A FUNÇÃO SÓCIO-AMBIENTAL DOS CONTRATOS E DA PROPRIEDADE EM PERSPECTIVA DEMOCRÁTICA

Ecy Vieira Lage
Edna Oliveira
Felipe Vieira Lage
Priscila Hoffman Nascimento
Richard Campos Alves
Monique Lorena Gomes Silva
Wilson Soares da Silva

                   Faculdade de Minas – Belo Horizonte/MG
                                            FAMINAS BH 

Resumo

O presente trabalho objetiva analisar o instituto dos contratos e sua função socioambiental em uma perspectiva democrática, sendo um veículo de circulação da riqueza, centro da vida dos negócios e propulsor da expansão capitalista, proteção social e ambiental. O Código Civil de 2002 tornou explícita que a liberdade de contratar pode ser exercida em consonância com os fins sociais do contrato, implicando nos valores primordiais: princípio da probidade e da boa-fé objetiva, norma de comportamento que deve ser pautado no princípio geral. Todos devem agir de boa-fé nas suas relações recíprocas, fundados na honestidade, na retidão, na lealdade. Embora a formação do negócio jurídico dependa da junção de duas vontades, tem-se o contrato, que dispõe a liberdade de contratar que será exercida em razão e nos limites da função social do contrato, os quais condicionam ao atendimento do bem comum e aos fins sociais. Os interesses individuais das partes contratantes não poderão ser contrários à ordem pública, aos bons costumes, que estão subordinados ao interesse coletivo. A garantia dos direitos fundamentais gera ônus ao cidadão para que exerça de forma atuante e participativa o direito à democracia e a cidadania. Dessa forma a função socioambiental deve ser observada sob a ótica da perspectiva democrática.

PALAVRAS-CHAVE: Contratos. Propriedade. Função Socioambiental. Cidadania.

 

  1. 1.      Introdução

A função socioambiental do contrato e da propriedade é um pressuposto básico para a vida em sociedade, o acordo entre os contratantes é baseado e concretizado em um acordo de vontades. Nesse sentido, não há dúvida que a liberdade, em relação à definição do conteúdo do contrato, deve ser garantida aos contratantes.

 Os estudos sobre a evolução do contrato e sua função socioambiental, são levados ao esclarecimento sob a ótica do “status” constitucional de direitos e garantias individuais, de cláusula pétrea alcançada pelo referido instituto, em particular no texto constitucional vigente, que integram este trabalho. Outro tema relevante tratado nesse trabalho, de forma breve em nível constitucional, é a legislação especial e extravagante do novo código civil de 2002 que trata da garantia e do cumprimento da função social da propriedade.

As normas jurídicas que dividem em regras e princípios preveem uma conduta, consequência jurídica em relação ao seu descumprimento. As regras são independentes entre si, cada uma se dirige a fatos abstratamente previstos, no entanto os princípios contrariam as regras, onde não há ligações do pressuposto de fato.

O direito civil aqui expressado será abordado de forma sucinta, trazendo como elemento essencial o discurso sobre a pena para quem não seguir as normas descritas no contrato. Outro ponto importante a ser tratado é a função social que traz o artigo 5º da constituição, que descreve a propriedade em geral. Então, esse discurso nos leva a refletir sobre a concentração dessa população rural no meio urbano e as consequências e desafios enfrentados pelo poder público nos dias atuais.

  1. 2.      Função social dos contratos

A função social busca um equilíbrio junto ao ordenamento jurídico, que neste contexto trata dos contratos e da propriedade. Desde já sabendo que se encontra assegurado pela Constituição Federal do Brasil (BRASIL, 1988), presentes nos artigos 170 e 225.

Sobre os contratos, eles devem atender às necessidades entre as partes, ou seja, ambos realizam comutativamente suas vontades e firmam em contrato com o que querem e o que esperam um do outro. Entretanto, é possível afirmar que os contratos devam respeitar o princípio da função social, ou seja, além do contrato atender o que é convencionado pelas partes, também deverá sempre cumprir uma função social, que é respeitar os interesses e vontades da sociedade. É possível perceber que o contrato possui uma parte interna e externa.

