A ESTERILIZAÇÃO DAS PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIENCIA MENTAL FRENTE O PRINCIPIO DA DIGNIDADE HUMANA.

 

Camilla Canuto Tanios

Thamires Santana Dantas de Cerqueira

 

 

 

Sumário:1. Introdução; 2. Curatela: breves considerações; 3.Sexualidade e esterilização dos portadores de deficiência mental;  4. Principio da dignidade da pessoa humana e o curatelado 5. Conclusão.

 

RESUMO

Sendo a curatela o instituto jurídico através do qual o juiz nomeia um curador com a finalidade de administrar os interesses de outra pessoa que se encontra incapaz de fazê-lo, o presente artigo irá analisar esse processo de curatela dos deficientes metais. Será realizada uma observação a respeito da sexualidade dos deficientes mentais e sua possível esterilização. Analisando se realmente o curador, como defensor dos interesses do curatelado tem direito de determinar a esterilização deste.

 

 

PALAVRAS CHAVE

 

Curatelado, Esterilização, Dignidade Humana

 

 

 

 

  1. 1.                  INTRODUÇÃO:

O presente trabalho tem por objetivo analisar a esterilização de pessoas portadoras de deficiência ou de doença mental, em razão de entendermos que o tema diz respeito aos direitos de personalidade, coletivos, difusos e ainda a dignidade da pessoa humana, já que como essas pessoas não possuem discernimento suficiente para decidir sobre esse assunto, uma decisão como essa devera ser decidida pelo seu curador, que é a pessoa responsável pela defesa dos interesses do curatelado.

Será realizada ainda uma analise em relação a sexualidade dos deficientes mentais, já que a nossa sociedade contemporânea os considera como pessoas assexuadas, as quais não possuem realização afetiva e sexual pelo fato de não terem autonomia e independência em determinados aspectos da sua vida, o que nem sempre condiz com a realidade. Observando desse modo a vida afetiva desses curatelados e até onde se limita o poder do curador sobre o curatelado.

2.     CURATELA: BREVES CONSIDERAÇÕES

 

 A curatela é o encargo deferido por lei a alguém capaz, denominada curador, com a finalidade de administrar os interesses de outrem que se encontra incapaz de fazê-lo, ou seja, trata-se da proteção ao incapaz maior. Desse modo, segundo os ensinamentos de Beviláqua: "Curatela é o encargo público, conferido por lei, a alguém, para dirigir a pessoa e administrar os bens de maiores, que por si não possam fazê-lo".(BEVILÁQUA)

A regra de que a curatela destina-se somente aos incapazes maiores não é absoluta, uma vez que o Código Civil prevê a curatela do nascituro e de pessoas que, por situações congênitas como adquiridas, não se acham habilitadas para a administração de sua pessoa e seus bens, ainda que se trate de fenomenologia temporária.(PEREIRA, 2006, p.479)

A curatela apresenta cinco características relevantes: seus fins são assistenciais; tem caráter tem caráter eminentemente publicista; tem, também, caráter supletivo da capacidade; é temporária, perdurando somente enquanto a causa da incapacidade se mantiver e a sua decretação requer certeza absoluta da incapacidade.(GONÇALVES, 2010)

O caráter publicista advém do fato de ser dever do Estado zelar pelos interesses dos incapazes. Tal dever, no entanto, é delegado a pessoas capazes e idôneas, que passam a exercer um múnus público, ao serem nomeadas curadoras. O caráter supletivo da curatela, em terceiro lugar, exsurge do fato de o curador ter o encargo de representar ou assistir o seu curatelado, cabendo em todos os casos de incapacidade não suprida pela tutela. Supre-se a incapacidade, que pode ser absoluta ou relativa conforme o grau de imaturidade, deficiência física ou mental da pessoa, pelos institutos da representação e da assistência.(GONÇALVES, 2010)

 

Segundo Maria Helena Diniz, as espécies de curatela podem ser divididas em 3 grandes grupos: a) Curatela dos adultos incapazes; b) Curatelas destacadas da disciplina legal do instituto em razão de suas peculiaridades; c) Curadorias especiais. Conforme a doutrina citada, no primeiro grupo incluem-se os psicopatas, os toxicômanos, os ébrios habituais e os que, por alguma causa duradoura, não podem exprimir a sua vontade. O segundo, trata-se da curatela do nascituro e da curatela do ausente, e o terceiro grupo, trata-se da curadoria que tem uma finalidade específica, que são elas: curadoria instituída pelo testador para bens deixados a herdeiro ou legatário menor; curadoria que se da à herança jacente; curadoria que se da a filho, sempre que no exercício do poder familiar colidirem os interesses do pai com os daquele; Curadoria dada ao incapaz que não tiver representante legal ou se, tendo, seus interesses entrarem em conflito. (DINIZ, 2008, p.630 e 637)

A interdição só poderá ser promovida pelos pais ou tutores; pelo cônjuge(ou companheiro) ou por qualquer parente; e pelo Ministério público, vale ressaltar que esta ordem é taxativa, mas não preferencial, isto é, qualquer das pessoas indicadaspodem promover a ação. (DINIZ, 2008, p.635)

Ao decretar a interdição, o juiz nomeará um curador, onde a lei denomina em seu art. 1775 CC, como curador legítimo o cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato, na falta do cônjuge ou companheiro pode ser nomeado qualquer dos pais, e na falta destes o descendente que se mostrar mais apto. E na falta das pessoas mencionadas, "compete ao juiz a escolha do curador" (art. 1775, §3º), podendo ser pessoa estranha a família do interdito, configurando-se então a curatela dativa. (RODRIGUES, 2004, p. 419)

  1. 2.                  SEXUALIDADE E ESTERILIZAÇÃO DOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA MENTAL

 

 

Os portadores de deficiência mental são aquelas pessoas que possuem certa limitação mental, que não conseguem em regra interagir socialmente com os demais, não possuindo discernimento necessário para realizar decisões a respeito da própria vida e atos da vida civil, precisando de um curador, ou seja, uma pessoa responsável que defenda os seus interesses perante a sociedade. É esse justamente o ponto mais importante do presente estudo, saber se o curador como defensor dos interesses dessa pessoa, possui o direito de decidir pela esterilização deste, visto que a sexualidade dos deficientes mentais é amplamente discutida. (BEVERVANÇO, 2009)

A sexualidade dos deficientes mentais é socialmente construída como um problema para todos os membros da sociedade e do meio em que se inserem, sendo as suas atividades sexuais consideradas inexistentes para as suas famílias e médicos que com eles lidam. (ALBUQUERQUE, 2007, P. 3) Mas é importante deixar claro que a sexualidade esta presente em todas as pessoas, e que especificamente no caso de uma pessoa portadora de deficiência mental, ela esta diretamente ligada a uma maior compreensão de suas reais necessidade e à diminuição dos preconceitos e também aos limites impostos pelo grau de deficiência dessa pessoa. Então uma pessoa apesar de apresentar uma certa deficiência mental, possui sim habilidade para exercer uma vida sexual. (BEVERVANÇO, 2009)

O ato de esterilização de uma pessoa deficiente mental, considerando ser esta incapaz, devera ser decidido pelo seu curador, uma vez que este é o responsável por defender os interesses do curatelado. Assim na medida em que a esterilização corresponde a um esgotamento nas capacidades de reprodução da pessoa, torna-se evidente que o ato de esterilizar um deficiente mental é cômodo e oferece uma garantia de tranquilidade para a família ou responsável no sentido de não precisar se preocupar em vigiar a vida sexual do portador de deficiência mental. Mas esse beneficio oferecido a família e responsáveis, em contrapartida ofende os direitos de personalidade, e consequentemente a própria dignidade da pessoa. (BEVERVANÇO, 2009)

É importante ressaltar ainda que a sexualidade é um fato importante para o desenvolvimento da personalidade, e que, portanto não devem ser recriminadas, mas sim tratadas como algo natural. Pois apesar dos fatores ligados a sexualidade passarem pelo crivo do discernimento, as questões instintivas relacionadas a pulsão, que norteiam a vontade podem ter predominância sobre a racionalidade e estão presentes tanto em pessoas consideradas normais, quanto naquelas que não possuem deficiências ou transtorno mental. (SCRIBONI, 2011)

4.     PRINCIPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O CURATELADO

 

Este tópico tem por finalidade afirmar sobre a importância do principio da dignidade da pessoa humana, visto que a família atualmente é vislumbrada como instrumento que promove o desenvolvimento pessoal do ser humano.

Não é tarefa fácil definir o que é dignidade, mas ainda assim a doutrina consegue fazer a conceituação de tal principio constitucional. A dignidade da pessoa humana pode ser entendida como sendo não só um reconhecimento do valor do homem em sua dimensão de liberdade, como também de que o próprio Estado se constrói com base nesse princípio. (CARVALHO, p. 654, 2008).

