O vocábulo Jurisprudência, atualmente, é adotado para indicar os precedentes judiciais, ou seja, a reunião de decisões judiciais, interpretadoras do Direito vigente. Em seu contínuo labor de julgar, os tribunais desenvolvem a análise do Direito, registrando, na prática, as diferentes hipóteses de incidência das normas jurídicas. Sem o escopo de inovar, essa atividade oferece, contudo, importante contribuição à experiência jurídica. Ao revelar o sentido e o alcance das leis, o Poder Judiciário beneficia a ordem jurídica, tornando-a mais definida, mais clara e, em conseqüência, mais acessível ao conhecimento. Para bem se conhecer o Direito que efetivamente rege as relações sociais, não basta o estudo das leis, é indispensável também a consulta aos repertórios de decisões judiciais. A jurisprudência constitui, assim, a definição do Direito elaborado pelos tribunais.
A jurisprudência acerca do tema estudado - A Ilegalidade da Execução de Contratos por meio de Execução Fiscal ? atualmente pende para o lado do fisco, em que pese sua não unanimidade. Tanto os Tribunais Regionais Federais quanto o Superior Tribunal de Justiça, que fique bem claro, atualmente, tem posicionamento que pende à tese da Fazenda Pública.
Demonstrar-se-á, que o posicionamento do STJ foi se modificando com o decorrer do tempo, ao passo que, em passado recente, admitia-se a tese da ilegalidade do procedimento executório fiscal para cobrança de contratos privados. Já nos tribunais regionais federais, principalmente o da 4ª Região, até hoje, há posicionamento divergente.


1 NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA


O ministro do STJ à época, Waldemar Zveiter, demonstra seu posicionamento acerca do tema estudado, frisando a natureza privada sob qual o contrato de mútuo se reveste:

PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL - ACORDÃO EMBASADO EM RAZÕES CONSUBSTANCIADAS EM MATERIA CONSTITUCIONAL - DIVIDA NÃO TRIBUTARIA - INCABIVEL O PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL. I - ACORDÃO EMBASADO EM RAZÕES CONSUBSTANCIADAS EM MATERIA CONSTITUCIONAL NÃO SE MOSTRA APTO A REEXAME EM SEDE DE ESPECIAL. II - SE O CONTRATO DE MUTUO (EMPRESTIMO BANCARIO), OBJETO DE EXECUÇÃO POR TITULO CAMBIARIFORME, VERSA RELAÇÃO JURIDICOMATERIAL DE NATUREZA PRIVADA, A CONTROVERSIA A RESPEITO DE TAL NÃO PODE SER APRECIADA, QUANDO VEICULADA ATRAVES DA EXECUÇÃO FISCAL, NEM, PARA O CASO, EM HOMENAGEM AO PRINCIPIO DA INSTRUMENTALIDADE, OS ATOS PROCESSUAIS JA PRATICADOS PODEM SER APROVEITADOS, POSTO QUE A CONSTITUIÇÃO DO TITULO EXECUTIVO FOI EFETIVADA SEM O PROCEDIMENTO REGULAR DA DIVIDA ATIVA, MORMENTE QUANDO ESSE ASPECTO EMBASA O "DECISUM" E O INSTRUMENTO ORIGINAL DA DIVIDA NÃO CONSTA DOS AUTOS. III - REGIMENTAL IMPROVIDO.

Assim, por conseqüência lógica, não cabe discussão material quando o título executivo apto a execução pelo rito do CPC, utiliza-se erroneamente do rito restringido da Execução Fiscal. É o procedimento incorreto.
A decisão do ministro Waldemar Zveiter, tornou-se paradigma para futuras decisões no mesmo sentido e, até hoje, é citada em decisões mais recentes.
O ex-ministro Cesar Asfor Rocha também já decidiu por essa linha. É imprópria a Execução Fiscal lastreada por contrato bancário de caráter privado:

EXECUÇÃO FISCAL FUNDADA EXCLUSIVAMENTE EM CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. OPERAÇÃO BANCÁRIA DE CARÁTER PRIVADO. IMPROPRIEDADE DO EXECUTIVO FISCAL. PRETENDIDA CONVERSÃO EM EXECUÇÃO COMUM. IMPOSSIBILIDADE. INICIAL NÃO APARELHADA COM TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. O executivo fiscal aparelhado apenas com certidão de inscrição em dívida ativa e que foi julgado inviável nas circunstâncias não é conversível em execução comum diante da ausência de título executivo enquadrável no artigo 585 do Código de Processo Civil. Recurso especial não conhecido.

Contrato privado é ato jurídico perfeito quando revestido de completa legalidade e na observância dos princípios contratuais, tais como boa-fé objetiva e função social, por exemplo. Gerando, por decorrência, direito adquirido, sendo protegido de lei futura que altere o disposto sob a égide da lei à época.
Os julgados acima transpostos são dotados de clareza e objetividade. Contrato privado tem seu rito próprio para o caso de exigência de cumprimento, ao passo que o crédito fiscal, consubstanciado através da certidão de dívida ativa, possui rito especial, definido por lei e com prerrogativas especiais e não desproporcionais ou desiguais, se visto sob a ótica da supremacia do interesse público.
Entretanto, não pode se fiar e amparar-se na supremacia do interesse público, procedimento que afronta legislação vigente, inclusive a Constituição Federal e seus princípios norteadores. A supremacia do interesse público não pode prevalecer sobre os princípios da segurança jurídica, do ato jurídico perfeito, do direito adquirido, do contraditório e da ampla defesa. Obviamente e, como não poderia deixar de ser, alguns princípios são preponderantes em relação a outros, ou seja, possuem maior peso ou influência em determinada situação e à luz do caso aplicável. Contudo, entende-se, pelo exposto no presente estudo, que tal princípio (supremacia do interesse público) não pode prevalecer sobre tantos princípios, tão ou mais sólidos que este.


1.1 Posição contrária STJ


Posição recente do STJ entende possível e legal, a execução de contratos privados por meio de execução fiscal. Nesse sentido:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CÉDULA RURAL HIPOTECÁRIA. MP Nº 2.196-3/01. CRÉDITOS ORIGINÁRIOS DE OPERAÇÕES FINANCEIRAS CEDIDOS À UNIÃO. MP 2.196-3/2001. DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO. (PRECEDENTE. RESP. 1.123.539/RS, RECURSO ESPECIAL JULGADO SOB O REGIME DO ART. 543-C, DO CPC). 1. Os créditos rurais originários de operações financeiras, alongadas ou renegociadas (cf. Lei n. 9.138/95), cedidos à União por força da Medida Provisória 2.196-3/2001, estão abarcados no conceito de Dívida Ativa da União para efeitos de execução fiscal ? não importando a natureza pública ou privada dos créditos em si -, conforme dispõe o art. 2º e § 1º da Lei 6.830/90, verbis: "Art. 2º Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não-tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. §1º. Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o art. 1º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda.". Entendimento firmado pela Primeira Seção desta Corte
Superior, no julgamento do REsp 1123539/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, julgado em 09/12/2009, DJe 01/02/2010 (recurso representativo de controvérsia submetido ao regime do 543-C do CPC). 2. À luz da novel metodologia legal, publicado o acórdão do julgamento do recurso especial, submetido ao regime previsto no artigo 543-C, do CPC, os demais recursos já distribuídos, fundados em idêntica controvérsia, deverão ser julgados pelo relator, nos termos do artigo 557, do CPC (artigo 5º, I, da Res. STJ 8/2008).
3. In casu, cuida-se de execução fiscal destinada à cobrança de valores provenientes de operações de alongamento de dívidas originárias de crédito rural, ao amparo da Lei 9.138/95, posteriormente repassados à União, nos termos do art. 2º da MP 2.196/2001. 4. A exceção de pré-executividade é servil à suscitação de questões que devam ser conhecidas de ofício pelo juiz, como as atinentes à liquidez do título executivo, os pressupostos processuais e as condições da ação executiva. 5. O espectro das matérias suscitáveis através da exceção tem sido ampliado por força da exegese jurisprudencial mais recente, admitindo-se a argüição de prescrição e decadência, desde que não demande dilação probatória (exceção secundum eventus probationis). 6. A validade da execução fiscal, aferível pela presença dos requisitos de certeza e liquidez da Certidão de Dívida Ativa ? CDA que a instrui, demanda indispensável reexame das circunstâncias fáticas da causa, o que é vedado em sede de Recurso Especial, ante o disposto na Súmula nº 07, do STJ. 7. Agravo regimental desprovido.

Extrai-se do acórdão acima, de relatoria do Min. Luiz Fux, que os créditos cedidos à União por força da Medida Provisória 2.196-3/2001, estariam abarcados no conceito de Dívida Ativa da União para efeitos de execução fiscal ? não importando a natureza pública ou privada dos créditos em si. Portanto, afasta-se, nesse entendimento, a diferenciação da natureza do contrato, deixando de lado sua importância, visto que, conforme a mesma linha de raciocínio, os contratos, mesmo que de origem privada, estão elencados no dispositivo legal que a Lei 6.830/80 faz remissão, qual seja, a Lei 4.320/64 que conceitua dividas ativas tributárias e não-tributárias.
Acerca da inconstitucionalidade da MP 2.196-3, depois validada pela EC 32/2001, é o acórdão de relatoria da Min. Eliana Calmon:

PROCESSO CIVIL - CIVIL - CESSÃO DE CRÉDITO RURAL - MP 2.196-3/2000 - PRESUNÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE - CDA - REQUISITOS - ART. 349 DO CC/2002 - INOVAÇÃO OBJETIVA DA DÍVIDA - EXECUÇÃO FISCAL - TITULARIDADE DO CRÉDITO - VALIDADE - DÍVIDA ATIVA NÃO-TRIBUTÁRIA - INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA - INCIDÊNCIA DE ENCARGOS DECORRENTES - VALIDADE - DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL - AUSÊNCIA DE COTEJO - TRANSCRIÇÃO DE EMENTAS. 1. Embora o STJ como Corte de Justiça possa declarar a inconstitucionalidade de ato normativo através de seu órgão competente, presume-se constitucional medida provisória validada pela EC 32/2001. 2. Cabível a cobrança via execução fiscal de quaisquer créditos titularizados pela Fazenda Pública. Precedentes do STJ. 3. Inexistência de inovação objetiva do crédito cedido pela inscrição em dívida ativa, fato gerador que autoriza a incidência de novos encargos dela decorrentes. 4. É requisito formal da comprovação do dissídio jurisprudencial o confronto analítico entre os julgados em testilha para evidenciar a semelhança fática e a conclusão jurídica diversa. A transcrição de ementas, neste contexto, equivale à deficiência do recurso, nos termos da súmula 284/STF. 5. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido.

Já sobre a legitimidade da Fazenda Pública para a cobrança de créditos cedidos à União, colaciona-se o seguinte acórdão:

PROCESSUAL CIVIL. CRÉDITOS RURAIS CEDIDOS À UNIÃO. EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE. LEGITIMIDADE DA FAZENDA PÚBLICA PARA REALIZAR A COBRANÇA CONFIGURADA. DISSENSO PRETORIANO NÃO COMPROVADO. 1. É cabível a cobrança via execução fiscal dos créditos consolidado na CDA com origem em encargos financeiros egressos de alongamentos de dívidas rurais tomadas junto ao Banco do Brasil que foram cedidos a União. A Fazenda Pública Nacional é a parte legítima para cobrar tais créditos. 2. Não comprovada a divergência jurisprudencial nos moldes exigidos, não há que se dar guarida ao apelo extremo com finco no art. 105, III, "c", da CF.3. Recurso especial não provido.

Assim, o STJ através desse posicionamento recente, entende ser legal a cobrança, visto estar previsto na MP 2.196-3 que faz remissão a Lei 4.320/64, a cobrança dos créditos cedidos à União por meio de execução fiscal, sendo, por conseqüência lógica, a Fazenda Pública legitimada para cobrar tais créditos, restando afastada, portanto, qualquer inconstitucionalidade levantada acerca da MP 2.196-3, após validada por Emenda Constitucional.


2 NOS TRIBUNAIS REGIONAIS FEDERAIS


O Tribunal Regional Federal da 4ª Região propicia análise mais aprofundada, pois possui maior gama de julgados acerca do presente estudo.
O eminente desembargador Loraci Flores de Lima, em julgamento de recurso de apelação, decidiu:

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. CÉDULAS RURAIS PIGNORATÍCIAS. CRÉDITO DO BANCO DO BRASIL. EXTINÇÃO. ARTS. 267, I E IV, DO CPC. Preliminar de nulidade da sentença afastada. . Os créditos em questão - cédulas rurais pignoratícias - não podem, e nem mesmo estão inscritos em dívida ativa. O procedimento de sua cobrança não pode ser aquele da Lei de Execuções Fiscais. Embora Constituição de 1988 tenha alargado o rol de créditos que podem ser inscritos em dívida ativa (e que não estão arrolados no art. 39, § 2º, da Lei 4.320/64), o certo é que as cédulas rurais pignoratícias não sofreram qualquer alteração quanto a isso. A ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo enseja extinção do feito sem julgamento de mérito, matéria que pode ser conhecida pelo julgador a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição (arts. 267, I e IV e § 3º do CPC). Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. Apelação e remessa oficial improvidas.