Sendo a sua parte interna um atendimento aos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, conforme assegurado na constituição, concretizando dessa forma a horizontalização dos direitos, ou seja, não ferindo a dignidade da pessoa humana. Tendo assim uma espécie de equilíbrio interno do contrato, e é o Estado que determina que haja, e se esse equilíbrio não ocorrer, ele assegura medidas para que seja estabelecido, tendo como sanção a anulação do ato. Participando desse processo, tanto as partes quanto o Estado que será um mediador quando necessário.

Na esfera externa, podemos afirmar que o contrato atende o “pacta sunt servanda”, que é o contrato firmado pelas partes se torna uma espécie de lei, porém para que realmente seja considerado com lei, o mesmo deverá atender sua função social.

Já a propriedade, da mesma forma que o contrato, deverá atender a função social, conforme o artigo 5º, XXIII da constituição federal “a propriedade atenderá a sua função social” (BRASIL, 1988).

A doutrina coforme José Afonso da Silva relata que, o dono de determinada propriedade deve utilizá-la atendendo o princípio da função social, pois bem, a questão é que a pessoa não necessariamente deve residir na propriedade para que a função social seja cumprida “a função social da propriedade não se confunde com o os sistemas de limitação da propriedade. Esses dizem respeito ao exercício do direito ao proprietário; aquela, a estrutura do direito mesmo, a propriedade” (SILVA).

É válido ressaltar, que segundo Jose Afonso da Silva “a funcionalização da propriedade é um processo longo” (SILVA), por isso é que se diz que ela sempre teve uma função social, segundo o qual “a função social da propriedade se modifica com as mudanças nas relações de produção” (RENNER). Com isso a função social da propriedade deverá cumprir sempre a sua relação de produção, atendo sempre o bem social.

  1. 3.      Função ambiental dos contratos

Vale ressaltar, que muito antes, em 1920 "a propriedade é função social indispensável à sociedade” (DUGUIT). Os critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos quais são de responsabilidade da propriedade rural atendê-los.

A partir da interpretação de tais requisitos, pode-se perceber que o direito de propriedade condiciona não só a preservação do meio ambiente, mas age também em favor da coletividade, visando o bem-estar de todos.  Os requisitos segundo a constituição federal são:

 I – aproveitamento racional e adequado; II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho e IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e trabalhadores. (BRASIL, 1988).

O advento da medida provisória 2.166-67/2001, modificou o Código Florestal de 1965, o conceito de área de preservação permanente (APP) era apenas doutrinário. A partir de então, este espaço passou a ter uma definição legal e hoje, área de preservação permanente – APP é a:

 Área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preserva os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. (BRASIL, 2001).

Atente-se para o fato de que a finalidade da APP não se confunde com a da área de reserva legal que, nos termos do inciso III do mesmo Art.3º da lei 12.561/12:

Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do Art.12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa. (BRASIL, 2012).

Sabe-se que o novo código florestal distingue duas diferentes espécies de APP:

  • Aquelas que são consideradas pelo só efeito da lei e aquelas consideradas quando assim declaradas por ato do poder público. Interessa-se examinar somente as APPs relacionadas no artigo 4ª do novo código florestal, eis que o seu caput expressamente estabelece que essas áreas podem-se localizar tanto em zonas rurais como urbanas.

Os princípios caracterizadores do direito ambiental têm como escopo fundamental orientar o desenvolvimento e a aplicação de políticas ambientais que servem como instrumento fundamental de proteção ao meio ambiente e, consequentemente, a vida humana.

O Principio do ambiente ecologicamente equilibrado conforme constituição federal, "todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder publico e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para presentes e futuras gerações” (BRASIL, 1988).

O principio da participação comunitária (popular)/Principio democrático, decorre do direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e do regime jurídico do ambiente como bem de uso comum do povo, impondo a toda a sociedade o dever de atuar na sua defesa.

