A LEI Nº. 12.694/2012 E A INSTITUIÇÃO DO “JUIZ SEM ROSTO”: a busca pela proteção dos magistrados e a violação aos princípios básicos do direito penal[1]

 

Ingra Fernandes Costa

 Karina Rocha Mousinho [2]

Cleopas Isaías Santos[3]

Sumário: Introdução; 1 A realidade do país e a necessidade da Lei 12.694/12; 2 A manutenção dos princípios básicos do direito penal 3 O crime organizado frente ao Estado intimidado; 3.1 A fragilidade na relação entre magistrado e sua segurança; 3.2 O retrocesso da lei perante a situação atual; 4. As consequências de um julgamento coletivo. Conclusão; Referências.

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo analisar e estabelecer bases para a compreensão do problema que acontece na atualidade e coloca em risco a vida de juízes criminais que cumprem seus deveres com honestidade e profissionalismo, bem como a solução encontrada para tal fato, que é a figura do juiz sem rosto. Para isso, parte-se da hipótese de que a causa da sua existência é o fortalecimento do crime organizado, sendo assim é traçado um panorama geral sobre o problema. No primeiro momento é feita a ilustração com casos que já aconteceram, mostrando sua gravidade, em continuidade é desenvolvida uma crítica sobre a solução encontrada para a diminuição dos assassinatos à juízes, onde é questionado o funcionamento e aplicação do julgamento coletivo, bem como se a segurança será garantida. 

Palavras-chave: Juiz sem rosto, crime organizado, segurança, princípios.

INTRODUÇÃO

Com a crescente pressão feita em face de magistrados atuantes em processos de crimes com grande complexidade, percebe-se que esses profissionais estão cada vez mais vulneráveis nas mãos de organizações criminosas, que colocam em risco não só o trabalho exercido por tais, como a segurança particular. Os casos de assassinato, perseguição e terrorismo que sofrem os juizes responsáveis por julgar grandes crimes estão cada vez mais corriqueiros.

Em decorrencia desses fatos, foi sansionada pela Presidenta Dilma Rousseff a lei nº 12.694/2012 que cria a figura do “juiz sem rosto”, permitindo a atuação de um grupo de magistrados em julgamentos de organizações criminosas. Com ela, ao sentir-se ameaçado,o juiz poderá solicitar o sorteio de mais 2 profissionais. Em análise à lei, percebe-se que há um dilema surgindo, onde pontos de vistas bastante divergentes.

­­­­­­­­­­­­­­­O trabalho científico em questão visa analisar o tema a partir da colisão entre alguns princípios: Como continuar garantindo que princípios básicos do processo penal continuem sendo respeitados, como a publicidade e motivação das decisões judiciais, juiz natural e a identidade física do juiz? Do mesmo modo, como garantir e entregar nas mãos do próprio juiz a decisão sobre se aquele caso representa ou não risco para ele e sua família, sem uma prévia análise de inteligência policial dos fatos?  

Em continuidade, o trabalho expõe que a realidade no país que mostra um crime cada vez mais organizado frente a um Estado cada vez mais acuado (Estado este que gera cada vez mais violência, com leis cada vez mais severas em busca de uma paz social), encontra na figura do juiz sem rosto uma solução para suas próprias seguranças. Alguns questionamentos críticos serão debatidos durante o desenvolvimento do trabalho, como: A segurança dos juízes que normalmente é feita por policiais, protegerá esses magistrados dos policiais bandidos? Será essa a solução para o crime ou o retrocesso ao converter o julgador em antigos carrascos que executavam as vítimas sem identificar os rostos? Por fim será avaliada a consequência para a sociedade, para o criminoso e para o juiz de um julgamento coletivo, bem como será ressaltada a importância do tema e que medidas efetivas precisam ser adotadas para que tal situação seja contornada. 

1 A REALIDADE DO PAÍS E A NECESSIDADE DA LEI 12.694/12

 

Algo bastante preocupante vem ocupando lugar de destaque nos noticiários brasileiros da atualidade, e mais ainda, é motivo de vários debates sobre o tema.

Andar com escolta mudou tudo na minha rotina, eu vivo com segurança 24 horas por dia. Policial dorme em casa, como se fosse membro da família... Eu sou acompanhado por uma equipe, tenho um posto da Polícia Federal (PF) dentro de casa e uso carro blindado da própria PF. A parte social também muda completamente. Fica praticamente nula. Eu só saio à noite, quando há extrema necessidade. (ORÁCIO, 2012).

O trexo descrito acima faz parte de um depoimento do juiz Odilon de Oliveira, da  3ª Vara Federal de Mato Grosso do Sul, em entrevista ao jornalista Carlos Eduardo Orácio para sua coluna. Casos como esse e como o da juíza Patricia Acioli que morreu assassinada em 2011, vítima de vingança dos réus, mostra o alarmante crescimento das organizações criminosas. A violência do país tem canalisado uma nova área de atuação forte,  onde bandidos perseguem profissionais da justiça, como a juíza em questão, violentando àqueles que estão apenas fazendo com que o direito seja cumprido e garantido em toda a sua plenitude.

Esses acontecimentos crescentes têm alarmado a sociedade, e debates sobre uma mudança nas normas penais e processuais surgiram, pois é mais do que constatado que algo precisa ser feito. De acordo com o entendimento do Juiz da 1ª Região, Roberto Veloso:

O Estado brasileiro não pode admitir que fatos dessa natureza aconteçam e se repitam, sem a tomada de posição imediata e contundente contra os autores e mandantes de tão bárbaro crime. Esse fato não é isolado e nem pode ser tratado como episódico, pois dezenas de juízes espalhados por nosso país convivem diariamente com ameaças de morte e de agressão física. (VELOSO, 2011).

De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça, até agosto de 2012 uma média de 134 juízes estão ameaçados de morte no país. Esse número alarmante mostra a proporção grave que a situação vem tomando e portanto, que algo precisa ser feito e provavelmente modificado no sistema brasileiro.

Foi instaurada a Lei 12.694/12 criando a figura do “juiz sem rosto” como combate à violência cometida contra os juizes, onde esses podem, nos julgamentos de crimes praticados por oganizações criminosas, decidirem pela formação de um colegiado (artigo 1º da Lei). Tal colegiado é formado pelo juiz do processo e por outros 2 juizes escolhidos por sorteio, conforme dispõe o § 2º do artigo 1º.

2 A MANUTENÇÃO DOS PRINCÍPIOS BÁSICOS DO DIREITO PENAL 

 

O primeiro ponto que precisa ser debatido ao analisar a implementação dessa nova lei, diz respeito à manutenção de princípios básicos do direito penal. A lei de proteção ao juízes se fez necessária frente a uma realidade alarmante já descrita anteriomente. Apesar disso questiona-se ser essa a melhor forma de combater o crime contra os magistrados.

Alguns questionamentos são colocados em evidência e merecem destaque. O primeiro deles é o respeito ao princípio da publicidade, uma vez que a lei prevê reuniões sigilosas por parte do orgão colegiado. “§ 4º As reuniões poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial”.

Deverá ser pontuada também a violação do princípio do juíz natural, aquele previamente constituído para julgar de forma imparcial, vez que o colegiado quando é constituído, o crime já aconteceu. Da mesma forma, o princípio da identidade física do juiz não é respeitado, visto que não existe previsão para 3 juízes participarem de colheita de provas. Assim entende o professor da USP Pierpaolo Bottini.

Dois magistrados que integrarão o colegiado poderão determinar a sentença sem terem participado de fases anteriores do processo, como a produção de provas, interrogatórios e audiências. Quisesse ser a lei coerente com a identidade física, estabeleceria um colegiado que participasse também dos atos probatórios, da instrução do processo (BOTTINI, Pierpaolo).