Portanto, a ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo enseja a extinção do feito sem julgamento de mérito, ou seja, o contrato privado, no caso concreto acima, cédula de crédito rural, dispõe de regulamentação específica e própria para sua exigência, sendo que, nitidamente, não é a execução fiscal, acarretando então, a extinção do feito.
Não há margem à interpretação legal criativa. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo e os seus requisitos formais, taxativamente ditados na lei, conferem-lhe irrecusável certeza e liquidez. Não pode o judiciário recusar-lhe nem a natureza, nem os efeitos jurídicos próprios que decorrem dessa qualidade de título de crédito e executivo, por vontade expressa da lei.
A cédula de crédito rural possui características de direito especial e de ordem pública, ultrapassando as normas gerais comuns de direito, mesmo as de crédito bancário, além de conter amparo constitucional (art. 187, inciso I, da Constituição Federal). A sua disciplina se submete à Lei 4.829/65 e ao Decreto-Lei 167/67, recepcionados pela Constituição Federal com hierarquia de Lei Complementar, pelo que a Lei 9.138/95, que regulou a securitização não pode colidir com os ditames daqueles diplomas legislativos, de hierarquia superior. Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. EMENDA DA INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CÉDULAS RURAIS PIGNORATÍCIAS. CRÉDITO DE NATUREZA PRIVADA. NÃO APLICAÇÃO DA LEI N. 6.830/80.
[...]
2. O crédito em questão - cédulas rurais pignoratícias - não podem, e nem mesmo estão, inscritos em dívida ativa, o procedimento de sua cobrança não pode ser aquele da Lei de Execuções Fiscais. 3. Versando o feito acerca de créditos de natureza privada cedidos à União Federal, não pode ser utilizado o procedimento da Lei n. 6.830/80 para sua cobrança. O procedimento não corresponde à natureza da causa, embora estejam na titularidade de ente público. Precedentes do STJ. (grifei)

Desta feita, cédula de crédito rural, contrato de origem privada, é protegido também por lei complementar, com força de norma constitucional. Assim, tratando-se de norma de hierarquia superior, tais contratos também não podem ser abarcados pela MP que autoriza a União a exigir por meio de execução fiscal os contratos inadimplidos cedidos pelas pessoas jurídicas de direito público elencadas no já demasiadamente citado art. 1º, parágrafo único da MP 2.196-3/2001. São créditos que possuem limitação ainda maior, tornando clara a ilegalidade no procedimento adotado pela Fazenda Pública.
As autarquias, em que pese estarem previstas no rol trazido pelo art.1º da Lei. 6.830/80 , em exercendo função de banco, como por exemplo, o BRDE, não podem e não possuem legitimidade para propor Execução Fiscal para cobrança de crédito advindo de contrato de mútuo. Em acórdão de relatoria do Desembargador Federal Valdemar Capeletti evidencia-se tal limitação:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. A Justiça Federal é competente para processar e julgar tanto a execução quanto o presente recurso. O BRDE, sendo autarquia que atua como banco, não dispõe da execução fiscal para haver crédito advindo de contrato de mútuo. Isso significa dizer que o BRDE, conquanto entidade autárquica, não se inclui entre aquelas compreendidas na expressão Fazenda Pública. Portanto, não se lhe pode aplicar, relativamente às dívidas sob execução, o disposto no art. 730 e seguinte do CPC. (grifei)

Nada mais lógico, visto que, autarquia que atua como banco, banco é. Assim, não pode valer-se do rito da Execução Fiscal para a cobrança de seus créditos, conforme já explanado em momento anterior. Já a desembargadora Silvia Maria Gonçalves Goraieb, do TRF da 4ª Região, em julgamento de acórdão no corrente ano, destaca a impossibilidade da utilização da execução fiscal para a cobrança de crédito de natureza privada:

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. CÉDULAS RURAIS PIGNORATÍCIAS. CRÉDITO DO BANCO DO BRASIL. EXTINÇÃO. ARTS. 267, I E IV, DO CPC. ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. . Incabível a inscrição em dívida ativa dos créditos decorrentes de cédula rural pignoratícia cedida pelo Banco do Brasil à União Federal. Embora a Constituição de 1988 tenha alargado o rol de créditos que podem ser inscritos em dívida ativa (e que não estão arrolados no art. 39, § 2º, da Lei 4.320/64), as cédulas rurais pignoratícias não sofreram qualquer alteração quanto à natureza. . A ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo enseja extinção do feito sem julgamento de mérito, matéria que pode ser conhecida pelo julgador a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição (arts. 267, I e IV e § 3º do CPC). .Desconstituída a penhora no rosto dos autos do processo de inventário Adão Ortiz de Tunes, em razão da impossibilidade da utilização da execução fiscal para a cobrança de crédito de natureza privada. . Sucumbência fixada na esteira dos precedentes da Turma. Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. (grifei)

A Desembargadora Federal Silvia Maria Gonçalves Goraieb, no julgamento do Agravo de Instrumento nº 0000098-84.2010.404.0000/RS , analisou de maneira precisa e didática o tema estudado:

Assiste razão ao embargante quanto à alegada impossibilidade de cobrança do débito por meio de execução fiscal em relação à inscrição n. 90606000384-35, tendo em conta que a mesma reporta-se a créditos relativos a operações de crédito rural cedidas à Secretaria do Tesouro Nacional, na forma da Medida Provisória nº 2.196-3/2001, em razão de Renegociação e Confissão de Dívidas com Garantias Hipotecária, Pignoratícia e Cessão de Créditos, a qual, inicialmente, foi formalizada entre o embargante e o Banco do Brasil.
O Banco do Brasil é uma sociedade de economia mista, revestindo-se da forma de empresa particular e não dispõe de qualquer privilégio estatal, v.g., vantagens tributárias e as prerrogativas processuais da Fazenda Pública.
O crédito do Banco do Brasil cedido à União Federal leva consigo a mesma natureza privada. Portanto, não se pode confundi-lo com débito fiscal de caráter essencialmente público.
Assim, considerando que o crédito, objeto da execução fiscal, decorre de confissão de dívida de contrato privado, a embargada não poderia valer-se do procedimento das execuções fiscais para sua cobrança.
Nem se cogite que a Lei nº 6.830/80 (c/c Lei nº 4.320/64, artigo 39, § 2º), autorize a propositura de execução fiscal de débito não tributário no caso de contratos em geral, pois, consoante já ponderado, a confissão de dívida foi realizada, inicialmente, entre o embargante e o Banco do Brasil e não entre o embargante e a União Federal. (grifei)
Recentemente, o TRF da 4ª Região, em caso semelhante, deferiu pedido de efeito suspensivo, pleiteado em Agravo de Instrumento, o qual foi interposto contra decisão que, em sede de execução fiscal fundada em escritura pública de confissão de dívida com garantia pignoratícia e cessão de crédito mediante condição resolutiva, rejeitou exceção de pré-executividade. Oportuna a transcrição do inteiro teor do r. Despacho, cuja fundamentação adoto como razão de decidir:
Conforme alega a agravante, o crédito consolidado na CDA teria origem em encargos egressos de alongamentos de dívidas rurais tomadas junto a Banco do Brasil. Tal instituição financeira teria cedido o crédito para União apenas para valer-se de prerrogativas próprias do executivo fiscal, como rito sumário e possibilidade de utilização desse meio para a cobrança do crédito privado; incompetência da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional para inscrever e executar créditos sem natureza tributária ou fiscal; o sub-rogado não poderia ter contra o devedor mais direitos que o credor primitivo; a CDA seria elaborada com dados fornecidos pela instituição financeira, sem oportunidade de defesa em processo administrativo. Pede a atribuição de efeito suspensivo para que seja suspensa a execução, bem como sejam sustados os efeitos das inscrições em dívida ativa e no CADIN, possibilitando a emissão de certidões negativas de débito.
Em sede de cognição sumária, entendo como plausível o argumento pela agravante, uma vez que de fato entende E. STJ pela impossibilidade da utilização do procedimento executivo fiscal para a cobrança de crédito de natureza privada, mesmo que pertencentes a entes públicos:

PROCESSO CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL - ACÓRDÃO EMBASADO EM RAZÕES CONSUBSTANCIADAS EM MATÉRIA CONSTITUCIONAL - DÍVIDA NÃO TRIBUTÁRIA - INCABÍVEL O PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL.
I - ACÓRDÃO EMBASADO EM RAZÕES CONSUBSTANCIADAS EM MATÉRIA CONSTITUCIONAL NÃO SE MOSTRA APTO A REEXAME EM SEDE DE ESPECIAL.
II - SE O CONTRATO DE MÚTUO (EMPRÉSTIMO BANCÁRIO), OBJETO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO CAMBIARIFORME, VERSA RELAÇÃO JURÍDICO-MATERIAL DE NATUREZA PRIVADA. A CONTROVÉRSIA A RESPEITO DE TAL NÃO PODE SER APRECIADA, QUANDO VEICULADA ATRAVÉS DA EXECUÇÃO FISCAL, NEM, PARA O CASO, EM HOMENAGEM AO PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE, OS ATOS PROCESSUAIS JÁ PRATICADOS PODEM SER APROVEITADOS, POSTO QUE A CONSTITUIÇÃO DO TÍTULO EXECUTIVO FOI EFETIVADA SEM O PROCEDIMENTO REGULAR DA DÍVIDA ATIVA, MORMENTE QUANDO ESSE ASPECTO EMBASA O "DECISUM" E O INSTRUMENTO ORIGINAL DA DÍVIDA NÃO CONSTA DOS AUTOS.

