Introdução:

 

Dentre as várias contribuições sociais que um cidadão pode exercitar, uma de grande relevância se mostra na função de jurado. Prevista na Constituição Federal de 1988, é uma atividade obrigatória que depende de alistamento (voluntário na prática), de cidadãos maiores de 18 anos, mentalmente capazes que têm por responsabilidade condenar, em nome da sociedade a qual representam, o réu que comete os crimes previstos nos artigos 121, §§ 1º e 2º, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados.

O tribunal do júri, conforme a revista eletrônica do Tribunal de Justiça de Minas Gerais Infoco¹, foi criado na Inglaterra em 1215 e os responsáveis pela acusação e sentença eram aqueles que testemunhavam o julgamento do acusado. No século XVII os jurados passaram a ser fixados em número de 12 e após Revolução Francesa o júri foi adotado em quase toda Europa.

No Brasil, o júri é garantido pela Constituição Federal de 1988:

“Artigo 5º, XXXVIII, CF: é reconhecida a instituição do júri, com

a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra

a vida.”

 De acordo com o Código de Processo Penal os jurados são formados por 25 (vinte e cinco) membros, sendo a sessão instalada por com no mínimo 15 (quinze), dentre os quais deverão ser sorteados 7 (sete) que irão compor o conselho de sentença. Os trabalhos realizados em plenário, quase que em sua totalidade, se destinam a formar o convencimento dos jurados, portanto, o juiz, assim como as partes, devem fornecer os meios legais e necessários ao esclarecimento dos fatos. O julgamento, basicamente, é composto por sorteio dos jurados, arguição do réu e de testemunhas, parlatório (exposição de provas e argumentos produzidos pelo Ministério Público e advogados de defesa), quesitos e sentença.

 

Objetivo:

 

            Discorrer sobre a função dos cidadãos escolhidos para compor o rol de jurados nos tribunais de justiça espalhados pelo território nacional e questionar a influência que os profissionais do direito, no caso magistrados, promotores, advogados e defensores, exercem sobre o conselho de sentença.

 

Da Responsabilidade do Júri

 

Em uma análise superficial a função do conselho de sentença parece tarefa simples, pois, os trabalhos são fiscalizados e desempenhados pelo juiz presidente da sessão, pelo membro do Ministério Público e pelo advogado ou defensor público, todos profissionais tecnicamente competentes para conhecerem da natureza da infração cometida pelo (s) acusado (s) e dos procedimentos cabíveis. Entretanto, a falta de capacitação técnica da maioria dos jurados e os quesitos dotados no Brasil levantam críticas.

Cabe ressaltar que a ideia de delegar um cidadão comum a função de juiz de fato, implica deixar que a sociedade decida se o possível criminoso representa ou não risco para o convívio social, mesmo que este tenha incidido no tipo penal. Esta decisão, além de ser influenciada pelas provas documentais e orais juntadas ao processo, está diretamente ligada ao desempenho do promotor de justiça e do advogado/defensor público na fase dos debates. Esses profissionais, capacitados para suas respectivas funções, detêm o dever de direcionar o conselho de sentença a tomar uma decisão. Na prática, muitos processos possuem extenso volume e são complexos, pois, na busca pela verdade real, demandam esforço por parte de peritos e investigadores da polícia na produção de grande quantidade de provas e conclusões que nem sempre são suficientes para ligar o acusado aos fatos. Some-se a isso, a missão de passar todas essas informações, muitas vezes recolhidas e analisadas por meses, em debates orais que duram algumas horas. Não resta dúvida, portanto, quanto a difícil tarefa desempenhada em plenário, tanto pelos jurados quanto pelas partes.

 

Da Influência Exercida pelos Profissionais do Direito

 

Exposta estas considerações, infere-se que os cidadãos que compõem o júri não têm a capacidade de ler, na íntegra, os autos, até mesmo porque, conforme já exposto, não seriam capazes, em sua maioria, de entender o linguajar técnico inerente ao processo, logo o juiz, assim como a parte contrária, deve fiscalizar o andamento e as afirmações colocadas em debate, a fim de evitar que falsos dados ou afirmações desleais sejam postas à apreciação no tribunal, pois, uma má influência pode desencadear em uma decisão injusta para acusado. Uma vez que os jurados dispõem da faculdade de absolver o acusado ainda que provado que este tenha praticado o crime, se assim acharem conveniente (obrigatoriedade do quesito genérico sobre a absolvição²), e ainda, considerando que o juiz está vinculado a decisão do conselho de sentença mesmo que discorde de sua decisão depreende-se que todo o trabalho depende de qual parte expõe os fatos com maior clareza e, não com menos importância, com emotividade, pois:

“O quesito genérico da absolvição veio em benefício da defesa, na medida em que corrigiu odiosa falha do sistema anterior, que permitia que o réu fosse condado, mesmo quando a maioria dos jurados pretendesse absolvê-lo, sob diferentes teses. Por maioria, afastava-se a justificativa; também por maioria, o Conselho de Sentença rechaçava a dirimente; em consequência, acabava-se por condenar o réu, conquanto a maioria pretendesse absolve-lo.