Essa lei propõe ainda que o voto divergente não seja revelado. Assim a parte não saberá quem votou de forma divergente, o que poderá prejudicar consubstancialmente a sua defesa, ferindo o princípio da ampla defesa e do livre convencimento do juiz, uma vez que obrigatoriamente vai de encontro com o seu entendimento, ao tratar do voto divergente. Nessa mesma linha de raciocínio, o professor da USP Pierpaolo Bottini também questiona o fato do réu não ter o direito de saber quais foram os argumentos expostos. “§ 6º As decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro”. Ele afirma que o réu tem o direito de saber quais os argumentos que foram expostos, bem como o teor e os fundamentos da decisão, especialmente sobre aquelas que divergiram das demais. “Em tempos de transmissão ao vivo das sessões do STF, do CNJ, e de aprovação da lei de transparência, parece um despropósito a criação de decisões ocultas, que não são expostas ou juntadas aos autos”, afirma.

Sendo assim, percebes-se que essa lei ao não levar em consideração o respeito a tais princípios básicos, pode reduzir, dificultar ou mesmo anular os meios que atingem a defesa plena do indivíduo.

3  O CRIME ORGANIZADO FRENTE AO ESTADO INTIMIDADO;

 

A situação narrada até o presente momento  não representa apenas uma parcela isolada na sociedade. A violência e a criminalidade crescem cada vez mais dentro de um estado que não consegue colocar em prática suas medidas para estancar ou ao menos minimizar os efeitos do crime na sociedade, onde sequer as medidas básicas de proteção carcerária são respeitadas, e a ressocialização não consegue ser promovida. A realidade consegue ser oposta à todas as teorias existentes sobre a pena. O resultado disso é o desenvolvimento de revoltas que levam à mais violência, dando espaço para o fortalecimento de organizações criminosas fortes o suficiente para desafiarem o Poder Público, como fazem.

Corroborando com o que foi dito, informação encontrada no texto do professor Luiz Flávio Gomes, conta com a fala de Luigi Ferrajoli em sua lectio doctoralis em Tucuman (Argentina), no dia 27 de junho de 2012, onde diz que:

 O crime organizado tem hoje um peso financeiro e econômico sem precedentes, visto que possui caráter global (muitas vezes) e conta, ademais, com um poder destrutivo impressionante [destruição do ser humano, da natureza, das condições necessárias para a vivência democrática etc.]. Estamos neste momento experimentando a mundialização da economia e do mercado, sem a correspondente globalização da Justiça assim como dos direitos e garantias fundamentais. A fortaleza do crime organizado (terrorismo interno ou internacional, máfias, narcotraficantes, exploração ilícita dos jogos etc.) ao se deparar com a fraqueza do sistema jurídico e estatal de controle, sobretudo internacional, conduz a um cenário de regressão social onde vigora a “lei do mais forte” (a lei do mais selvagem). (Grifo nosso).

É partindo da análise desse fato sobre a sociedade atual que outra questão é levantada, além da violação de princípios já comentada. A lei busca solucionar um problema nessa gravidade através de uma medida na qual altera a burocracia de trabalho do juiz. Talvez no primeiro momento seja algo mais rápido e de fácil resultado, porém é preciso entender que mais do que a atuação do juiz, a alteração precisa ser feita na sociedade, com ajuda da criminologia crítica e sociologia, estudos sobre o crime a pena precisam ser avaliados e a partir daí algo efetivo deverá ser pensado. Assim entende Luiz Flávio Gomes.

O mal da edição das leis no nosso país reside no seguinte: nada (ou pouco) se faz para combater as causas do problema. Não se resolve o problema, sim, ilude-se a população com novas medidas simbólicas, que podem até surtir algum efeito psicológico no princípio, mas são perniciosas a médio e longo prazo, porque as condições materiais geradoras do problema vão se agravando a cada dia, sem que medidas concretas para enfrentá-las sejam tomadas. (GOMES, Luiz Flávio.)

Se algo não for pensado para alterar toda sociedade e o combate ao crime organizado, essa será uma medida que a médio e longo prazo se mostrará ineficaz. Vale ressaltar que a lei não prevê solução para os mais de 100 juízes que, atualmente, sofrem constantes ameaças.

