criminalidade e os criminosos em interação com o controle social informal, funcionalmente relacionado às estruturas sociais. (ANDRADE, 2008)

Ao abordamos o tema da prestação pecuniária e os aspectos sociais que a envolvem é justamente com esse viés crítico que o fazemos, uma vez que somente esta Criminologia é capaz de nos oferecer conhecimentos que representam dados de grande utilidade para o direito penal e para a política penal, especialmente no que se refere ao aspecto do controle social. (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2008, p. 140)

Sob esse olhar crítico, o caráter seletivo do sistema penal pode ser percebido, ainda, quando se estudam os preconceitos e se identificam os estereótipos que guiam a ação tanto dos órgãos investigadores como dos órgãos judicantes, o que acaba por fazer com que se procure a verdadeira criminalidade naquelas classes sociais nas quais seria comum verificá-la. (BARATTA, 2002, p. 176-7)

Ao abordar o tema da seletividade do sistema prisional, Vera Andrade, grande estudiosa da área, mais uma vez confirma a relação capitalismo x sistema penal ao discorrer que existe uma desigualdade (seletividade) na distribuição da impunidade e da criminalização entre as várias classes sociais baseada, sobretudo, na

imagem estereotipada da criminalidade e do criminoso em que a variável status social dos acusados tem um peso decisivo. De modo que a gravidade da conduta criminal não é, por si só, condição suficiente deste processo, pois os grupos poderosos na sociedade possuem a capacidade de impor ao sistema uma quase total impunidade das próprias condutas criminosas. (ANDRADE, 2003, p.129)

Zaffaroni e Pierangeli (2008, p. 69 e 71) também atestam esta seletividade quando constatam que o sistema seleciona dentre as pessoas advindas das camadas mais humildes aquelas que, uma vez condenadas, surgem como boas candidatas a uma criminalização posterior, tendo como conseqüência sua “inevitável” inserção no rol dos desviados, como resultado do conhecido fenômeno psicológico do “bode expiatório”. Alertam os autores ainda que a vulnerabilidade ao sistema penal não se revela de forma igual para todos. Este sistema costuma se orientar por “estereótipos” impregnados de caracteres dos setores marginalizados e humildes, fazendo com que a criminalização gere fenômeno de rejeição do etiquetado e a segregação perdure na sociedade livre.

Esse, certamente, é um dos muitos motivos que levaram a atual situação em que se encontra o sistema penal brasileiro.

4  PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS: SOLUÇÕES ALTERNATIVAS À FALÊNCIA DO SISTEMA PRISIONAL E À INEFICÁCIA DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE NO BRASIL

 

Toda a problemática exposta anteriormente a respeito das conseqüências sociais impostas por um sistema capitalista segregador, de uma dogmática penal que, embora não devesse, funciona em conformidade com esse sistema, tem sido constantemente debatida nos dias atuais, especialmente quando se fala do sistema de justiça criminal ou, mais especificamente, do subsistema prisional.

De acordo com dados coletados pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ) do Conselho Nacional de Justiça há no Brasil o reflexo de um movimento mundial conhecido por “o grande encarceramento”.

No ano 2000 o total de pessoas confinadas no sistema penitenciário era de 232.755, sendo este número a soma de condenados em todos os regimes de cumprimento de pena (fechado, semi-aberto e aberto), mais os presos provisórios e os detentos nas delegacias. De 2000 a 2008 este número cresceu 89%, e a população carcerária saltou para 440.013. (BRASIL, 2008)

Frente a essa crescente demanda e por razões elementares pressupostas, hoje se fala abertamente no mundo do “fracasso da prisão” (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2008, p. 70), especialmente se levarmos em conta, ainda, a função ressocializadora da pena privativa de liberdade, visto que se torna impossível nos dias de hoje obter-se algum efeito positivo sobre o apenado. (BITENCOURT, 1993, p.142-3)

Para o escopo deste trabalho não nos importa estudar de maneira detalhada as causas que originam ou evidenciam a crise do sistema prisional e a ineficácia das penas privativas de liberdade, sejam elas quais forem (os estabelecimentos penitenciários que temos, a infraestrutura e dotação orçamentária que dispomos, as circunstâncias e a sociedade atuais, a superlotação das prisões, a presença de uma subcultura carcerária, dentre tantas outras). O que realmente é necessário sabermos neste momento é que toda essa discussão que envolve o sistema penal é um fato, e que soluções, como as penas alternativas, têm sido buscadas com o intuito de, na medida do possível, amenizar tal situação.

Diante de toda a problemática supracitada, importa notar que as denominadas penas alternativas constituem, na verdade, mais uma espécie de pena concedida ao magistrado como forma de punir, em determinados casos, àquelas pessoas que cometam um fato típico previsto em nossa legislação penal. No dizer de Prado, “as penas restritivas de direito previstas no estatuto atual são autônomas – e não acessórias –, sendo, de conseguinte, inadmissível sua cumulação com as penas privativas de liberdade”. (PRADO, 2008, p. 530)

Posto toda a temática vista até aqui, visando, então, alcançar o escopo deste trabalho, torna-se indispensável que empreendamos um recorte histórico da evolução de nossa legislação penal pátria, destacando, de início, o ano de 1984. Nesse ano, através da Lei nº 7.209/84 foram criadas, pela primeira vez, as denominadas penas alternativas sob a designação de penas restritivas de direito. Tais penas nasceram com o intuito de serem mais uma opção de punição ofertada ao juiz, além das já existentes: penas privativas de liberdade e a pena de multa. As então penas restritivas de direito criadas foram: prestação de serviços à comunidade, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana.

Avançando na exposição, é notável destacar que uma das principais motivações para a introdução das penas alternativas em nosso ordenamento penal, está fundada na frustrada função declarada pretendida pelo sistema penal pátrio, qual seja: a ressocialização do condenado. É sabido, na atualidade, que o encarceramento – penitenciarismo, nas palavras de Martins (2001) – coopera, na maioria dos casos, para em vez de recuperar, produzir indivíduos mais perigosos, o que contribui, portanto, para que cometam novos delitos ao saírem do cárcere.

Somada à imprestabilidade do confinamento carcerário de curta duração, Cruz acrescenta como outro motivo que impulsionou a criação das penas alternativas, a “necessidade de redução dos custos da execução, resultantes não só da subsistência dos presos, mas também da manutenção das instalações edificadas, do mobiliário e do aparato subjetivo de segurança e vigilância”. (CRUZ, 2000, p.37)

5  A PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA COMO PENA RESTRITIVA DE DIREITOS NO SISTEMA CAPITALISTA BRASILEIRO: ALTERNATIVA OU SELEÇÃO?

Outro marco importante, no que tange às penas alternativas, foi o ano de 1998, quando, por intermédio da Lei nº 9.714/98, foram instituídas duas novas modalidades de penas restritivas de direito: a prestação pecuniária e a perda de bens e valores. Sendo mantida, porém alterada, a pena de prestação de serviços à comunidade, a fim de possibilitar o seu cumprimento junto também às entidades públicas e, por fim, foi acrescentada à pena de interdição temporária de direitos a proibição de freqüentar determinados lugares. Ademais as penas restritivas de direito continuaram a manter o seu caráter autônomo em relação às penas privativas de liberdade.

Sobre a prestação pecuniária, verifica-se que esta é aplicada àqueles crimes cujas penas não sejam superiores a 4 (quatro) anos e o crime não tenha sido praticado com violência ou grave ameaça à pessoa; sendo o crime culposo (qualquer que seja a pena) é cabível a aplicação da pena restritiva de direito na modalidade de prestação pecuniária, ficando também condicionada o seu emprego aos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça ao indivíduo. É possível ainda a sua utilização àqueles réus não reincidentes em crimes dolosos.

Após esta visão mais técnica sobre a prestação pecuniária e, evidentemente, sem desmerecermos sua importância como meio alternativo para minimizar os problemas atualmente enfrentados pelo sistema penal, cabe a partir daqui abordarmos o tema sob outro olhar, o crítico, que leva em consideração, como mencionado anteriormente, aspectos mais voltados para o âmbito social.

Sob esta perspectiva, o problema da desigualdade promovido pelo capitalismo e o da seletividade, característico do sistema penal torna-se mais uma vez evidente.

Sem a mínima intenção de associarmos pobreza à criminalidade, mas levando-se em consideração a seletividade e o fenômeno do etiquetamento do sistema penal, bem como a situação econômica em que vive grande parte da população brasileira é perfeitamente detectável que a aplicação de penas de prestação pecuniárias sobre esta população certamente produzirá efeitos contrários daqueles pretendidos.

Não é surpresa para ninguém que grande parte da população brasileira viva em precárias condições de vida. Mesmo os que ganham salário mínimo sabem o quanto é difícil manter uma qualidade de vida digna mínima.

Diante desta situação, a aplicação do valor mínimo da prestação pecuniária permitido pela legislação (um salário mínimo), mesmo que divido em pequenas parcelas, se torna na maioria das vezes inconveniente, restando ao apenado outros tipos de penas restritivas de direitos, como, por exemplo, a prestação de serviços em entidades públicas.

Ainda sobre esta relação prestação pecuniária x situação econômica não é difícil deduzir que mesmo aplicada em apenados cuja situação econômica seja deficiente, corre-se o risco de se ter que usar a tutela do Estado outras vezes, além da usual. Esta situação certamente poderá ocorrer quando do não quitamento da prestação pelo criminoso-pobre na data estipulada pelo juiz. Por mais que deseje cumprir a pena determinada, a própria condição econômica do apenado o impede de cumprir a prestação estabelecida. Isso acaba por fazer com que esta demanda volte à esfera judicial, contribuindo como mais um fator para o inchaço do Judiciário.

Zaffaroni e Pierangeli alertam para essa problemática social implícita nas penas de prestação pecuniária quando afirmam que este tipo de pena não é

adequada para ser imposta aos setores mais carentes de uma população que se encontra no limite de sua subsistência, e que viria agravar, ainda mais, uma situação social que, em definitivo, é uma condicionante do delito. Em alguns países, permite-se a substituição da multa por trabalho gratuito, o que tem merecido pesadas críticas, por considerar a providência como um ‘pagamento’ da execução penal, por quem não reúne condições de pagar a multa. Em outros, a multa é convertida em privação de liberdade quando o condenado não pode pagá-la, o que tem merecido justas críticas, porque se trata de uma prisão por pobreza. [...] a multa não pode ser imposta, [...] quando a pessoa não chega a ganhar mais – quando ganha – do que o suficiente para viver. (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2008, p. 696-7)

Inserido neste cenário e consciente de sua função e da real situação em que se encontra o apenado é de suma importância que o juiz ao aplicar a sentença tenha um mínimo de discernimento e de razoabilidade na aplicação da pena de prestação pecuniária, mesmo que possua ampla competência para definir a pena baseado nas alternativas que lhe permitem a norma penal.

Para tanto, pode-se utilizar ele de preceitos formais inclusos no nosso próprio ordenamento, como no Código Penal que, em seu art. 60, §1.º, considera a questão social do apenado ao afirmar que é obrigação do juiz levar em conta a situação econômica do réu na fixação da pena de multa[3]. (ZAFFARONI e PIERANGELI, 2008, p. 698).

Ainda sob este viés social, a Constituição Federal em seu Art. 5º, Inc. LXXIV, determina que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".

Mediante o exposto não é difícil chegar à conclusão de que, embora seja na teoria uma pena alternativa aplicável a todos, a prestação pecuniária torna-se, na prática, uma verdade para poucos, não por culpa do que determina o código penal em si, mas da inevitável realidade na qual ele está inserido.

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Como visto no decorrer da pesquisa, a temática abordada, a pena de prestação pecuniária traz em seu bojo um conjunto de questões contemporâneas como o sistema prisional, a relação capitalismo x dogmática penal, a seletividade no sistema penal, dentre outros.

É fato que a prestação pecuniária como pena restritiva de direitos e, por conseguinte, como meio de conter o problema da ineficácia das penas privativas de liberdade e da superlotação das prisões constitui uma válida alternativa. Contudo, uma visão fechada como esta acaba por limitar a reflexão sobre as múltiplas problemáticas que envolvem o fenômeno, especialmente no que concerne a questões de âmbito social.

Por derradeiro, é preciso, antes de tudo, que a sociedade tenha consciência de que o delito é uma conseqüência e não uma causa. E seja qual for esta causa, é preciso combatê-la. Por isso, clamar por justiça nos momentos de dor e sofrimento, seja como vítima ou como réu, após o acometimento de um crime bárbaro, é admissível. Mas é necessário muito mais que isso. É imprescindível que se clame por justiça muito antes, quando então se deve lutar para que direitos garantidos pela Constituição, como a dignidade da pessoa humana, a educação, a saúde e tudo mais – incluindo aqui, por conseguinte, a prestação pecuniária, como pena alternativa –, sejam de fato uma verdade para todos (conforme pressupõe o Estado Democrático de Direito) e não para poucos, como se vê na triste realidade vivida pelo povo brasileiro.

 

REFERÊNCIAS

 

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Por que a criminologia (e qual criminologia) é importante no ensino jurídico? São Luís: Revista Eletrônica de Ciências Jurídicas, n. 5. maio 2008. Disponível em: <http://www2.mp.ma.gov.br/ampem/ampem1.asp>. Acesso em: 7 maio 2009.

ANDRADE, Vera Regina Pereira. Sistema penal máximo x cidadania mínima: códigos da violência na era da globalização. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2003.

BITTENCURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.

BRASIL. Relatório Anual 2008. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, Departamento de Pesquisas Judiciárias, 2008.

CRUZ, Walter Rodrigues da. As penas alternativas no direito pátrio. São Paulo: Editora de Direito, 2000.

MARTINS, Jorge Henrique Schaefer. Penas alternativas. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2001.

NAHUZ, Cecília dos Santos; FERREIRA, Lusimar Silva. Manual para normalização de monografias. São Luis: Visionária, 2007.

PRADO, Luiz Regis. Curso direito penal brasileiro: parte geral. v. 1. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

SANTOS, Tania Steren dos. Globalização e exclusão: a dialética da mundialização do capital. Revista Sociologias, Porto Alegre, ano 3, n. 6, p. 170-198, jul./dez. 2001.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro, volume 1: parte geral. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.



[1] Acadêmica do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Teoria econômica do Estado desenvolvida por Karl Marx que apresentava características o capitalismo.

[3] Embora a pena de multa se confunda com a prestação pecuniária, tecnicamente possui pré-requisitos diferentes para ser aplicada.