Assim, percebe-se que o principio da dignidade humana, visa garantir o respeito à pessoa humana. Além de respeitar direitos e garantias da pessoa, o referido princípio almeja promover a realização pessoal e fazer com que se evite sofrimentos, buscando se assim a plena felicidade de todos.(PINTO, 2009)

Desse modo, toda matéria de Direito Civil, deve ser revista sob um enfoque constitucional, em outras palavras, deve ser atribuído a toda e qualquer norma infraconstitucional interpretação constitucional, ou seja, sempre deverá prevalecer os princípios constitucionais. Como é sabido, são vários os males mentais e ultra diversificados os seus graus. Isso significa que inúmeras pessoas que padecem de deficiência ou doença mental conservam a possibilidade de decisão sobre constituir família, procriar, exercitar como lhe aprouver a afetividade. (BEVERVANÇO, 2009)

 O “planejamento familiar é livre decisão do casal”, a Constituição Federal impede que qualquer lei infraconstitucional possa exigir autorização do Poder Público para qualquer ato do planejamento familiar.(BEVERVANÇO, 2009)

Deve o Poder Público, fazer cumprir urgentemente com a previsão legal de atenção ao direito ao planejamento familiar para as pessoas portadoras de deficiência já estabelecido na Lei nº 7.853/89, trazendo em seu bojo os princípios estabelecidos na Lei nº 9.263/96: informação, orientação e acompanhamento na utilização de métodos contraceptivos que devem por óbvio estar adaptados às necessidades especiais das pessoas portadoras de deficiência. Urge, portanto, a criação de programa de planejamento familiar para essas pessoas, mormente para os portadores de deficiência mental. Acaso seja a esterilização indicada, entendemos deva ser a última instância de um processo técnico científico desenvolvido e não como "atalho" para enfrentamento da sexualidade e reprodução de portador de deficiência. Lembra-se, por oportuno, que o direito de constituir família deve sempre que possível ser preservando qualquer que seja a deficiência. (BEVERVANÇO, 2009)

Portanto, a esterilização só é aceitável se realizada com responsabilidade, inserida num programa de planejamento familiar voltado à prestação de assistência à saúde especializada para a pessoa portadora de deficiência.

 

 

 5. CONCLUSÃO

Fica claro que apesar da pessoa ser portadora de deficiência mental ela goza assim como qualquer outra pessoa normal de sexualidade, o que a permite ser capaz de formar uma família, apesar de suas limitações.

 O curador no seu dever de defender os interesses do curatelado tem o dever de realizar as escolhas que melhorem a vida do deficiente mental e não limitar a vontade deste, não tendo, portanto, o direito de determinar que seja realizada uma esterilização do curatelado, visto que essa esterilização em regra só traria benefícios aos responsáveis pelo curatelado.

 

REFERÊNCIAS

 

ALBUQYERQUE, Marta. A sexualidade na deficiência menta profunda – Um estudo descritivo sobre atitudes de pais e profissionais. 2007. Disponível em: http://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0367.pdf. Acesso em: 1.out 2011

BEVERVANÇO, Rosana Beraldi. Esterilização da pessoa portadora de deficiência. 2009. Disponível em: http://www.ppd.caop.mp.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=386. Acesso em 2 out 2011..

BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de Família, 2007. Vol. 5.

CARVALHO, Kildare Gonçalves, Direito Constitucional, Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional Positivo, 14º edição, revista e atualizada e ampliada, Belo Horizonte: Dey Rey, 2008.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 5 volume: Direito de Família. 23 ed., São Paulo: Saraiva, 2008.

GONÇALVES, Carlos Roberto .Curatela. Disponível em:<http://abadireitodefamilia.blogspot.com/2010/05/curatela.html> Acesso em: 02 out 2011

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instruções de Direito Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2006.

PINTO, Davi Souza de Paula. Artigo 1.780 DO CC-2002. Disponível em: <http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=2507&idAreaSel=2&seeArt=yes> Acesso em: 05 out 2011

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família: volume 6. São Paulo: Saraiva, 2004

SCRIBONI, Marilia. PL quer garantir liberdade sexual de deficiente mental. 2011. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2011-nov-02/projeto-lei-garantir-liberdade-sexual-deficientes-mentais. Acesso em 3 out 2011.