Ainda, corroborando o entendimento, recente decisão proferida em Agravo de Instrumento:

DECISÃO: Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, em execução fiscal referente à dívida oriunda do programa federal de alongamento dos débitos rurais e cedida à União pelo Banco do Brasil, rejeitou a exceção de pré-executividade oposta pelo executado. Sustenta o agravante a impossibilidade da utilização de execução fiscal para cobrança de crédito privado, o que inviabiliza a inscrição em dívida ativa, assim como a nulidade da Certidão de Dívida Ativa, pois elaborada com base nas informações prestadas pelo Banco do Brasil S/A. Aduz que o credor sub-rogado não pode utilizar os privilégios e direitos não conferidos ao credor original. [...]. Relatado, decido. [...]. No presente caso, tenho que a questão ventilada pelo executado, ora agravante, se compreende no âmbito de impugnabilidade da exceção de pré-executividade, na medida em que a higidez do título executivo poderá ficar comprometida. Com efeito, a dívida executada refere-se a crédito oriundo de alongamento do contrato de crédito rural (cédula rural hipotecária) firmado entre o agravante e o Banco do Brasil, adquiridos, posteriormente, pela União, com fulcro na Medida Provisória 2.196-3, de 24.08.2001, que tratou do Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais. É certo que houve uma sub-rogação no crédito pela União. A situação, portanto, deve ser analisada à luz do art. 349 do Código Civil, segundo o qual se transfere ao novo credor os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo em relação à dívida. A contrário sensu, se o crédito cedido ou adquirido não podia ser cobrado por meio de execução fiscal, o novo credor não dispõe do rito especial, mesmo que seja um ente da Fazenda Pública. Além disso, a elaboração da certidão da dívida ativa foi baseada em dados fornecidos pelo Banco do Brasil, passando a gozar da presunção de certeza e liquidez que somente pode ser elidida por prova inequívoca a cargo do executado, nos termos do art. 3º da Lei 6.830/80. Há dúvida, outrossim, sobre se o crédito executado integra o rol do art. 1º da Lei 6.830/80, na medida em que é oriundo de um contrato de crédito rural, e não de um contrato administrativo típico. Em tal caso, a inscrição em dívida ativa e a utilização de procedimento executivo fiscal não se relacionam com a natureza privada do débito do agravante, cuja origem é o alongamento de dívidas rurais efetuado com base na Lei 9.138/95. Demais, a cessão é instituto pelo qual o credor pode ceder a terceiro o seu crédito, desde que a isso não se oponha a natureza da obrigação (art. 282, do Código Civil). No entanto, o crédito rural apresenta características de direito especial e de ordem pública, ultrapassando as normas gerais comuns de direito, mesmo as de crédito bancário, além de conter substrato constitucional (art. 187, inciso I, da Constituição Federal). A sua disciplina se submete à Lei 4.829/65 e ao Decreto-Lei 167/67, recepcionados pela Constituição Federal com hierarquia de Lei Complementar, pelo que a Lei 9.138/95, que regulou a securitização não pode colidir com os ditames daqueles diplomas legislativos, de hierarquia superior. Em tal perspectiva, a constitucionalização e especialização do crédito rural, fundada em princípios de ordem pública (art. 1º da Lei 4.829/65), não foram afastadas pelas normas de securitização.

Verdadeira aula sobre o tema é o que verificamos na decisão acima. O voto trouxe conceitos, julgados e demonstrou de forma clara, objetiva e sucinta, a ilegalidade do procedimento adotado.
Assim, coaduna-se o voto com todo o exposto no presente trabalho. É evidente que o Banco do Brasil ou qualquer entidade de cunho privado, em que pese ser pessoa jurídica de direito público, não possui as vantagens tributárias e as prerrogativas processuais da Fazenda Pública. Apesar de cedido à União, o crédito carrega consigo sua natureza, portanto, nada se altera quanto o procedimento para sua exigência; nada se altera quanto aos seus encargos; nada permite a transformação de um contrato privado, perfeitamente válido, em certidão de dívida ativa passível de execução fiscal, ao bel prazer da Fazenda pública.
Quando a eminente desembargadora diz:

Nem se cogite que a Lei nº 6.830/80 (c/c Lei nº 4.320/64, artigo 39, § 2º), autorize a propositura de execução fiscal de débito não tributário no caso de contratos em geral, pois, consoante já ponderado, a confissão de dívida foi realizada, inicialmente, entre o embargante e o Banco do Brasil e não entre o embargante e a União Federal.

Fica claro que a discussão não se prende na característica do crédito, tributário ou não-tributário, mas o cerne da questão se encontra na impossibilidade de mutabilidade contratual, de forma unilateral, alterando os termos originalmente pactuados, e principalmente, o meio de cobrança desse título que, se antes era perfeito e apto para a Execução pelo rito do CPC, passou a ser, de forma ilegal, exigível por meio de Execução Fiscal.