Os recursos naturais devem protegido por cada indivíduo, por se caracterizar um direito difuso, que são todos aqueles direitos que não são atribuídos a somente um individuo ou um grupo específico, pois são expressamente de toda sociedade, sem nenhum tipo de exceção.  Com isso é possível perceber, que se um desses direitos é desrespeitado não irá ter efeito em somente uma pessoa ou grupo, e sim em toda uma sociedade. Tendo em vista que:

Os recursos naturais da Terra, incluídos o ar, a água, o solo, a flora e a fauna e, especialmente, parcelas representativas dos ecossistemas naturais, devem ser preservados em benefício das gerações atuais e futuras, mediante um cuidadoso planejamento ou administração adequada.  (Declaração de Estocolmo).

Contudo percebe-se que como a proteção desses direitos, as gerações atuais e futuras também poderão usufruir e garantir e preservar a sua existência.

O descumprimento da função ambiental da propriedade pode acarretar, conforme a lei 10257/01, “parcelamento ou edificação compulsória, IPTU progressivo, desapropriação com o pagamento de dívida pública” (BRASIL, 2001).

  1. 4.      Democracia e cidadania

O exercício da democracia e cidadania nos contratos e na propriedade não deveria causar conflitos entre os direitos da propriedade e leis ambientais, se os proprietários obtivessem o mínimo de compreensão sobre as leis ambientais vigentes. O principio da função socioambiental da propriedade indaga que não é legitima a emissão de poluentes que vão invadir a propriedade alheia, visando prejudica-los em benefício próprio.

A função social é cumprida quando a propriedade atende critérios e exigências estabelecidas em leis, utilizando adequadamente os meios que garantem direitos, e ao mesmo tempo respeita a propriedade alheia.

Há o principio da cooperação entre os povos na constituição federal: “a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade” (BRASIL, 1988). Este princípio é de vital importância, uma vez que fenômenos poluidores geralmente ultrapassam a fronteira de uma nação, atingindo outros territórios.

Neste principio esta incluída a cooperação no sentido de repasse os conhecimentos de tecnologias e conhecimento de proteção do ambiente obtida pelos países mais avançados e que tem possibilidade econômica de investir e obter resultados nas pesquisas ambientais. Pode-se, exemplificar como participação de cidadania ativa, passeatas, protestos, corridas contra a verticalização e descaracterização de patrimônio público.

  1. 5.      Conclusão

Em virtude dos aspectos mencionados, entende-se que a função social do contrato socioambiental é um pressuposto básico para a vida em sociedade, sendo acordo entre os contratantes baseados e concretizados em uma convenção de vontades, porém os contratantes devem respeitar em primeiro lugar a função ambiental dos contratos.

Tendo em vista que há proteção constitucional a se tratar da função socioambiental do contrato e da propriedade, onde o busca a proteção não só realizado entre as partes, mas também sobre a toda sociedade, onde o Estado intervém buscando a proteção do direito coletivo, denominado de direito difuso.

Contudo com a proteção do direito difuso, é possível afirmar que está assegurando a democracia, que é constituído com a participação da população, representado pelo Estado, já que todos sofrem com os efeitos realizados pelos contratos e também pelas propriedades, que não cumprem a função socioambiental.

Em resumo, todos os contratos e as propriedades deveram sempre ser realizados atendendo sua função social e a sua função ambiental, para que não gere danos ou restrição à sociedade.


Referências

GARCIA, Leonardo de Medeiros e THOMÉ, Romeu - Direito Ambiental - editora: JusPodium - 2 edição, 2010.

SILVA, José Afonso da, Curso de direito constitucional positivo, 25ª ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2005.

GUILHERME, Fernando do Vale de Almeida, Código Civil Comentado, Editora Ridell, São Paulo - Edição Atualizada; 11 de Janeiro 2013.

GONÇALVES, Carlos Roberto, Curso de Direito Ambiental, Ed. Saraiva 14 edição2012.

FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin, Revista dos tribunais - 6ª edição - 2013.

MACHADO, Paulo Afonso Lemes - Direito Ambiental Brasileiro, 12ª edição, 2005.

DUGUIT, Léon, Fundamentos do Direito, São Paulo, Ícone, 1996.

Direito das Obrigações - Sinopses Jurídicas

BRASIL, Lei 10.257/01, www.planalto.gov.br

BRASIL, Constituição federal 1988, www.planalto.gov.br

BRASIL, Lei 12.561/12, www.planalto.gov.br

BRASIL, Lei 10.406/02, Código Civil, www.planalto.gov.br