Há que ser pontuado também o fato de que a lei objetiva uma solução para a violência, porém é questionável se essa é, de fato, a melhor forma de lograr êxito, uma vez que essa medida mostra receio e insegurança por parte de quem deveria estar no controle da situação, o Estado, podendo resultar num fortalecimento ainda maior das organizações criminosas e consequentemente do terrorismo que causam perante os profissionais da justiça e da sociedade como um todo.

3.1 A fragilidade na relação entre magistrado e sua segurança

 

Questão que deve ser ressaltada remete ao assassinato da juíza Patrícia Acioli, mais uma vez. É interessante constatar que os responsáveis por sua morte, os criminosos que cometeram essa barbárie são policiais. 11 policiais foram os suspeitos pelos crimes e respondem ao processo.

Paulo Roberto Melo, promotor que trabalhava com Patrícia, pontua algo bastante relevante sobre esse caso, vez que um dos principais problemas da segurança dos magistrados continua:

A segurança, tanto dos promotores como dos juízes, ela é normalmente feita por policiais e nos dias que a gente vive, a gente tem muitos réus são policiais. Você não sabe quem conhece quem, o nível de extensão de relacionamento que essas pessoas têm entre si (MELO, Paulo Roberto).

Portanto, é necessário analisar até onde compensa a proteção realizada por policias, quando estes já passaram a fazer parte do mesmo grupo de criminosos e não mais cumprem o seu papel perante a sociedade. Esse fato é um ponto bastante forte na análise dessa situação de perigo que enfrentam os magistrados, pois deixa claro que o problema é bem maior e que a solução precisa ser pensada de forma mais abrangente, atingindo os conceitos atuais sobre segurança, crime, Estado, polícia e bandido.

3.2 O retrocesso da lei perante a situação atual

 

Emblemático debate sobre o assunto em questão é feito também sobre a figura do juiz sem rosto perante o Estado Democrático do Direito no qual vivemos. O juiz Siro Darlan de Oliveira, da 1ª Vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro acredita ser essa lei é um retrocesso, uma vez que, de acordo com os princípios já citados, o juiz não pode se esconder para julgar. O réu tem o direito de saber quem cumpre essa atividade. Assim, faz uma comparação inteligente entre a novidade legislativa e os carrascos, aqueles que executavam suas vítimas sem mostrar os rostos:

A proposta dos ‘juízes sem rosto’ constitui uma afronta à magistratura porque implica no retrocesso de converter o julgador em carrasco que executa suas vítimas sem se identificar. O juiz prolata a sentença, mas não se identifica, oculta-se, esconde-se, acovarda-se. O julgamento impessoal pode ser um precedente que justificará toda forma de arbítrio e a volta do pelourinho é a imagem que mais se aproxima dessa forma medieval de ‘fazer justiça’. Assim como os carrascos da idade média, os juízes terão que esconder seu rosto com um capuz. Nada mais vergonhoso e covarde. (ALVES, 2006.)

Da mesma forma, em artigo publicado no O Globo (22.06.12, p. 7) o Ministro Fux defendeu uma campanha pela vida digna da sociedade, que deve ser levada a cabo “por aqueles que almejam erradicar a marginalização para o bem de todos, ainda que para alcançarem esse desígnio sejam ‘homens sem rosto’”. De acordo com sua opinião, deve-se colocar o juiz sem rosto “diante da criminalidade, tal qual um agente desconhecido e infiltrado capaz de vencer esse flagelo por que passa a sociedade brasileira”. Menciona em favor da tese a Convenção de Palermo, o II Pacto Republicano, a Resolução n. 3 do CNJ, a lei processual espanhola, a experiência exitosa (sic) da França e da Colômbia etc.

A pesar disso, o professor Luiz Flávio Gomes em comento a publicação afirma que o ministro confundiu o juízo colegiado com o juiz sem rosto, fazendo uma defesa deste último, porém dando a impressão de que defende, na verdade, o primeiro. O professor afirma que conhecendo bem a competência do Ministro Fux faz-se acreditar que o mesmo apenas confundiu-se. Nos dizeres do professor:

Ficaríamos muito entristecidos se fosse o contrário, ou seja, se ele efetivamente defendera a validade de uma instituição falida que é ultrarreacionária, uma aberração dos tempos da Inquisição, um retrocesso sem precedentes, uma ideia fora do seu tempo, uma violação à cultura Ocidental, um desvio na linha civilizatória evolutiva da humanidade, um descompasso com a modernidade, para além de constituir um deslize deplorável da pós-modernidade. (GOMES, 2012).

O outro lado no debate sobre esse ponto específico acredita que a lei 12.694 não criou o chamado juiz sem rosto, caracterizado por não revelar sua identidade civil. Juiz sem rosto é o juiz cujo nome não é divulgado, cujo rosto não é conhecido, cuja formação técnica é ignorada. E nada disso foi instituído pela nova lei, pois os juízes por ela são conhecidos, tendo os seus nomes divulgados, somente não se divulga divergência entre eles. (GOMES, 2012).

4 AS CONSEQUÊNCIAS DE UM JULGAMENTO COLETIVO

 

De acordo com a lei: “§ 1o O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será dado conhecimento ao órgão correicional”. Sendo assim, entende-se que o juiz precisa se sentir ameaçado e provar que um membro da organização criminosa está fazendo ameaças constantes.

Tal fato leva à interpretação acerca da fragilidade de tal situação, já que há a possibilidade do inquérito aberto pela Polícia Federal não constatar que existe uma ameaça, podendo o réu entrar com um processo alegando calúnia ou difamação. Fato bastante contraditório, uma vez que o objetivo dessa medida é enfraquecer o crime organizado.

É por isso, portanto, que alguns, como o Presidente da Associação de Magistrados do Rio de Janeiro, acreditam que o mapeamento de risco não deve ficar sobre a impressão daquele que sofre tal risco, “nós acreditamos que a verificação do risco é um trabalho de inteligência policial, observando se há ou não há risco para o magistrado e para sua família”, porém o que mais uma vez coloca em discussão até onde devemos confiar na integridade do policial em questão.

Em decorrência disso, mais um ponto que merece ser observado é o atrito entre juiz e réu. O juiz Odilon de Oliveira da 3ª Vara Federal de Mato Grosso do Sul, participou da comissão que desenvolveu o projeto dessa lei e tem o seguinte ponto de vista, ilustrado com um possível caso concreto:

Tem ainda a possibilidade de criar um atrito entre o juiz e o réu, caso não seja possível provar a ameaça, possibilitando que a defesa solicite a suspensão do juiz. Além de um processo por denunciação caluniosa que o juiz vai sofrer, ele ainda vai correr o risco de ser suspenso do processo, pois o próprio Ministério Público pode arguir a suspensão do magistrado. Objetivamente o juiz terá que dizer que está com medo e isso pode ser relacionado a um desequilíbrio emocional (...) como é que o juiz pode conduzir um processo se ele está com medo? O acusador, o MP, irá considerar que o juiz vai beneficiar o réu e vai arguir a suspensão dele e o réu, sabendo disso, irá usar a situação a seu favor. (grifo nosso). (ORÁCIO, 2012).

 

Há também que ser considerado o fato do país não ser preparado para a aplicação dessa lei. O colegiado precisa ser formado, porém não são todas as cidades, ou melhor dizendo, praticamente só as capitais possuem quantidade de juízes suficiente para que esse sorteio seja feito. O juiz Odilon também opina sobre esse assunto:

A divisão judiciária não permite essa disponibilidade. Em razão da extensão do país, é inviável a formação de um colegiado. O Brasil possui cerca de três mil comarcas, 70% delas possuem apenas um juiz, e muitas são de difícil acesso e distantes umas das outras. (ORÁCIO, 2012).

CONCLUSÃO

A crescente pressão feita por parte do crime organizado, onde encontraram na vingança aplicada contra os juízes responsáveis pelas suas dissoluções e aplicação justa das penas, tem mostrado uma nova forma de aterrorizar a organização do Estado e a paz social. Muitos juízes já foram assassinatos e outros continuam sobre forte vigilância 24 horas por dia, pois sofrem ameaças constantes de bandidos que já deram provas de que partem para as “vias de fato” e não ficam apenas no âmbito de intimidações. Uma medida de combate a essa situação precisava ser pensada com urgência, o que deu origem à lei 12.694/2012.

Diante de tudo o que foi exposto, pode ser concluído que com a instituição dessa lei, mais especificamente, com a criação de um colegiado para o julgamento desses casos, o Estado acaba por beneficiar o crime organizado, uma vez que a própria lei permite que ele se esconda atrás dos seus atos. Algo precisa ser feito, porém da forma que está sendo conduzida a situação, mostra a falta de resistência na qual o crime organizado se fortalece ainda mais.

Sendo assim, constata-se que outras ações mais importantes devem ser adotadas para enrijecer a legislação penal. Uma estrutura onde o bandido passe a respeitar e ter medo do policial. Onde o policial que protege não só a sociedade, como também faz a proteção particular dos magistrados contra os criminosos possa encarar seu papel com seriedade e profissionalismo.

  O sistema de proteção à testemunha precisa ser reforçado, uma vez que hoje é reduzido apenas ao policial, única figura que depõe contra o crime organizado, o que se mostra bastante duvidoso atualmente, onde eles próprios acabam participando dessas organizações criminosas. Da mesma forma, o fortalecimento do sistema prisional também deve ser priorizado uma vez que é de conhecimento de todos que mesmo presos os bandidos continuam comandando suas facções, telefonando, passando suas ordens, o que não mostra nenhum tipo de enfraquecimento do crime.

Portanto, não desmerecendo a Lei que cria o “Juiz sem Rosto” e respeitando e corroborando com a grave situação enfrentada no país, é sintetizado através do entendimento deste trabalho que antes de pensar em qualquer ação de proteção aos juízes, é necessário que seja pensado em um meio eficaz de fortalecer o Estado, que é o detentor do real problema desencadeante dessa situação. Para que haja eficácia na atividade profissional desses juízes e para que isso não resulte nos seus assassinatos, o Estado precisa readquirir o respeito e o criminoso deve voltar a temer essa organização.

REFERÊNCIAS

ALVES, Léo da Silva. As duas faces dos "juízes sem rosto". Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1163, 7set. 2006 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8798>. Acesso em: 7 nov. 2012.

 

BOTTINI, Pierpalo. Lei do juiz sem rosto viola garantias constitucionais. Disponível em: <http://ibccrim.jusbrasil.com.br/noticias/100014952/lei-do-juiz-sem-rosto-viola-garantias-constitucionais>. Acesso em: 03 nov. 2012.

GOMES, LUIZ FLÁVIO. Lei de Proteção aos Juízes não vai pegar; faltam recursos. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-ago-02/coluna-lfg-lei-protecao-aos-juizes-nao-pegar-faltam-recursos>. Acesso em: 03 nov. 2012.

GOMES, Luiz Flávio. Ministro Luiz Fux e o juiz sem rosto. Disponível em: < http://www.institutoavantebrasil.com.br/artigos-do-prof-lfg/ministro-luiz-fux-e-o-juiz-sem-rosto/>. Acesso em 05 nov. 2012.

MELO, Paulo Roberto. Lei cria a figura do “juiz sem rosto”. [online]. [visto em youtube]. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=aHaqT0fIsRc>. Acesso em: 02 nov. 2012.

ORÁCIO, Carlos Eduardo. Juiz Odilon diz ser contra lei “juiz sem face” e aponta beneficio ao crime organizado. Disponível em: <http://www.midiamax.com.br/noticias/809479>. Acesso em 05 nov. 2012.

VELOSO, Roberto. A violência contra os juízes. Disponível em: <http://www.portalaz.com.br/coluna/roberto_veloso/225353_a_violencia_contra_os_juizes.html>. Acesso em: 05 nov. 2012.

 

 

 

 



[1] Paper desenvolvido como requisito parcial para aprovação da disciplina Direito Processual Penal I.

[2] Graduandas do 6º período do curso de Direito (noturno) da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.

[3] Professor da disciplina.