2.1 Posição contrária nos Tribunais Regionais Federais


O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, não é pacifico quanto a ilegalidade ou não, na cobrança de contratos privados por meio de execução fiscal.
Anteriormente vimos a corrente favorável a tese que entende ser ilegal tal cobrança e neste momento, passaremos a colacionar as jurisprudências noutro sentido, ou seja, julgamentos favoráveis ao fisco e, portanto, a legalidade na utilização de execução fiscal para a exigência de contratos primitivamente privados.
Nessa linha, acerca da possibilidade de execução fiscal de cédula de crédito rural, é o acórdão de relatoria da Des. Vivian Josete Pantaleão Caminha:

CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. EXECUÇÃO FISCAL. CRÉDITO CEDIDOS ATRAVÉS DA MP N.º 2.196-3/2001. ART. 2º, LEI N.º 9.138/95, ART. 5º E §§. PRECEDENTE DA 2ª SEÇÃO. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. POSSIBILIDADE. LEGITIMIDADE PASSIVA. BANCO DO BRASIL. ENCARGOS MORATÓRIOS. ENCARGOS APÓS A CESSÃO DO CRÉDITO À UNIÃO. 1. A Segunda Seção desta Corte firmou entendimento que a União possui legitimidade para efetuar a cobrança dos créditos oriundos da cessão de que trata a Medida Provisória nº 2196-3/2001 por meio da execução fiscal. 2. A transformação da dívida civil em dívida ativa tem previsão legal, no § 2º da Lei n.º 4.320/1964 e expressamente permite o enquadramento como dívida ativa não-tributária de quaisquer créditos decorrentes de obrigações de contratos em geral. No caso não retrata de uma simples cessão de créditos. Trata-se de renegociação de financiamento rural fundada na lei a cuja alocação de recursos se deu por conta do Tesouro Nacional (art. 1º, § 2º, da Lei n.º 9.138/1995). 3. A própria Medida Provisória n.º 2.196-3, de 24 de agosto de 2001, já previa o recebimento por parte da União dos créditos correspondentes às operações celebradas com recursos do Tesouro Nacional (art. 2º). 4. O Banco do Brasil, na qualidade de instituição financeira participante do Programa de Securitização de Dívidas de Crédito Rural, do Sistema Nacional de Crédito Rural, age por delegação do Poder Público, formalizando os financiamentos rurais por meio da emissão de cédula de crédito rural (Lei nº 9.138/95, art. 4º, parágrafo único). O agir por delegação de poder não afasta a sua legitimidade. 5. É firme entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que, embora haja previsão contratual de incidência de comissão de permanência, tal encargo é inexigível nas cédulas de crédito rural, disciplinadas pelo Decreto-Lei nº 167/1967, uma vez que o § único do art. 5º, do referido diploma legal, prevê a possibilidade de cobrança somente de juros e multa. 6. Em decorrência da mora, os juros remuneratórios poderão ser majorados até 1% ao ano, autorizada a cobrança de multa de 10% prevista no art. 71 do Decreto-Lei nº 167/67. 7. A limitação da multa contratual em 2%, nos termos do art. 52, § 1º do CDC, alterado pela Lei n.° 9.298, de 01.08.1996, aplica-se tão somente aos contratos bancários firmados após a vigência da referida alteração legislativa, o que não é o caso dos autos. 8. Após a cessão do crédito à União não mais incidem os encargos previstos no Decreto-Lei nº 167/67, mas sim a taxa SELIC e juros de mora de 1% ao ano, conforme expressamente dispõe o art. 5º da MP 2.196-3/2001.

A eminente desembargadora entende ser possível a utilização de execução fiscal para a cobrança das cédulas rurais, visto que, segundo vosso entendimento, o Banco do Brasil age por delegação do Poder Público, formalizando os financiamentos rurais por meio da emissão de cédulas rurais, e, portanto, o banco agindo por delegação do Poder Público, e com o advento da MP 2.196-3/2001, fica a União Federal, autorizada a executar tais contratos por meio de execução fiscal.
Carlos Eduardo Thompson Flores, no julgamento da Apelação Cível 2007.70.16.001835-0, firma posição no sentido de que Podem ser cobrados, por meio de execução fiscal, créditos da Fazenda Pública, mesmo que não tenham natureza tributária:

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CRÉDITO RURAL. CESSÃO DE CRÉDITO. LIMITAÇÃO DE JUROS. JUROS MORATÓRIOS. MULTA MORATÓRIA. SELIC. 1. Não há nulidade no processo administrativo. Os embargantes foram notificados do vencimento e dos atrasos, bem como da cessão de crédito em favor da União. 2. Não há qualquer ilegalidade na cláusula que prevê o vencimento antecipado em caso de inadimplemento, porquanto em consonância com a boa-fé objetiva que deve nortear os contratos. Não pode o devedor inadimplente pretender que o credor espere o vencimento de cada uma das parcelas do contrato de mútuo para promover a cobrança do débito ou promova uma ação para cada parcela que for se vencendo sob a justificativa da ilegalidade da cláusula contratual em comento. 3. Podem ser cobrados, por meio de execução fiscal, créditos da Fazenda Pública, mesmo que não tenham natureza tributária. A legislação inclui os contratos e garantias como possibilidades de dívida de natureza não-tributária, e, no caso específico dos autos, houve alongamento de prazos e cessão de créditos para a União, com recursos do próprio Tesouro Nacional, não se revestindo o ajuizamento em ato ilegal. (TRF da 4ª Região, EIAC 2006.70.09.004668-0/PR, 2ª Seção, Relª Desª. Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. 17/04/2008) 4. O STJ já pacificou o entendimento da possibilidade de revisão de contrato anteriores e liquidados. Porém, no caso dos autos, a cédula levada à inscrição é aquela originalmente emitida. 5. Os juros remuneratórios a serem cobrados nas cédulas de crédito rural não estão limitados a 3% ao ano, mas a 12% ao ano conforme precedente do Eg. STJ, REsp 887.034/DF, 3ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 08/02/2008). No caso dos autos, foram estipulados juros remuneratórios de 3% ao ano. 6. São devidos os juros moratórios posto que foram pactuados em 1% ao ano, conforme o estipulado no art. 5º, parágrafo único, do Decreto-Lei 167/67. No caso dos autos, foram nesse patamar os juros moratórios estipulados na cédula rural. 7. O entendimento prevalecente no STJ, é assente no sentido de que não cabe a redução da multa moratória de 10% para 2% nos contratos firmados antes da vigência da Lei 9.298/96, de 1º.08.1996, em razão do que dispõe o § 1º, do artigo 52, do Código de Defesa do Consumidor, na sua redação originária. 8. Determina a MP 2.196-3, em seu artigo 5º, que após o inadimplemento contratual, deverão incidir a Taxa Selic e juros de mora de 1% ao ano sobre o valor principal. A aplicação da Taxa SELIC aos créditos não tributários da Fazenda Nacional tem amparo legal. 9. Apelação improvida.

A possibilidade e a previsão legal de transformação de dívida civil em divida ativa, é o destaque do acórdão abaixo colacionado, de relatoria da Desembargadora Marga Inge Barth Tessler:

EXECUÇÃO FISCAL. TÍTULOS DE CRÉDITO (MEDIDA PROVISÓRIA N.º 2.196-3/2001, ART. 2º, LEI N.º 9.138/95, ART. 5º E §§). PRECEDENTE DA 2ª SEÇÃO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EXIGIBILIDADE SUSPENSA. LEI Nº 1.060/50, ART. 3º, V. 1. A transformação da dívida civil em dívida ativa tem previsão legal, no § 2º da Lei n.º 4.320/1964 e expressamente permite o enquadramento como dívida ativa não-tributária de quaisquer créditos decorrentes de obrigações de contratos em geral. No caso não retrata de uma simples cessão de créditos. Trata-se de renegociação de financiamento de safras agrícolas fundada na lei a cuja alocação de recursos se deu por conta do Tesouro Nacional (art. 1º, § 2º, da Lei n.º 9.138/1995). A própria Medida Provisória n.º 2.196-3, de 24 de agosto de 2001, já previa o recebimento por parte da União dos créditos correspondentes às operações celebradas com recursos do Tesouro Nacional (art. 2º). 2. Entendimento adotado pela 2ª Seção deste Tribunal no julgamento dos Embargos Infringentes em AC nº 2006.70.09.004668-0/PR, rel. Desembargadora Federal Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. de 17.04.2008. 3. A concessão da gratuidade de justiça impõe a suspensão da exigibilidade da verba honorária, cuja isenção vem prevista no inciso V, do art. 3º da Lei nº 1.060/50.

O entendimento da relatora foi no sentido de que a transformação de dívida civil em dívida ativa tem previsão legal, tendo por base a Lei 4.320/1964, §2º, que, segundo o entendimento da eminente desembargadora, permite o enquadramento como dívida ativa não-tributária de quaisquer créditos decorrentes de obrigações de contratos em geral.
Cabe ressaltar que, nesse mesmo julgamento, houve voto divergente da Desembargadora Silvia Maria Gonçalves Goraieb, que, conforme já visto e colacionado ao presente trabalho, tem posição firmada no sentido da ilegalidade de tal cobrança, corroborando com a posição defendida no presente trabalho.