Por essa razão, e também a fim de que se mantenha íntegro o princípio constitucional da plenitude da defesa, é imperiosa a conclusão, com respaldo na Súmula 156 do STF, de que a falta do quesito obrigatório conduz a nulidade absoluta. Logo, mesmo que a absolvição não tenha sido defendida em plenário, o quesito deve ser formulado, sob pena de nulidade absoluta.

A sentença absolutória não especificará o motivo da absolvição, a teor do art. 492, inc. II, do CPP. Note-se que o fundamento da sentença absolutória proferida na segunda fase do júri é o art. 492, inc. II, do CPP, e não o art. 386. Esse sim recomenda que o juiz, ao proferir a sentença absolutória, mencione a causa na parte dispositiva. Aquele não.” (MANZANO, pág.651, 2012).

Há que se dar o devido destaque a emotividade que o orador é capaz de produzir. Essas emoções podem variar entre intensidades de indignação ou simpatia pelo acusado, podendo desencadear situações que levem à condenação ou absolvição, aparentemente, somente por força da capacidade de persuasão do promotor ou defensor. Tais afirmações se baseiam em casos concretos e como exemplo pode-se citar uma ocorrência comum quando determinado réu, na fase de pronúncia, é posto a julgamento pelo tribunal do júri aplicando-se a fundamentação do in dubio pro societate e a acusação, mesmo sem provas patentes, resolve optar por defender a condenação do réu. Ora, é elementar que em localidades por vezes numerosas em habitantes e com acentuadas desigualdades sociais, a criminalidade seja algo natural, logo, a sensação de insegurança aliada ao sensacionalismo midiático tendenciam à intolerância pelos delinquentes, cabendo aqui mencionar a semelhança com a teoria do direito penal do inimigo. Logo a inclinação pela condenação é mais forte, o que torna mais fácil de serem consideradas as afirmações do promotor de justiça, devendo este redobrar o zelo quanto à sua função, pois em plenário deve vigorar o princípio da presunção de inocência, ou seja, in dubio pro reo.

A etapa dos quesitos é talvez o momento mais relevante da função dos jurados, pois, é neste momento que reconhecerão a autoria do crime, se absolvem ou não o réu e, havendo qualificadora, se houve ou não sua incidência. Cabe aqui citação do trecho de Luís Fernando de Moraes Manzano que dispõe os quesitos na ordem em que são perguntados pelo juiz, além de uma breve crítica ao método aqui exposto:

“Os quesitos serão formulados na seguinte ordem indagando sobre (art. 483):

  1. a materialidade de fato;
  2. a autoria ou participação;
  3. se o acusado deve ser absolvido;
  4. se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa;
  5. se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação

Basta uma rápida comparação com o antigo art. 484, que foi revogado e substituído pelo art. 483 supra, para se concluir que os quesitos foram substancialmente simplificados. Adotou-se o critério da simplificação. O legislador caminhou em direção ao adversarial system, em que os jurados debatem livremente a causa, não há sigilo na votação e, ao final, decidem se o réu é guilty ou not guilty, o que ficou patente no terceiro quesito. Melhor seria que o tivesse adotado puramente, em lugar do sistema misto, que ficou no meio do caminho.” (MANZANO, pág.648, 2012).

 

Conclusão:

            Diante da reposta/sentença votada pelo conselho o juiz deve proferir a sentença fixando o tempo e a forma como o réu cumprirá a pena. Baseando-se no que foi exposto neste trabalho, chega-se a conclusão de que o Estado coloca o poder que deveria exercer, nas mãos dos cidadãos. Questionar a conveniência deste método de julgamento é questionar a própria sociedade enquanto eleitora dos legisladores que instituíram o texto da lei. O que se pode afirmar é que o trabalho exercido pelo júri é válido e eficaz, cabendo, portanto, aos profissionais do direito e das demais atividades que auxiliam na busca pela verdade real, zelar por suas funções a fim de provocar as emoções e razões da maneira mais justa para o réu e para a sociedade.

 

Bibliografia:

1-    http://www.tjmg.jus.br/revista/numero_08/materias/materia04.html

2-    MANZANO, Luís Fernando de Moraes. Curso de Processo Penal, São Paulo: 2ª edição. Atlas, 2012.

3-    Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm

4-    DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Código de Processo Penal. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm